Dragões não morreram. Um dança de chamas não aconteceu. Aerys não foi um louco e Rhaegar não se deixou levar por profecias. Agora, perto da Dinastia Targaryen completar 300 anos, uma princesa foi raptada e o reino se move pela princesa.
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Conto V
hey! aqui está mais um conto que eu espero que vocês amem tanto quanto eu, feito pela mestra das palavras @holtzm-ann
A cabeça de Elrie girava. Seus sentidos permaneciam entorpecidos, levemente extasiados, mesmo que o sol tivesse raiado há muito e deixado para trás a noite anterior e seus acontecimentos. Apesar da natureza das palavras trocadas e dos gestos realizados, todavia, seu corpo apresentava-se leve. Não seria exagero afirmar que seu mundo e suas percepções acerca do futuro haviam virado de ponta cabeça, e em contrapartida não havia se quer um sinal de dúvida, uma centelha de temor, ou ainda um vislumbre de arrependimento.
Pelo contrário; a manhã pareceu fortalecer sua convicção. Ao abrir os olhos, pela primeira vez a ideia pareceu inteira e cruamente real. Contudo, ela sabia que a jornada não findara ali. Não verbalizara nada à Coryn, não até então, pois estava cônscia de que precisava tomar alguns passos antes. E, ainda que intuísse que eles não ofereceriam grandes obstáculos, a noção de enfrentá-los fê-la estacar. Não tinha ideia de como faria ou diria aquilo.
Repentinamente, sentiu-se novamente como a menina retraída e pouco articulada que havia sido. Deveria ter tomado as providências naquela manhã. Chegou até a redigir a correspondência que enviaria à Mãe, que estava fora numa visita a alguns de seus vassalos, informando-a de seu retorno à Lançassolar. Mas parara no meio, no ponto em que decidira introduzir o assunto da maneira mais casual e sóbria possível. Não soube formular as palavras. E em vez de insistir, ela saiu dos próprios aposentos quando a tarde já ia pela metade.
Só notou o que procurava quando parou na entrada da Torre do Sol. Perguntou aos guardas que cuidavam da antecâmara se sua irmã estaria presente. Ela estava ali e, por algum milagre, não estava atarefada demais para recebê-la. Sempre precisava haver um Príncipe ou Princesa no trono de Dorne; essa fora uma lição que ouvira inúmeras vezes de sua mãe. Com a partida dela, pois então, restava à primogênita levar a orientação à cabo.
Elrie a encontrou sentada num dos tronos elevados, naquele condecorado por um sol feito de ouro batido. Tinha um tomo na mão e aparentava lê-lo, um cálice de algo até então não identificável ao alcance da outra. Era o retrato da graça e altivez de uma soberana. Quando a viu aproximar-se, no entanto, fechou o livro e o pôs de lado com um sorriso acolhedor e, pela primeira vez, ocorreu a Elrie que poderia ter sido egoísta de sua parte aparecer daquela maneira, sem ser anunciada. Talvez Sif desejasse passar um fim de tarde tranquilo em casa.
Mas nada mais - ou melhor, ninguém mais - viera em sua mente. Não eram demasiado íntimas, apesar de dividirem laços sanguíneos. Desde seu nascimento, Elrie não passará de mera expectadora da vida da irmã mais velha e de todos os acontecimentos, a maior parte trágicos, que a acometeram. E, no entanto, havia se atentado a cada um deles, registrando-os em sua mente afim de assimilar alguma coisa, qualquer coisa que lhe revelasse mais sobre a irmã e sua natureza.
Taryne retinha uma visão mais crítica de Sif e das escolhas que ela havia tomado, nem todas sábias, ela pontuava, apesar da postura metida de sabedoria que fazia questão de exibir. Elrie a via simplesmente como um ponto de equilíbrio. Quando o pai havia morrido não passava de uma menina, mas recordava vividamente das atitudes que Sif havia tomado na época.
Sua mãe ficara acamada durante o restante de sua última gravidez, arrasada demais para retornar à ativa tão rapidamente. Elrie não processara a perda com devida consciência, visto a idade tenra que tinha, mas lembrava-se vagamente de sentir-se perdida, confusa e principalmente abandonada. Não compreendia o distanciamento da mãe e, dependente como era, nem mesmo a companhia de outras figuras conhecidas como Meistre Alyn ou Septão Oswyck era capaz de consolá-la.
