#morrendo de vergonha por conta do tamanho *risos risos*
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—ㅤㅤnĂvel um,ㅤㅤpov dois.
CHALÉ 15, ㅤㅤ(CIRCE).
“Mais uma vez.”
A voz da filha de Circe ecoou pelo pequeno espaço que compartilhavam. Em um movimento rápido, ela colocou mais um bloco de madeira sobre a mesa, a poucos centĂmetros de Natalia. Na teoria, tudo parecia fácil. Durante dias intermináveis, a filha de HĂ©cate leu grimĂłrios e compreendeu todos os conceitos. Mas colocá-los em prática era outra histĂłria. Ă€s vezes, a luz esverdeada surgia sem qualquer dificuldade. Outras vezes, nĂŁo importava a pressĂŁo, nada acontecia. O que ela estava fazendo de errado? Logo atrás, havia uma prova extensa de que todos os esforços estavam sendo em vĂŁo: mĂşltiplos blocos de madeira nĂŁo mais em sua forma original, “derretidos”, queimados, em pĂł. As exigĂŞncias de Emily a sufocavam, e por um segundo, ela se arrependeu de ter seguido o conselho de QuĂron, que, preocupado, indicou uma filha habilidosa da deusa da feitiçaria para ajudá-la, já que sua teimosia a impedia de recorrer a um dos irmĂŁos.
As duas haviam se aproximado na ilha de Circe. Emily foi atenciosa e amigável, guiando-a nos ensinamentos sobre feitiços. O que praticavam agora se tornava um pouco mais suportável, e seria ainda melhor se nĂŁo fossem as várias imposições que a atingiam a um nĂvel absurdo de cansaço. “VocĂŞ nĂŁo está fazendo direito. NĂŁo está se concentrando direito”, disse Emily alto, trazendo Natalia de volta Ă realidade. “NĂŁo está usando os gatilhos certos. Está dispersa. Relapsa. Manipular a realidade pode parecer fácil, mas ao mesmo tempo Ă© difĂcil. Os livros nĂŁo serĂŁo suficientes se nĂŁo houver prática.” Sua voz era dura e impassĂvel, como a de uma professora que buscava a perfeição em sua aluna. Definitivamente, nĂŁo haveria “paz” enquanto Natalia nĂŁo desse o que era pretendido ali. “Vamos lá. NĂŁo se faça de boba, Natalia. Deve haver algo aĂ dentro que pode impulsioná-la. Poderes como o seu sĂŁo reativos. Raiva, ira, tristeza, alegria… amor...” Ela riu, como se fosse fácil captar o que Natalia estava sentindo. Envergonhada, a filha de HĂ©cate encolheu-se um pouco. “Use isso a seu favor. Pense em algo. E deixe...” PrĂłxima ao seu ouvido, Emily fez questĂŁo de tornar ainda mais claro o que queria expressar. “Deixe o caos se expor.”
Caos. Aquela pequena palavra surgia repetidamente nas páginas antigas que Natalia havia se proposto a ler. Claro, a magia era caĂłtica, um poder instável que precisava ser controlado, regido por forças que podiam ultrapassar o limite do natural. A mais nova amiga tinha razĂŁo. Natalia precisava de um motivo, ou estaria perdendo tempo. Mas o que deveria escolher? Era irĂ´nico. Ela tinha motivos suficientes para fazer tudo acontecer. Entretanto, o que a impedia? Medo, talvez? Por tanto tempo, ela se acostumou com a ideia de nĂŁo ter poderes desse tipo. Na força fĂsica, ela se aprimorou, e nas armas, dedicou toda a sua confiança. A forma como tudo havia acontecido, e aquele poder ter surgido, ainda nĂŁo fazia sentido. Durante dez anos, nĂŁo era merecedora ou nĂŁo estava preparada para lidar com algo assim. Pensando bem, a Natalia de dezoito anos teria lidado muito mal com toda a situação. Ainda que calma, era imprudente, um tanto egoĂsta… e assustada. Por meses, ela nĂŁo permitiu a aproximação de muitas pessoas e pouco tinha controle sobre as prĂłprias emoções. O pensamento a fazia rir: teria uma outra reputação e, talvez, nĂŁo seria a mesma pessoa de hoje. “Eu nĂŁo sei como posso fazer isso sem ser intensa demais.” Disse, enfim, olhando a outra com seus tĂpicos olhos lamuriosos. “NĂŁo sei expressar. Tenho medo… Medo de ser impulsiva demais e assustar. Assustar vocĂŞ, assustar as pessoas de quem gosto. E agora, tenho medo de deixar isso sair de mim e acabar criando uma bagunça que nĂŁo Ă© necessária.” Um sorriso gentil, porĂ©m triste, cresceu em seus lábios. “Os Ăşltimos acontecimentos bastaram para reafirmar o que estou dizendo.” Os pesadelos, as visitas onĂricas, os traidores, as pessoas machucadas, deuses revoltosos, novos sentimentos que floresciam e pareciam ser recĂprocos… tudo isso a atingiu com força. As mĂŁos foram imediatamente ao tampo de madeira da mesa, os dedos apertados ali, tornando os nĂłs esbranquiçados. Por um segundo, ela desejou ter uma caneta e um papel em mĂŁos. Em momentos como aquele, escrever aliviava. Se nĂŁo expressava em voz, as palavras eram suas amigas, e o sentimento de calma era imediato. Natalia parecia a ponto… de explodir. Do outro lado da sala, Emily a observava com um sorriso pequeno, mas vitorioso, nos lábios. A raiz da situação estava sendo tocada, e nĂŁo tardaria muito para que os poderes provenientes de HĂ©cate começassem a se manifestar.
A sensação era estranha. Todo o corpo parecia adormecer e as mĂŁos esquentavam, quase em estado febril. A boca secava, tornando-se necessário passar a lĂngua pelos lábios. Fechar os olhos, especialmente, era essencial. Embora tudo estivesse em silĂŞncio, Natalia conseguia ouvir o barulho fraco de algo se aproximando ou crescendo. Os batimentos cardĂacos tambĂ©m eram perceptĂveis, tornando-se ensurdecedores apenas para ela. Na mente, travava uma batalha consigo mesma, tentando organizar o caos mental. Contudo, uma Ăşnica lembrança se destacou juntamente com a frustração. A memĂłria da visĂŁo que teve no mesmo dia do roubo de energia se intensificou. A cena, que parecia um filme de terror, de pessoas importantes dispostas em um caixĂŁo, era algo que ela tentava esquecer, mas que seria sempre um lembrete do que poderia acontecer. As palavras do pai naquele cenário ainda causavam arrepios. A forma como foi comparada Ă mĂŁe, a mulher que mais detestava entre todos os deuses, trazia-lhe desgosto. Ela era impulsiva, algo que, de algum jeito, era imutável. Contudo, como a deusa, ela protestaria. NĂŁo era certo, nem justo.
