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#morrendo de vergonha por conta do tamanho *risos risos*
magicwithaxes · 16 days
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—ㅤㅤnível um,ㅤㅤpov dois.
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CHALÉ 15, ㅤㅤ(CIRCE).
“Mais uma vez.”
A voz da filha de Circe ecoou pelo pequeno espaço que compartilhavam. Em um movimento rápido, ela colocou mais um bloco de madeira sobre a mesa, a poucos centímetros de Natalia. Na teoria, tudo parecia fácil. Durante dias intermináveis, a filha de Hécate leu grimórios e compreendeu todos os conceitos. Mas colocá-los em prática era outra história. Às vezes, a luz esverdeada surgia sem qualquer dificuldade. Outras vezes, não importava a pressão, nada acontecia. O que ela estava fazendo de errado? Logo atrás, havia uma prova extensa de que todos os esforços estavam sendo em vão: múltiplos blocos de madeira não mais em sua forma original, “derretidos”, queimados, em pó. As exigências de Emily a sufocavam, e por um segundo, ela se arrependeu de ter seguido o conselho de Quíron, que, preocupado, indicou uma filha habilidosa da deusa da feitiçaria para ajudá-la, já que sua teimosia a impedia de recorrer a um dos irmãos.
As duas haviam se aproximado na ilha de Circe. Emily foi atenciosa e amigável, guiando-a nos ensinamentos sobre feitiços. O que praticavam agora se tornava um pouco mais suportável, e seria ainda melhor se não fossem as várias imposições que a atingiam a um nível absurdo de cansaço. “Você não está fazendo direito. Não está se concentrando direito”, disse Emily alto, trazendo Natalia de volta à realidade. “Não está usando os gatilhos certos. Está dispersa. Relapsa. Manipular a realidade pode parecer fácil, mas ao mesmo tempo é difícil. Os livros não serão suficientes se não houver prática.” Sua voz era dura e impassível, como a de uma professora que buscava a perfeição em sua aluna. Definitivamente, não haveria “paz” enquanto Natalia não desse o que era pretendido ali. “Vamos lá. Não se faça de boba, Natalia. Deve haver algo aí dentro que pode impulsioná-la. Poderes como o seu são reativos. Raiva, ira, tristeza, alegria… amor...” Ela riu, como se fosse fácil captar o que Natalia estava sentindo. Envergonhada, a filha de Hécate encolheu-se um pouco. “Use isso a seu favor. Pense em algo. E deixe...” Próxima ao seu ouvido, Emily fez questão de tornar ainda mais claro o que queria expressar. “Deixe o caos se expor.”
Caos. Aquela pequena palavra surgia repetidamente nas páginas antigas que Natalia havia se proposto a ler. Claro, a magia era caótica, um poder instável que precisava ser controlado, regido por forças que podiam ultrapassar o limite do natural. A mais nova amiga tinha razão. Natalia precisava de um motivo, ou estaria perdendo tempo. Mas o que deveria escolher? Era irônico. Ela tinha motivos suficientes para fazer tudo acontecer. Entretanto, o que a impedia? Medo, talvez? Por tanto tempo, ela se acostumou com a ideia de não ter poderes desse tipo. Na força física, ela se aprimorou, e nas armas, dedicou toda a sua confiança. A forma como tudo havia acontecido, e aquele poder ter surgido, ainda não fazia sentido. Durante dez anos, não era merecedora ou não estava preparada para lidar com algo assim. Pensando bem, a Natalia de dezoito anos teria lidado muito mal com toda a situação. Ainda que calma, era imprudente, um tanto egoísta… e assustada. Por meses, ela não permitiu a aproximação de muitas pessoas e pouco tinha controle sobre as próprias emoções. O pensamento a fazia rir: teria uma outra reputação e, talvez, não seria a mesma pessoa de hoje. “Eu não sei como posso fazer isso sem ser intensa demais.” Disse, enfim, olhando a outra com seus típicos olhos lamuriosos. “Não sei expressar. Tenho medo… Medo de ser impulsiva demais e assustar. Assustar você, assustar as pessoas de quem gosto. E agora, tenho medo de deixar isso sair de mim e acabar criando uma bagunça que não é necessária.” Um sorriso gentil, porém triste, cresceu em seus lábios. “Os últimos acontecimentos bastaram para reafirmar o que estou dizendo.” Os pesadelos, as visitas oníricas, os traidores, as pessoas machucadas, deuses revoltosos, novos sentimentos que floresciam e pareciam ser recíprocos… tudo isso a atingiu com força. As mãos foram imediatamente ao tampo de madeira da mesa, os dedos apertados ali, tornando os nós esbranquiçados. Por um segundo, ela desejou ter uma caneta e um papel em mãos. Em momentos como aquele, escrever aliviava. Se não expressava em voz, as palavras eram suas amigas, e o sentimento de calma era imediato. Natalia parecia a ponto… de explodir. Do outro lado da sala, Emily a observava com um sorriso pequeno, mas vitorioso, nos lábios. A raiz da situação estava sendo tocada, e não tardaria muito para que os poderes provenientes de Hécate começassem a se manifestar.
A sensação era estranha. Todo o corpo parecia adormecer e as mãos esquentavam, quase em estado febril. A boca secava, tornando-se necessário passar a língua pelos lábios. Fechar os olhos, especialmente, era essencial. Embora tudo estivesse em silêncio, Natalia conseguia ouvir o barulho fraco de algo se aproximando ou crescendo. Os batimentos cardíacos também eram perceptíveis, tornando-se ensurdecedores apenas para ela. Na mente, travava uma batalha consigo mesma, tentando organizar o caos mental. Contudo, uma única lembrança se destacou juntamente com a frustração. A memória da visão que teve no mesmo dia do roubo de energia se intensificou. A cena, que parecia um filme de terror, de pessoas importantes dispostas em um caixão, era algo que ela tentava esquecer, mas que seria sempre um lembrete do que poderia acontecer. As palavras do pai naquele cenário ainda causavam arrepios. A forma como foi comparada à mãe, a mulher que mais detestava entre todos os deuses, trazia-lhe desgosto. Ela era impulsiva, algo que, de algum jeito, era imutável. Contudo, como a deusa, ela protestaria. Não era certo, nem justo.
