#Suplício social
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Minha memória é horrível. As pessoas costumam ficar putas quando eu não lembro de situações significativas vividas entre nós. Em memórias mais banais, rolam piadas sobre a planta que eu fumo ou o álcool que eu bebo, piadas sobre qualquer sequela que possa justificar essa memória de peixe. Claro, além das piadas, que acabam sendo a parte menos desagradável, muita gente (incapacitada) tenta analisar e resolver essa questão através das loucuras mais variadas. Entre as análises, o signo é a mais insana. E é pior quando essas pessoas estão bêbadas. Os místicos, os crentes e quem usa sunga na praia, eles não aceitam o contrário. Tem também os que falam que a vida é uma só, “bora fazer um churrasco?”. Que são os mesmos do “vem, vem sair na foto”, ou do “não precisa saber dançar, é só mexer o corpo”, que também vão te chamar para ir no karaokê “pra se divertir, lá ninguém sabe cantar”. Enfim. Voltando ao que eu dizia antes, acho que, nessa disputa, quem fala que minha memória colapsada tem a ver com a bebida é quem está mais certo. Não pela substância em si, mas por conta da fobia social que me acompanha. Esse é o foco. É muito difícil sair de casa sóbrio. Há um curto circuito na minha mente que faz com que apenas uma voz ecoe. Ou talvez um ruído, um chiado, porque isso que quero dizer não tem a racionalidade de uma voz. É uma sensação, uma aflição permanente, uma desarmonia que costuma dizer que tem algo de errado. E eu, minuto a minuto, segundo a segundo, tento domar essa vertigem. Aliás, nesse ponto a minha memória funciona. Tenho muitas lembranças dos “desvios” que fiz para me distrair de mim mesmo e do mundo. Lembro de muitas particularidades dos cantos que me escondi quando precisei respirar. Mas enquanto lidava com esses tremores ao interagir, pouco do lado de fora ficou gravado em mim, por mais agradável que fosse a companhia e o momento. Ou melhor, mesmo que tenha ficado gravado de forma nítida e intensa, tudo foi rapidamente aterrado por um novo desmoronamento. E esse processo ocorre praticamente o tempo todo, deixando muitas vezes apenas ruínas. É difícil explicar. Sempre vai faltar um ponto de vista. Sempre vou achar que dei uma explicação incompleta. Além do constrangimento de assumir uma condição que por si só me causa vergonha e afastamento. Sinto que as pessoas não entendem, muito pela forma que lidam. Sinto que sou uma pessoa difícil. Sinto que sou incapaz de agir igual aos outros, de maneira espontânea e convicta. Daí, minha vida não anda. Vem o pânico, a ansiedade, a tristeza, a depressão. As pessoas não tem tempo para ouvir sobre isso, a vida não para por conta disso. O sol nasce dia após dia e eu estou nesse buraco. Passam oportunidades, passam amigos e mulheres que por algum motivo gostaram de mim, mas nada fica. Fiz alguns meses de terapia e pareceu um jogo de colecionar palavras. “Como é? Interessante! Já percebeu que você usa bastante essa expressão? Ficamos com ela por hoje. Até semana que vem”. Mas eu queria dizer mais. Queria sentir que essa merda tem alguma importância. Até que a duração das sessões foi diminuindo, diminuindo, e com alguns minutos nós já tínhamos a palavra do dia. Fui me sentindo ridículo. Imaginava ela desligando a câmera, respirando fundo e agradecendo por aquele suplício ter acabado, “caralho, esse cara não vai parar de chorar nunca?”. Sei que era um ressentimento da minha parte, por conta de toda frustração, mas é difícil se convencer do contrário. Uma força te puxa pra isso e você vai. Simplesmente. Quando alguém te elogia, é por pena. Quando alguém te admira, não faz sentido. Vivam entre vocês nesse mundo. Tudo que eu sinto é verdade, todo o resto é falso. Me deixem agonizando em paz. Já entendi o que é meu e o que é de vocês. Uma loucura fodida, que é foda dar conta. Então, preciso calar essas vozes. Anestesia. Minha melhor anestesia é o álcool. Álcool até o descanso. Sem dar trabalho e sem feiura. Apenas silêncio. O melhor silêncio de todos. Sem criar nada, sem me relacionar, mas quieto, sem chiado, o silêncio após as bombas... A vida pra frente.
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FOUCAULT, M
A sociedade punitiva
p. 57
AULA DE 24 DE JANEIRO DE 1973
“emergência do criminoso como inimigo social”
ROUSSEAU – o contrato social > por ser inimigo da sociedade deve ser exilado e morto
ROBESPIERRE - “antiroussoneano” porém mesma base teórica [contratualista]
Visto que o criminoso é inimigo da sociedade, esta não tem o direito de matá-lo, seria bárbaro para a sociedade matar um inimigo que ela já venceu, quanto para um guerreiro matar seu prisioneiro ou para um ADULTO matar uma CRIANÇA”
ANÁLISE TEPORICO-POLÍTICA DESSE DEBATE - dos efeitos teórico-políticos
Deveria levar em conta aquilo que MARX escreveu sobre o roubo de madeira (GRUNDRISSE)
“talvez partir desses modelos fosse possível ver como analisar discussões políticas oposições e BATALHAS ORATÓRIAS dentro de DADA SITUAÇÃO POLÍTICA”
Mas e o “APARECIMENTO” do criminoso como INIMIGO SOCIAL seria por meio de?
; formação de uma ideologia
; organização de um tipo de discurso?
; Esquema de comportamento?
CONTEXTUALIZAÇÃO
“constata-se um fenômeno notável: na mesma época em que dentro da instituição penal, era formulado e posta em prática o princípio do criminoso como inimigo social aparecia uma nova tática punitiva: A RECLUSÃO”
A PRISÃO COMO PENA
1767 - (Serpillon) “A prisão não é vista como uma pena de acordo com nosso código civil (direito civil)
1831 - “primeira grande revisão do sistema penal (inicio da Monarquia de Julho - França ou Inglaterra)
O que é o sistema de penalidade admitido pela nova lei?
São 4 penas principais em que não é apresentada a pena de morte como opção, portanto, 4 sinônimos para a DETENÇÃO;
1779 - (Inglaterra) “em consequência da independência Americana - inquérito de HOWARD sobre as casas de reclusão
HOWARD E BLACKSTONE - propõe um projeto de lei em que a reclusão aparece como pena EXLPÍCITA
“Muitos dos indivíduos culpados por crimes que outrora eram punidos com a deportação, caso submetidos à detenção isolada poderiam não só inspirar terror àqueles que fossem tentados a imitá-los como também contrair o HÁBITO DO TRABALHO e assim, corrigir-se.
1790 – 1800 – instaura-se o sistema PENITENCIÁRIO na INGLATERRA
1793 – BENTHAM – PANOPTICON
“matriz arquitetônica das prisões europeias (inspirado em Catarina II da Rússia - projeto de vigilância generalizada portuária)
FRANÇA - (defasagem) 1791 - formulação teórica do princípio de encarceramento como esquema geral de punição
DUPORT – 1791 -
Sentimento universal que atinge todos os seres sensíveis “é o amor à liberdade, o bem sem o qual a própria vida se torna o SUPLÍCIO, uma pena real, repressiva e duradoura que NÃO ALTERA OS COSTUMES DE UM POVO. É possível de ser GRADUADA, de tal maneira que pode ser aplicada aos diferentes crimes e possibilitar que entre eles seja a penalidade seja PROPORCIONAL dependendo dos diferentes graus de PERVERSIDADE e nocividade”.
1810 – (NOVO) CP – instaura-se todo o sistema de encarceramento
1791 - Diferenciação das casas de detenção na França em – réus a espera de sentença; acusados sem julgamento; condenados - HIERARQUIA DAS PRISOES
O PROBLEMA - “No fim do século XVIII assiste-se à total reorganização do sistema das penas em torno do ENCERCARAMENTO e, por outro, essa reorganização é contemporânea da emergência do criminoso como inimigo social
2 FENÔMENOS CORRELATOS – pode-se dizer que O SISTEMA DE ENCARCERAMENTO NÃO DERIVA DA REDISTRIBUIÇÃO DA TEORIA E DA PRÁTICA PENAIS EM TORNO DO TEMA DO CRIMINOSO SOCIAL
“entre o PENAL, organização em torno do criminoso (do principiado) e o PENITENCIÁRIO, organizado em torno da prisão percebe-se uma fissura cujo aparecimento histórico;
A FISSURA - (CONTRADIÇÃO/CONFLITO ENTRE PENAL E PENITENCIÁRIO)
Discurso do Direito Penal – passa a ser chamado de discurso da “Ciência das prisões”
“O MAL É QUE A LEI NÃO PENETRA NA PRISÃO”
OPOSIÇÃO no nível dos discursos – SABER autorizado pela prática do DIREITO e de outra, pela prática da RECLUSÃO apenas reproduz o JOGO [de poder] que se encontra nos níveis das instituições
Interessante observar o porquê Foucault começa falando sobre o sistema penitenciário no seu discurso
SISTEMA PENITENCIÁRIO - escapa à penetração do jurídico e da lei
SISTEMA JUDICIÁRIO - esforço em controlar o sistema penitenciário que lhe é heterogêneo
SISTEMA DE RECLUSÃO - deriva do modelo teórico da teoria penal: criminoso = inimigo social
BECCARIA – como deduz que o criminoso é inimigo da sociedade?
“se for verdade que o crime nada mais é que um atentado à ordem, ao interesse social, o que deve ser a punição?”
A punição então não é algo [ligado] à reparação ou a vingança, nem em a ver tampouco com castigo ou penitência, é apenas a defesa e a proteção da sociedade
PRINCÍPIO DAS PENAS
1º
cada sociedade, segundo suas necessidades pode modular a escala de suas penas pois a pena já não deriva, intrinsecamente da importância da culpa, mas deriva apenas da UTILIDADE SOCIAL
Quanto mais fraca uma sociedade, mais facilmente ela é posta em perigo por um crime, e mais pesada é a penalidade; uma sociedade organizada não é gravemente atingia por um crime e pode satisfazer-se com um sistema penal relativamente leve
RELATIVIDADE
Não associada aos indivíduos, mas ao ESTADO (do que? De organização?) da SOCIEDADE
“nessas condições não pode haver um modelo universal de penas”
POR OUTRO LADO... “se a pena for penitência, o fato de ser severa demais no fundo não terá muita importância (porque salva o indivíduo/sua alma) mas se a pena for a reação da sociedade, superando a medida, se tornará ABUSO DE PODER
2º
Uma graduação fina dos contra-ataques em função dos contra-ataques da sociedade (?)
