#em breve edito KKKKKKKK
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lleroisoleil · 5 years ago
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WHEN THE TRUTH HUNTS YOU DOWN.
                                                              — TAREFA 05.
Essa task foi uma montanha russa de indecisões na minha vida: não sabia se postava, se fingia que nunca tinha acontecido, se guardava pra mim KKKKK Mas, após encher a paciência de MUITA GENTE e com o apoio incrível principalmente de @sorenotsore, @itsautumnstein e @sxweselton... POSTADO NOS 45 DO SEGUNDO TEMPO. Esse pov começa com uma continuidade desse post aqui com @ikaimana tw: posts de qualidade duvidosa hm kk... brincadeira klnflsfdl tw: sangue, tw: violência subentendida, tw: morte
☀ I
Por um momento, nada havia.
E então, das sombras o mundo se reconstruiu novamente, peça por peça enfim rodeando-o num labirinto de adornos dourados. Os corredores de mármore se estendiam sombrios, vozes antigas que entoavam distantes e desarmônicas pelos diferentes cômodos servindo-lhe em desagradável companhia. Sentia que devia reconhecê-las, reconhecer o que diziam, mas já fazia  tanto tempo. Não percorria aquele trajeto desde…
 “... é demoníaco!” A voz desafinada do homem ecoou direto em sua mente. Parou em meio à escuridão, e como mágica, uma única porta surgiu entreaberta diante de si.
“Já disse para falar baixo, Armand, não vou pedir novamente.”
“E por que deveria? O povo merece a verdade.” “O que o povo merece, cardeal, é um rei. E sugiro também que não se esqueça de que neste momento está se dirigindo a sua rainha.”
Sentiu o sangue gelar sob as veias com a súbita realização do que estava acontecendo, o tom frio e urgente de sua mãe naquele momento uma memória que jamais conseguiu se libertar. Não. Tentou girar os calcanhares, se afastar às pressas da cena que iria se desenrolar diante de seus olhos mais uma vez. Não ficaria mais um segundo ali. Contudo, o corpo não respondia aos seus comandos, pelo contrário. Não! A mente gritava, o rosto cada vez mais próximo da fresta iluminada. As duas figuras trajadas de preto circulavam ao redor da sala de estudos do rei consternadas. 
“O povo já tinha um rei, Majestade.”, Armand respirou fundo, realizando o sinal da cruz sob o rosto antes de continuar. “E agora ele está morto.”
“Desaparecido.”, ela retorquiu, um fiapo de desespero perceptível sob a fachada austera. 
“Há anos! Estamos em um funeral, Ana, quando vai aceitar? Sabe o que o garoto… aquilo é, as coisas que ele… o risco que representa a todos nós. Pense no que aconteceu ao rei! Que Deus nos proteja, é uma aberração, não deveria existir.”
“Presume que não considero o que ele é, o que representa? Sei mais do que você sequer imagina.” Os olhos dela se perderam em meio à papelada rabiscada na mesa redonda que se interpunha entre ambos, a expressão horrorizada. “Mas, para melhor ou para o pior, ele carrega o nome Bourbon e é isso o que ele será. Um rei Bourbon. Não podemos nos dar ao luxo de perder isso. Ele nos é útil, Armand.”
“Minha senhora…” O velho hesitou e como se pudesse finalmente sentir sua presença virou o rosto em sua direção, os olhos vidrados em desgosto. “O que ele é, é uma ameaça.”
Tentou responder, mas algo fechava sua garganta, chumbava seus pés na mesma posição submissa em que se encontrava. Ele não era dono de si mesmo, não ali. A porta fechou com um estrondo, desvanecendo na escuridão trêmula a se alimentar vagarosamente de qualquer facho de luz e estreitava sua passagem.
Um estalido alto ressoou e tornou a perceber o passar do tempo, as memórias derramadas como um balde de água fria sobre os ombros arrancando a consciência do breve estupor vivenciado. Não estava na França, não era mais uma criança. E com certeza não teria chances de processar o que tinha acabado de acontecer antes de ser engolido pela escuridão novamente. Precisava ir embora daquele lugar, onde quer que estivesse. Um calafrio correu pela nuca ao se sentir estranhamente exposto.
Algo brincava com ele.