Enquanto isso, a filha de Circe era a felizarda da vez, assistindo ao pequeno show que se desdobrava diante de seus olhos. O cubo que havia deixado sobre a mesa assumia repetidas e diferentes formas. O papel de parede azulado mudava de cor freneticamente, e as prateleiras cheias de livros acompanhavam o mesmo ritmo. As cadeiras pareciam saltar sobre o assoalho, e de repente, o clima dentro da sala mudou. Parecia que ia chover. O ambiente ficou mais ventilado, apesar da ausência de janelas, como se o próprio Éolo estivesse presente realizando uma de suas façanhas. Mais à frente, havia dois copos com água. Emily se aproximou para se certificar do que estava vendo: ali dentro, parecia haver um pedaço do oceano, e quanto mais se aproximava, mais tinha certeza de que podia ouvir o bater das ondas e o soar alto das gaivotas. Natalia era a fonte de tudo aquilo. Como Hécate, estava mudando a realidade, mas em meio ao descontrole. Era um começo, concluiu. Se continuasse assim, logo poderia se equiparar à própria deusa. Sua atenção foi roubada novamente ao presenciar a magia tomando uma cor. Verde. Verde como campos de baixa gramíneas. Verde como a vastidão de um campo bem cuidado. A luz escapava pelas mãos de Natalia, semelhante a chamas, já que a mesa com a qual estava em contato parecia querer se desmanchar em razão da força ali exercida.
Por outro lado, Natalia estava focada em livrar-se dos pensamentos que a envenenavam, completamente alheia ao que estava acontecendo. Se não houvesse nenhum limite, continuaria daquele jeito por mais tempo, mas o cansaço se fez presente, obrigando-a a parar. O corpo parecia amolecer, semelhante ao que sentiu quando teve a energia usurpada, mas em uma complexidade menor. Não muito antes de voltar à realidade, Emily a tocou, e antes que pudesse abrir os olhos para observá-la, ouviu: “Bloco de madeira, casinha de boneca.” A imagem dos objetos surgiu em sua mente, rapidamente fazendo com que largasse a mesa, tateando pelo primeiro objeto mencionado. Natalia o segurou com força e, em seus dedos, sentiu a mudança ocorrer livremente. Mais um pouco. Estava quase lá. Precisava apenas se concentrar. Aguentar, respirar, imaginar e colocar em prática. Não era tão difícil. “Abra os olhos. Abra os olhos!” Ouviu a exclamação. Ao lado, Emily pulava alegre, largando a postura dura de antes. Em suas mãos havia uma casa perfeita em miniatura, a imagem exata do que havia imaginado. Além disso, viu suas mãos tomadas por aquele verde vivo, precisando levar ambas ao rosto para confirmar o que estava enxergando. “Você causou uma impressão e tanto aqui dentro. Não sei se irá agradar as minhas irmãs, mas a nova decoração não é tão ruim.” Seus olhos pularam do brinquedo para os móveis. Eram diferentes: uma mescla de móveis do século XIX, que em nada tinham a ver com os objetos de antes. O queixo caiu e o olhar lamurioso ganhou novas proporções. “Sinto muito… por tudo. Eu não quis…”
“Relaxe. Relaxe, Natalia.” O tom era calmo e a postura menos exigente. “É claro que vamos precisar de um novo estofado. Talvez veludo. Ainda não sei. Eu gostei muito. Uma pequena novidade para todos as filhas de Circe. Enfim, foi o suficiente por hoje. Não é bom exigir muito, embora gostaria de continuar.” Natalia foi rápida em responder: “Não. Eu não estou cansada.” O olhar sério da outra a silenciou. “Quíron ficará feliz em saber que conseguiu dar o primeiro grande passo, apesar de seus lamentos e sua teimosia. Se quer me agradar, poderá tentar trazer as poltronas ao seu estado de antes, mesmo que mentalmente exausta. Eu quero ter certeza de que o chalé estará como antes para quando você for embora.” Ela não questionaria. Colocar as coisas no lugar parecia uma exigência tão pequena, e não se importava em tentar. Se esticou para o objeto mais próximo, imaginando o que fazer. Ainda que confusa, estava calma e confortável. “Você consegue. Mentalize. Imagine e execute.” A voz da filha de Circe pareceu distante, mais próxima ao canto da sala, então Natalia teve um segundo para respirar. “Velho ao novo.” Disse, em um tom baixo. E as coisas voltaram ao normal. Como mágica, a luz verde desapareceu.
Não havia conseguido fazer muito, mas sentiu um alívio ao ver que o caos que havia criado poderia ser controlado. Um sorriso tímido surgiu em seus lábios, ainda ofegante, enquanto se virava para Emily, que a observava com um olhar avaliador, mas satisfeito. “Bem feito, Natalia. Apesar de toda a relutância, você conseguiu. Mas lembre-se, o verdadeiro desafio será manter esse controle em situações mais intensas e caóticas. Você tem potencial, mas precisa aprender a confiar em si mesma e, principalmente, a dominar suas emoções.” Natalia assentiu, sabendo que as palavras da semideusa eram verdadeiras. Controlar sua magia significava controlar suas próprias emoções, e isso era algo que ela ainda estava aprendendo a fazer. Mas agora, pelo menos, havia dado um passo na direção certa. A filha de Circe sorriu levemente, um raro vislumbre de afeto voltando a quebrar sua fachada severa. “Você tem um longo caminho pela frente, Natalia, mas não duvide de sua capacidade. Com esforço, você poderá alcançar grandes feitos. Agora vá descansar. Amanhã, começaremos novamente.” Natalia pegou a pequena casinha de bonecas e a segurou com cuidado. Era um lembrete tangível de sua conquista, por menor que fosse. Saindo do chalé, sentiu-se mais leve, embora soubesse que o caminho à frente seria árduo. Ainda assim, com cada pequeno sucesso, sentia que estava um passo mais perto de entender seu poder e a si mesma.
Enquanto se dirigia ao seu mais novo lar temporário, o chalé nove, seu coração estava mais tranquilo. O treinamento tinha sido exaustivo, mas também revelador. A magia dentro dela era real, poderosa e poderia ser perigosa, mas, acima de tudo, era uma parte intrínseca de quem ela era. Agora, ela só precisava aprender a usá-la corretamente, e sabia que, com tempo e prática, conseguiria. Ao chegar no quarto de Kit, Natalia colocou a pequena casa de bonecas na mesa de cabeceira e se deitou na cama. O cansaço finalmente a alcançou, e seus olhos pesaram. Enquanto o sono a envolvia, um último pensamento passou por sua mente: ela tinha medo de quem poderia se tornar, mas estava determinada a descobrir.