Enquanto isso, a filha de Circe era a felizarda da vez, assistindo ao pequeno show que se desdobrava diante de seus olhos. O cubo que havia deixado sobre a mesa assumia repetidas e diferentes formas. O papel de parede azulado mudava de cor freneticamente, e as prateleiras cheias de livros acompanhavam o mesmo ritmo. As cadeiras pareciam saltar sobre o assoalho, e de repente, o clima dentro da sala mudou. Parecia que ia chover. O ambiente ficou mais ventilado, apesar da ausĂŞncia de janelas, como se o prĂłprio Éolo estivesse presente realizando uma de suas façanhas. Mais Ă frente, havia dois copos com água. Emily se aproximou para se certificar do que estava vendo: ali dentro, parecia haver um pedaço do oceano, e quanto mais se aproximava, mais tinha certeza de que podia ouvir o bater das ondas e o soar alto das gaivotas. Natalia era a fonte de tudo aquilo. Como HĂ©cate, estava mudando a realidade, mas em meio ao descontrole. Era um começo, concluiu. Se continuasse assim, logo poderia se equiparar Ă prĂłpria deusa. Sua atenção foi roubada novamente ao presenciar a magia tomando uma cor. Verde. Verde como campos de baixa gramĂneas. Verde como a vastidĂŁo de um campo bem cuidado. A luz escapava pelas mĂŁos de Natalia, semelhante a chamas, já que a mesa com a qual estava em contato parecia querer se desmanchar em razĂŁo da força ali exercida.
Por outro lado, Natalia estava focada em livrar-se dos pensamentos que a envenenavam, completamente alheia ao que estava acontecendo. Se nĂŁo houvesse nenhum limite, continuaria daquele jeito por mais tempo, mas o cansaço se fez presente, obrigando-a a parar. O corpo parecia amolecer, semelhante ao que sentiu quando teve a energia usurpada, mas em uma complexidade menor. NĂŁo muito antes de voltar Ă realidade, Emily a tocou, e antes que pudesse abrir os olhos para observá-la, ouviu: “Bloco de madeira, casinha de boneca.” A imagem dos objetos surgiu em sua mente, rapidamente fazendo com que largasse a mesa, tateando pelo primeiro objeto mencionado. Natalia o segurou com força e, em seus dedos, sentiu a mudança ocorrer livremente. Mais um pouco. Estava quase lá. Precisava apenas se concentrar. Aguentar, respirar, imaginar e colocar em prática. NĂŁo era tĂŁo difĂcil. “Abra os olhos. Abra os olhos!” Ouviu a exclamação. Ao lado, Emily pulava alegre, largando a postura dura de antes. Em suas mĂŁos havia uma casa perfeita em miniatura, a imagem exata do que havia imaginado. AlĂ©m disso, viu suas mĂŁos tomadas por aquele verde vivo, precisando levar ambas ao rosto para confirmar o que estava enxergando. “VocĂŞ causou uma impressĂŁo e tanto aqui dentro. NĂŁo sei se irá agradar as minhas irmĂŁs, mas a nova decoração nĂŁo Ă© tĂŁo ruim.” Seus olhos pularam do brinquedo para os mĂłveis. Eram diferentes: uma mescla de mĂłveis do sĂ©culo XIX, que em nada tinham a ver com os objetos de antes. O queixo caiu e o olhar lamurioso ganhou novas proporções. “Sinto muito… por tudo. Eu nĂŁo quis…”
“Relaxe. Relaxe, Natalia.” O tom era calmo e a postura menos exigente. “É claro que vamos precisar de um novo estofado. Talvez veludo. Ainda nĂŁo sei. Eu gostei muito. Uma pequena novidade para todos as filhas de Circe. Enfim, foi o suficiente por hoje. NĂŁo Ă© bom exigir muito, embora gostaria de continuar.” Natalia foi rápida em responder: “NĂŁo. Eu nĂŁo estou cansada.” O olhar sĂ©rio da outra a silenciou. “QuĂron ficará feliz em saber que conseguiu dar o primeiro grande passo, apesar de seus lamentos e sua teimosia. Se quer me agradar, poderá tentar trazer as poltronas ao seu estado de antes, mesmo que mentalmente exausta. Eu quero ter certeza de que o chalĂ© estará como antes para quando vocĂŞ for embora.” Ela nĂŁo questionaria. Colocar as coisas no lugar parecia uma exigĂŞncia tĂŁo pequena, e nĂŁo se importava em tentar. Se esticou para o objeto mais prĂłximo, imaginando o que fazer. Ainda que confusa, estava calma e confortável. “VocĂŞ consegue. Mentalize. Imagine e execute.” A voz da filha de Circe pareceu distante, mais prĂłxima ao canto da sala, entĂŁo Natalia teve um segundo para respirar. “Velho ao novo.” Disse, em um tom baixo. E as coisas voltaram ao normal. Como mágica, a luz verde desapareceu.
NĂŁo havia conseguido fazer muito, mas sentiu um alĂvio ao ver que o caos que havia criado poderia ser controlado. Um sorriso tĂmido surgiu em seus lábios, ainda ofegante, enquanto se virava para Emily, que a observava com um olhar avaliador, mas satisfeito. “Bem feito, Natalia. Apesar de toda a relutância, vocĂŞ conseguiu. Mas lembre-se, o verdadeiro desafio será manter esse controle em situações mais intensas e caĂłticas. VocĂŞ tem potencial, mas precisa aprender a confiar em si mesma e, principalmente, a dominar suas emoções.” Natalia assentiu, sabendo que as palavras da semideusa eram verdadeiras. Controlar sua magia significava controlar suas prĂłprias emoções, e isso era algo que ela ainda estava aprendendo a fazer. Mas agora, pelo menos, havia dado um passo na direção certa. A filha de Circe sorriu levemente, um raro vislumbre de afeto voltando a quebrar sua fachada severa. “VocĂŞ tem um longo caminho pela frente, Natalia, mas nĂŁo duvide de sua capacidade. Com esforço, vocĂŞ poderá alcançar grandes feitos. Agora vá descansar. AmanhĂŁ, começaremos novamente.” Natalia pegou a pequena casinha de bonecas e a segurou com cuidado. Era um lembrete tangĂvel de sua conquista, por menor que fosse. Saindo do chalĂ©, sentiu-se mais leve, embora soubesse que o caminho Ă frente seria árduo. Ainda assim, com cada pequeno sucesso, sentia que estava um passo mais perto de entender seu poder e a si mesma.
Enquanto se dirigia ao seu mais novo lar temporário, o chalĂ© nove, seu coração estava mais tranquilo. O treinamento tinha sido exaustivo, mas tambĂ©m revelador. A magia dentro dela era real, poderosa e poderia ser perigosa, mas, acima de tudo, era uma parte intrĂnseca de quem ela era. Agora, ela sĂł precisava aprender a usá-la corretamente, e sabia que, com tempo e prática, conseguiria. Ao chegar no quarto de Kit, Natalia colocou a pequena casa de bonecas na mesa de cabeceira e se deitou na cama. O cansaço finalmente a alcançou, e seus olhos pesaram. Enquanto o sono a envolvia, um Ăşltimo pensamento passou por sua mente: ela tinha medo de quem poderia se tornar, mas estava determinada a descobrir.