Soube o momento exato em que aquilo tinha aparecido. Sua presença reverberou pelo caminho torto que restava, enquanto tudo ao redor parecia ficar um pouco mais acordado. Analisou a imensidão titilada das sombras, em vã tentativa de encontrar o que por ali espreitava. No entanto, ao contrário do previsto, pelo canto dos olhos conseguiu notar algo tomar forma no final do extenso corredor iluminado.
Ficou lívido.
A figura não era inteiramente humana, ao mesmo passo em que parecia tentar se aproximar da humanidade em diferentes níveis. E falhava. Mas esse não era o pior. “O que foi, Louis? Minha aparência não lhe agrada?” As palavras serpenteavam através dos sentidos febris, ecoando em conjunto com seu horror pelo espaço. Olhos vermelhos vazios encaravam-no divertidos, as feições angulares distorcidas em um sorriso animalesco. Imediatamente buscou pelos óculos em seu próprio rosto, percebendo sua ausência.  A princípio, terror e repulsa o deixaram sem palavras, entretanto tinha a impressão de que ele tinha entendido perfeitamente, e, com certeza, estava lisonjeado. Atordoado demais para gritar, acompanhou vacilante os passos que o outro dava em sua direção. “Quem é você? O que é você?”
“Esse não é o mais importante agora. Definir-se é limitar-se, como bem sabe.” Não era real. Não podia ser real. Ignorou o som inconfundível e perturbador da própria voz, desviando o rosto do escrutínio alheio.  
“Lou...is”, a criatura cantarolou em reprimenda, “do que tanto se esconde? Para que tanto constrangimento, tanto medo... Não percebe que é assim que o dominam? Sua falta de esclarecimento é auto imposta, criança. Compreensível, imagino. Até mesmo o mais audacioso... humano”, cuspiu a palavra em desagrado “teria medo de si mesmo. O terror é o que os governa — reação comum a seres primitivos quando confrontados com o desconhecido. Mas as coisas que não seriam capazes de realizar se ao menos tivessem... Ah, qual a palavra? Coragem?” Hesitou em falsa reflexão, um sorriso malicioso rasgando a face ao encontrar a resposta. “Dignidade.”
Armadilha. Era palpável, conhecia aquela rodear de palavras, a entonação jocosa de um mercante. Mesmo assim, algo nele parecia responder ao que tinha diante de si quase instantaneamente. Não conseguia evitar pensar: se é uma armadilha, o que aquilo tinha a oferecer em troca?
“Parece saber muito sobre coragem para alguém disfarçado sob a aparência de outra pessoa.”
“Poderia dizer o mesmo de você.” Cerrou os punhos, a risada zombeteira tão semelhante a sua, e ainda assim, perdida em vida, um reflexo da raiva explícita que sentia. “O que posso dizer? Estou farto de mim hoje; além do mais, a quem o grande Louis Dieudonné daria ouvidos... senão a si?”
☀ II
Ninguém nunca tem medo do escuro.
Os passos eram abafados no solo úmido coberto de musgo, e Louis se perguntava o que mais percorria nas entranhas da floresta de maneira imperceptível. A escuridão, sabia, era sempre cheia de murmúrios inexplicáveis, porém havia algo no ambiente depois daquele dia que fazia sua imaginação viajar para lugares vis.
Não, as pessoas temiam o que as trevas poderiam trazer. Em seu caso, nada particularmente bom. E mesmo assim, obviamente, ele parecia não ter aprendido a lição. Há quem diga que existam apenas duas opções quando confrontado com o abismo: ou corra dele, ou mergulhe. Louis sempre mergulhava, não havia hesitação. Não, se havia algo com que podiam contar era que o homem sempre jogaria o bom senso pela janela dada a menor oportunidade. O que o trazia àquele momento. Apoiava a mão contra os curativos no tórax com cautela, enquanto a outra permanecia com a lâmina em riste, atento à qualquer possível ameaça.
Merlin estava com medo, era claro, todas as regras e pretensas proteções apenas paliativos; e o que quer que o mago tanto temesse estava preso em Aether junto com eles sob a maldita redoma.
O pensamento de que talvez o que tivesse ocorrido no sótão, as lembranças e as ilusões que o encurralaram e à Kaimana numa trama psicológica doentia, fosse algo intimamente ligado ao que tentavam encontrar cruzou sua mente mais do que uma vez. Os relatos das vozes que muitos aprendizes pareciam compartilhar terem escutado contendo uma semelhança perigosa com o que ele próprio tinha experimentado. Com apenas uma única diferença.