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frasesthirjorie · 8 years
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19 de Janeiro de 2013
Por Marjorie
— Humm… É você, Tadeu, que droga! - resmungo tapando a cara com a coberta, jogo-me no colchão novamente. — Meu sonho estava tão bom, sabia? - Afago o monte de pelos, sorrindo só de lembrar. — Que horas são? - Devia passar das 11hrs da manhã.
*10h45mim*
Erro por 15mim, constato no celular.
*4 sms*
*7 chamadas perdidas*
*1 mensagem de voz*
Todas do Leonardo Miggiorin.
Pulo da cama, sentando em seguida. Minha cabeça doí. Olho em volta forçando o cérebro a lembrar de algo e nada. Não lembro de muita coisa, a não ser é claro, de ter bebido, e muito.
— Hey, o que é isso? O que é que você tem aí, Tadeu… Tadeu, aqui! Dá aqui, deixa eu ver. - Consigo apanhar o papel da boca dele sem rasgar. Mal posso crer no que os meus olhos leem:
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Que amor… É muito amor!
Beijo o papel, olhando sua caligrafia com carinho. Leio-o novamente.
— E você, hein, danadinho, cumpriu direitinho o que o Thia… Quem é que é “seu dono” mesmo? Sou eu ou o senhor já se vendeu, rápido demais, para o Thiago?
Café, é tudo o que eu quero no momento. Não qualquer café, mas sim o dele. O que Thiago Fragoso preparou especialmente para mim. Pego o celular e rumo para cozinha como uma perfeita idiota. Penso em retornar as ligações do Léo, mas desisto assim que avisto a térmica de café junto a duas xícaras postas na mesa.
Duas, porque duas xícaras!?
Sento-me e ao me servir noto o semicírculo borrado no fundo de uma das xícaras, só então me dou conta de que ele provou o seu café antes de sair. Não acredito que perdi essa cena. Se tivesse acordado mais cedo o teria visto preparar o café, melhor, podíamos ter tomado o café da manhã juntos.
. Estranhamente minha dor de cabeça havia passado sem sequer sorver um gole daquele café, que fumegava um aroma delicioso. Provo, depois de permanecer alguns minutos com a xícara apenas colada aos meus lábios, e não só o aroma é delicioso como o sabor também.
Vejo o comprimido em cima da mesa e sou obrigada a rir da sua preocupação exagerada. Do seu excesso de zelo. Tomo o comprimido com um gole de café e quando dou por mim estou ouvindo meu coração bater junto com o toque de chamando.
— Quer dizer que o Tadeu, agora, é o responsável por mim? - questiono sem ao menos deixá-lo dizer “oi”.
— Sim, na minha ausência, ele é, sim. - Ouço o barulho que ele faz quando prende a risada. Não preciso vê-lo para saber que ele está sorrindo, porque o seu sorriso é o mesmo que o meu.
— Desde de quando você e ele são amigos íntimos? - pergunto curiosa
— Desde de que eu e ele passamos a amar a mesma pessoa. - Amar? — Tomou o remédio? - emenda ele, enquanto eu ainda conjugava o verbo amar. — Marjorie, tomou ou não tomou?
— Hã…Não – minto apenas para deixá-lo bravo e ouvir sua voz se alterar do outro da linha.
— Marjorie! - Péssima ideia, minha cabeça parece que vai explodir com a voz ríspida do Thiago ecoando nos meus ouvidos. — Quer fazer o favor de…  
— Eu já tomei… - digo tentando parecer melhor do que realmente estava. Porque, meu Deus, remédios não tem efeito imediato? Levo a mão à cabeça, como se segurá-la fosse ajudar.  — Quer falar com seu amigo, Tadeu, para ter certeza?
— Não – ele é rápido em dizer. — Confio em você.  – Quase deixo a xícara cair ao levantar. Sua voz é intensa e segura, fazendo-me estremecer. Isso é um jogo comigo, o qual o Tadeu parece disposto a participar, latindo.
— Ouviu?
— Humm… Viu só, não precisei nem perguntar, ele já respondeu. - Quase engasgo com o tamanho do seu convencimento. Chegou ontem e acha que pode tudo, até mesmo ganhar a confiança do meu filho?
— Tadeu, meu filho – o encaro chateada.  —, você não era dado assim, não.
— Ah, não? - Thiago ri alto com o gurnido que recebo em troca. São dois contra mim, desisto. — E o nome não significa nada? Ta-deu. Deu, é dado – debocha sem controlar o riso.
— Ha, ha – murmuro mal-humorada. — Péssimo trocadilho, alias como o seu café.
— Meu café é ruim? - indaga ofendido e eu o qualifico como:
— Péssimo, horroroso e intragável. – Mesmo não sendo.
— Mas é uma ingrata mesmo – diz sério. — Devia ter largado você com o porteiro e ido embora em vez de passar a madrugada inteira cuidando de você e como se não bastasse, acordo atrasado e ainda assim eu fiz café para você.
— Você dormiu aqui? - pergunto o obvio. É claro que ele dormiu.
— Sim, como você acha que o café estaria quente até a hora da senhorita acordar? - Largo as xícaras na pia, despejando um pouco da água dentro e acabo não compreendo-o. Não importa. Ele dormiu aqui…
— Co-migo? - gaguejo nervosa. — Na minha cama? - Ah, Marjorie, para de fazer perguntas idiotas.
— Claro, Marjorie, a onde mais você queria que eu dormisse? Na varanda com o Tadeu - fala com a maior naturalidade. — A propósito, porque você tranca o coitado na varanda?
— Eu não tranco ele na varanda, ele que gosta de ficar lá.
— Ele não me pareceu muito contente hoje de manhã, não. – Tadeu, porque ele quer conversar sobre o Tadeu, agora? Me arrasto até a sala e me jogo no sofá.
— Thiago, você… - A ligação fica muda até que eu decido enfim perguntar. — Minha…Que blusa velha é essa que eu… - Surpreendo-me. — Eu tô usando calci-?
— Ah, não me pede para explicar isso, Marjorie – Fica um instante calado. —, foi você quem pediu para colocar. - Seu constrangimento é palpável.
— Meu Deus, o que quê eu fiz me fala?
— Você não se lembra de nada mesmo, nadinha!? Faz um esforço aí na sua cachola.
— Cachola? - Thiago merecia um tapa por se referir a minha cabeça nesse termo. — Aí, tá doendo – resmungo — Não ri. - Porque eu nunca lembro que manhãs como a de hoje são a consequência previsível de noites como a de ontem?
— Mah?
— Ta, o que eu me lembro: - concentro-me em respondê-lo. — Lembro de você chegando na festa com a… - me recuso a pronunciar o nome dela e na falta de adjetivo melhor, digo: — Você sabe quem e… E depois eu bebi.