@silencehq
#poderes despertos: povs.#poderes despertos: nĂvel um.#ㅤ꒰ㅤㅤ⋆ㅤ ÍŹÍŹÍŹ ͏͏͏𝑏𝑙𝑜𝑜𝑑𝑦𝗺𝗮𝗴𝗶𝗰ㅤ ÍŹÍŹÍŹ ͏͏͏。 ㅤ༄ㅤ ÍŹÍŹÍŹ ÍŹÍŹÍŹdevelopment.#morrendo de vergonha por conta do tamanho *risos risos*#contexto: eu me empolguei porque eu gostei bastante de escrever este#mais um pra tabelinha!!! win win
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19 de Janeiro de 2013
Por Marjorie
— Humm… É você, Tadeu, que droga! - resmungo tapando a cara com a coberta, jogo-me no colchão novamente. — Meu sonho estava tão bom, sabia? - Afago o monte de pelos, sorrindo só de lembrar. — Que horas são? - Devia passar das 11hrs da manhã.
*10h45mim*
Erro por 15mim, constato no celular.
*4 sms*
*7 chamadas perdidas*
*1 mensagem de voz*
Todas do Leonardo Miggiorin.
Pulo da cama, sentando em seguida. Minha cabeça doĂ. Olho em volta forçando o cĂ©rebro a lembrar de algo e nada. NĂŁo lembro de muita coisa, a nĂŁo ser Ă© claro, de ter bebido, e muito.
— Hey, o que Ă© isso? O que Ă© que vocĂŞ tem aĂ, Tadeu… Tadeu, aqui! Dá aqui, deixa eu ver. - Consigo apanhar o papel da boca dele sem rasgar. Mal posso crer no que os meus olhos leem:
Que amor… É muito amor!
Beijo o papel, olhando sua caligrafia com carinho. Leio-o novamente.
— E você, hein, danadinho, cumpriu direitinho o que o Thia… Quem é que é “seu dono” mesmo? Sou eu ou o senhor já se vendeu, rápido demais, para o Thiago?
CafĂ©, Ă© tudo o que eu quero no momento. NĂŁo qualquer cafĂ©, mas sim o dele. O que Thiago Fragoso preparou especialmente para mim. Pego o celular e rumo para cozinha como uma perfeita idiota. Penso em retornar as ligações do LĂ©o, mas desisto assim que avisto a tĂ©rmica de cafĂ© junto a duas xĂcaras postas na mesa.
Duas, porque duas xĂcaras!?
Sento-me e ao me servir noto o semicĂrculo borrado no fundo de uma das xĂcaras, sĂł entĂŁo me dou conta de que ele provou o seu cafĂ© antes de sair. NĂŁo acredito que perdi essa cena. Se tivesse acordado mais cedo o teria visto preparar o cafĂ©, melhor, podĂamos ter tomado o cafĂ© da manhĂŁ juntos.
. Estranhamente minha dor de cabeça havia passado sem sequer sorver um gole daquele cafĂ©, que fumegava um aroma delicioso. Provo, depois de permanecer alguns minutos com a xĂcara apenas colada aos meus lábios, e nĂŁo sĂł o aroma Ă© delicioso como o sabor tambĂ©m.
Vejo o comprimido em cima da mesa e sou obrigada a rir da sua preocupação exagerada. Do seu excesso de zelo. Tomo o comprimido com um gole de café e quando dou por mim estou ouvindo meu coração bater junto com o toque de chamando.
— Quer dizer que o Tadeu, agora, é o responsável por mim? - questiono sem ao menos deixá-lo dizer “oi”.
— Sim, na minha ausência, ele é, sim. - Ouço o barulho que ele faz quando prende a risada. Não preciso vê-lo para saber que ele está sorrindo, porque o seu sorriso é o mesmo que o meu.
— Desde de quando vocĂŞ e ele sĂŁo amigos Ăntimos? - pergunto curiosa
— Desde de que eu e ele passamos a amar a mesma pessoa. - Amar? — Tomou o remédio? - emenda ele, enquanto eu ainda conjugava o verbo amar. — Marjorie, tomou ou não tomou?
— Hã…Não – minto apenas para deixá-lo bravo e ouvir sua voz se alterar do outro da linha.
— Marjorie! - PĂ©ssima ideia, minha cabeça parece que vai explodir com a voz rĂspida do Thiago ecoando nos meus ouvidos. — Quer fazer o favor de… Â
— Eu já tomei… - digo tentando parecer melhor do que realmente estava. Porque, meu Deus, remédios não tem efeito imediato? Levo a mão à cabeça, como se segurá-la fosse ajudar.  — Quer falar com seu amigo, Tadeu, para ter certeza?
— NĂŁo – ele Ă© rápido em dizer. — Confio em vocĂŞ.  – Quase deixo a xĂcara cair ao levantar. Sua voz Ă© intensa e segura, fazendo-me estremecer. Isso Ă© um jogo comigo, o qual o Tadeu parece disposto a participar, latindo.
— Ouviu?
— Humm… Viu só, não precisei nem perguntar, ele já respondeu. - Quase engasgo com o tamanho do seu convencimento. Chegou ontem e acha que pode tudo, até mesmo ganhar a confiança do meu filho?
— Tadeu, meu filho – o encaro chateada.  —, você não era dado assim, não.
— Ah, não? - Thiago ri alto com o gurnido que recebo em troca. São dois contra mim, desisto. — E o nome não significa nada? Ta-deu. Deu, é dado – debocha sem controlar o riso.
— Ha, ha – murmuro mal-humorada. — Péssimo trocadilho, alias como o seu café.
— Meu café é ruim? - indaga ofendido e eu o qualifico como:
— Péssimo, horroroso e intragável. – Mesmo não sendo.
— Mas é uma ingrata mesmo – diz sério. — Devia ter largado você com o porteiro e ido embora em vez de passar a madrugada inteira cuidando de você e como se não bastasse, acordo atrasado e ainda assim eu fiz café para você.
— Você dormiu aqui? - pergunto o obvio. É claro que ele dormiu.
— Sim, como vocĂŞ acha que o cafĂ© estaria quente atĂ© a hora da senhorita acordar? - Largo as xĂcaras na pia, despejando um pouco da água dentro e acabo nĂŁo compreendo-o. NĂŁo importa. Ele dormiu aqui…
— Co-migo? - gaguejo nervosa. — Na minha cama? - Ah, Marjorie, para de fazer perguntas idiotas.
— Claro, Marjorie, a onde mais você queria que eu dormisse? Na varanda com o Tadeu - fala com a maior naturalidade. — A propósito, porque você tranca o coitado na varanda?
— Eu não tranco ele na varanda, ele que gosta de ficar lá.