A direção dos ventos mudou abruptamente de maneira pouco natural, como se tudo ao redor começasse a responder a um mesmo ritmo e ficasse um pouco mais vivo. A sensação era familiar. Algo tinha surgido e o observava. Girou o corpo, procurando em agitação qualquer indício, qualquer... Um grito estridente emergiu da vegetação mais densa, não muito distante de onde estava. 
Soren. O coração deu um salto descompassado, esquecendo momentaneamente do que deixava para trás ao correr em sua direção. Ou seria… 
Não.
 ☀ III
“Não é possível que não tenha visto…” A voz da criatura sibilou. “Acredita mesmo na ingenuidade de seus pais? Na bondade de seus atos… A célebre dinastia Bourbon, que se manteve por séculos graças a seus atos clementes… Está pensando no conto errado, garoto.”
Sentia a cabeça latejar, tentando fazer sentido do que quer estivesse acontecendo à medida que tomava nota das sombras se aproximando perigosamente de seu corpo. 
“E quanto a você? Imagina ser o único segredo deles? O que mais escondem? O que mais não te permitem?” 
“Do que está falando?”
“Bem, sei tanto quanto você.”  Ele adicionou, a ironia banhada em sua voz. Era demais.
“Que jogo doentio é esse? O que esperava conseguir com isso?” gesticulou para o outro, a raiva e a confusão cegando qualquer lógica que pudesse ter para tentar sair daquela situação. Só queria alcançá-lo e resolver com as próprias mãos. 
 “Vamos lá, não há problema nisso! Todos amam um pouquinho de atuação. Diria que a sua está bem mais verdadeira que muitas realidades que conhecemos.”
Quanto mais andava, mais distante parecia ficar, sentiu a falta de fôlego e tropeçou. Estava cada vez mais tonto, e mais cansado. 
“Você está errado.”
“As perguntas que têm feito é que estão erradas. De qualquer forma, não deveria existir algo como certo ou errado: você tem boas razões para algo, ou não. Não é isso que pensa? Como defenderia seu caso? Como definiria seus desejos mais profundos, então?”
“Merde, o que diabos você quer afinal?”
“O mesmo que você. A verdade. Liberdade... E um pouco de diversão no caminho também.”
“Eu não compartilho nada com você, pode ter certeza disso.”
“Eu vi seus pensamentos, garoto, não me trate como um tolo. Ainda que não tivesse, a perversão é algo que se escreve no rosto de um homem, se sente no próprio respirar, não pode ser escondida.”
“Falando sobre perversões agora? Achei que tinha dito não existirem ações morais ou imorais.”
“Eu? Não disse absolutamente nada. Olhe mais perto.”
E então finalmente o alcançou no inalcançável final do corredor.
Uma moldura em pedra bem desenhada separava ambos, como um portal. Estendeu a mão receoso e  encontrou apenas o toque gélido do vidro, todos os movimentos refletidos — a monstruosidade que parecia imitar sua pele olhando em choque de volta para si, à espera.   
Estava conversando com o próprio reflexo o tempo todo.
IV
O grito se repetiu desesperado, mais alto. Estava perto.
Corria entre as árvores mais rápido do que conseguia pensar, a respiração em arquejos pesados ao sentir o esgarçar lento e dolorido dos pontos costurados no peito.
“SOR-” Para seu crédito, Louis não vacilou. Escorregou os pés contra a terra molhada tentando travar os passos e permanecer quão imóvel fosse possível diante da cena. A cabeça, o tronco e as asas de águia, em contraste as patas dianteiras e cauda de um leão não permitiam espaço para dúvidas: o corpo estendido no chão em agonia era de um grifo. Lembrava vagamente as histórias que os soldados costumavam lhe contar quanto às diferentes criaturas mágicas que estes enfrentavam. Grifos, eles diziam, eram criaturas que simbolizavam e tinham como propósito a proteção de algo, as lendas sempre alegavam que ao encontrar um grifo também tinha encontrado seu destino — fosse ele a morte, ou uma grande riqueza. A aparência do que tinha encontrado era a de que alguém havia tentado a sorte contra ele.