— Bebeu, chamou a Mariana de múmia, vazdia e Morticia Addams.
— Eu a chamei de?
— Chamou.- Custo a acreditar que eu realmente tenha dito isso, mas o Thiago não tem porque mentir.
— Me desculpa, e-eu não vou pedir desculpa por isso. - – Comemoro. Beber, de repente, valeu a pena e a dor de cabeça? A dor de cabeça era só recompensa por ter dito o que penso. Talvez eu deve reavaliar os meus conceitos e beber mais vezes, especialmente, na companhia dos dois.
— Dizem que a gente fala a verdade quando bebe. - Ah é sério, Thiago? O que ele está querendo, afinal, me provocar?
— Eu falo a verdade sempre, palhaço!
— Ui, essa doeu, Mah, tudo bem eu vou…   - Ah, merda! Não quero que ele desligue, não agora, não desta forma.
— Espera, o que mais eu fiz? - Ouço sua respiração se alterar. Ufa, evito que ele desligue.
— Marjorie, você tem certeza que quer mesmo saber? - Sua voz é meiga e cautelosa. Estou ansiosa, nervosa e confusa ao mesmo tempo, não sei se quero realmente saber o que mais eu fiz nessa festa, mas mesmo insegura o encorajo a prosseguir.  — Bom, você cantou e dançou em cima da mesa fez da garrafa de cerveja o seu microfone e cantou, cantou muito. Juro, Marjorie, não sei quantas músicas você cantarolou durante a festa. Foi do samba ao pop rock sem o maior problema. Depois no carro e depo…
— Depois, depois o quê, fala? Thiago, a gente…- Tenho medo da sua resposta, mas preciso saber. — É  - Respiro fundo. —, eu e você…
— Ah, Marjorie, foi tão bom, você não lembra. - Ele está brincando comigo, só pode. Mas e se…  Como queria lembrar desta noite nos mínimos detalhes. — Você dormiu nos meus braços e… só dormiu mesmo.
— Jura? - suspiro aliviada. — Ainda bem.
— Ainda bem? Achei que você queria.  – Queria, não. Eu quero e muito.
— Sou só eu quem queria, Thiago? – Aperto os dedos contra o celular como se o ato fosse amenizar a minha expectativa.
— Não. - ofega. — Você sabe que eu te quero. – Ele está mesmo me dizendo isso por telefone? Sua voz é tão próxima que quase posso ouvir a sua pulsação ao falar.
— Quer? – sussurro ainda sem acreditar que estamos mesmo conversando sobre o bem-quer. Sobre um quer o outro sem esconder o desejo.
— Quero – ele volta a afirmar enfático. — Só não aconteceu, ontem, porque… – Eu apaguei alcoolizada. Posso apostar que fiz bem mais do que a gentileza e generosidade do Thiago permitem contar.
— Ai, eu estou morrendo de vergonha, Thiago, não quero te ver nunca mais. Não quero olhar para sua cara tão cedo.
— Não brica com uma coisa dessa, Marjorie. Eu quero te ver. Quero te ver sempre. - Está todo sério, agora. Sei que ele está sendo sincero e por isso não penso duas vezes, quero encontrá-lo.
— A onde você está?
— Trabalhando.
— No Projac?
­— Onde mais, Marjorie? Eu cumpro os meus compromissos – responde ele com entusiamo.
— Ai, meus Deus, esqueci, eu tenho gravação hoje? – Caço minha bolsa com olhar e antes que eu a encontre, Thiago responde.
— Não tem – Como ele sabe? —, olha só que sorte a sua, não vai precisar me ver. – Sorte? Se isso for a minha sorte, Deus me ajude!
— Eu quero te ver – murmuro de repente
— Ué, que mudança repentina é essa, Mah? – estranha, ele — Há um minuto atrás…
— Eu quero te ver, posso? – pergunto como uma adolescente que vai a um encontro pela primeira vez.
— Eu vou adorar – diz simplesmente. — Preciso desligar agora, amor, estão me chamando aqui. Vou gravar.
Amor…. Ah, ele precisa urgentemente parar de brincar com o que diz, pois cada vez que ouço é como uma chama que se acende e me enche de esperanças. Não suportaria pensar ser este apenas um descuido seu.
Paro enfim de encarar o celular feito uma tola apaixonada. Se eu quiser o encontrar a tempo para o almoço, tenho que correr e me arrumar. Afinal, ele me deve um. Nossa última tentativa de almoçarmos juntos tinha sido arruinado pela visita surpresa da Mariana.
~*~
*Cadê vc? A festa já começou!?*
*Sério, vc desaparece e depois não responde? Tô preocupado, me liga*
*Ta. Entendi. Vc não vem ;( *
*Acho bom vc ter uma explicação muito boa para dar*
Leio as mensagens do Leo enquanto espero Thiago concluir a gravação.
*Oi, aniversariante*
Penso rapidamente no Leo ao apertar “enviar” e, apesar do meu cansaço recordo da sua mensagem de áudio pouco agradável aos ouvidos. Meu celular vibra: Leonardo Miggiorin
*Vc lembrou*
Penso no que responder:
*Claro, vai fazer alguma coisa especial para comemorar os 31?*
*Já fiz. Vc está atrasada*
*Ta. rsrs. Jantar hoje? Passo na sua casa às 7*
Sem resposta, encaro o celular por mais uns segundos e desisto. A porta se abre no mesmo instante em que levanto.
— Marjorie! - Fito o seu olhar, nossos olhares se cruzam íntimos. Sorrimos um para o outro.
— Ei, já vi que eu tô sobrando aqui – Emílio apressa-se em despedir —, até depois, Thiago. - Ignorando a saída do amigo, ele passa os dedos na lateral do meu rosto, da têmpora até a nuca.
— Você veio – diz fazendo uma trilha, então da nuca até a cintura. Sua mão se une a minha enquanto ele abaixa a cabeça e, em seguida, seus lábios estão colados aos meus com suavidade e cuidado. Aperto a mão livre no seu pescoço e me aproximo dele, aprofundando o nosso beijo. Ele solta a minha mão, deixando-a livre para percorrer meu quadril. Sua mão é quente sobre a minha pele, e se move palma a palma sobre a perna nua até a extremidade sensível atrás do joelho. Ah, saia e o poder que ela exerce sobre os homens. Minhas pernas bambeiam, mas não o deixo se afastar. Solto um gemido, abrindo a boca, seus lábios e sua língua adulando os meus. Agarro o terno que ele usa entreaberto, que alias é do seu personagem, e me aperto contra ele. Sua língua traça a minha devagar. Seu beijo é obstinado, gemo de novo e rápido demais ele se afasta. — Você está linda. – Beija a minha testa ainda ofegante.