A punição tem o OBJETIVO de desarmar o inimigo de 2 FORMAS
1 – Sem a condição de prejudicar
2 – Reintroduzi-la no pacto social
3º
O princípio da VIGILÂNCIA do indivíduo ao longo de sua punição e REEDUCAÇÃO
4º
Se for proteção da sociedade, a pena deverá ter em vista impedir que sejam criados novos inimigos; deverá ser exemplar e dissuadir os que possam apresentar-se como inimigos; deverá ser aplicada de maneira pública e infalível
PRINCÍPIOS GERAIS
3 MODELOS DE PUNIÇÃO EFETIVA
Que figuram em todos os discursos dos juristas que querem reformar o sistema penal – nenhum desses modelos é a prisão
I – Modelo da INFÂMIA: “modelo ideal” essa vergonha que marca o culpado é em primeiro lugar uma reação da sociedade inteira; justiça que não precisa passar pelo judiciário.
Binômios em oposição; punição//salário; crime//trabalho
“há uma utopia penal em que o julgamento no sentido jurídico do termo seria inteiramente no sentido PSICOLÓGICO; o julgamento nada mais é do que a TOTALIDADE dos julgamentos individuais feitos pelos cidadãos, por fim, é uma pena ideal por variar de acordo com cada sociedade; cada uma estabelece a intensidade da infâmia com que é preciso atingir cada crime; por fim, ela [a INFÂMIA] é revogável; permite a reconciliação deixando apenas uma lembrança, e não vestígios, como as penas corporais, É A ÚNICA PUNIÇÃO EM QUE O SISTEMA DAS PENAS COINCIDE EXATAMENTE COM O PRINCÍPIO PENAL DO CRIMINOSO COMO INIMIGO SOCIAL”
“O triunfo de uma boa LEGISLAÇÃO é quando a OPINIAO PÚBLICA é suficientemente forte para punir sozinho os delitos que forem os costumes públicos, o espírito nacional ou até mesmo os que atentam contra a SEGURANÇA PÚBLICA”
Sobre o programa policiais; ideologização sobre a punição (legitimação)
II – Modelo do TALIÃO (ressurgimento SEC XVIII)
Linha de derivação dos princípios, pena dosada em função do ato portanto não há abuso de poder: contra-ataque social
BECCARIA - “os atentados contra a pessoa devem ser incontestavelmente punidos com penas corporais; as injúrias pessoais, contra a honra, devem ser punidos com infâmia; roubo-pecuniária;
BRISSOT – cada crime deve ter sua pena específica
p. 64
III – Modelo da ESCRAVIDÃO: trabalho forçado e público
“não é tão puro como a infâmia, tão controlado quanto o talião mas possibilitará que a sociedade receba reparação; PACTO de reconciliação do indivíduo; reedição forçada do contrato social entre o criminoso e a sociedade; ASSIM, a partir dos princípios teóricos desenham-se diversos modelos de punição, nenhum dos quais HOMOGÊNEOS à PRISÃO
A PRISÃO - não é um sistema coletivo como infâmia, não é graduado pela própria natureza como a infâmia pela própria natureza como o talião, é um sistema punitivo ABSTRATO, MONÓTONO e rígido.
“A prisão é o sistema que substitui todas as variáveis previstas nos outros modelos pela variável TEMPO
Assim como o salário retribui o tempo durante o qual a força de trabalho foi comprada de alguém, a pena responde a infração não em termos de reparação ou de ajustamento exato mas em quantidade de tempo em liberdade.
O sistema de punição paz aparecer como sanção do crime a forma-prisão que não é derivável da teoria e aparenta-se com a forma-salário: assim como se dá um salário pelo tempo de liberdade como preço de uma infração. Sendo o único bem possuído, o tempo é comprado em razão do trabalho ou tomado em razão da infração.
O salário serve para compensar o tempo de trabalho, o tempo de liberdade vai servir para compensar a infração.
NÃO QUERO DIZER QUE O SALÁRIO impôs sua forma, que foi o modelo socioeconômico retomado na prática penal
> Nada na história das instituições, nos textos, permite dizer que esse modelo foi transferido para o sistema penal.
QUERO simplesmente dizer que a forma-prisão e a forma-salário são formas historicamente gêmeas sem que se possa dizer ainda quais são exatamente essas relações
PONTOS QUE INDICAM QUE NÃO É UMA METÁFORA;
1º continuidade criada nos sistemas penais do século XIX entre pena de multa e pena de prisão bem como sua sobreposição: quando não se é capaz de pagar a multa, vai-se para a prisão.
Multa = substituto para a jornada de trabalho.
Prisão = representa o equivalente de certa quantidade de dinheiro.
p. 101
Em suma o que temos é: moralização da penalidade; distribuição das classes de um lado e de outra dessa moralidade penal; estatização dos instrumentos desta última.
1º PRINCÍPIO - o que fundamenta um sistema penal deve ser a moralidade
BECCARIA – a lei não tem relação com a moral uma vez que só diz respeito ao interesse da sociedade
2º PRINCÍPIO se a lei precisa de uma moral e se a moral salvaguarda o Estado (no exercício da soberania) é preciso uma instância que vigie a moralidade dos individuos????????????????
Leis são aquilo que dá aos organismos de vigilância a possibilidade de intervir e agir no nível da moralidade
Polícia forte = sociedade pacífica
3º PRINCÍPIO - ALVO – lower classes “conspirações políticas, concretização de operários na fábrica (...) temos aí todos os temas da polícia do século XIX. Como acrescenta Colquhoun, a polícia é uma ciência absolutamente nova na economia política”
3 CONCLUSÕES -
A) 1) supercodificação ético-penal (XVIII)
2) Estado – agente essencial da moralidade, vigilância e do controle ético jurídico
B) Laços entre esse desenvolvimento do capitalismo; aplicação progressiva controle apenas as classes mais baixas e: finalmente aos operários
C) coerção cotidianas que incidem sobre os comportamentos, uso dos costumes agindo positivamente sobre os indivíduos = CORREÇÃO
COERÇÃO gera nexo entre moral e a penalidade
“É aquilo que deve ser como instrumento uma vigilância permanente e fundamental”
“É aquilo que tem por alvo não apenas as infrações, mas a natureza do caráter deles”
p. 103
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Demorei para perceber que estava em um relacionamento abusivo.
Na verdade, até o momento evito denominar dessa forma pelo peso da palavra “abusivo”. Ainda sinto a dor, a humilhação e a raiva.
As pessoas me alertavam com os olhos e eu míope não enxergava, não acreditava que alguém como eu, que pensava ser tão esclarecida, podia me encontrar em uma situação tão desoladora. Talvez esse seja o intuito do abusador.
No início são carinhosos e amorosos e você confunde o ciúme excessivo com amor incondicional. Depois as roupas, telefonemas e redes sociais passam a ser monitoradas e você acredita que isso seja sinônimo do cuidado e zelo que ele tem por você.
Aos poucos você pensa que o fato de ele não gostar da sua relação com terceiros seja o medo de te perder, a ânsia de não ter que dividir o tempo que possuem juntos com outras pessoas.
Chega em um ponto do isolamento social que não sobrou mundo externo para que você possa respirar, sua única opção é conviver com ele, no suplício de não ficar sozinha.
A dependência emocional era a cereja do bolo para que você entre em um círculo vicioso que parece não ter fim. Você não sabe o poço sem fundo em que se encontra, e quando se dá conta acredita que já é tarde demais. A culpa e o medo são os sentimentos que restaram. Parece que não há luz no fim do túnel.
Por fim, quando você está prestes a desistir, existem duas opções, emergir por conta própria, ou então, se estiver sem forças, deve rezar para que alguém ainda lute pela sua sobrevivência, com o afinco que você não teve para sair desse lamento interminável.
Para os que me leem vale um lembrete, “a culpa nunca é da vítima”. Ser vítima não é uma escolha, é uma imposição. Há no mundo seres humanos terríveis, e aqueles que são bons não podem e não devem pagar pelos maus. Seja você a força que falta para ajudar uma vítima de abuso a obter sua redenção.
- Palavras-Sucintas.
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III – A Fé e a Caridade
UM ESPÍRITO PROTETOR - Cracóvia, 1861
13 – Eu vos disse recentemente, meus queridos filhos, que a caridade sem a fé não seria suficiente para manter entre os homens uma ordem social de fazê-los felizes. Devia ter dito que a caridade é impossível sem a fé. Podereis encontrar, é verdade, impulsos generosos entre as pessoas sem religião. Mas essa caridade austera, que só pode ser exercida pela abnegação, pelo sacrifício constante de todo o interesse egoísta, nada a não ser a fé poderá inspirá-la, porque nada além dela nos faz carregar com coragem e perseverança a cruz desta vida.
Sim, meus filhos, é inútil querer o homem, ávido de prazeres, iludir-se quanto ao seu destino terreno, pretendendo que lhe seja permitido ocupar-se apenas da sua felicidade. Certo que Deus nos criou para sermos felizes na eternidade, mas a vida terrena deve servir unicamente para o nosso aperfeiçoamento moral, o qual se conquista mais facilmente com a ajuda do corpo e do mundo material. Sem contar as vicissitudes comuns da vida, a diversidade de vossos gostos, de vossas tendências, de vossas necessidades, são também um meio de vos aperfeiçoardes, exercitando-vos na caridade. Porque somente a custa de concessões e de sacrifícios mútuos, é que podeis manter a harmonia entre elementos tão diversos.
Tendes razão, entretanto, ao afirmar que a felicidade está reservada ao homem neste mundo, se a procurardes antes na prática do bem do que nos prazeres materiais. A história da cristandade nos fala dos mártires que caminhavam com alegria para o suplício. Hoje, na vossa sociedade, para ser cristão já não se precisa enfrentar a fogueira do mártir, nem o sacrifício da vida, mas única e simplesmente o sacrifício do egoísmo, do orgulho e da vaidade. Triunfareis, se a caridade vos inspirar e fordes sustentados pela fé.
Para ver o ÍNDICE:
Para mais "EVANGELHO no LAR"
Livro: O Evangelho Segundo o Espiritismo / Allan Kardec
Capítulo 11 – AMAR O PRÓXIMO COMO A SI MESMO
Tradução: José Herculano Pires
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AMAR O PRÓXIMO COMO A SI MESMO
O Evangelho Segundo O Espiritismo, capitulo XI, item 13.
A fé e a Caridade
13. Disse-vos, não há muito, meus caros filhos, que a caridade, sem a fé, não basta para manter entre os homens uma ordem social capaz de os tornar felizes. Pudera ter dito que a caridade é impossível sem a fé. Na verdade, impulsos generosos se vos depararão, mesmo entre os que nenhuma religião têm; porém, essa caridade austera, que só com abnegação se pratica, com um constante sacrifício de todo interesse egoístico, somente a fé pode inspirá-la, porquanto só ela dá se possa carregar com coragem e perseverança a cruz da vida terrena.
Sim, meus filhos, é inútil que o homem ávido de gozos procure iludir-se sobre o seu destino nesse mundo, pretendendo ser-lhe lícito ocuparse unicamente com a sua felicidade. Sem dúvida, Deus nos criou para sermos felizes na eternidade; entretanto, a vida terrestre tem que servir exclusivamente ao aperfeiçoamento moral, que mais facilmente se adquire com o auxílio dos órgãos físicos e do mundo material. Sem levar em conta as vicissitudes ordinárias da vida, a diversidade dos gostos, dos pendores e das necessidades, é esse também um meio de vos aperfeiçoardes, exercitando-vos na caridade. Com efeito, só a poder de concessões e sacrifícios mútuos podeis conservar a harmonia entre elementos tão diversos.