Na ausência da mãe, Sif ocupara-se com as atividades que cabiam a ela dirigir. Mas, de alguma forma, sempre havia encontrado a menor quantidade de tempo que fosse para dirigi-lo às irmãs. Elrie recordava de uma tarde inteira que passara na companhia daquela garota estranha que a lembrava tanto seu pai, enquanto a mais velha retinha uma pilha considerável de contas a serem equacionadas. Ao invés de ignorar a presença de Elrie em prol delas, contudo, a encarregara de anotar os resultados, distraindo sua mente e fazendo-a sentir-se querida e útil. Temporariamente curada.
A verdadeira cura havia sido mais demorada, é verdade. Levara algum tempo para a família recuperar-se daquela dura perda. Mas durante o extenuante início, de alguma forma Sif tivera o dom de fazer com que as três irmãs mais novas não sentissem-se completamente negligenciadas. Até ligeiramente especiais.
Elrie se perguntava com frequência se alguém, algum dia, dedicara a mesma atenção à Sieglinde, que também havia sido profundamnte ferida, uma e outra vez, ao decorrer de toda sua vida. Ou se, assim como ela, haviam apoiado-se na segurança que ela representava, indiferentes à possibilidade dela ser tão humana e vulnerável como qualquer um deles. Como esta era uma percepção tola.
— Elrie. — saudou-a a Princesa, levantando-se de onde estava para segurar-lhe as duas mãos. — Venha e sente-se enquanto lhe sirvo uma bebida.
Elrie obedeceu, sentando-se nos degraus que levavam aos tronos. De alguma forma, não sentia-se no direito de ocupar o outro assento disponível, aquele condecorado com a bela lança de bronze. Aquele que havia sido ocupado por seu pai e, quem sabe num belo e ideal futuro, talvez viesse a ser ocupado por um homem com o qual sua irmã escolhesse dividir o fardo de suas responsabilidades.
Parecia um sonho, como uma promessa doce de verão, e Elrie foi arrebatada pelo intenso desejo que se tornasse real, embora tudo o que a irmã havia feito desde a morte do pai de seu filho indicasse o contrário.
Ah, Sif.
— O que me traz o prazer de sua visita? — para alguém de fora, talvez a interação parecesse exageradamente formal. Mas esse era apenas o modo como a irmã se comportava, Elrie sabia. Mesmo perto da família, mantinha sempre uma postura de educação impecável, quase distante. Mas sempre estava atenta. À tudo. Ela podia ver isso em seus olhos cinzentos, repousados fixamente em seu rosto.
— Vim ver como estava. Distraí-la um pouco de seus deveres massantes. — mesmo aos ouvidos da mais nova a desculpa pareceu esfarrapada. Mas não tinha noção de como levar o diálogo até onde desejava. Não assim, tão repentinamente.
Para seu alívio, a irmã guiou o rumo da conversa. Agradeceu a iniciativa, dizendo que sentia que a qualquer momento enlouqueceria se continuasse lendo acerca de arrendamentos e lucros comerciais. Elrie perguntou-a sobre Daevon, que estava acompanhando Darrin em uma de suas muitas andanças. Sabia que inicialmente Sif havia ficado ligeiramente insegura em afastar o filho mais do que os quilômetros que separavam Lançassolar e os Jardins de Água. Mas, no fim, ela havia cedido, e Jaelyn e Benjicot Dayne haviam acompanhado a dupla no passeio demorado que intencionavam executar.
À medida que os minutos foram passando, Elrie começou a se sentir mais descontraída. Dividiu o forte tinto dornês que a irmã bebia, sentindo-se de repente muito feliz por estar passando aquele momento agradável com ela, como raramente fazia.
— Acabei de chegar de Porto Real. — disse, por fim. Como se ela já não soubesse.
Sif pareceu notar a repentina mudança em seus ares ao pronunciar a frase como se fosse um decreto. Deixou a taça e o sorriso aberto brevemente de lado.