— Ele não me pareceu muito contente hoje de manhã, não. – Tadeu, porque ele quer conversar sobre o Tadeu, agora? Me arrasto até a sala e me jogo no sofá.
— Thiago, você… - A ligação fica muda até que eu decido enfim perguntar. — Minha…Que blusa velha é essa que eu… - Surpreendo-me. — Eu tô usando calci-?
— Ah, não me pede para explicar isso, Marjorie – Fica um instante calado. —, foi você quem pediu para colocar. - Seu constrangimento é palpável.
— Meu Deus, o que quê eu fiz me fala?
— Você não se lembra de nada mesmo, nadinha!? Faz um esforço aà na sua cachola.
— Cachola? - Thiago merecia um tapa por se referir a minha cabeça nesse termo. — AĂ, tá doendo – resmungo — NĂŁo ri. - Porque eu nunca lembro que manhĂŁs como a de hoje sĂŁo a consequĂŞncia previsĂvel de noites como a de ontem?
— Mah?
— Ta, o que eu me lembro: - concentro-me em respondê-lo. — Lembro de você chegando na festa com a… - me recuso a pronunciar o nome dela e na falta de adjetivo melhor, digo: — Você sabe quem e… E depois eu bebi.
— Bebeu, chamou a Mariana de múmia, vazdia e Morticia Addams.
— Eu a chamei de?
— Chamou.- Custo a acreditar que eu realmente tenha dito isso, mas o Thiago não tem porque mentir.
— Me desculpa, e-eu não vou pedir desculpa por isso. - – Comemoro. Beber, de repente, valeu a pena e a dor de cabeça? A dor de cabeça era só recompensa por ter dito o que penso. Talvez eu deve reavaliar os meus conceitos e beber mais vezes, especialmente, na companhia dos dois.
— Dizem que a gente fala a verdade quando bebe. - Ah é sério, Thiago? O que ele está querendo, afinal, me provocar?
— Eu falo a verdade sempre, palhaço!
— Ui, essa doeu, Mah, tudo bem eu vou…  - Ah, merda! Não quero que ele desligue, não agora, não desta forma.
— Espera, o que mais eu fiz? - Ouço sua respiração se alterar. Ufa, evito que ele desligue.
— Marjorie, você tem certeza que quer mesmo saber? - Sua voz é meiga e cautelosa. Estou ansiosa, nervosa e confusa ao mesmo tempo, não sei se quero realmente saber o que mais eu fiz nessa festa, mas mesmo insegura o encorajo a prosseguir.  — Bom, você cantou e dançou em cima da mesa fez da garrafa de cerveja o seu microfone e cantou, cantou muito. Juro, Marjorie, não sei quantas músicas você cantarolou durante a festa. Foi do samba ao pop rock sem o maior problema. Depois no carro e depo…
— Depois, depois o quê, fala? Thiago, a gente…- Tenho medo da sua resposta, mas preciso saber. — É  - Respiro fundo. —, eu e você…
— Ah, Marjorie, foi tĂŁo bom, vocĂŞ nĂŁo lembra. - Ele está brincando comigo, sĂł pode. Mas e se…  Como queria lembrar desta noite nos mĂnimos detalhes. — VocĂŞ dormiu nos meus braços e… sĂł dormiu mesmo.
— Jura? - suspiro aliviada. — Ainda bem.
— Ainda bem? Achei que você queria.  – Queria, não. Eu quero e muito.
— Sou só eu quem queria, Thiago? – Aperto os dedos contra o celular como se o ato fosse amenizar a minha expectativa.
— Não. - ofega. — Você sabe que eu te quero. – Ele está mesmo me dizendo isso por telefone? Sua voz é tão próxima que quase posso ouvir a sua pulsação ao falar.
— Quer? – sussurro ainda sem acreditar que estamos mesmo conversando sobre o bem-quer. Sobre um quer o outro sem esconder o desejo.
— Quero – ele volta a afirmar enfático. — Só não aconteceu, ontem, porque… – Eu apaguei alcoolizada. Posso apostar que fiz bem mais do que a gentileza e generosidade do Thiago permitem contar.
— Ai, eu estou morrendo de vergonha, Thiago, não quero te ver nunca mais. Não quero olhar para sua cara tão cedo.
— Não brica com uma coisa dessa, Marjorie. Eu quero te ver. Quero te ver sempre. - Está todo sério, agora. Sei que ele está sendo sincero e por isso não penso duas vezes, quero encontrá-lo.
— A onde você está?
— Trabalhando.
— No Projac?
— Onde mais, Marjorie? Eu cumpro os meus compromissos – responde ele com entusiamo.
— Ai, meus Deus, esqueci, eu tenho gravação hoje? – Caço minha bolsa com olhar e antes que eu a encontre, Thiago responde.
— Não tem – Como ele sabe? —, olha só que sorte a sua, não vai precisar me ver. – Sorte? Se isso for a minha sorte, Deus me ajude!
— Eu quero te ver – murmuro de repente
— Ué, que mudança repentina é essa, Mah? – estranha, ele — Há um minuto atrás…
— Eu quero te ver, posso? – pergunto como uma adolescente que vai a um encontro pela primeira vez.
— Eu vou adorar – diz simplesmente. — Preciso desligar agora, amor, estão me chamando aqui. Vou gravar.
Amor…. Ah, ele precisa urgentemente parar de brincar com o que diz, pois cada vez que ouço é como uma chama que se acende e me enche de esperanças. Não suportaria pensar ser este apenas um descuido seu.
Paro enfim de encarar o celular feito uma tola apaixonada. Se eu quiser o encontrar a tempo para o almoço, tenho que correr e me arrumar. Afinal, ele me deve um. Nossa última tentativa de almoçarmos juntos tinha sido arruinado pela visita surpresa da Mariana.
~*~
*Cadê vc? A festa já começou!?*
*SĂ©rio, vc desaparece e depois nĂŁo responde? TĂ´ preocupado, me liga*
*Ta. Entendi. Vc nĂŁo vem ;( *
*Acho bom vc ter uma explicação muito boa para dar*
Leio as mensagens do Leo enquanto espero Thiago concluir a gravação.
*Oi, aniversariante*
Penso rapidamente no Leo ao apertar “enviar” e, apesar do meu cansaço recordo da sua mensagem de áudio pouco agradável aos ouvidos. Meu celular vibra: Leonardo Miggiorin
*Vc lembrou*
Penso no que responder:
*Claro, vai fazer alguma coisa especial para comemorar os 31?*
*Já fiz. Vc está atrasada*
*Ta. rsrs. Jantar hoje? Passo na sua casa Ă s 7*
Sem resposta, encaro o celular por mais uns segundos e desisto. A porta se abre no mesmo instante em que levanto.
— Marjorie! - Fito o seu olhar, nossos olhares se cruzam Ăntimos. Sorrimos um para o outro.
— Ei, já vi que eu tĂ´ sobrando aqui – EmĂlio apressa-se em despedir —, atĂ© depois, Thiago. - Ignorando a saĂda do amigo, ele passa os dedos na lateral do meu rosto, da tĂŞmpora atĂ© a nuca.