Tereis, contudo, razão, se afirmardes que a felicidade se acha destinada ao homem nesse mundo, desde que ele a procure, não nos gozos materiais, sim no bem. A história da cristandade fala de mártires que se encaminhavam alegres para o suplício. Hoje, na vossa sociedade, para serdes cristãos, não se vos faz mister nem o holocausto do martírio, nem o sacrifício da vida, mas única e exclusivamente o sacrifício do vosso egoísmo, do vosso orgulho e da vossa vaidade. Triunfareis, se a caridade vos inspirar e vos sustentar a fé. – Espírito protetor. (Cracóvia, 1861.)
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Suplício social.
Estamos no purgatório, pois, convivemos com os juízes. Pode não parecer, mas antes de sermos escravos do dinheiro, do prestígio e da inveja, somos escravos da liberdade.
Sartre, filósofo contemporâneo, tem sob sua autoria esta renomada frase, "O homem está condenado a ser livre". Livre, pois temos o direito a escolher o que fazer e o que não fazer, moldando ao nosso jeito o futuro. Liberto, pois somos responsáveis por tudo o que fazemos.
No entanto, condenados. Sentenciados, pois vivemos em função da visão de outros, tomando ações de formas reticentes. Somos pássaros engaiolados por barras de moderação social, nunca exibimos nosso potencial individual.
Portanto, uma personagem de Sartre, na peça "Entre quatro paredes", dirá "O inferno está nos outros". Não porque os tais nos infernizam, mas sim porque aprenderam a reprimir enquanto eram reprimidos.
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eu que tenho por hábito a capacidade de me jogar de altas janelas, que tenho por mote o suicídio desprendido do escorregar. dissolver.
que tenho por hábito a atração irrefreável das altas janelas.
mergulho no ar, a grandiosa sina de quem escorre. "eu não obedeço porque sou molhada."
quando eu morrer espero que alguém diga que me amou, verdadeiramente, que diga: - ela tinha uma cartografia hídrica, era feita de água e eu a amava por todos os seus defeitos.
de todas as coisas o que permanecerá em mim é lembrança dele falando: - posso chegar perto de você?
"can you touch my body like it's something new?" é com delicadeza que devemos nos aproximar de um corpo, é com uma nova suavidade que se despe roupas e defesas.
o maior presente que você pode dar a outro ser humano é despir-lhe de toda deturpada valoração social para encontrá - lo nu, livre de amarras.
a gente só conhece o amor quando é amado por uma criança, quem já foi amado e tocado por uma criança de dedos desajeitados sabe que com poucas palavras somos capazes de demonstrar muito. quando é que ao aprender-mos muitas palavras a gente perde esse jeito de quem se aproxima sem medo? grandes pequenos mestres na arte da demonstração.
uma criança é o único ser que vai lhe amar na inocência desinteressada da sua companhia, é claro que com o tempo ela irá aprender a usufruir dos benefícios que você lhe dá, ainda assim sua valoração é outra se comparada ao mundo dos adultos.
uma criança quando quer sua companhia quer por você ser quem é.
e nos protegemos desse amor, nós não conseguimos amar como uma criança porque existir com atenção no momento presente é algo ao qual estamos desacostumados. a nossa mente vagueia para miragens de matéria memória do passado e do futuro. temos medo do presente, ficamos ausentes em nossos corpos porque a mente em polvorosa tem preocupações práticas da horrorosa vida capital.
chove lá fora. há riscos e a ambiguidade do mundo continua sendo que a chuva amoral pode aniquilar vidas e também é precisa no crescimento da natureza.
o verde tomará conta de todos os lugares abandonados por você.
de todos os elementos me encanta a primazia de destruição da água. e criação.
a água contorna tudo que rígido, a água disforma e enferruja tudo que é fixo, a água altera: nosso princípio e fim; amo tudo que escorre. agora chove lá fora e caem lágrimas dos meus olhos, dizem que lágrimas de alegria, tristeza ou raiva tem constituições químicas diferentes, não sei qual é o gosto desse choro.
sangue, sêmen, lágrimas, chuva eu amo tudo quanto escorre.
você não segura um peixe na mão por muito tempo, eu amo todos os segundos fugidios. o que sustenta uma relação?
um equilíbrio. o movimento alternado pendular.
ser íntimo com total liberdade para conhecer sendo quem se é
e... ainda assim • mistério
olhar para você e ter a visão de que somos pessoas separadas por memórias, sentidos, pensamentos e sentimentos completamente diferentes.
apesar da confiança e apoio preciso ser maravilhada e tocada pelo que incinera e me pega de surpresa, a tensão entre familiaridade e desconhecimento.
proximidade/estranhamento.
em ordem de saber o que quero sei o que não quero
o que mantém uma relação?
espécie de confiança infantil e vontade de caminhar para a mesma direção.
você tem medo de se comprometer
com o mundo? com a vida?
em ordem de expressar o que quer que seja precisa ser maior que o medo
seu medo
é maior?
que eu
choro e agora me abençoo da cabeça aos pés rezando e pedindo que toda aquela mágoa no peito seja desfeita pela água, seja desfeita a nódoa que impede o sentir de forma mais genuína.
eu me liberto de todos que me feriram, eu peço a calma absoluta para deixá - los ir.
eu não sei para quem rezo, talvez para o desejo imemorial das memórias lunares, é contraditório assim.
é possível que eu reze para estabelecer uma nova linguagem, um fraseado de olhos, mãos e gestos.
foi assim que desejei que todos que tocassem o osso que desponta antes da virilha no começo da minha perna, osso do qual não sei o nome, mas que quis ser beijado como um altar atemporal de todos os suplícios de amor. há que se amar como quem reza uma oração no corpo amado.
escrevo cartas para destinatários desconhecidos. jogo ao vento sibilante a vontade de que todos sejam despidos de suas defesas, deixar dores num canto iluminado do peito guardando a aprendizagem de que toda ferida é curada com água salgada, de que toda cicatriz te constitui corpo.
eu posso chegar perto de você?
você consegue me tocar como se eu fosse algo novo?
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Carta a um amigo que parou no tempo
Meu querido, o tempo passou por cima de nós como passa um uninho de firma com escada. Talvez com raiva e força, mas solícito e motivado: existe um ponto no destino em nos separar, e me separar, principalmente, de tudo o que você representa. E acredite, isso é tão bom quanto pode ser. É feliz demais!
Tem um tempo que eu não escrevo. Você me vê pelas redes sociais. A coisa anda braba, trabalho, mestrado, militância. Na nossa época as preocupações eram menores. A nossa ordem secreta, velas e capas, calçadão, um rolê ou outro, cinco reais e coisas que não chamávamos de 'crush'. Engraçado pensar mas meu momento maior era a filantropia, palavra sagrada, e hoje sei que esse conceito se baseia em areia mole e triste. Ao contrário dos seus, meus sonhos de transformação nunca passaram. Essa carta é um suplício de um poeta silenciado que me força a tornar público tudo que sinto e tudo que vejo e tudo que me interessa, coisa que nos torna, felizmente, tão diferentes.
Ontem você me encontrou pelas ruas de Itapeva. Na verdade esse encontro é cada vez mais casual, e é culpa minha. Eu odeio te encontrar. Tenho feito de tudo para evitar sua presença, porque você me lembra outros tempos e tudo que sai da sua boca é pesadelo. Mas quando você se dignou, novamente, a me dizer o quanto também não me suporta e lamenta o que me tornei e a tristeza e azar que vê em mim, eu finalmente percebi o seu problema e a pena que sinto usualmente se tornou, definitivamente, compaixão ilimitada. Esse uninho-tempo que voa e não deixa rastros talvez não te informe sobre mim. Parte disso é minha culpa, na vitrine que lhe é cabível, as redes e os papos, não costumo contar como anda minha situação.Tive oportunidades raras e minha vontade é de inspirar e não de construir imagem, mas talvez, talvez, eu abra uma exceção.
A filosofia de boteco que chamamos de ordem me abriu os olhos aos 14 anos. A simbologia e a mística foram essenciais, meu papel como responsável por inúmeros projetos sociais, minhas brigas morais e éticas, a sobrevivência social do que representava tudo aquilo - tão distante do debate ideológico como se distancia Itapeva da minha casa no Butantã - fez parte de mim. De uma pequena e passada, idílica e inóspita parte de mim, e me serviu mais para lutar contra e me indicar por onde não pisar do que realmente crescimento. Mas eu cresci, cresci lendo como sempre fiz, cresci crescendo como você devia. A dívida que tenho contigo pela indicação-carta foi paga, graças a Deus, e o anel que você me deu se subverteu em coisas cada vez melhores: não agradeço pelo que você me fez, agradeço pelo que você é. Muito do que sei se baseia no seu contrário - você imagem, tantos outros, vocês. Obrigado por passarem.
Fiz faculdade, duas na verdade, e uma eu larguei. Grupos de estudo, estágios, iniciações científicas, amigos, festas, lugares inacreditáveis no meio do mar, trabalhei.. o ''vermelho'' aqui trabalhou até em empresa júnior e, claro, eu sou muito mais que só um comunista. Hoje existem pessoas que me admiram pela trajetória e pelas palavras - já que me tornei professor. Contraditório, passei por muito e fiz passar. Mudei. Contratado, CLT inclusive, tenho um emprego de verdade. Ao mesmo tempo, entrei no mestrado. Eu pesquiso Crime Organizado e Mercado Imobiliário. Ainda não me acostumei com a alcunha ''Pesquisador''. Muito menos com a 'Palestrante', a 'Colunista/Editor' em jornal online. Não me acostumei com uma série de coisas que faço porque ainda me vejo honesto simbólico pequeno e sendo eu mesmo um minúsculo eu. Aprendi que a humildade devia ser meu guia porque eu não queria me tornar alguém como você. Mas os dez minutos que conversamos me fez tão mal, me rasgou tanto as têmporas, voltei tantos anos e tantas vidas, que essa carta é uma resposta necessária. Você precisa saber a verdade.
Normalmente eu deixaria garganta a baixo e dedos acima esse sentimento. Sapo engolido como tantas noites. Tantas noites ouvi de você e de outros, tantas noites sem resposta eu engulo o silêncio e tenho deixado ser humilhado e tenho deixado falarem por dó e respeito pelo zero pelo nada pelo indiscutível. Normalmente. Mas no terreiro eu fui intimado em menos de cinco minutos: pare, pare de se preocupar. Pare de abaixar a cabeça. Você está certo. Livre e certo. Livre e certo, então, estou. E também
muito bem e feliz. Quando seus olhos de dó sobre a vida me lembram dos amigos que perdi, de quando rompi, são tão inocentes e chorosos que eu ri da sua desgraça porque você, ainda de vendas como numa iniciação passada, não enxerga nenhum palmo adiante. Mesmo com tanto sofrimento. Mesmo com tanto azar. Mesmo depois da sua violência gratuita irresponsável irremediável sem desculpa sem razão.. Você não enxerga nada.