— Como está a corte? E o Mestre Navegador? — ela sabia. Elrie não fazia ideia de como, mas supôs que fosse estranho se não fosse o caso. Não achava que a irmã usaria de métodos evasivos para invadir a privacidade de sua vida, mas não havia sido muito discreta em sua companhia à Coryn.
— Muito bem. — respondeu, deixando o próprio vinho de lado e unindo as duas mãos no colo. Então travou, as palavras presas na garganta. Por um momento efusivo, quase se levantou e foi embora, considerando toda a situação um exagero tolo de sua parte.
Mesmo quando o silêncio se estendeu, Sif não disse nada. Bebericou e se recostou, cruzando as pernas forradas de uma linda seradeia azul que a fazia parecer mais jovem e cândida, enquanto envolvia o braço do trono com o braço livre. Era a imagem da descontração elegante. Seus olhos pousavam no rosto da irmã mais nova sem fitá-la de modo desconfortável. Era um dom seu: aquela pose, aquele silêncio, aquela atenção. Demonstrando estar à espera. Convidativa. Sem ameaçar nem julgar, tendo sido ela mesma tão julgada vez após vez.
Elrie entrelaçou os próprios dedos, então desviou os olhos para a tocha mais próxima, permitindo que seu olhar se perdesse nas chamas crepitantes.
— O que pode me dizer sobre o amor, Sif?
A Martell mais velha ergueu ligeiramente as sobrancelhas. Então pareceu pensar, girando o líquido escuro em seu cálice.
— É algo belo. E contagiante. Especialmente quando se é jovem. — começou, tendo um claro cuidado na escolha das palavras, como se temesse que ela encarasse-as como uma crítica ou uma reprimenda. — A vida parece muito mais simples quando se é jovem, na verdade. Bem e mal, preto e branco... Como se as coisas fossem diametralmente opostas, sem gradações entre elas. Contudo, à medida que a pessoa envelhece, tudo parece ganhar matizes variados. E é aí que se percebe que, por mais que o amor pareça um conceito simples, amar nem sempre é fácil. — sorriu levemente, mas sem humor. — É claro que eu não sou nenhuma anciã. Mas há dias na vida que parecem décadas, meses que parecem milênios.
— Fala de papai e de Gaemon.
Ela anuiu. Elrie pôde ver o lampejo de dor que cruzou seus olhos sob a mera menção daqueles homens que tanto havia amado.
— Como conseguiu? — perguntou a mais nova suavemente, incapaz de continuar mantendo para si aquelas dúvidas. — Como aguentou, sem nunca desabar?
Sua irmã pendeu, pensativa. Talvez decidindo se continuaria o rumo expositivo da conversa ou não.
— Eu encontrei força nos lugares mais improváveis. Olhei para os outros, aqueles que precisavam muito de mim, e me agarrei às suas necessidades para suplantar as minhas próprias. Para esquecê-las.
— Eu sei como é. — e sabia mesmo. Não compararia suas experiências com as da irmã, mas sabia como a ideia de cuidar de alguém era capaz de desviar sua atenção, fazendo até mesmo com que se esquecesse de seus próprios problemas. Fazendo-os parecer inexistentes. Sentia-se exatamente assim quanto a Coryn.
Sif olhou-a com tranquila compaixão.
— Amor talvez signifique somente isso, afinal; apenas aceitar as pessoas como são, respeitar suas escolhas e condoer-se de seus sofrimentos.
— Ele está sofrendo, Sif. — Elrie disse, intensamente.
Sabia que era verdade. Coryn não era desprovido de emoções, como havia suspeitado à princípio. O vazio que ele aparentava era só o que cobria um poço turbulento de dor, cujas sequelas haviam cobrado caro de si.
— Eu sei. — acrescentou, mais baixo.
— Assim como você, Elrie. — a mais velha respondeu suavemente.
A mente de Elrie negava. Ela ás vezes se sentira sufocada, sim, solitária, até triste e insegura. Mas nada se comparava ao que se passava com Coryn. E tudo desaparecia sob essa constatação.
— E você? — ela acabou disparando. E se arrependendo depois, ao notar o cenho franzido de sua irmã.
Para sua surpresa, a expressão logo se desfez, e ela continuou falando.