— VocĂŞ veio – diz fazendo uma trilha, entĂŁo da nuca atĂ© a cintura. Sua mĂŁo se une a minha enquanto ele abaixa a cabeça e, em seguida, seus lábios estĂŁo colados aos meus com suavidade e cuidado. Aperto a mĂŁo livre no seu pescoço e me aproximo dele, aprofundando o nosso beijo. Ele solta a minha mĂŁo, deixando-a livre para percorrer meu quadril. Sua mĂŁo Ă© quente sobre a minha pele, e se move palma a palma sobre a perna nua atĂ© a extremidade sensĂvel atrás do joelho. Ah, saia e o poder que ela exerce sobre os homens. Minhas pernas bambeiam, mas nĂŁo o deixo se afastar. Solto um gemido, abrindo a boca, seus lábios e sua lĂngua adulando os meus. Agarro o terno que ele usa entreaberto, que alias Ă© do seu personagem, e me aperto contra ele. Sua lĂngua traça a minha devagar. Seu beijo Ă© obstinado, gemo de novo e rápido demais ele se afasta. — VocĂŞ está linda. – Beija a minha testa ainda ofegante.
— Você também está – retribuo timidamente. Olhar para ele depois da noite de ontem. Depois do que provavelmente eu fiz e que só ele sabe, não é tarefa fácil.  — Thiago.
— Humm – Os olhos verdes me encaram como quem busca decifrar os meus pensamentos.  — O que foi? - Passando os dedos de um jeito carinhoso no meu cabelo, ele ajeita uma mecha atrás da minha orelha. Ah, esse gesto.
— Me desculpa.
— Pelo quê? - Dou de ombros, ele não vai me fazer falar, vai?  — Pela bebedeira de ontem? - Fecho os olhos enquanto ele envolve meu rosto com a mão, o dedão acariciando minha bochecha e meu maxilar.  — Ta tudo bem, Mah… É, tirando o fato de ter que limpar o seu vomito o resto tá de boa. Não se preocupa mais com isso. Já foi, passou, combinado.
— Humm… - Busco um ponto fixo, que não seus olhos para encarar. — Ta quase na hora do almoço, você já almoçou?
— Já. Almocei mais cedo.
— Ah, que pena. - lamento, pegando minha bolsa em cima do sofá. — Você perdeu uma ótima oportunidade de almoçar comigo.
— Como é? Perdi, perdi nada. - Para na minha frente me impedido de sair. — Se eu soubesse que você vinha perto do meio-dia teria esperado. - Me olha ressentido. — Vai, onde você quer almoçar, te faço companhia – propõe ele. — Tem o que nós fomos a última vez.
— Qual, o que você foi com a Mariana e o Benjamin?
— É esse mesmo. – estreita os olhos, provocativo. — O mesmo que você encontrou o Miggiorin.
— Ah, não. - Porque estamos falando nesse assunto. — Perdi até a fome agora – suspiro —, qualquer lugar menos este, combinado?
— Combinado. - Ele sorri. — Você espera eu trocar de roupa, que nós já vamos. - diz, de costas para mim, se livrando do palito. Meu Deus, strip-tease essa hora, não
— Trocar de roupa, por quê? - Thiago me olha de canto de olho, desabotoando o punho da camisa com sorriso sacana.
— Marjorie, você não quer que eu sai na rua, nesse calor, com esse terno, quer? - Droga, ele me ouviu.
— Não, não quero. - Para ser sincera, não quero que ele saia desse camarim. Quanto menos exposição nós tivéssemos melhor.
— Ei, Marjorie – Paro. Achei que ele nĂŁo fosse notar minha saĂda.  —, Marjorie aonde vocĂŞ vai?
— Comprar o meu almoço. - Viro-me na sua direção. Ele está parado no batente da porta com a camisa desalinhada. Seus olhos brilham em expectativa.
— Não me diz que…
~*~
— Não vou te beijar, você está com gosto de atum na boca. - Thiago se estica para colocar a garrafa d’ água na mesa de centro e me lança um olhar insinuante.
— Grande coisa - insinuo como se nós não tivéssemos nos beijado há cinco minutos e o gosto de atuam não estivesse também na sua garganta. —, você não tem nenhuma cena de beijo para gravar depois.
— Quem disse? - provoca ele, uma das mão está na minha cintura enquanto a outra prende uma mecha do meu cabelo atrás da orelha.
— Eu tĂ´ dizendo. - Meus braços estĂŁo em volta do seu pescoço, prontos para beijá-lo novamente,  — Achei que vocĂŞ gostasse de sanduĂche de atum, lembra, foi vocĂŞ quem comprou um pra mim?
— Eu, eu fiz isso?  - franze a testa, desentendido.  — NĂŁo lembro, nĂŁo. Quando foi?
— Peraà que eu vou refrescar a sua memória. - Contraio os lábios, parando na sua frente. Thiago estranha meu gesto. O que é bom. Tenho toda a sua atenção voltada para mim quando decido sentar na sua perna esquerda, o abraçando pelo ombro. Sem nenhum movimento brusco, deixo meus lábios apenas em contar nos seus.
— Ah, Marjorie. - Ele se mexe como se estivesse desconfortável com a situação, toma meus lábios para si e me beija profundamente. Seus lábios queimam uma trilha desde do meu queixo atĂ© retornar a base da minha garganta. Nossas lĂnguas se enroscam, consumindo-se mutuamente. Suas mĂŁos alisam a pele nua dos meus ombros, puxando as alças do sutiĂŁ para o lado enquanto me coloca delicadamente de costas para o sofá, novamente. NĂłs nos beijamos por mais uma eternidade de segundos. NĂŁo sei precisar por quanto tempo, meus lábios se mantiveram unidos, colados aos dele sem necessitar o mĂnimo de oxigĂŞnio. Quando me afasto tĂŁo sem folego, sua boca corre o meu pescoço formando uma linha de beijos atĂ© a orelha. — VocĂŞ quer me enlouquecer, nĂŁo Ă©? - Suspira, os olhos se prendem aos meus, observador sei que ele consegue perceber em mim a vontade insana de sucumbir, no entanto ele nĂŁo o faz. PorquĂŞ?
Passando as mãos pelos cabelos, Thiago respira fundo e me beija mais uma vez de forma rápida e doce, depois me abraça, deslizando os dedos pelo braço, puxa a minha mão sobre o seu peito. — Ainda não entendi porque você preferiu ficar aqui. - Sinto sua pulsação acelerar sob a palma da mão. Estou confusa com a pergunta, não lhe parece obvio?
— Queria passar mais tempo, assim, com você e evitar problemas, você sabe....  - admito, deitando a cabeça no seu ombro.
— E-eu, Mah, eu sei, eu e a Mariana – Ele fica tenso de repente. — Eu tenho evitado o assunto, mas chega eu tô cansado de fingir, de disfarçar e esconder o que eu sinto por você. Eu já adiei essa conversa tempo demais, mais do que deveria.