Mais uma vez, obrigado por passar: eu sinto a mágoa perto da bolha que representa a sua vida, mas eu quero que você saiba, fui eu quem furei. Essa mágoa é súplica de atenção e ao inverso, não, eu não vou senti-la em conjunto. Eu escapei. Eu saí disso e hoje infinito amigos passado futuro possibilidade tudo, tudo, tudo além. Tudo de possível. E para ajudar, eu durmo melhor do que você - o sonho justo. Vejo suas olheiras. É claro, o que mais motivaria alguém a falar tudo que você me disse?
Viva sua vida tranquilo o quanto puder. Não preciso, nem eu nem os meus, de sua preocupação ou pensamento.
Daí do fundo, daí do que já foi, parece tão frio. Espero que um dia você saia.
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Já imaginou que, muitas vezes, nós carregamos nosso próprio suplício?
Recentemente, tenho feito muitas reflexões cristãs e não poderia ser diferente, dada a minha formação e criação, embora já tenha tido acesso à diversas culturas, religiões e filosofias.
Hoje, como em qualquer outro dia fui confrontado com uma esdrúxula situação e ao invés de respirar profundamente e me lembrar que nem todo mundo está pronto para verdade, que o silêncio é o melhor remédio, acabei explodindo e reagindo a um ser frágil cujo recurso, ao não possuí-los, busca como boa parte dos seres, é arregimentar, "cancelar" alguém pra se sentir validado.
Ao me deparar com as consequências da minha rebeldia, inicialmente, fiquei ainda mais revoltado, mas depois eu lembrei que antes de ser Crucificado, acreditamos nós, cristãos, que Jesus foi flagelado, foi coroado com espinhos crucificado, açoitado, desnudo, humilhado e ainda teve que carregar em seus ombros e com suas forças, o próprio suplício, que foi a Cruz.
Então, pensei em quantas vezes nós não carregamos nossa própria razão de sofrimento? Quantas vezes nós mesmos não nos inflingimos dores? Quantas vezes nós mesmos não as criamos no trabalho, no relacionamento, na vida doméstica e até na social?
Na bíblia o caminho apontado por Jesus foi o silêncio e o amor para aceitar todo esse sacrifício como parte de algo maior. No budismo, a lição é que nós devemos assumir nossa responsabilidade na falta de comunicação e na reação como causa. E no espiritismo, isso é simplesmente um suplício que devemos suportar para avançarmos no estágio de evolução espiritual.
Vejam que em todos os lugares, o mais importante não é focar no sujeito que provocou a reação, mas em nós, no porquê reagimos instintivamente para agravar a situação e não mostramos, nesses momentos, quão evoluído somos ou estamos, a ponto de não nos afetarmos, pois no fundo não nos afetamos mesmo.
Apenas respondemos como forma de mantermos uma suposta pose de superioridade, que se diga nem ser necessária, porque "per si" ignorar e segurar a reação já é a maior demonstração de como ela não nos afetou, nem afetará de jeito maneira.
Resumo da ópera: o modo como reagimos mostra mais de nós que do outro, de quem não deveríamos esperar nada, inclusive empatia para reagirmos à altura, pois para isso precisaríamos nos curvar e descer ao seu mundo instintivo e inseguro de lhe dá com a vida.
Ouvindo agora, isso pode soar soberbo, mas se analisarmos Jesus, Buda, Maomé, Chico Xavier ignorar a atitude egoísta do outro era forma de carinho e catequese, porque mostrava exatamente quanto estavámos distantes em termos de evolução uns dos outros.
Isso também é válido num relacionamento. Ciúmes, grosseria, apego, não são demonstrações de amor, são demonstrações de egoísmo. Companheirismo, compreensão, empatia, parceria e paciência sim, são sinais de amor.
Sejamos a evolução que queremos ver no mundo!
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Sete dias sem Elza
FALECEU, NO ÚLTIMO DIA 20, UMA DAS 100 MAIORES VOZES DA MÚSICA BRASILEIRA. ELEITA PELA BBC LONDRES A “CANTORA BRASILEIRA DO MILÊNIO”, ELZA SOARES NOS DEIXOU AOS 91 ANOS.
Por Giulia Marques e Hellica Miranda
Início de carreira
Créditos de imagem: Arquivo Agência O Globo
Elza Gomes da Conceição nasceu em 1930, na antiga Favela da Moça Bonita, no Rio de Janeiro. Filha de família grande e humilde, dividia seu tempo de menina entre brincar na rua — soltar pipa, piões — e ajudar a mãe nas tarefas domésticas.
Desde pequena já sonhava com uma carreira na música, e exercia seu talento compondo e cantando as próprias canções desde cedo.
Viúva e mãe de quatro filhos aos 23 anos, Elza não desistiu de seu sonho, mesmo com todas as dificuldades que enfrentava. Incentivada pelos elogios de familiares e amigos, inscreveu-se no concurso “Calouros em Desfile”, onde foi ridicularizada pelo músico Ary Barroso devido ao seu visual: ela usava um vestido da mãe, muito maior que seu manequim, ajustado com alfinetes, e o cabelo em um penteado estilo maria-chiquinha. Ary perguntou a ela “De que planeta você veio, minha filha?“, e recebeu de Elza apenas mais uma das respostas certeiras da cantora: “Do mesmo planeta que o senhor, seu Ary. Do planeta fome”.
Em sua apresentação, cantou ‘Lama’, de Paulo Marques e Aylce Chaves, entoando os versos marcantes da canção.
(…)
Se o meu passado foi lama Hoje quem me difama Viveu na lama também Comendo da minha comida Bebendo a mesma bebida Respirando o mesmo ar E hoje, por ciúme ou por despeito Achar-se com o direito de querer me humilhar Quem foste tu? Quem és tu? Não és nada! Se na vida fui errada, Tu foste errado também Não compreendeste o sacrifício Sorriste do meu suplício Me trocando por alguém Se eu errei, se pequei, Não importa! Se a teus olhos estou morta, Pra mim, morreste também!
Pouco depois, a cantora conseguiu uma vaga em um conjunto musical, com quem se apresentava em eventos, bailes e festas. Menos naqueles que não aceitavam cantoras negras.
Mas foi no ano de 1960 que a estrela de Elza começou a brilhar mais forte. Depois de ganhar um concurso musical, apresentou-se na televisão e começou uma turnê pela América do Sul, América do Norte e Europa. Ainda assim, Elza acabou sem dinheiro devido a um golpe de um empresário, ficando na Argentina por muito mais tempo que o esperado, com o objetivo de juntar dinheiro suficiente para voltar ao Rio de Janeiro.
Vida pessoal
Em seu primeiro casamento, ainda que as várias fontes discordem da idade correta (12 ou 13 anos), o marido era um velho amigo de seu pai, e tinha tentado abusar da menina, que foi obrigada pelo pai a se casar para “limpar sua honra”.
O marido, Lourdes Antônio Soares, o Alaordes, constantemente agredia Elza, física e sexualmente, e foram anos difíceis no matrimônio que deu a ela o sobrenome que usou artisticamente.
Em 1962, conheceu o jogador de futebol Garrincha, que era casado, e exigiu que ele a assumisse para que ficassem juntos. O romance entra Elza e Garrincha foi mal visto pelo público, que passou a persegui-los, atirar pedras em sua casa e constantemente ameaçá-los.
Créditos de imagem: Getty Images
Em 1964, a casa onde viviam foi invadida pelo DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), que rendeu os moradores, revirou toda a casa e matou o pássaro de estimação de Garrincha. Até hoje a motivação do crime é desconhecida, mas especula-se que tenha sido causada pela amizade entre Elza e Juscelino Kubitschek, ou à reunião de Elza a outros artistas em uma música a favor de João Goulart.
Elza separou-se de Garrincha após 16 anos de união, entre outros motivos, por causa alcoolismo do marido, de suas constantes agressões, humilhações e traições.
Elza teve oito filhos. Os dois primeiros, ambos meninos, não chegaram a ser registrados, e morreram pouco depois do nascimento, de desnutrição. Em seguida, deu à luz João Carlos. Seu quarto filho, Gerson, foi entregue para adoção por não ter condições de cuidar dele. O quinto, Gilson, faleceu aos 59 anos, em 2015, e a sexta, Dilma, foi sequestrada com apenas um ano de idade, em 1950, e encontrada apenas 30 anos depois. Depois de Dilma, deu à luz Sara, e a Manoel Francisco, apelidado de “Garrinchinha”, em homenagem ao pai.
O caçula faleceu em um acidente de carro aos 9 anos de idade, deixando a cantora em depressão. Elza chegou a tentar suicídio, e precisou fazer tratamento psiquiátrico, que abandonou e saiu em viagem pelo mundo com sua carreira, até voltar ao Brasil, 4 anos depois. Sobre isso, a cantora declarou mais tarde: “A única coisa do passado que ainda me machuca é a perda dos meus quatro filhos. O resto tiro de letra. Mas filho é uma ferida aberta que não cicatriza. Estará sempre presente!“
Legado
Créditos de imagem: Bob Wolfenson/ Revista Ela
Ao longo de sua vida, Elza lançou 34 discos, com misturas de samba, jazz, eletrônica, hip hop e funk. Foi eleita pela Rolling Stone Brasil “uma das 100 maiores vozes da música brasileira”, ficando em 16º lugar. Foi, também, eleita “voz do milênio”.
Teve uma vida cheia de luta, emocionando não só com sua voz, mas com sua força e determinação.
Venceu, em 2015, o Troféu APCA, da Associação Paulista de Críticos Teatrais, por seu álbum “A Mulher do Fim do Mundo”, consagrado como melhor álbum, que também conquistou o Prêmio da Música Brasileira, em 2016. No mesmo ano, venceu como Canção do Ano pela música “Maria da Vila Matilde”, e ganhou o Grammy Latino também por “A Mulher do Fim do Mundo”, considerado Melhor Álbum de Música Popular Brasileira.
Foi homenageada diversas vezes, uma delas como enredo da Unidos do Cabuçu, no carnaval de 2012. Foi homenageada no carnaval seguinte pela escola Bola Preta de Sobradinho, do Distrito Federal e, em 2020, foi enredo da Mocidade Independente de Padre Miguel, que ficou em terceiro lugar. Foi também homenageada pelo Troféu Raça Negra, em 2016, e no WME Awards (Women’s Music Events Awards), em 2019.
Elza faleceu de causas naturais, em casa, aos 91 anos de idade. No dia, a cantora teria confidenciado aos familiares “Eu acho que vou morrer“. Seu médico pessoal foi chamado e enviou uma ambulância, mas ela já havia partido.