— Tristezas fazem parte da condição mortal. — declarou, voltando-se ao líquido em seu cálice. — Ninguém que chega à idade adulta consegue escapar delas, creio eu. Nem as crianças, na verdade. O que importa é o que fazemos com a dor, o modo como moldamos nosso caráter, nossas ações e nossos relacionamentos. Afinal, a vida não é pura tristeza. Ninguém deve, de forma alguma, permitir que o pessimismo ou o ceticismo o lance num poço profundo. Não para sempre. Existe alegria, também. Muita alegria. Você consegue ser feliz com ele, Elrie? Será feliz com ele?
De repente, encarando aqueles olhos cinzentos, Elrie se lembrou de uma conversa que tivera com o pai, ainda muito pequena, enquanto ele entalhava um pedaço de madeira distraidamente para transformá-lo num brinquedo. Era dado a aforismos, ela lembrava, e um de seus preferidos era: "Mude o que pode ser mudado e aceite o que não pode".
Isso também parecia resumir muito bem sua irmã mais velha. A olhou, estudando-a por um momento. Era dona de uma força e uma graça impressionantes.
Ficou se perguntando se ela tinha noção disso.
— Será que eu consigo ser feliz? — repetiu a pergunta. — Claro que sim. Serei feliz? Quem sabe? Mas, se não for, não será por falta de oportunidade nem de tentativa.
Sif estendeu a mão em sua direção. Elrie não pensou duas vezes antes de aceitá-la. Ela sorriu ternamente.
— Então tem minha benção. Não acho que tenha sido isso que veio buscar. E eu não sou a Princesa Regente, mas um dia serei, o que deve valer de algo, não?
A mais nova riu, invadida por uma onda de gratidão quase sufocante pelas palavras de sua irmã. Pôs-se de pé, envolvendo-a com força nos seus braços. Quis transmitir a ela tudo o que estava sentindo, a felicidade que a preenchia naquele momento, o carinho e a admiração que nutria por ela.
— Já confrontou mamãe? — ela perguntou, quando se afastaram.
— Não. Ainda não.
— Recebi uma carta dela. Chegará em um ou dois dias, se os planos correrem normalmente. — informou. — Seu Senhor das Marés virá?
— Não. — Elrie respondeu, sorrindo ao ouvir Coryn sendo relacionado com ela tão abertamente. — Decidi fazer isso só. Afinal, é minha responsabilidade. Ele ainda não sabe que...
Parou. De repente assumir aquilo em voz alta para a irmã antes mesmo de fazê-lo à Coryn pareceu constrangedor demais, íntimo demais. Sif ajudou-a, sorrindo gentilmente ao murmurar:
— Eu sei. Você tomou uma sábia decisão. Quando resolver isso, vá encontrá-lo nos Jardins de Água. Estão vagos. Taryne partiu deles recentemente.
— Obrigada, Sif.
Ela piscou, cúmplice. O gesto pareceu tão bizarro em seu rosto normalmente estoico que Elrie não conseguiu não rir.
— Agora vá. O jantar daqui há pouco será servido, e você precisa se trocar. — dispensou-a com um gesto da mão. Ela sabia mesmo como agir como uma soberana.
Elrie achou que ficaria muito feliz em vê-la prestar esse papel, quando o momento chegasse.
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r h a e r y s & a e m o n d
ele nunca poderia tê-la, ela nunca poderia revê-lo
* essa perfeição em forma de edit foi feita pelas talentosíssimas @holtzm-ann e @robinsu! obrigada por sempre presentearem a história com essas belezuras <3
#gotedit#got edit#game of thrones#got#asoiaf#asoiaf edit#pela princesa#fanfiction#a song of ice and fire#edit#extra
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Conto IV
hey! aqui com mais um conto incrivelmente escrito pela @holtzm-ann para acabar com as nossas estruturas e nos fazer amar sierys ainda mais <3
A noite estava terrivelmente fria, mesmo para aquela época do ano. Um vento frio e úmido rodopiava pelas vielas, levantando a poeira do dia.