— Thiago!? - suspiro exasperada.  — Você vai conversar sobre o… - Não consigo raciocinar direito. Divorcio, a palavra está girando na minha cabeça.
— ��, o que foi, você não gostou da ideia? - - Massageia minhas costas com uma das mãos enquanto a outra segura minha nuca.
— É claro que eu gostei – Beijo-o empolgada. — Eu amei, amei.- Seguro o seu rosto com entusiamo e o beijo de novo, do queixo, as maças do rosto, do nariz aos lábios. Meus dedos estão no cabelo dele, prendendo-o a mim. — Eu, amei, amei – repito, retribuindo da melhor forma que conheço. Com beijos.
— Eu tô vendo. – Ele está rindo para mim, quando saca o celular do bolso da calça e dispara a câmera na minha direção, mirando o meu rosto.
— Thiago, não. – Olho para ele, ofendida, depois caio na gargalhada, cobrindo meu rosto com a palma da mão.
— Tira mão do rosto ou eu vou publicar a foto assim mesmo, Marjorie. – Duvido que ele faça isso, mas resolvo cooperar dando a ele o meu melhor sorriso. — Foto minha, só não vale – resmusgo, apanhando o meu celular da mesa de centro, miro a câmera no melhor ângulo e tiro a foto. Nossa primeira foto juntos.
— O que tanto vocĂŞ olha, aĂ. - pergunta curioso, inclinando-se para frente na hora exata em que recebo uma mensagem.
— É o Leo confirmando o nosso jantar as sete. - Percebo-o avaliando a minha resposta, os olhos grudados no meu celular. Ele lê as mensagens.
— Mentira, que ele te mandou essas mensagens, Marjorie? - questiona irritado. — E você vai jantar com ele?  - Olho para ele, piscando. Qual o problema?
— Não esquece que eu faltei ao aniversário dele por sua causa. - Thiago me olha boquiaberto.
— Minha causa, agora a culpa é minha, é isso? - Inclina a cabeça de lado me dando um sorriso artificial. Thiago estava agindo como uma criança insegura. Eu amava a sua preocupação e até mesmo o jeito possessivo, mas ele não controlaria meus passos, me impedindo de fazer o que quero.
— Não. A escolha é minha, e eu vou a esse jantar porque devo isso ao meu amigo, Thiago, você querendo ou não, eu vou.
— Ta bom, vocĂŞ pode ir – murmura ele  —, eu deixo vocĂŞ ir.
— Ah, você deixa? - Tenho vontade de rir da sua careta, mas me contenho. Thiago ainda está sério quando contrai os ombros e diz seco.
— Deixo, mas com uma condição, duas na verdade, vocĂŞ vai se comportar, nada de bebida, ouviu? - ressalta, me fazendo sentir uma adolescente de novo.
— Ouvi – balanço a cabeça concordando —, e outra condição?
— Fica, vai  - levanta-se, buscando pelo blazer jogado na extremidade do sofá. Veste-o, colocando o palito em seguida.  — são duas horas, agora – verifica ele, no relógio de bolso.  —, até o seu jantar faltam…
— E esse relógio aà funciona, Thiago, não é cenográfico, não é? - Faço graça, esquecendo-me do seu humor do cão.
— Cenográfico é o caram-, Marjorie, você não me irrita, que eu mudo de ideia e faço você ficar aqui, e adeus o seu jantarzinho.
~*~
— Ah, chegou a margarida! E esse bolinho com essas velinhas, aĂ, nĂŁo vĂŁo te redimir. - ele diz assim que abre a porta e me vĂŞ com um cupcake em mĂŁos. — VocĂŞ perdeu um bem melhor, ontem.
— Desculpa. Você me entende, não? - Faço cara de choro e entrego-o o abraçando antes de entrar no seu apartamento bagunçado. O que não é nenhuma novidade, ele sempre esteve desorganizado, mas talvez hoje, eu não sei, tenha batido seu recorde. Ele fecha a porta e me encara sério.
— O que? Que você prefere o Thiago a mim?
— Co-mo… Como você sabe? - Busco um lugar no sofá pra me sentar.
— Falei com ele ontem. - Dá de ombros, sentando-se ao meu lado.
— Como assim! - o encaro perplexa. — Espera, ele atendeu o meu celular? - Só pode ter sido isso, de que outra maneira o Leonardo saberia sobre o Thiago.  — O que ele falou, conta?
— Pode tirando esse sorrisinho da cara. - Aponta para os meus lábios, dizendo, — ele não falou nada demais. Eu é que mandei ele cuidar bem de você, aproveitei e falei o quanto você o ama.
— Quê? - grito.  — Você, o que?
— Mentira… Mentira, é mentira, Marjorie. - Ele ri do meu desespero e se apressa ao explicar.  — Eu não falei essa última parte, mas devia. Ele precisa saber o quanto você o ama.
— Ele sabe
— Sabe? - Leo está realmente surpreso com a minha afirmação, também pudera, ele sabe o quanto sua amiga, aqui, evita este tipo relacionamento. Bem, evitava. Thiago era a minha exceção.
— De alguma forma ele sabe. - Atiro-me no sofá, deitando a cabeça no lado oposto ao dele. —Você sabe que eu…
— Tomou um porre daqueles, encheu a cara, agora me conta uma novidade? - Jogo uma almofada na cara dele. Tinha esquecido da sua capacidade irritante de ser tão perspicaz.
— A novidade, você quer saber a novidade?  - Fecho os olhos e sorrio.
— Que agonia, anda, fala, Marjorie, vocês passaram a noite juntos, rolou é por isso essa sua carinha de…
— Feliz e apaixonada. - Alargo o meu sorriso, vendo os olhos do Leo se estreitarem. — Dá pra ficar feliz por mim? - Peço, erguendo a coluna para encará-lo nos olhos.
— Tô tentando  - diz sem disfarçar o desanimo na voz. Se ele está tentando como diz, definitivamente não está funcionando. Dobro as pernas sobre o sofá, ficando de frente para ele.
— Leonardo – suspiro preocupada
— Mah, nem começa, eu já sei – desconversa ele.  — Vai me fala: você e o Thiago estão namorando?
— Não – reconheço, Leo já está de pé antes que eu termine a fala. — Eu adoraria, mas não.
— Eu não acredito, o cara fica com você e não. - Agitado, ele anda de um lado para outro. — Acho que vou ter que mudar de ideia e ligar para esse Thiago e explicar como as coisas funcionam.
— Quem disse que a gente ficou?
— Você
— Eu não falei isso.. Disse que estou feliz.
— E apaixonada – diz enfaticamente, os dedos imitando o sinal de aspas.
— Mas não que tinha rolado.
— Não?
— Quer dizer, eu não sei ao certo, eu bebi… Duvido muito que eu não tenha tentado, mas o Thiago me garantiu que não rolou nada ainda
— Ainda!? - fala entre dentes. — Nunca te vi assim tão…
— Apaixonada.