— Você também está – retribuo timidamente. Olhar para ele depois da noite de ontem. Depois do que provavelmente eu fiz e que só ele sabe, não é tarefa fácil.  — Thiago.
— Humm – Os olhos verdes me encaram como quem busca decifrar os meus pensamentos.  — O que foi? - Passando os dedos de um jeito carinhoso no meu cabelo, ele ajeita uma mecha atrás da minha orelha. Ah, esse gesto.
— Me desculpa.
— Pelo quê? - Dou de ombros, ele não vai me fazer falar, vai?  — Pela bebedeira de ontem? - Fecho os olhos enquanto ele envolve meu rosto com a mão, o dedão acariciando minha bochecha e meu maxilar.  — Ta tudo bem, Mah… É, tirando o fato de ter que limpar o seu vomito o resto tá de boa. Não se preocupa mais com isso. Já foi, passou, combinado.
— Humm… - Busco um ponto fixo, que não seus olhos para encarar. — Ta quase na hora do almoço, você já almoçou?
— Já. Almocei mais cedo.
— Ah, que pena. - lamento, pegando minha bolsa em cima do sofá. — Você perdeu uma ótima oportunidade de almoçar comigo.
— Como é? Perdi, perdi nada. - Para na minha frente me impedido de sair. — Se eu soubesse que você vinha perto do meio-dia teria esperado. - Me olha ressentido. — Vai, onde você quer almoçar, te faço companhia – propõe ele. — Tem o que nós fomos a última vez.
— Qual, o que você foi com a Mariana e o Benjamin?
— É esse mesmo. – estreita os olhos, provocativo. — O mesmo que você encontrou o Miggiorin.
— Ah, não. - Porque estamos falando nesse assunto. — Perdi até a fome agora – suspiro —, qualquer lugar menos este, combinado?
— Combinado. - Ele sorri. — Você espera eu trocar de roupa, que nós já vamos. - diz, de costas para mim, se livrando do palito. Meu Deus, strip-tease essa hora, não
— Trocar de roupa, por quê? - Thiago me olha de canto de olho, desabotoando o punho da camisa com sorriso sacana.
— Marjorie, você não quer que eu sai na rua, nesse calor, com esse terno, quer? - Droga, ele me ouviu.
— Não, não quero. - Para ser sincera, não quero que ele saia desse camarim. Quanto menos exposição nós tivéssemos melhor.
— Ei, Marjorie – Paro. Achei que ele não fosse notar minha saída.  —, Marjorie aonde você vai?
— Comprar o meu almoço. - Viro-me na sua direção. Ele está parado no batente da porta com a camisa desalinhada. Seus olhos brilham em expectativa.
— Não me diz que…
~*~
— Não vou te beijar, você está com gosto de atum na boca. - Thiago se estica para colocar a garrafa d’ água na mesa de centro e me lança um olhar insinuante.
— Grande coisa - insinuo como se nós não tivéssemos nos beijado há cinco minutos e o gosto de atuam não estivesse também na sua garganta. —, você não tem nenhuma cena de beijo para gravar depois.
— Quem disse? - provoca ele, uma das mão está na minha cintura enquanto a outra prende uma mecha do meu cabelo atrás da orelha.
— Eu tô dizendo. - Meus braços estão em volta do seu pescoço, prontos para beijá-lo novamente,  — Achei que você gostasse de sanduíche de atum, lembra, foi você quem comprou um pra mim?
­— Eu, eu fiz isso?  - franze a testa, desentendido.  — Não lembro, não. Quando foi?
— Peraí que eu vou refrescar a sua memória. - Contraio os lábios, parando na sua frente. Thiago estranha meu gesto. O que é bom. Tenho toda a sua atenção voltada para mim quando decido sentar na sua perna esquerda, o abraçando pelo ombro. Sem nenhum movimento brusco, deixo meus lábios apenas em contar nos seus.
— Ah, Marjorie. - Ele se mexe como se estivesse desconfortável com a situação, toma meus lábios para si e me beija profundamente. Seus lábios queimam uma trilha desde do meu queixo até retornar a base da minha garganta. Nossas línguas se enroscam, consumindo-se mutuamente. Suas mãos alisam a pele nua dos meus ombros, puxando as alças do sutiã para o lado enquanto me coloca delicadamente de costas para o sofá, novamente. Nós nos beijamos por mais uma eternidade de segundos. Não sei precisar por quanto tempo, meus lábios se mantiveram unidos, colados aos dele sem necessitar o mínimo de oxigênio. Quando me afasto tão sem folego, sua boca corre o meu pescoço formando uma linha de beijos até a orelha. — Você quer me enlouquecer, não é? - Suspira, os olhos se prendem aos meus, observador sei que ele consegue perceber em mim a vontade insana de sucumbir, no entanto ele não o faz. Porquê?
Passando as mãos pelos cabelos, Thiago respira fundo e me beija mais uma vez de forma rápida e doce, depois me abraça, deslizando os dedos pelo braço, puxa a minha mão sobre o seu peito. — Ainda não entendi porque você preferiu ficar aqui. - Sinto sua pulsação acelerar sob a palma da mão. Estou confusa com a pergunta, não lhe parece obvio?
— Queria passar mais tempo, assim, com você e evitar problemas, você sabe....  - admito, deitando a cabeça no seu ombro.
— E-eu, Mah, eu sei, eu e a Mariana – Ele fica tenso de repente. — Eu tenho evitado o assunto, mas chega eu tô cansado de fingir, de disfarçar e esconder o que eu sinto por você. Eu já adiei essa conversa tempo demais, mais do que deveria.
— Thiago!? - suspiro exasperada.  — Você vai conversar sobre o… - Não consigo raciocinar direito. Divorcio, a palavra está girando na minha cabeça.
— É, o que foi, você não gostou da ideia? - - Massageia minhas costas com uma das mãos enquanto a outra segura minha nuca.
— É claro que eu gostei – Beijo-o empolgada. — Eu amei, amei.- Seguro o seu rosto com entusiamo e o beijo de novo, do queixo, as maças do rosto, do nariz aos lábios. Meus dedos estão no cabelo dele, prendendo-o a mim. — Eu, amei, amei – repito, retribuindo da melhor forma que conheço. Com beijos.