Na conta de sua instituição no Instagram, a cantora Beyoncé lamentou a morte de Elza “Descanse em paz, Elza Soares. Sua música será eternizada e irá inspirar o Brasil e o mundo. Somos gratos!“. Diversos artistas brasileiros também postaram mensagens de luto, como a cantora Ivete Sangalo, que declarou que Elza era “uma mulher que jamais deixará de existir“. A atriz Taís Araujo escreveu: “Eu honro Elza Soares. Honro a mulher, a artista, a cidadã, a amiga. Ela é foda! Sempre foi e sempre será! Dura na queda, nos ensinou a levantar a cabeça a cada tombo e depois seguir. Nos ensinou que é a gente quem leva a vida, que o comando é nosso e quando a gente perde o rumo, cabe a nós mesmos encontrar o caminho de volta. Perdi uma ídola e ganhei uma ancestral forte, firme, uma luz. Alterno lágrimas com risos, lembrando das histórias e me pego pensando no legado deixado por Elza: cabeça erguida e passos firmes”.
Que a nova leva de artistas brasileiras se inspire nesta grande artista, que foi e sempre será marcada na história. Nós nos despedimos de uma das maiores representantes do que há de mais moderno na arte brasileira. Nossos mais sinceros sentimentos à família, aos amigos e aos grandes fãs de Elza.
Créditos de imagem: Instagram @elzasoares
Originalmente veiculado em Click Ceunsp.
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Pobre de direita ódio ignorância mídia desonesta Mailson Ramos* Dos mesmos autores de ‘Bolsa Família é esmola’, ‘política de cotas é privilégio para os negros’ e ‘pobre em aeroporto é um absurdo’, vem aí o novo ideário da direita brasileira: o pobre que não gosta de pobre. No espectro político, ele está no penúltimo degrau da escada social, submetido aos trabalhos pesados, mas vive ainda dos usufrutos do estado de bem estar social, promovido pelos últimos governos. O pobre de direita é contra as cotas raciais nas universidades públicas. Subentende que pobre e negro deve pagar os seus estudos, pois, ao aderir a uma política de concessão do estado, estaria contribuindo com a discriminação. Ele, pobre e negro, não consegue compreender a condição de excluído da sociedade, a histórica subserviência da classe, a escravidão dos seus antepassados que durou 300 anos e foi a última a acabar no mundo. O pobre de direita não compreende o que é política de direita ou de esquerda. Conceituado assim porque adere a pensamentos conservadores e neoliberais (que ele também não compreende), este cidadão absorve das premissas do contexto político um lugar que é seu por osmose. Muitas vezes submete-se a um contexto familiar, a uma conjuntura no espaço de trabalho, a qualquer motivo que não seja a capacidade ideológica, racional e consciente de decidir e de militar. O pobre de direita é contrário às políticas sociais. Possivelmente passou fome ou viu alguns dos seus passar; ou atravessou um mar de necessidade, nos tempos em que o governo estendia a mão e junto o cabresto. Viu crianças morrerem desnutridas e outras nascerem mortas. Viu o suplício do nordestino com a seca e a morte dos seus rebanhos. Viu o retirante partir para as grandes cidades, molambento, para se humilhar nas portas das fábricas. ‘Bolsa Família é esmola’ virou mantra fundamental. Para além das ideias conservadoras, era mais importante congelar investimentos em Saúde e Educação durante 20 anos, do que reajustar um auxílio social. Era preciso cortar. Porque pobre tem que trabalhar. Pobre tem que morrer trabalhando. Sem direito a aposentadoria e sem o direito a um trabalho digno. Isso é conversa de comunista. (em Brazil) https://www.instagram.com/p/CTiqfg2rypl/?utm_medium=tumblr
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Mulheres
Eram irmãs. Dez e oito anos, quando tudo começou. O padrasto as tocava e abusava de todo jeito. A mãe, na enfermagem noturna. Silêncio. Ameaças de dar fim a mãe. Três anos de suplícios. Então, numa noite, embebedaram o homem. E lhe cortaram os pulsos. A mãe o encontrou quando chegou. Na lei, foi suicídio. A mais velha conseguiu fazer Direito. A outra serviço social. Juntas, criaram ONG de auxílio às vítimas de abuso sexual.
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Monteiro Lobato: alma de boxeador
Ninguém descreve a trajetória do sol sobre a paisagem brasileira como ele. O amanhecer é a promessa do país ainda virgem da devassidão europeia, que tem uma chance na esperança de ser um lugar agradável de viver, onde poderia imperar a harmonia e o equilíbrio entre as pessoas. Mas quando o dia avança e a bigorna do sol acaba tisnando a paisagem, eis que se revela o país insuportável, onde medra o fogo e o crime ecológico.
Os originais do livro de estreia do polemista Monteiro Lobato, “Urupês”, uma coletânea de textos analisados neste ensaio, dormiu algumas noites, esquecidos, na garçonière usada pelos modernistas liderados por Oswald de Andrade, em São Paulo. Foi em 1917, muitos anos antes da semana de 22. Depois foram devolvidos ao autor, que conseguiu definir um papel transgressor nesta obra que mudou a literatura brasileira por vários motivos, especialmente por um: o de ter inventado o povo no genial perfil do Jeca Tatu, personagem vítima do latifúndio e do colonialismo que foi apropriado pela cultura brasileira como um vetor de visibilidade e insurgência.
O modernismo é um movimento amplo, que extrapola a Semana e o enfoque paulistano (da capital). Nasceu do inconformismo do talento diante da mesmice da cultura, que estava amarrada a velhos esquemas agrários, culturais, políticos. É pioneiro mais no Rio de Janeiro do que em outros lugares, e não se circunscreve apenas à literatura, mas à caricatura, ao panfletarismo, ao deboche e à denúncia pura e simples. Vejo Monteiro Lobato como um dos primeiros modernistas e sua importância revolucionária foi reconhecida mais tarde pelo próprio Oswald de Andrade, quando se reconciliou com ele depois de anos de rusgas e ressentimentos.
Mas Lobato era turrão e inconformado demais, e além disso, vivia no interior, para fazer parte de um movimento de inspiração europeia. Lobato bebia em fontes abundantes da literatura universal e aferrava-se à narrativa coesa, eficiente e encantadora, inspirada pelo mato que o cercava. Kipling e Maupassant são suas referências em “Urupês”, livro pioneiro desse modernismo do fundão, uma obra generosa em neologismos e soluções narrativas radicais (onde uma onomatopeia, como bééé, tem a força de muitos parágrafos). Nessa sua radicalidade, a abordagem que faz da natureza, como parte da estrutura social, é única.
Ninguém descreve a trajetória do sol sobre a paisagem brasileira como ele. O amanhecer é a promessa do país ainda virgem da devassidão europeia, que tem uma chance na esperança de ser um lugar agradável de viver, onde poderia imperar a harmonia e o equilíbrio entre as pessoas. Mas quando o dia avança e a bigorna do sol acaba tisnando a paisagem, eis que se revela o país insuportável, onde medra o fogo e o crime ecológico. É na devastação da natureza, reflexo do mau uso da terra, que confina os homens nos ermos sem cidadania e deixa impune a elite cruel e exploradora, que o Brasil mostra a cara. Mas ainda é cedo para demonstrar todo o horror que a paisagem inspira. Quando chega o entardecer, com ele chega a tristeza, o banzo, o desespero da solidão na natureza entregue ao sabor da maldade humana.
A noite então vem com seus fantasmas e assassinatos, como no conto inicial “Os faroleiros”, em que dois sujeitos diante do breu compartilham uma história de terror ocorrida num farol perdido no meio do mar. Apenas duas pessoas moravam no farol e isso bastava para haver o conflito, o ódio mútuo, a desconfiança e por fim a violência. Não há como insurgir-se contra o império natural da sociedade de classes, dividida no país que poderia ser um paraíso. No conto “Bocatorta”, a feiura de quem vive entocado, expulso da comunidade, no meio de uma clareira imunda, revela um Quasímodo brasileiro, encarnando todos os preconceitos existentes contra a humanidade que veio habitar a nação. E na história em que dois vizinhos se atracam devido às diferenças de personalidade e interesses, não há como melhorar a produção que acaba sendo devorada pelas pragas. Em outro conto, um filho adotado imita o mata-pau, destruindo a família que o recebeu.
O resultado dessa fatalidade da natureza, como reflexo da incompetência humana de se resolver em sociedade, é o estigma de nascença, rastro de um assassinato gerado pelo ciúme. O pessimismo das histórias nada tem a ver com o romantismo velho de guerra. É pura ponte entre a natureza destruída e a sociedade descosturada, ambas territórios de frustração e miséria. Foi essa lucidez e essa radicalidade que jogaram Monteiro Lobato para o alto no cenário das letras nacionais. “Urupês” vendeu como pãozinho quente. Todos queriam enxergar o país oculto na ramagem, todos queriam ter acesso à verdade que se escondia sob toneladas de papel e fingimento.
O extirpador de carrapatos
“Urupês”, de José Renato (mais tarde, Bento) Monteiro Lobato, é uma sementeira farta de criação e nacionalidade. Com 14 textos entre contos, crônicas e ensaios, o livro é um primor de construção literária (o boxeador Lobato não perde uma só frase, nenhuma letra é colocada em vão). Por que levei tanto tempo para ler essa obra que praticamente fundou a indústria editorial no Brasil, pois seu sucesso viabilizou a empresa do autor numa época em que os livros eram impressos na Europa? Sei lá. Só sei que fiquei energizado de novo com o texto lobatiano, como acontecia quando eu mergulhava, anos a fio, no “Sítio do Pica-Pau Amarelo”.
É o meu escritor favorito. Pelo que faz com a palavra, parece que o vemos contando histórias. Enxergamos claramente o conteúdo de sua narrativa, inventiva até o osso e brutal, de uma brutalidade lúcida e humana que nos faz falta como nunca. E que se presta, exatamente pela sua força, a vários equívocos.
O grande feito de Lobato nesse livro foi denunciar o esquema que domina o país por meio da política e da posse e mau uso da terra. A malandragem, a mentira, a crueldade das pessoas poderosas escorrem como fel das páginas destas narrativas. A chamada elite (o grupo privilegiado que se beneficia de toda essa bandalheira) impera na nação roubada, vilipendiada e por isso mesmo, condenada ao atraso.
Mas Lobato sabia de tudo. Não iria fazer uma denúncia pão-pão, queijo-queijo. Ele simplesmente vira o binóculo ao contrário e seduz o leitor (os brasileiros vítimas desse sistema de exclusão e que estão em todas as classes sociais, especialmente a classe média, que comprava seus livros) criando a representação da ponta do varejo da exclusão. Sua definição do caboclo, que não deita raízes sobre a terra latifundiada, e é tocado de um ermo para outro, é o poder escancarado dos coronéis do mando e do garrote.
Ao inventar o Jeca Tatu, Lobato decifrou a unha encravado da vida comunitária no Brasil. A partir do Jeca, toda uma linhagem cultural se formou, de Mazzaroppi à música sertaneja. O que ele denuncia como ausência de arte no caboclo acabou se transformando em arte popular genuína, pois o povo entendeu o recado e assenhorou-se do retrato para tornar-se visível na nação cega.