Um vento nortenho, e cheio de gelo. Borys Baratheon puxou o capuz para cima, a fim de esconder o rosto. Não gostava de ser reconhecido. Desde o momento em que havia pisado em Dorne, o rapaz sentia-se pouco à vontade sempre que saía do seu recinto em Lançassolar para percorrer as vielas da cidade sombria. Sentia olhos colocados em si onde quer que fosse, pequenos e negros olhos dorneses que o fitavam com uma hostilidade mal dissimulada. Aquele era um povo naturalmente desconfiado e arisco, pouco afável com estrangeiros. E, embora não atentassem contra sua vida em si, visto que estava ali como protegido de Sua Princesa, isto não impedia que o destratassem sempre que surgisse uma oportunidade.
Os lojistas faziam o possível para enganá-lo em cada negócio, e por vezes ele se perguntava se os taberneiros cuspiam nas suas bebidas. Uma vez, um grupo de crianças esfarrapadas começara a atirar pedras nele, até que ele puxara o tridente e correra atrás delas. Borys não temia por sua vida – de qualquer modo, qualquer um encontraria um adversário duro em mim. Na verdade, teria quase agradecido um ataque. A mão subia-lhe para roçar no cabo do tridente que pendia, meio escondido, entre as pregas das suas vestes sobrepostas de linho, a exterior com as suas riscas azul-escuras e de sóis dourados, e a mais leve e amarela por baixo.
O traje dornês era confortável, mas seu pai teria ficado horrorizado se estivesse ali para vê-lo. Mesmo assim, usar abertamente o brasão de sua casa na cidade sombria parecia ser brincar um pouco demais com a sorte. Antes nu do que morto, disse a si próprio. O exasperava que, após tanto tempo, aquelas pessoas ainda não tivessem se adaptado à sua presença. Fazia já meio ano, pelos Deuses. Será que, até o fim de sua estadia, continuariam perseguindo-o daquela maneira? Ele acreditava saber a resposta. Mas não gostava nem um pouco dela.
Era frequente que a cidade sombria de Lançassolar parecesse deserta debaixo do calor do dia, quando apenas moscas se deslocavam e zumbiam pelas ruas poeirentas, mas uma vez caída a noite, as mesmas ruas voltavam à vida. Borys podia ouvir uma canção tênue sendo cantada por uma voz doce que viajava através de janelas tapadas por persianas enquanto passava por baixo destas, e tambores que batiam o ritmo rápido de uma dança de lanças, dando à noite um espécime de pulso. Algo não sincronizado, mas de alguma forma harmônico. Como o bater de um único coração, o coração de Dorne. No local onde duas vielas se encontravam junto à segunda das Muralhas Sinuosas, uma mulher chamou-o de uma varanda. Estava vestindo uma corrente de ouro e azeite. Somente.
Olhou-a, curvou os ombros e avançou, direto para os dentes da ventania. Uma mulher baixa e gorda estava em uma esquina, grelhando postas de cobra num braseiro, virando-as com pinças de madeira à medida que cozinhavam. O odor pungente dos seus molhos trouxe lágrimas aos olhos do rapaz. Sieglinde havia dito a ele que o melhor molho de cobra tinha uma gota de veneno, assim como sementes de mostarda e pimentas dragão. Aquela comida deixava sua boca dormente e fazia-o arquejar por vinho, e ainda queimava mais ao sair que ao entrar. Normalmente, quando insistia em comê-la, ainda precisava aturar a perturbação de Benjicot pelas horas de indigestão seguintes.
Ele havia saído na companhia do Dayne. Alguns meses antes, tombara com ele numa taberna aleatória, encontrando-o com duas canecas de cerveja preta nas mãos e duas mulheres, uma em cada perna sua. Havia guiado-o de volta até Lançassolar, entre seus tropeços e comentários delirantes, mas não antes que ele vomitasse todo o seu jantar – e o almoço também, Borys suspeitava – nas roupas novas que o Baratheon havia ganhado de Sieglinde. Desde então, havia tornado-se um hábito sair em sua companhia em determinadas noites. Em uma ou outra, Gaemon Targaryen os acompanhava.
Mas Borys havia se perdido deles. Na última vez que os vira, Benjicot estava debruçado sobre uma mesa de jogo em frente de uma prostituta, empurrando peças elaboradas por quadrados de jade, cornalina e lápis-lazúli. O jogo chamava-se cyvasse. Tinha chegado de Vila Tabueira numa galé mercante vinda de Volantis, e os órfãos do sangueverde tinham-no espalhado para cima e para baixo, ao longo do rio. A corte dornesa era louca por ele.