— Eu tô vendo. – Ele está rindo para mim, quando saca o celular do bolso da calça e dispara a câmera na minha direção, mirando o meu rosto.
— Thiago, não. – Olho para ele, ofendida, depois caio na gargalhada, cobrindo meu rosto com a palma da mão.
— Tira mão do rosto ou eu vou publicar a foto assim mesmo, Marjorie. – Duvido que ele faça isso, mas resolvo cooperar dando a ele o meu melhor sorriso. — Foto minha, só não vale – resmusgo, apanhando o meu celular da mesa de centro, miro a câmera no melhor ângulo e tiro a foto. Nossa primeira foto juntos.
— O que tanto você olha, aí. - pergunta curioso, inclinando-se para frente na hora exata em que recebo uma mensagem.
— É o Leo confirmando o nosso jantar as sete. - Percebo-o avaliando a minha resposta, os olhos grudados no meu celular. Ele lê as mensagens.
— Mentira, que ele te mandou essas mensagens, Marjorie? - questiona irritado. — E você vai jantar com ele?  - Olho para ele, piscando. Qual o problema?
— Não esquece que eu faltei ao aniversário dele por sua causa. - Thiago me olha boquiaberto.
— Minha causa, agora a culpa é minha, é isso? - Inclina a cabeça de lado me dando um sorriso artificial. Thiago estava agindo como uma criança insegura. Eu amava a sua preocupação e até mesmo o jeito possessivo, mas ele não controlaria meus passos, me impedindo de fazer o que quero.
— Não. A escolha é minha, e eu vou a esse jantar porque devo isso ao meu amigo, Thiago, você querendo ou não, eu vou.
­— Ta bom, você pode ir – murmura ele  —, eu deixo você ir.
— Ah, você deixa? - Tenho vontade de rir da sua careta, mas me contenho. Thiago ainda está sério quando contrai os ombros e diz seco.
­— Deixo, mas com uma condição, duas na verdade, você vai se comportar, nada de bebida, ouviu? - ressalta, me fazendo sentir uma adolescente de novo.
— Ouvi – balanço a cabeça concordando —, e outra condição?
— Fica, vai  - levanta-se, buscando pelo blazer jogado na extremidade do sofá. Veste-o, colocando o palito em seguida.  — são duas horas, agora – verifica ele, no relógio de bolso.  —, até o seu jantar faltam…
— E esse relógio aí funciona, Thiago, não é cenográfico, não é? - Faço graça, esquecendo-me do seu humor do cão.
— Cenográfico é o caram-, Marjorie, você não me irrita, que eu mudo de ideia e faço você ficar aqui, e adeus o seu jantarzinho.
~*~
— Ah, chegou a margarida! E esse bolinho com essas velinhas, aí, não vão te redimir. - ele diz assim que abre a porta e me vê com um cupcake em mãos. — Você perdeu um bem melhor, ontem.
— Desculpa. Você me entende, não? - Faço cara de choro e entrego-o o abraçando antes de entrar no seu apartamento bagunçado. O que não é nenhuma novidade, ele sempre esteve desorganizado, mas talvez hoje, eu não sei, tenha batido seu recorde. Ele fecha a porta e me encara sério.
— O que? Que você prefere o Thiago a mim?
— Co-mo… Como você sabe? - Busco um lugar no sofá pra me sentar.
— Falei com ele ontem. - Dá de ombros, sentando-se ao meu lado.
— Como assim! - o encaro perplexa. — Espera, ele atendeu o meu celular? - Só pode ter sido isso, de que outra maneira o Leonardo saberia sobre o Thiago.  — O que ele falou, conta?
— Pode tirando esse sorrisinho da cara. - Aponta para os meus lábios, dizendo, — ele não falou nada demais. Eu é que mandei ele cuidar bem de você, aproveitei e falei o quanto você o ama.
— Quê? - grito.  — Você, o que?
— Mentira… Mentira, é mentira, Marjorie. - Ele ri do meu desespero e se apressa ao explicar.  — Eu não falei essa última parte, mas devia. Ele precisa saber o quanto você o ama.
— Ele sabe
— Sabe? - Leo está realmente surpreso com a minha afirmação, também pudera, ele sabe o quanto sua amiga, aqui, evita este tipo relacionamento. Bem, evitava. Thiago era a minha exceção.
— De alguma forma ele sabe. - Atiro-me no sofá, deitando a cabeça no lado oposto ao dele. —Você sabe que eu…
— Tomou um porre daqueles, encheu a cara, agora me conta uma novidade? - Jogo uma almofada na cara dele. Tinha esquecido da sua capacidade irritante de ser tão perspicaz.
— A novidade, você quer saber a novidade?  - Fecho os olhos e sorrio.
— Que agonia, anda, fala, Marjorie, vocês passaram a noite juntos, rolou é por isso essa sua carinha de…
— Feliz e apaixonada. - Alargo o meu sorriso, vendo os olhos do Leo se estreitarem. — Dá pra ficar feliz por mim? - Peço, erguendo a coluna para encará-lo nos olhos.
— Tô tentando  - diz sem disfarçar o desanimo na voz. Se ele está tentando como diz, definitivamente não está funcionando. Dobro as pernas sobre o sofá, ficando de frente para ele.
— Leonardo – suspiro preocupada
— Mah, nem começa, eu já sei – desconversa ele.  — Vai me fala: você e o Thiago estão namorando?
— Não – reconheço, Leo já está de pé antes que eu termine a fala. — Eu adoraria, mas não.
— Eu não acredito, o cara fica com você e não. - Agitado, ele anda de um lado para outro. — Acho que vou ter que mudar de ideia e ligar para esse Thiago e explicar como as coisas funcionam.
— Quem disse que a gente ficou?
— Você
— Eu não falei isso.. Disse que estou feliz.
— E apaixonada – diz enfaticamente, os dedos imitando o sinal de aspas.
— Mas não que tinha rolado.
— Não?
— Quer dizer, eu não sei ao certo, eu bebi… Duvido muito que eu não tenha tentado, mas o Thiago me garantiu que não rolou nada ainda
— Ainda!? - fala entre dentes. — Nunca te vi assim tão…
— Apaixonada.
— Nem na época que a gente namorava. - Ele bufa, analisando-me novamente, o olhar consternado.
— O quê? - Estou surpresa.  — Nós nunca namoramos!?
— Porque você não quis. – Isso é novidade. Não lembro de alguma vez o Leonardo deixar claro sua intenção. Exceto… A noite que… Ah, meu Deus
— Qual foi a parte da história que eu perdi, Leonardo Miggiorin, porque nós sempre fomos grandes amigos. Você é como um irmão para mim. Um irmão de alma.