Os ossos do peito em quilha estavam expostos, marcas de dentes afiados que tinham dilacerado carne, músculo e ligamentos sem qualquer precisão clínica. Era puro instinto. Devia ser uma morte rápida, ao que tudo indicava, mas no cenário de sangue, pena e sujeira, um líquido azul se misturava borbulhante e chamava sua atenção. Parecia reagir de forma a retardar a morte do grifo, enquanto lhe infringia dor.  O que poderia ter causado esse dano? Não conhecia veneno natural assim, e por mais que receasse admitir, devia ser um ataque premeditado. Por que?
O animal lhe encarou em súplica e gritou novamente. E então ele soube. Independente de qualquer circunstância, a motivação por trás era a simples e pura crueldade. Ele morreria de qualquer forma, não sem antes desejar que acontecesse logo.  Aproximou-se lentamente do corpo, levantando a lâmina contra este. Segundos pareciam se transformar em minutos, enquanto o grifo apenas abria a envergadura das asas e fechava os olhos pela última vez. A dor findou. Engoliu em seco, soltando a respiração que mal percebia ter prendido em primeiro lugar. Sem que notasse, no entanto, novos olhos observavam-no com atenção.
☀ V
Louis já teve momentos melhores.
Até mesmo respirar se provava uma tarefa difícil, sentindo cada músculo do corpo dilacerar com o ato. Apertou os olhos, ecos da risada fantasmagórica confundindo-se com o burburinho frenético dos alunos em busca de ajuda na movimentada ala hospitalar. Ali não tinha a menor percepção de tempo, sua consciência flutuando entre estados mais distantes que somente o acordar e o dormir. Os delírios febris apenas pioravam, tinha certeza disso. O que mais justificaria as malditas vozes que se multiplicavam, gritavam e chamavam em seu sono?
“Não é possível que não tenha visto…” A voz da criatura sibilou. 
E antes que percebesse, sombras irromperam pelas cortinas finas do lugar, mergulhando seu frágil estado na inconsciência, e novamente, na sala de estudos do rei. Dessa vez, no entanto, estava na presença de seu dono.
Ele trajava cinza. Eram roupas simples para um rei em comparação com as conferidas e descritas a ele desde sua tenra idade. No entanto, muito semelhante às vestes do quadro em tamanho real que tinha do homem em seus aposentos, a imagem constante daquele a sempre lhe creditarem à morte antes mesmo de saber reconhecer que ele deveria ser o seu pai. Diziam ser aquele o grande rei Louis XIII, o Justo, mas sequer isso poderia afirmar com certeza sobre o homem. A imagem era amedrontadora, olhos frios que pareciam seguir e antecipar seus movimentos por toda a parte. Por isso não associou de imediato o homem diante de si, uma bomba-relógio prestes a explodir, ao do quadro e imaginário francês.
“... Pai?” Testou a palavra inseguro. Sabia que devia ser mais uma de suas alucinações, afinal, o rei francês estava morto.
Desaparecido, o eco de uma voz retorquiu divertida em sua mente. O homem o ignorou, olhando para ambos os lados com desconfiança antes de checar mapas de Mítica e rotas desenhadas neste. “Majestade.” Tornou a insistir, a voz mais firme que anteriormente. 
“Precisamos contatar Merlin. Agora!” Os mosqueteiros reais surgiram à porta, carregando muitos dos papéis com desenhos esquisitos que o rei lhes incumbia.
“O que precisa contar ao Merlin? O que aconteceu?”
“Tem algo aqui… Imagino que seja tarde demais.” Constatou que o rei segurava firme uma pequena caixa enquanto refletia, decidindo por fim correr até um dos cofres da sala para resguardá-la.
O escurecer do aposento ocorreu em um piscar de olhos, uma onda de sussurros e gritos justapostos crescendo cada vez mais e mais.
Então todas se silenciaram.Uma única chamou sua atenção, seu pai. “Há muito que não sabe ainda. Isso é só um sonho, Louis. Mas você sabe onde me encontrar. Venha até mim.”
E foram engolidos pelas sombras.
 ☀
VI
Estava ali.
Todo esse tempo sabia ser o lugar onde deveria chegar, com o qual vinha sonhando, cravado por trás de suas pálpebras como tatuagem. Não conseguia fugir disso. O que era, o que deveria ser. Tudo começava e terminava ali. Encontraria o rei. Seria melhor, seria mais. 
Já esperava as curvas e ângulos desenhados na parede da gruta cinza com algum líquido seco e pungente, era a imagem vista. Jamais imaginaria a energia que emanava do lugar, no entanto. Havia algo pesado no ar, uma espécie de antecipação pulsátil a mantê-lo ali, em guarda para qualquer mudança. E ela veio.