— Nem na época que a gente namorava. - Ele bufa, analisando-me novamente, o olhar consternado.
— O quê? - Estou surpresa.  — Nós nunca namoramos!?
— Porque você não quis. – Isso é novidade. Não lembro de alguma vez o Leonardo deixar claro sua intenção. Exceto… A noite que… Ah, meu Deus
— Qual foi a parte da história que eu perdi, Leonardo Miggiorin, porque nós sempre fomos grandes amigos. Você é como um irmão para mim. Um irmão de alma.
— Para! Pode parar por aĂ, Marjorie. - Fecha os olhos, vejo um turbilhĂŁo de emoções passando pelo seu rosto. Quando os abre sua expressĂŁo Ă© de desalento.  — Quer saber, acho que foi esse o meu erro, deixei vocĂŞ entender que o que eu sentia por vocĂŞ era apenas amizade. - Ah, nĂŁo… Â
— Mas você namorava a Carla, vocês formavam um casal tão bonito, eu acho. - Leonardo revira os olhos para mim, chateado. Xingo-me mentalmente. Precisava ser tão direta?
— Tudo para te fazer ciúmes – confessa. O interfone toca antes que possa dizer algo. — Encomendei comida japonesa daquele restaurante que você gosta – avisa, colando o interfone no ganço, indo até a porta em seguida. — Espero que eu tenha acertado na escolha – diz colocando as sacolas sobre a mesa de centro.
— Sushi… Jura? - Arregalo os olhos, e enquanto ele continua a falar lembro-me da primeira vez em que comemos um. Meu primeiro dia no Rio, apartamento novo, vida nova e o Leo. Ele estava lá ajudando com a mudança, arruma os mĂłveis para lá, arrastada para cá, coloca ali, no fim da noite estávamos exaustos sĂł querĂamos uma coisa, alĂ©m de dormir, comer. Como nĂŁo percebi seus gestos durante o jantar, a forma de me olhar, o jeito de falar tudo tĂŁo claro. Quando volto Ă tona ele está falando alguma coisa sobre o seu relacionamento com a Carla e o meu comportamento.
— Mas não funcionou, também do jeito que você estava envolvida e empolgada com aquele concurso lá, o…
— O Popstar?
— Esse mesmo. - acena com a cabeça, me alçando minha porção de sushi.  — Era demais olhar para o seu amigo apaixonado, aqui? - Aponta para si mesmo, voltando a ocupar seu lugar no sofá. — Depois eu consegui um papel de destaque.
— Numa novela das nove – o interrompo, fazendo graça.  — Como nós comemoramos quando você soube, lembra? - falo de boca cheia. — Nossa, eu fiquei tão feliz por você. Era a realização de um sonho seu, afinal.
— Nosso sonho – corrigi ele, com o hashi vazio no ar.  —, porque você também sonhava com uma megaoportunidade dessa e conseguiu logo depois.
— Humm – engulo apressada.  — Não foi tão logo assim, vai. - digo sem encará-lo. Ele ri do meu estado afobado para comer.
— Ah, nĂŁo? - Pousa o talher do lado do prato e me olha bem-humorado. — Depois de Malhação, vocĂŞ nĂŁo parou mais, minha amiga, continua aĂ, atĂ© hoje fazendo sucesso, a danada.
— Ai, como você é exagerado. – Caio na gargalha, e ele continua sério.
— Sua carreira só deslancha, já a minha.  – Que mania de se comparar a mim e a minha carreira.
— Ai, é exagerado e reclamão ainda por cima – debocho, limpando os lábios no guardanapo. Penso no Thiago. A essa hora ele deve estar discutindo sobre o divórcio. Meu coração se aperta só de pensar nessa conversa e instantaneamente busco pelo meu celular na bolsa. Droga, esqueci de tirar do “silencioso”.
— O que foi? - Nada, só a minha vida que está em jogo.
— Thiago me ligou. - Não é nada. — Tem três chamadas perdidas dele. - E eu não atendi nenhuma.
— Ué, liga para ele.  - Leonardo diz com um sorrisinho. Ah, como se fosse fácil fazer isso. — Você não vai ligar?
— Será? Não sei, essa hora ele deve estar em casa e, a você sabe… - O telefone toca. É ele, eu sei.
— Ah, não é sério isso, Marjorie? É esse o toque do seu celular quando o… - Dá risada, pegando o celular da minha mão.
— Para, quer parar!  - imploro, avançando sobre ele. Tento em vão recuperar o celular. — Me dá o celular, aqui, me deixa atender. - É ele. Não conferi e não precisava, a música denunciava.
— Não. - Balança a cabeça. — Nada disso, deixa eu curti esse momento. - Olho para ele incrédula. Não acredito que ele está rindo da minha cara.
— Você quer é curti com a minha cara, isso sim.  - Faço uma cara de zangada.
— Também… - admite com um sorrisinho insolente.  — Marjorie você não existe. - suspira, todo alegre, os olhos brilhando. Ah… não… — Ele sabe? - Quem… O quê.  — Eu quero dizer ele sabe… sabe dessa música? - pergunta, devolvendo-me o celular quando ele para de tocar. — Sabe que você, não me diz que ele… - Faz uma pausa, buscando meu olhar. — Espera, ele tem uma música também, é isso.
— Não, não tem, você tá doido. Porque ele teria?
— Eu sei lá – Encolhe os ombros.  —, você não tem uma, então ele deve ter outra ou a mesma, vai saber – sugere ele com toda a calma.
— Você não pode estar falando sério. - pisco para ele. Aonde ele quer chegar com isso?
— É serĂssimo, liga para ele e pergunta. - Ele se mexe, como se estivesse desconfortável. — NĂŁo melhor, aproveita e conta para ele sobre a mĂşsica – diz levantando-se, indo em direção a cozinha.
— Eu não vou fazer isso – o acompanho.
— Claro que não, - gira os calcanhares e me encara. — Como eu imaginava, você não tem coragem. Cerveja? - oferece, abrindo a geladeira. O ignoro.
— Você tá me chamando de covarde, é isso mesmo, Miggiorin?
— E se eu estiver, você vai fazer algo para mudar isso, vai? - provoca ele. Não penso duas vezes. Vou até a sala e pego o celular. Ligo para o Thiago.
— Oi, Mah, só um minuto. Não posso falar, agora. - Imediatamente me arrependo de ter ligado.
— Humm. - murmuro. Sou capaz de ouvir minha própria pulsação. Esforço-me para perceber alguma movimentação a mais, e nada. Estou quase interrogando-o novamente quando ouço sua voz.
— Agora posso, fala. - sua voz é mais calma do que antes, me pergunto se isso tem a ver com a ausência da Mariana. Será que eles… Calma, Marjorie, agora não…  não é hora.
— Thiago, eu liguei para… - suspiro. — Ah, não interessa porque eu liguei, não é nada, esquece. - Desisto, não ia fazer a besteira de cantar para ele, não mesmo.
— Marjorie, amor, fala.
— Thiago
— Quê?