— Para! Pode parar por aí, Marjorie. - Fecha os olhos, vejo um turbilhão de emoções passando pelo seu rosto. Quando os abre sua expressão é de desalento.  — Quer saber, acho que foi esse o meu erro, deixei você entender que o que eu sentia por você era apenas amizade. - Ah, não…  
— Mas você namorava a Carla, vocês formavam um casal tão bonito, eu acho. - Leonardo revira os olhos para mim, chateado. Xingo-me mentalmente. Precisava ser tão direta?
— Tudo para te fazer ciúmes – confessa. O interfone toca antes que possa dizer algo. — Encomendei comida japonesa daquele restaurante que você gosta – avisa, colando o interfone no ganço, indo até a porta em seguida. — Espero que eu tenha acertado na escolha – diz colocando as sacolas sobre a mesa de centro.
— Sushi… Jura? - Arregalo os olhos, e enquanto ele continua a falar lembro-me da primeira vez em que comemos um. Meu primeiro dia no Rio, apartamento novo, vida nova e o Leo. Ele estava lá ajudando com a mudança, arruma os móveis para lá, arrastada para cá, coloca ali, no fim da noite estávamos exaustos só queríamos uma coisa, além de dormir, comer. Como não percebi seus gestos durante o jantar, a forma de me olhar, o jeito de falar tudo tão claro. Quando volto à tona ele está falando alguma coisa sobre o seu relacionamento com a Carla e o meu comportamento.
— Mas não funcionou, também do jeito que você estava envolvida e empolgada com aquele concurso lá, o…
— O Popstar?
— Esse mesmo. - acena com a cabeça, me alçando minha porção de sushi.  — Era demais olhar para o seu amigo apaixonado, aqui? - Aponta para si mesmo, voltando a ocupar seu lugar no sofá. — Depois eu consegui um papel de destaque.
— Numa novela das nove – o interrompo, fazendo graça.  — Como nós comemoramos quando você soube, lembra? - falo de boca cheia. — Nossa, eu fiquei tão feliz por você. Era a realização de um sonho seu, afinal.
— Nosso sonho – corrigi ele, com o hashi vazio no ar.  —, porque você também sonhava com uma megaoportunidade dessa e conseguiu logo depois.
— Humm – engulo apressada.  — Não foi tão logo assim, vai. - digo sem encará-lo. Ele ri do meu estado afobado para comer.
— Ah, não? - Pousa o talher do lado do prato e me olha bem-humorado. — Depois de Malhação, você não parou mais, minha amiga, continua aí, até hoje fazendo sucesso, a danada.
— Ai, como você é exagerado. – Caio na gargalha, e ele continua sério.
— Sua carreira só deslancha, já a minha.  – Que mania de se comparar a mim e a minha carreira.
— Ai, é exagerado e reclamão ainda por cima – debocho, limpando os lábios no guardanapo. Penso no Thiago. A essa hora ele deve estar discutindo sobre o divórcio. Meu coração se aperta só de pensar nessa conversa e instantaneamente busco pelo meu celular na bolsa. Droga, esqueci de tirar do “silencioso”.
— O que foi? - Nada, só a minha vida que está em jogo.
— Thiago me ligou. - Não é nada. — Tem três chamadas perdidas dele. - E eu não atendi nenhuma.
— Ué, liga para ele.  - Leonardo diz com um sorrisinho. Ah, como se fosse fácil fazer isso. — Você não vai ligar?
— Será? Não sei, essa hora ele deve estar em casa e, a você sabe… - O telefone toca. É ele, eu sei.
— Ah, não é sério isso, Marjorie? É esse o toque do seu celular quando o… - Dá risada, pegando o celular da minha mão.
— Para, quer parar!  - imploro, avançando sobre ele. Tento em vão recuperar o celular. — Me dá o celular, aqui, me deixa atender. - É ele. Não conferi e não precisava, a música denunciava.
— Não. - Balança a cabeça. — Nada disso, deixa eu curti esse momento. - Olho para ele incrédula. Não acredito que ele está rindo da minha cara.
— Você quer é curti com a minha cara, isso sim.  - Faço uma cara de zangada.
— Também… - admite com um sorrisinho insolente.  — Marjorie você não existe. - suspira, todo alegre, os olhos brilhando. Ah… não… — Ele sabe? - Quem… O quê.  — Eu quero dizer ele sabe… sabe dessa música? - pergunta, devolvendo-me o celular quando ele para de tocar. — Sabe que você, não me diz que ele… - Faz uma pausa, buscando meu olhar. — Espera, ele tem uma música também, é isso.
— Não, não tem, você tá doido. Porque ele teria?
— Eu sei lá – Encolhe os ombros.  —, você não tem uma, então ele deve ter outra ou a mesma, vai saber – sugere ele com toda a calma.
— Você não pode estar falando sério. - pisco para ele. Aonde ele quer chegar com isso?
— É seríssimo, liga para ele e pergunta. - Ele se mexe, como se estivesse desconfortável. — Não melhor, aproveita e conta para ele sobre a música – diz levantando-se, indo em direção a cozinha.
— Eu não vou fazer isso – o acompanho.
— Claro que não, - gira os calcanhares e me encara. — Como eu imaginava, você não tem coragem. Cerveja? - oferece, abrindo a geladeira. O ignoro.
— Você tá me chamando de covarde, é isso mesmo, Miggiorin?
— E se eu estiver, você vai fazer algo para mudar isso, vai? - provoca ele. Não penso duas vezes. Vou até a sala e pego o celular. Ligo para o Thiago.
— Oi, Mah, só um minuto. Não posso falar, agora. - Imediatamente me arrependo de ter ligado.
— Humm. - murmuro. Sou capaz de ouvir minha própria pulsação. Esforço-me para perceber alguma movimentação a mais, e nada. Estou quase interrogando-o novamente quando ouço sua voz.
— Agora posso, fala. - sua voz é mais calma do que antes, me pergunto se isso tem a ver com a ausência da Mariana. Será que eles… Calma, Marjorie, agora não…  não é hora.
— Thiago, eu liguei para… - suspiro. — Ah, não interessa porque eu liguei, não é nada, esquece. - Desisto, não ia fazer a besteira de cantar para ele, não mesmo.
— Marjorie, amor, fala.
— Thiago
— Quê?
— Repete
— Mah, eu…
— Eu gosto de você e gosto de ficar com você. Meu riso é tão feliz contigo. O meu melhor amigo é o meu amor. - Antes que eu mude de ideia e perca a coragem, canto timidamente.