Apesar de um recado tão explícito, o trabalho de Lobato costuma gerar calúnias sobre ele. Pode-se imaginá-lo preconceituoso em relação ao povo e a suas artes. Pode-se tachá-lo de elitista bruto ao comparar o caboclo a uma praga silvestre. Mas seria pobreza mental em demasia não ver exatamente nisso que parece ser preconceito ou racismo, o toque genial de sua personalidade literária. A terra roubada nos cartórios e na política serve só de enfeite para o enriquecimento, pois este vem do compadrio, das propinas e dos golpes. Ao descrever a fazenda do ex-colega da faculdade que enriqueceu com o casamento, Lobato explica: “Fausto era fazendeiro amador. Tudo ali demonstrava longo dispêndio de dinheiro sem a preocupação da renda proporcional; trazia-o no pé de quem não precisava da propriedade para viver”.
No clássico “O Comprador de Fazendas” (transformado em filme), a terra dá prejuízo e apenas engambelando os possíveis compradores será possível tirar o pé da jaca. Em “Um Suplício Moderno”, ele diz textualmente: “É honra penetrar na falange gorda dos carrapatos orçamentívoros que pacientemente devoram o país”. Um país das Arábias segundo sua definição, em que medram o analfabetismo e o aliadismo e a falsa literatura (“o romance traduzido de Jaime Ohnet”).
Ao longo de todo o livro, o leitor tem a chance de gargalhar com as tiradas de Lobato, criador de vários neologismos como olhodaruável (situação dos que têm chances, depois de uma eleição, de ir para o olho da rua). Nem se trata de ironia, esse biscoito fino de massas sedosas. É escracho mesmo, é galhofa, é coragem de dizer com todas as letras o que vai pela nação embasbacada. Foi por essa contundência que Lobato fez sucesso e se destacou como a grande personalidade da primeira metade do século vinte. Uma obra que causa polêmica ainda hoje, pois os inimigos de Lobato continuam por toda a parte: os burros titulados, os medíocres cruéis, os carreiristas. E as vítimas apontadas por ele continuam na boca das elites imbecis, ainda convencidas de que o povo excluído é igual ao caboclo descrito por Lobato há mais de cem anos. Esqueceram da profecia de Antônio das Mortes, o matador de cangaceiro (o caboclo nordestino que se insurgiu) em “Deus e o Diabo”: “Ainda vai haver uma guerra grande nesse sertão”. Depois não digam que Monteiro Lobato não avisou.
Monteiro Lobato: alma de boxeador Publicado primeiro em https://www.revistabula.com
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"Vincent Willem van Gogh foi um pintor pós-impressionista neerlandês do século XIX. Apesar de sofrer de ansiedade e ter crises de desequilíbrio mental, suas obras influenciaram variadas frentes da arte de seu tempo e, sua póstuma fama cresceu especialmente após a exibição das suas telas em Paris, em março de 1901, tornando-se assim, um dos mais importantes artistas da história. No entanto, o que poucos sabem é que durante os últimos anos de sua vida, Van Gogh costumava ingerir tinta amarela porque julgava que tal atitude muniria-o de felicidade.
Com exceção de seu irmão Theo, todas as pessoas o achavam orate e néscio por fazer isso. Afinal, a tinta era tóxica e de que jeito comê-la teria conexão com a felicidade? Mas eu não penso dessa forma. Rumino que desde o exórdio, da aurora da humanidade (e está já agregada ao seu entendimento como ser social), as pessoas vivem de excessos. Excesso de ego, excesso de vaidade, excesso de inveja, excesso de se importar com a vida alheia, excessos, excessos, excessos. Porém, concebi que em meio a tanta demasia, há uma coisa precípua em carestia: a coragem. Pensemos: por que quando estamos infelizes, as ideias mais insanas começam a fazer sentido? O que te leva a pensar que pintar seus órgãos internos de amarelo irá diminuir seu suplício e a sua angústia existencial? Não é muito diferente de se apaixonar ou usar drogas. Existe um grande risco de ter seu coração partido ou ter uma overdose, mas as pessoas ainda continuam o fazendo todos os dias porque sempre há uma chance das coisas melhorarem. Parece que fugir da realidade ao invés de levantar a cabeça e ser resiliente, é mais fácil. E realmente é. Quem disse que enfrentar obstáculos é algo simples, banal? Todos temos a nossa tinta amarela, nossa válvula de escape para uma versão mais conveniente da vida. E isso se dá porque o ser humano é falho. Mas não é por isso que não se deve buscar aprimorar-se a cada dia. Olhar para aquele reflexo no espelho e dizer “hoje eu vou fazer um dia melhor do que ontem”, e realmente se esforçar para que isso aconteça. Ter coragem pra enfrentar o passado e virar aquelas páginas empoeiradas. Pra viver o presente sem se arrepender da poeira que demorou para ser limpa. E para traçar o futuro a partir das manchas que se obteve com essa organização.
A vida é uma linha tênue entre o acaso e a desventura. Cabe a nós amarelar as agruras que resultam deste cônsono conjunto. Fazer de cada entrave, uma nova chance." - Marina
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Árvore e floresta
O Natal é uma armadilha. Como estudo antropológico, naturalmente. Algo tão dentro de nós, pertencentes à sociedade cristã ocidental e, neste contexto particular, membros da comunidade portuguesa, o olhar torna-se cego pela proximidade. O grande desafio é conseguirmos ter o olhar distanciado para analisar uma manifestação onde religião, cultura e modernidade se interligam tão fortemente, e são constitutivos das nossas identidades plurais (1). E por causa da modernidade, muitos fogem pelo esmagamento que provoca, independentemente de reconhecer a relevância e história do Natal. É um assunto com tanta matéria para desbravar que a entrega de presentes pelo Pai Natal parece um trabalho menos hercúleo.
"(...) é mais fácil e ao mesmo tempo mais difícil estudar factos que se desenrolam sob nossos olhos, tendo como palco nossa própria sociedade. Mais fácil, porque a continuidade da experiência está salvaguardada, com todos os seus momentos e cada uma de suas nuances; e também mais difícil, porque são nessas raríssimas ocasiões que percebemos a extrema complexidade das transformações sociais, mesmo as mais tênues; e porque as razões aparentes que atribuímos aos acontecimentos nos quais somos atores são muito diferentes das causas reais que neles nos determinam algum papel.” — LÉVI-STRAUSS, Claude O Suplício do Papai Noel, p.14
Tempo, modo e transformação. Há mais de dois mil anos, o nascimento de Emanuel, o Jesus que todos conhecemos tornar-se-ia o Cristo que mudou a história do mundo; as origens e adaptações religiosas deste nascimento; as celebrações do advento, desde o rito à culinária; a simbologia e a fé; as transformações, pagãs e comerciais; a crença e a normalidade. E a lista poderia continuar. Já muito se escreveu sobre cada uma destas características do Natal, e tanto (e tão bem) está exposto no “Suplício do Pai Natal”, de Lévi-Strauss. Sondei a questão do nascimento e do renascimento (Ano Novo), mas enveredar por este exercício necessitaria de mais tempo, e seguramente mais conhecimento, para desenvolver um trabalho correcto.
Mas há que saber ler a árvore e entender a floresta. Na procura exaustiva de tema, encontrei na simbologia uma janela com vista curiosa.
(1) Não somos uma “coisa” só. Definimo-mos com tantos conceitos que um não funciona sem o outro. Homem, filho, pai, benfiquista, cristão, europeu, são apenas alguns elementos que identificam e, podendo nalguns casos isolar-se em determinado contexto, todos têm influência no modo e ideia do que somos.
ÁRVORE E FLORESTA Simbologia e conhecimento Como um ornamento de Natal de origem pagã foi incorporado na cultura cristã
RESUMO Árvore é vida, sim. Mas um pinheiro como símbolo de um evento ocorrido no Médio Oriente? As origens pagãs e “apropriação” cristã. A evolução da simbologia e da tradição. O conhecimento do simbólico até à ignorância por ser tradição. Experiência familiar.
PALAVRAS-CHAVE Árvore de Natal, Natal, simbologia, crença, paganismo, magia, tradição, história, marketing, cultura, ignorância, transformação, família
PARTE I
Florestas de símbolos O mundo está coberto de representações físicas, visuais e literárias de ideias e linguagem. Estão presentes na história e na cultura de povos antigos e actuais. São fruto da imaginação e da necessidade de comunicar. Criatividade e comunicação são irmãs gémeas da inventividade humana. Símbolos, signos e significados revelam mensagens específicas ou metafóricas, são caixas de segredos ou rostos de comportamento. A expressividade é espantosa pois temos um legado imenso de explicações do universo até o design-thinking criador de sinais de trânsito. Ou seja, “é dizer muito pouco que vivemos num mundo de símbolos, um mundo de símbolos vive em nós” (2). Em tantos momentos ou circunstâncias há uma mensagem, qualquer que seja a linguagem haverá sempre um receptor.
A ascensão vertiginosa do design e da publicidade após a Segunda Guerra Mundial, criou novos métodos de comunicação e uma presença cada vez mais constante no nosso tempo. Estamos sucumbidos ao branding, no seu conceito mais lato, bem para lá da sua génese que era a simples iconografia. A mensagem foi trabalhada, tendo a oralidade e a escrita ganho outros contornos que transformaram a semiologia da comunicação. Um dos maiores motores de criatividade e produção de riqueza das sociedades industrializadas é o Natal. Modificou a preparação, criou uma antecipação próxima da ansiedade e alterações/adaptações no modo de celebração (nomeadamente nas iluminações de rua e, qualquer marca ou produto está “inundado” de tema natalício). Mas, não querendo entrar na crítica ao mercantilismo do Natal, mantendo-se como um evento social importante, é notório que a simbologia religiosa diminuiu. Do mistério do Natal passámos à magia do Natal. Dois conceitos bem diferentes, duas simbologias para a mesma efeméride.
Mergulhando em alguns livros sobre simbologia, a natação entre conceitos e observações brilhantes deixou-me muitas vezes sem ar. No fim de contas, não sou anfíbio. A necessidade de regressar à tona para respirar apenas me conduziu a mais leitura e igualmente mais assombro face à magnitude do tema. "Não será o símbolo o factor de socialização ou de endoculturação mais importante da vida dos homens?”, pergunta Mesquitela Lima (3). Muita da pesquisa e recolha de informação veio confirmá-lo. E uma quase urgência de entender melhor, saber mais. Talvez uma plataforma de salto interessante para esta piscina é a expressão artística de 1880-90s, que ficou conhecida como Simbolismo. Longe de serem os primeiros na história de arte (mas talvez, os últimos), pintores, músicos e escritores orientaram a sua criatividade com o uso de signos para uma nova percepção e valorização da nossa realidade interior. Os pintores Gauguin, Munch e os Pré-Rafaelitas e, os escritores Baudelaire e Verlaine, talvez sejam hoje os mais mediáticos intérpretes dos símbolos e dos significados. Lendo o antropólogo francês Dan Sperber (4), fico com uma noção que simbolismo e interpretação são alvo de animada discussão.