Um vento quente roçou seu rosto, e por cima do farfalhar de folhas secas ouviu o som de um longo assovio acompanhado de uma movimentação entre os pinheiros. Procurou pela fonte de cima a baixo por um tempo, a destra com a lâmina apontada em múltiplas direções por segundo. Até que percebeu, não estava entre as árvores: era uma das árvores. O ser a surgir ora se assemelhava a vegetação rasteira, ora aos diferentes arbustos, se camuflando entre a paisagem exceto pelos esquisitos olhos verdes e as garras pontiagudas. “O que pretende fazer com isso? Me cutucar?”  A voz da criatura correu suave junto com a brisa. A única coisa que conseguiu fazer de início foi evitar correr, pois sabia que se o fizesse as chances de ser imediatamente seguido eram altas. 
“Era você. Eu o senti.” Não abaixou a adaga, apesar de entender que sim, em seu estado provavelmente só seria capaz disso. Daria seu jeito. 
O som do estalar de madeira alcançou seus ouvidos, e Louis sentiu como se essa fosse a risada da criatura. “Há forças mais poderosas e perigosas que um Leshy por aqui, humano. Mas você está certo em dizer que sentiu algo, apenas não a mim.” O Leshy se aproximou reduzindo em tamanho gradualmente até alcançar sua altura. “A mesma força que atacou meu amigo, a quem você assistiu nos últimos momentos. É com essa que deve se preocupar.” 
“E com você não?”
A criatura hesitou, parecia estar dividida com a resposta que queria dar. “Não hoje. Tenho uma dívida com você, pelo que fez pelo grifo.” 
Abaixou a adaga por um breve segundo dada a confusão. Como assim o que tinha feito pelo grifo? “Aquilo não foi nada. Não digo isso por educação ou porque eu queira retirar sua dívida comigo, estou muito satisfeito em manter nossa trégua, acredite. Mas, realmente não foi algo que fiz por isso.”
“Surpreendente, vindo de você.”
“Vindo de…”
“Eu vou lhe dar uma dica, garoto, e entenda da maneira que lhe convém.” Leshy o interrompeu, os ventos se agitando ao redor deles. “Seres como eu, ou o grifo, estamos aqui por um motivo. Guardamos essas regiões, protegemos de motivações em nome de um bem ou um mal maior. Não acreditamos nesse tipo de coisa, somos parte da natureza. Aquele a quem deve temer sabia disso e precisava de você para alcançar o que acredita que será em seu favor. Essa será a sua ruína.” 
“Quem é essa criatura?”
“Não posso dizer.” Uma série de flores voaram em sua direção, o tom do Leshy repleto de zombaria. “De qualquer forma, minha dívida está paga. Você pode sair daqui com vida caso deseje concluir o que veio para fazer. Terão consequências e você precisará aceitá-las. Consente?”
“Quais consequências?”
“Não posso dizer. Consente?”
Percebeu tarde demais que nada de frutífero sairia daquela conversa. “Mon ami, não costumo realizar contratos sem entender os termos. Do jeito que pergunta, faz parecer como se eu pudesse recusar.”
“Você pode.”
Mas ele não podia. A escolha já havia sido feita antes mesmo de saber de sua existência. Imaginava ser uma armadilha e estava disposto a pagar o preço. 
“Consinto.”
“Uma pena. Espero que volte a me surpreender, humano.”
De onde o Leshy levantou, o solo começou a se dissolver gradualmente, até enfim denotar um brilho prateado no fundo da fissura. Enfiou as mãos na terra, cavando quando necessário até segurar firme entre os dedos um metal frio. 
Uma chave. 
Ergueu o objeto contra a luz da lua, reconhecendo nele os mesmos caracteres que tanto observou em suas visões nos pergaminhos pertencentes ao pai. 
O imponente rei francês estremecia toda vez que consultava seus escritos, e agora, Louis também tremia. 
Virou a atenção para o céu, caminhando de volta para a trilha em direção ao castelo. Ainda precisava encontrar Soren. 
A lua iluminou sua silhueta uma última vez antes de sair da clareira e adentrar a mata fechada. Curiosamente, mais do que uma sombra tinha sido formada. 
Para o bem ou para o mal, Louis Bourbon tinha lançado os dados.
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