— Repete
— Mah, eu…
— Eu gosto de você e gosto de ficar com você. Meu riso é tão feliz contigo. O meu melhor amigo é o meu amor. - Antes que eu mude de ideia e perca a coragem, canto timidamente.
— VocĂŞ bebeu de novo, Marjorie? - Nossa… Que mal juĂzo ele faz de mim.
— Não. Só tô pagando uma aposta – digo simplesmente.  — Você tá surrando por quê?
— Que aposta? - sussurra outra vez.
— Uma aĂ, mas agora Ă© sĂ©rio, Thiago, eu te amo
— Eu…
— Thiago, alô… Alô, Thiago. - Ele fica mudo, aumentando em mim a minha angustia.
— É ela? - Ah… Merda!  — Eu tenho uma Ăłtima notĂcia para contar…
— Mariana, me dá o celular – o ouço gritar exasperado.
— Calma, meu amor, deixa eu contar a novidade.  - SĂnica, ela enfatiza as suas palavras porque sabe que eu estou do outro lado da linha ouvindo tudo, mesmo que parte de mim insista para que eu nĂŁo o faça.  — Acho que vocĂŞ vai gostar de ouvir: Eu estou grávida.
— Mariana, meu… - Desligo antes de ouvi-lo chamá-la de meu amor. Acho que sou capaz de vomitar o que comi. Tudo gira na minha frente enquanto a voz dela ainda ecoa lentamente nos meus ouvidos: ES-TOU GRA-VI-DA.
— Marjorie, o que houve? - Leo corre ao meu encontro como um bote salva vidas, ao qual eu me apoio para não cair ao me sentar. Sua mão ergue o meu rosto, o dedão seca uma lágrima. Estou chorando antes mesmo de começar a falar.
— O Thiago, ele… ele tá com ela e eles, adivinha? Estão comemorando a chegada de outro filho, enquanto eu… eu canto música e me declaro feito uma idiota.
— Não pode ser.
— Eu ouvi da própria, toda empolgada…  - Por mais que eu tente não consigo achar explicação para o que acabo de ouvir. Thiago não pode tá fazendo isso comigo, pode? Planejando um segundo filho com a mulher e ao mesmo tempo me iludindo com a promessa do divórcio. Dói ainda mais quando lembro do jeito com que ele prometeu, hoje, à tarde.
— Ele disse isso, calma aà Marjorie, deve haver algum engano.
— Ah… a muitos enganos.  - Sorrio, o Leo estava tentando me animar, apesar de todo o seu esforço ser em vĂŁo, agradeço. Havia tanta segurança nas palavras do Thiago, que em nenhum momento eu cogitei serem um equĂvoco. Um engano.
— Ta vendo – Ele faz uma pausa, me olha docemente. —, vocĂŞs vĂŁo conversar e…
— Um deles sou eu nessa histĂłria – digo sarcasticamente.  — Acabou a bebida dessa casa? - Esfrego as mĂŁos no joelho, ali foram parar o resquĂcio das minhas lágrimas. — CadĂŞ a cerveja que vocĂŞ acabou de me oferecer, eu quero.
— Marjorie, para  - a mão dele prende o meu pulso, antes que eu prossiga. —, você não vai beber. – “Nada de bebida, ouviu?”. Fecho os olhos com a imagem do Thiago na cabeça.  — Você não vai resolver nada desse jeito – observa cauteloso. O seu olhar é para que eu me sente, mas não o faço. Ao invés disso, busco a cerveja. Prometi ao Thiago não beber, mas quer saber, dane-se.
— Ou eu bebo ou eu choro, o que vocĂŞ prefere, escolhe? - o encaro rapidamente, baixando o olhar em seguida.  — NĂŁo precisa já tĂ´ fazendo os dois.  - Mal tomo um gole e o Leonardo está ao meu encalço, tirando o copo da minha mĂŁo.
— Hey, vem cá, para com isso. - Ele me puxa para o seu colo e eu nĂŁo faço nada para impedi-lo. Sei que deveria, mas nĂŁo o faço. Tudo o que queria no momento Ă© alguĂ©m mais forte do que eu para me amparar. Me sinto bem com o seu abraço apertado. É como um balsamo com efeito calmante. Por um instante parece sufocar, abafar e dissolver todos os meus medos.
— Eu não mereço amar e ser amada? - pergunto mais calma, apoiando minha cabeça no seu ombro.
— Merece, é claro que merece, Mah – diz sem me encarar. —, só que as coisas não são tão fáceis assim no amor.
— Porquê? Todo mundo tem um amor. - Leo ainda está segurando a minha mão, fazendo carinho, a aperta com mais intensidade quando diz.
— Nem todo mundo, eu por exemplo. - Engole em seco, continuamos sem olhar um para outro. Olhar o nada ou contemplar o silĂŞncio dos mĂłveis na sala Ă© melhor e menos constrangedor. Leonardo Miggiorin Ă© bem mais do que um amigo. Se eu soubesse ler nas entrelinhas que a vida escreve talvez estarĂamos juntos, talvez terĂamos uma linda histĂłria de amor para contar… Talvez nĂŁo estaria aqui sofrendo por um amor quase impossĂvel… Talvez, talvez… Ah, coração! O amor pode ser tudo, menos simples.
— Porque você não insistiu, porque não me fez enxergar esse amor que você sentia por mim, por quê? - Ergo a cabeça, seus olhos fitam os meus intensamente.
— Quem disse que eu não sinto mais? - Pela primeira vez na noite, vejo além da amizade sincera de dois amigos irmãos, brilhar. Vejo amor, muito amor. — Eu sinto…. Ainda sinto amor por você. Ainda amo você, Marjorie.
Ele me puxa de encontro a seu corpo, sinto sua ereção pressiona a minha barriga antes mesmos dos lábios estarem colados aos meus. Ele me beija… bem, na verdade, ele quer mais do que apenas um beijo… como lido com isso? Eu deveria fugir, mas nĂŁo consigo. Sou atraĂda por ele em um nĂvel primitivo que mal consigo compreender, apenas sinto… Sinto amor, muito amor em cada um dos seus beijos.
Seu corpo inclina-se sobre o meu, as mãos na minha coxa, tento não pensar no Thiago, mas é em vão. Ele está comigo, luto para afastá-lo da minha mente. Desliso as mãos pela barra da sua camiseta, trazendo-o para mim, envolvo seus lábios, e quando ele pensa em para o impeço com as pernas presas no seu quadril. A respiração dele ofega junto com a minha. Seu beijo é intenso e profundo, tão bom que não consigo parar de pensar e se… e se eu der uma chance a esse amor? Não posso lutar contra o inevitável… Um filho. Ele não vai largar a mulher e mais um filho. Ah… Thiago…. Por quê?
— Ah… Thiago….
— Ah, Marjorie se você vai continuar me chamando de Thiago, é melhor parar por aqui, eu não…
— Por favor, não
— Marjorie, eu não quero isso que você está me propondo.
— Por favor, faz amor comigo.
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