(2) in Dicionário dos Símbolos, p.9 (3) in Antropologia do Simbólico, p.54 (4) "(...) symbolic interpretation is not a matter of decoding, but an improvisation that rests on an implicit knowledge and obeys unconscious rules.” do Prefácio, página xi da edição inglesa do livro Rethinking symbolism
Quo vadis? Embrulhado na temática do Natal, desdobrando perguntas para outras questões pertinentes, descubro que the devil is in the detail. Perdoe-me a introdução do belzebu, mas até o sujeito desta frase se alterou a certa altura de Deus para Diabo. A imaginação é inesgotável e as transformações são intermináveis. Qual, então, o caminho a tomar?
Formulei um conjunto de questões (no fim desta Parte I) que enderecei a 54 amigos, via e-mail, e obtive respostas de 14 deles. Curiosamente 7 homens e 7 mulheres. Idades entre 21 e 55. Solteiros, casados, divorciados. Com e sem filhos. Ocupação desde universidade, medicina, criatividade e serviços.
As respostas revelaram dois aspectos fundamentais. A primeira: esta época, de origem e fundamento religioso, é hoje vivido apenas como congregação de família. Segundo, que existe um desconhecimento do significado dos símbolos do Natal, em concreto da árvore.
A árvore (des)conhecida Segundo o Dicionário dos Símbolos, a árvore “é um dos temas simbólicos mais ricos e mais difundidos, e só a sua bibliografia daria para fazer um livro” (p.88). Em qualquer ponto do mundo representa sempre uma ideia de cosmos e vida, e especificamente para o Natal, é um símbolo forte mas cuja origem tem pouco de cristão.
O verde das árvores inverno dentro possuía uma enorme conotação de vida, e as festividades do Solstício personificavam a renovação e o regresso próximo do Sol, dos dias quentes e das novas colheitas. Embelezar as casas com galhos reforçava todos estes desejos de um bom futuro. Muitos séculos se passaram e lentas transformações ocorreram até chegarmos à cristianização de uma tradição de vários povos pagãos da Europa central, nomeadamente no séc. XVI na actual Alemanha. De Árvore do Paraíso (honrando Adão e Eva a 24) até árvore de redenção pela vinda do Salvador, o caminho não deverá ter sido muito complicado uma vez que fé e devoção estavam diariamente presentes. Trazer pinheiros para o calor das casas e embelezá-las com velas, a representação da luz da vida, é outro elemento simbólico fundamental que podemos reconhecemos em celebrações luminosas de outras religiões em data similar, como o judaico Hanukkah ou mais distante indiano Diwali. O costume virou tradição mas a árvore de Natal nos territórios anglófonos (Grã-Bretanha e futuras colónias norte-americanas) eram entendidas pelas congregações cristãs mais puritanas como símbolo de paganismo, havendo diversos episódios de repúdio e punição.
O pinheiro tal como hoje o conhecemos apenas no séc. XIX iniciaria a sua marcha para o sucesso com relevância central na celebração do Advento. Curiosamente, na corte inglesa. Se Catarina de Bragança, rainha emigrante introduziu o hábito do consumo de chá no reinado de Charles II, seria outro royal igualmente emigrante que levaria a tradição do pinheiro de Natal para Londres. O Príncipe-Consorte Albert, alemão, marido da poderosa Rainha Victoria, inseriu na cultura britânica o que na sua terra de origem era comum há alguns séculos. A publicação no Illustrated London News, em Dezembro de 1848, de uma ilustração da rainha e a sua família à volta de uma árvore de Natal, influenciaria para sempre a moda a seguir pelos seus súbditos. Antes do final do século, o sucesso de uma velha tradição medieval agora chic entre as mais variadas famílias inglesas, conduziria à exponencial implantação entre os “primos” da sociedade norte-americana. Se as cada vez maiores catedrais góticas eram competição entre dioceses na Velha Europa, nos EUA cada cidade tinha de ter a maior árvore de Natal, sendo a anual iluminação da árvore na praça do Rockefeller Center, em Nova Iorque, o mais representativo desta corrida desenfreada que pouco mais de um século depois ainda assistimos.
As origens pagãs e a “apropriação” cristã. A evolução da simbologia e da tradição. O conhecimento do simbólico até à ignorância por ser tradição. O cruzamento de culturas e mero costume de praticar o habitual fez muitos esquecer o porquê das coisas. O estranho(?) é como a curiosidade se ausenta. Algumas igrejas manifestam-se contra o crescente paganismo (5) do Natal e descristianização da sociedade. Não discordo por inteiro, pois o elemento central parece cada vez mais invisível: antes havia o Menino Jesus e o presépio, agora temos o mágico Pai Natal e as renas. Mas isso é outra conversa. Contudo, leio a crítica igualmente como um não-reconhecimento da evolução das celebrações, e não entenderem o modo como o humano sempre produziu cultura, juntando vários elementos espelhos da sua própria diversidade.
As respostas quanto à importância das simbologias demonstra a necessidade de perpetuar objectos representativos do que se celebra. Não para se saber onde estamos, mas para nos sentirmos inteiros nesse lugar especial. “Quanto mais um símbolo é vivo, mais ele é a melhor expressão possível de um facto” (6). A Árvore de Natal é hoje esse símbolo vivo, um microcosmos de um mundo maior, uma representação essencial de uma realidade concreta do indivíduo e do colectivo, dos valores de (re)união, amor, partilha e felicidade, uma parte de nós próprios e da família a que pertencemos.
(5) A católica Canção Nova no artigo avisa contra “Os perigos de trocar os símbolos cristãos pelos pagãos no Natal” https://formacao.cancaonova.com/liturgia/tempo-liturgico/advento/os-perigos-de-trocar-os-simbolos-cristaos-pelos-pagaos-no-natal/ (6) JUNG, Carl Gustav, “Types psychologiques“, Genebra, 1950, p.492 como enunciado na introdução de Dicionário dos Símbolos
— QUESTIONÁRIO E RESPOSTAS
1. A época de Natal é um momento especial. Uma delas é o nascimento de Jesus. O período do Advento significa chegada, tempo novo. a) O que significa para ti o nascimento de Jesus? b) Nesta época, o que é mais forte: a fé, a família ou a cultura? c) Para lá da religião, qual a simbologia de um nascimento?
2. A simbologia da Árvore de Natal a) É importante para ti? b) Porque achas que um pinheiro possa ser um símbolo de um evento ocorrido no Médio Oriente? c) Será tão importante assim expor/usar objectos simbólicos?
1. a)
O nascimento de Jesus Cristo, há muitos anos tinha um grande impacto e simbologia, devido à minha educação maioritariamente cristã. Contudo, com o passar dos anos penso que acabei por ceder à ideologia capitalista do Natal. Por diversas razões.
Uma data para relembrar que todos temos o mesmo valor independentemente da nossa origem, contexto, aspirações.
Para mim o nascimento de Jesus é um marco na história da igreja e na sociedade que eu revivo com uma reflexão de que podemos voltar a acreditar na igualdade, um momento de serenidade sobre a sociedade e aceitar as diferenças. Tudo isto porque sinto que os princípios da doutrina religiosa me fazem reflectir desta forma.
Do ponto de vista da religião cristã o nascimento de Jesus representa a chegada do salvador. No entanto, para mim, o nascimento de Jesus representa o Natal, uma época de Paz, Amor, Partilha e Solidariedade.
Jesus foi descrito como um ser humano excecional, então, poderia dizer que significa o amor mais puro. Tal como quando nasce um filho que se deseja torna-se num bom ser humano.
O nascimento de um homem importante na história da humanidade que marcou a vida de milhões de pessoas.
O nascimento de Jesus significa esperança num dia melhor e renovação.
Absolutamente nada. Ou talvez o momento em que espero pela nova música da Rádio Comercial.
Como católico pouco praticante/crente acredito que Jesus nasceu, filho de Maria e José. Era um líder de convicções fortes que mobilizou uma série de seguidores... O que significa o seu nascimento... Natal, celebração do nascimento de uma figura história central na maneira como a história é contada na Bíblia.
Um evento histórico.
Celebração religiosa de uma história de esperança.
Facto histórico usado por religiões para conduzir pessoas ao longo dos tempos no corredor estreitinho do obscurantismo.
Hoje em dia para mim nada. Mas ajuda a ensinar os mais pequenos a terem mais parcimónia, mais igualdade, mais vontade de ajudar o próximo. A serem mais humanos dentro de um espírito de bondade.
Acredito em Deus Universal, em fé. Jesus é uma figura “forte” mas acima de tudo é cultural. Ainda somos um povo maioritariamente católico mesmo que não praticantes.
1. b)
Para mim, o Natal acabou por perder simbologia a partir do momento que a minha família foi minguando de tamanho. Apesar disso, penso que provavelmente a família.
Por esta ordem: família, cultura, fé.
Na minha opinião, o que é mais forte é a família. É o encontro, um momento de proximidade entre todos, fazendo-nos sentir que pertencemos a uma comunidade que está ligada por laços de sangue.
A família.
A família.
A família e os amigos.
A fé e a família.
A família. É uma altura em que conseguimos e nos esforçamos para estar todos juntos. A desculpa? É Natal!
Família.
A família.
A família.
Definitivamente a Família.
Família.
Estão interligados e não independentes.
1. c)
O nascimento está sempre ligado com a noção de começo. Em parte, acho que existe uma grande ligação entre esperança e nascimento. Esperança de que a criança tenha melhores oportunidades, que qualquer que seja o projecto, corra bem. Esperança, em geral e positivismo.
Continuidade e renovação.
A simbologia de um nascimento é uma descendência familiar, uma nova geração. Pessoalmente é uma vivência, aprendizagem, uma nova fase da vida.
O nascimento representa a vida, a continuidade da prole, o futuro.
É o fruto do amor entre duas pessoas, um momento muito especial de certeza.
O nascimento é um marco do que é novo. E tudo o que é novo pode influenciar os outros.
Esperança e continuidade da família.
Recomeço, renovar da esperança na humanidade. Os que temos cá poucos prestam. Talvez tenha nascido um "messias"? Para quem não acredita vai aqui uma grande confusão…)
Vida, possibilidades, oportunidades, futuro.
Uma dádiva. Suponho eu, que não tenho filhos.
Esperança.
Prova provada da atracção que dois adultos sentiram. A crença no Futuro. O gene egoísta.
Nascimento é vida, é renovação, é ciclo. Natureza viva.
2. a)
Sim.
Sim é importante. Um símbolo da alegria da infância, dos presentes, da magia da luzes, do calor das reuniões de família, doces de natal…
Não.
É. Há alguma magia nas luzes, nas cores e na alegria das crianças. É o espirito no geral, sem cultura, só pela beleza.
Sim.