— Você bebeu de novo, Marjorie? - Nossa… Que mal juízo ele faz de mim.
— Não. Só tô pagando uma aposta – digo simplesmente.  — Você tá surrando por quê?
— Que aposta? - sussurra outra vez.
— Uma aí, mas agora é sério, Thiago, eu te amo
— Eu…
— Thiago, alô… Alô, Thiago. - Ele fica mudo, aumentando em mim a minha angustia.
— É ela? - Ah… Merda!   — Eu tenho uma ótima notícia para contar…
— Mariana, me dá o celular – o ouço gritar exasperado.
— Calma, meu amor, deixa eu contar a novidade.  - Sínica, ela enfatiza as suas palavras porque sabe que eu estou do outro lado da linha ouvindo tudo, mesmo que parte de mim insista para que eu não o faça.  — Acho que você vai gostar de ouvir: Eu estou grávida.
— Mariana, meu… - Desligo antes de ouvi-lo chamá-la de meu amor. Acho que sou capaz de vomitar o que comi. Tudo gira na minha frente enquanto a voz dela ainda ecoa lentamente nos meus ouvidos: ES-TOU GRA-VI-DA.
— Marjorie, o que houve? - Leo corre ao meu encontro como um bote salva vidas, ao qual eu me apoio para não cair ao me sentar. Sua mão ergue o meu rosto, o dedão seca uma lágrima. Estou chorando antes mesmo de começar a falar.
— O Thiago, ele… ele tá com ela e eles, adivinha? Estão comemorando a chegada de outro filho, enquanto eu… eu canto música e me declaro feito uma idiota.
— Não pode ser.
— Eu ouvi da própria, toda empolgada…  - Por mais que eu tente não consigo achar explicação para o que acabo de ouvir. Thiago não pode tá fazendo isso comigo, pode? Planejando um segundo filho com a mulher e ao mesmo tempo me iludindo com a promessa do divórcio. Dói ainda mais quando lembro do jeito com que ele prometeu, hoje, à tarde.
­— Ele disse isso, calma aí Marjorie, deve haver algum engano.
— Ah… a muitos enganos.  - Sorrio, o Leo estava tentando me animar, apesar de todo o seu esforço ser em vão, agradeço. Havia tanta segurança nas palavras do Thiago, que em nenhum momento eu cogitei serem um equívoco. Um engano.
­— Ta vendo – Ele faz uma pausa, me olha docemente. —, vocês vão conversar e…
— Um deles sou eu nessa história – digo sarcasticamente.  — Acabou a bebida dessa casa? - Esfrego as mãos no joelho, ali foram parar o resquício das minhas lágrimas. — Cadê a cerveja que você acabou de me oferecer, eu quero.
— Marjorie, para  - a mão dele prende o meu pulso, antes que eu prossiga. —, você não vai beber. – “Nada de bebida, ouviu?”. Fecho os olhos com a imagem do Thiago na cabeça.  — Você não vai resolver nada desse jeito – observa cauteloso. O seu olhar é para que eu me sente, mas não o faço. Ao invés disso, busco a cerveja. Prometi ao Thiago não beber, mas quer saber, dane-se.
­— Ou eu bebo ou eu choro, o que você prefere, escolhe? - o encaro rapidamente, baixando o olhar em seguida.  — Não precisa já tô fazendo os dois.  - Mal tomo um gole e o Leonardo está ao meu encalço, tirando o copo da minha mão.
­— Hey, vem cá, para com isso. - Ele me puxa para o seu colo e eu não faço nada para impedi-lo. Sei que deveria, mas não o faço. Tudo o que queria no momento é alguém mais forte do que eu para me amparar. Me sinto bem com o seu abraço apertado. É como um balsamo com efeito calmante. Por um instante parece sufocar, abafar e dissolver todos os meus medos.
— Eu não mereço amar e ser amada? - pergunto mais calma, apoiando minha cabeça no seu ombro.
— Merece, é claro que merece, Mah – diz sem me encarar. —, só que as coisas não são tão fáceis assim no amor.
— Porquê? Todo mundo tem um amor. - Leo ainda está segurando a minha mão, fazendo carinho, a aperta com mais intensidade quando diz.
— Nem todo mundo, eu por exemplo. - Engole em seco, continuamos sem olhar um para outro. Olhar o nada ou contemplar o silêncio dos móveis na sala é melhor e menos constrangedor. Leonardo Miggiorin é bem mais do que um amigo. Se eu soubesse ler nas entrelinhas que a vida escreve talvez estaríamos juntos, talvez teríamos uma linda história de amor para contar… Talvez não estaria aqui sofrendo por um amor quase impossível… Talvez, talvez… Ah, coração! O amor pode ser tudo, menos simples.
— Porque você não insistiu, porque não me fez enxergar esse amor que você sentia por mim, por quê? - Ergo a cabeça, seus olhos fitam os meus intensamente.
— Quem disse que eu não sinto mais? - Pela primeira vez na noite, vejo além da amizade sincera de dois amigos irmãos, brilhar. Vejo amor, muito amor. — Eu sinto…. Ainda sinto amor por você. Ainda amo você, Marjorie.
Ele me puxa de encontro a seu corpo, sinto sua ereção pressiona a minha barriga antes mesmos dos lábios estarem colados aos meus. Ele me beija… bem, na verdade, ele quer mais do que apenas um beijo… como lido com isso? Eu deveria fugir, mas não consigo. Sou atraída por ele em um nível primitivo que mal consigo compreender, apenas sinto… Sinto amor, muito amor em cada um dos seus beijos.
Seu corpo inclina-se sobre o meu, as mãos na minha coxa, tento não pensar no Thiago, mas é em vão. Ele está comigo, luto para afastá-lo da minha mente. Desliso as mãos pela barra da sua camiseta, trazendo-o para mim, envolvo seus lábios, e quando ele pensa em para o impeço com as pernas presas no seu quadril. A respiração dele ofega junto com a minha. Seu beijo é intenso e profundo, tão bom que não consigo parar de pensar e se… e se eu der uma chance a esse amor? Não posso lutar contra o inevitável… Um filho. Ele não vai largar a mulher e mais um filho. Ah… Thiago…. Por quê?
— Ah… Thiago….
— Ah, Marjorie se você vai continuar me chamando de Thiago, é melhor parar por aqui, eu não…
— Por favor, não
— Marjorie, eu não quero isso que você está me propondo.
— Por favor, faz amor comigo.
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