Nem por isso.
A Árvore de Natal é um símbolo importantíssimo de uma época securizante chamada infância. Devolve-nos a crença mágica num mundo bom e belo que - apesar de não existir realmente - gostamos de acreditar que existe. E se calhar existe mesmo...
2. b)
Não sei.
Nunca tinha pensado nisso. Não faço a menor ideia.
Nunca questionei...é pinheiro, já não é dos verdadeiros porque não se pode, mas é verde, nada cá de cores. E se tivesse alguém que me fizesse um presépio à antiga, com musgo verdadeiro e tudo era o delírio. Voltava a ser aquela menina pequenina que ficava no colo do avô a ver o moinho de água a funcionar e imaginar uma vida onde tudo era perfeito (ao contrário da minha na altura…)
Nunca tinha pensado nisso! Por aquilo que me apercebi é uma tradição que começou há 500-600 anos no norte da Europa (Alemanha, Estónia, Latvia). Aparentemente quem deu um empurrão valente em termos de marketing à árvore de natal foi uma rainha inglesa, em 1800. O seu uso tornou-se popular a partir daí no Reino Unido, Estados Unidos e presumo, no resto do mundo.
Sei que faz parte da bandeira do Líbano.
Não faço ideia. Fenómenos de aculturação? Falta de google na época? Influências de um Norte europeu rico e poderoso?
2. c)
Não é muito importante, mas ainda assim importa sempre…
Sim! Ajuda-nos a fazer sentido da nossa história, pessoal, como comunidade, como humanidade.
Sim. Todas as culturas exprimem as suas características através de objectos, imagens, desenhos que contêm uma carga simbólica. Sejam árvores, máscaras, bandeiras, músicas, ou qualquer outra forma. São tudo caminhos para uma comunidade expressar a sua identidade e os seus valores culturais. Sendo em simultâneo fonte de identificação, agregação e comunhão individual e colectiva.
Para mim, pela magia a que me leva, pela tranquilidade. Porque nos é permitido estar em família, sem pressas, todos de férias. Até do mundo podemos mesmo “relaxar".
Sim. Objectos simbólicos/símbolos fazem parte da nossa cultura. Através daquilo que representam movem-se massas, para o bem e para o mal…
Sim, faz parte da nossa identidade.
Claro que sim, o que seria de nós sem símbolos? Imaginem o que seria ter de explicar, chegada a época de Natal, a toda a gente lá em casa: Chegou a época de sermos melhores e desejarmos boas festas, engendrar presentes misteriosos que dirão a quem os oferecermos que nos lembrámos dessa pessoa, ou seja que essa pessoa é importante para nós, chegou a altura de descermos à infância e celebrarmos com os mais pequenos a magia e acreditar num mundo melhor, está a chegar a época de nos reunirmos com todos os que gostamos. Dizer isto todos os dias a toda a hora? Nah... Enfeita-se a árvore de Natal, ligam-se as luzinhas coruscantes e pronto, está tudo dito.
PARTE II
Christmas em London (7) Se o Natal é uma regularidade cumprida de forma mais ou menos generalizada, entre nós não. Todos os anos realiza-se de forma diferente. Talvez a única consistência celebratória aconteceu quando criança, em casa da minha avó paterna enquanto era viva (que incluía a Missa do Galo). A idade adulta trouxe lugares e pessoas diferentes à equação. Na casa dos pais ou dos sogros. Ponto em comum, o bacalhau. Mas também um certo tédio, porque o Natal é para as crianças, como é costume dizer-se. Quando o meu filho era criança pré-escolar, a alegria dele encantava-nos. A magia do Natal entre adultos perde-se, torna-se um simples cumprir da tradição. O meu divórcio reduziu este tempo a nada, já lá vão 6 anos. A morte do meu Pai, em Novembro de 2018, para a minha mãe, menos que nada. Ambas as situações pessoais eliminaram a vontade de celebrar o Natal no seu todo, sendo a ausência de ornamentos e respectiva Árvore o mais evidente.
Este Natal de 2019, foi diferente. O meu irmão mais novo vive e trabalha em Londres. Com ele, a minha cunhada e a família dela, também da Madeira como a minha mãe, a semana do Advento foi inteiramente diferente e, pela primeira vez em muitos anos, vivido com alegria. Seguramente para a minha mãe estar de volta a uma terra que tão amou, na noite vespertina em conjunto com os seus dois filhos, a ausência física do meu pai foi apenas isso, física, pois em nenhum momento a sua existência foi esquecida apesar da diferença de lugar. Talvez a simbologia da família feliz se tenha reconstituído à volta de uma sala e mesa ricamente decoradas com ornamentos natalícios clássicos (árvore de Natal, velas, azevinho, o design da toalha verde, o vermelho de pequenos fatos de Father Christmas que continham talheres especiais), o luso bolo-rei (curiosamente não havia o bolo de mel, delícia madeirense própria do Natal), todos de chapéu de cone (9) (que aqui em Portugal se acontecer agora será pela internacionalização comercial), os famosos Christmas crackers (9) ingleses que há tantos anos não via e, como o bacalhau que levámos de Portugal não demolhou a tempo, jantámos o madeirense Carne de Vinha d’Alhos (10) que se come no almoço de 25 de Dezembro. Uma conjugação de elementos culturais, de dois territórios lusos (Portugal continental e Madeira), de Inglaterra (dizer britânico aqui seria um abuso, pois estas ilhas são igualmente diversas), dois idiomas e, um calor humano e físico notórios (casas quentes, fosse assim tão bom em Portugal no inverno). Toda uma experiência nova, ao que se juntou a troca de presentes e um longo fim de serão jogando board games (jogos de tabuleiro, como diversão tradicional inglesa).
Talvez seja isto a simbologia do Natal que prevalece e que obtive nas respostas ao meu questionário: que a família é o mais importante. Não há referências a Jesus, a Missa do Galo é de outra época; estas tradições e culturas religiosas desvaneceram. A geração da minha mãe vivia o Natal em plena religiosidade, passadas tantas décadas a laicização do Natal predomina e sem confronto com o passado. O denominador comum são as pessoas que aprecia manter este vínculo social que é a família e, quanto mais gosto houver em estarem juntas, mais feliz será esse momento de uma noite santa e o festivo dia seguinte.
(7) Mistura de idiomas é propositado. Tradições de dois lugares reunidos em alegria. (8) Enfeitar a cabeça era um costume antigo no Império Romano, que nestes dias de Dezembro celebrava Saturno, culminando as festas a 25. O início da Cristandade para melhor implementar a nova crença usou esta data para evocar o nascimento de Jesus Cristo. (9) Christmas crackers: cilindros como se fossem embalagens de rebuçados gigantes, cerca de 3cm de diâmetro que, todos à mesa puxam as pontas em uníssono, rebentam e revelam do seu interior um brinde ou texto de boas novas ou humorístico. (10) Esta tradição gastronómica da Madeira tem, naturalmente, origens anteriores. Levada por colonos do Minho, a carne de porco (em virtude das matanças deste animal para esta época) é marinada em vinho e alho durante alguns dias. Os “toques” regionais são os condimentos, especiarias e o acompanhamento de pão banhado na água da cozedura, uma forma de aproveitar pão duro para nada desperdiçar, face às carências de tempos antigos mas igualmente da inventividade para se comer bem.
BIBLIOGRAFIA
— Livros
CHEVALIER, Jean e GHEERBRANT, Alain (1982) Dicionário dos Símbolos, Lisboa: Teorema
LÉVI-STRAUSS, Claude O Olhar Distanciado, (1983) Lisboa: Edições 70, 1985 Mito e Significado, (1978) Lisboa: Edições 70, 1985 O Suplício do Papai Noel, (1994) São Paulo: Cosac Naify, 2008
LIMA, Mesquitela (1993) Antropologia do Simbólico (ou o Simbólico da Antropologia), Lisboa: Editorial Presença
SPERBER, Dan (1975) Rethinking symbolism, Cambridge: Cambridge University Press, 1977 2ª Ed.
— Online
History of Christmas Trees https://www.history.com/topics/christmas/history-of-christmas-trees Artigo do canal de televisão History, de 27.10.2009 e actualizado a 9.12.2019
“Os perigos de trocar os símbolos cristãos pelos pagãos no Natal” https://formacao.cancaonova.com/liturgia/tempo-liturgico/advento/os-perigos-de-trocar-os-simbolos-cristaos-pelos-pagaos-no-natal/ Artigo da autoria de Canção Nova, comunidade católica brasileira / lido 14.01.2020
— Ensaio Final para PROBLEMÁTICAS CENTRAIS DA REFLEXÃO ANTROPOLÓGICA 1º ano, 1º semestre • 2019/2020 15 Janeiro 2020 — Avaliação: 18 Nota Final de Semestre: 18 Licenciatura de Antropologia | Iscte-IUL, Lisboa
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❤️Este ano o dia das mães será um pouco diferente em virtude da pandemia de coronavirus que impôs à sociedade a necessidade de distanciamento social. . ❤️No entanto, o sentimento de amor e gratidão que todos nós temos com as nossas mães nunca irá mudar, não importa a situação em que nos encontremos. . ❤️Estejamos fisicamente presentes ou não, é o dia de expressar o quanto nossa mãe é especial e querida. Dizer isso a elas é retribuir um pouquinho de todo esforço e abnegação diários necessários para se cuidar de uma criança. . ❤️É momento também de lembrarmos que, sejam humanas ou não, as mães têm os mesmos sentimentos em relação aos filhos. As fêmeas de todas espécies possuem o instinto materno de cuidar da cria, ensinar as lições, sejam elas escolares ou de sobrevivência na selva africana. . 😔Em virtude da "industrialização" dos animais, muitas fêmeas levam uma vida de suplício como exemplo as mães porcas que amamentam seus filhotes enclausuradas num minúsculo espaço onde nem podem se mover. As vacas, são inseminadas artificialmente e são afastadas de seus filhotes para que o leite que seria deles, seja destinado aos humanos. As galinhas poedeiras vivem num espaço do tamanho de uma folha de papel A4 para produzirem ovos destinados à indústria, sendo que os pintinhos machos, sem serventia à indústria, são descartados e vão parar no triturador. . ❤️Todas são mães. . 🌱É hora de retirar a venda do especismo dos olhos e permitir que o milagre da maternidade seja livremente um direito de todas elas. . ❤️Que este dia traga a reflexão do Amor Incondicional, o Amor Universal, o Amor que se expande e que liberta todas as criaturas e lhes permite exercer cada qual sua individualidade que é delas por direito. . ❤️Feliz dia das mães! . Dra. Graciani Pessini @dragracianipessini CRM RJ 5262091-2 via @medicosvegetarianos . . . #sejavegano #comasemcarne #maustratosanimais #comersemculpa #carnenao #ameosanimais❤️ #veganismoacessivel #diadasmães #diadasmaes2020 #roseliterapeuta (em Roséli Terapeuta) https://www.instagram.com/p/CABBxDGne3c/?igshid=123384nj5m450
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