E, se pudesse se confiar nas baboseiras que Benjicot dizia, alguns anos antes uma versão aprimorada do jogo havia surgido, graças ao falecido Príncipe Consorte. Adaryos Martell tinha transformado o jogo já complexo numa competição de prendas; a cada peça perdida para o adversário, uma peça de roupa também precisava ser retirada. Essa versão do jogo era chamada Cyvasse do Príncipe – e era particularmente mais popular que a original nas terras dornesas.
Independente da versão, Borys achava o jogo enlouquecedor. Havia dez peças diferentes, cada um com os seus próprios atributos e poderes, e o tabuleiro mudava de jogo para jogo, dependendo do modo como os jogadores distribuíam os seus quadrados iniciais. E Gaemon Targaryen parecia dividir sua opinião, porque enquanto Benjicot tirava a primeira camada de linho de suas roupas, Borys pensou tê-lo visto sair furtivamente da taberna onde estavam. Após um tempo, o próprio Baratheon decidiu que deixaria o Dayne à sua própria sorte – ele não parecia ter bebido o suficiente para esquecer o caminho de casa. Não ainda. De modo que o estrangeiro se livrou da responsabilidade e partiu de volta à Lançassolar.
Se não lhe falhava a memória, aquele era um dia diferente dos demais. Haveria algum espécime de comemoração – algo que era feito anualmente pelo Príncipe Consorte quando este era vivo. Uma tradição que a Princesa Regente não parecia inclinada a quebrar. Borys perguntou-se se não era doloroso para ela recriar a festividade que, em todos os detalhes, tinha as marcas das mãos de seu marido. Ele ouvira de línguas indiscretas que haviam tido uma boa relação, apesar da má fama de cafajeste do Príncipe. Não conseguia imaginar como isso seria possível, mas quem era ele para questionar acerca das intimidades daquela raça tão excêntrica?
Ninguém, definitivamente. Não conseguia se quer compreender as intimidades que lhe envolviam. Sieglinde parecia estar evitando-o nos últimos tempos. Ou ele estava simplesmente esperando demais de uma dama inconstante cuja metade das atitudes eram incompreensíveis para ele, e a outra metade difícil de interpretar. Dama não, dornesa. Ele já aprendera que havia uma diferença alarmante entre os dois termos. Pouco após receber seu tridente, ela costumava assistir a todos os seus treinos. Juntos, eles caçoavam de Benjicot e de seus esforços em combater Borys, à medida que o cenário inicialmente exasperador para o Baratheon tornava-se gradativamente cada vez mais glorioso. Então, quando ele se dirigia ao canto do pátio, para guardar a arma, tinha um beijo dado furtivamente aqui e acolá.
Acontecia sempre nas sombras. O que, de algum modo, tornava toda a coisa mais emocionante. Agiam como criminosos, ávidos por esconder suas atrocidades – um beijo roubado na esquina de um corredor, uma carícia inesperada no meio das escadarias, um flerte inteligente que o fazia rir. Até certa noite poeirenta, quando um bilhete havia aparecido magicamente sobre sua cama. Depois da loja do vendedor de sedas, escrevera ela, um portão e dois degraus exteriores. Aquela fora a primeira vez em que ele voluntariamente se afastara de Gaemon e Benjicot enquanto andavam pela cidade sombria. Ele havia estado tão ansioso... Mas ela o havia guiado seguramente, fazendo-o questionar-se se de fato era a primeira vez em que ela fazia aquilo.
Dornesa, não dama, lembrou-se, sentindo o rosto repentinamente quente contra o frio da noite.
Então, após aquela vez, nada. Por intervalos variáveis de tempo. A impressão que tinha era como se fosse um brinquedo do qual a herdeira cansava-se de tempos em tempos, por isso afastava-se, para descansar um pouco de sua presença até que ele voltasse a parecer interessante. Mas provavelmente estava sendo apenas injusto – ela não era obrigada a dar-lhe atenção em tempo integral. O que quer que tivessem era apenas temporário – logo ele partiria de Dorne. Um dia, casaria-se com uma dama westerosi e ela, tornaria algum nobre seu futuro Príncipe Consorte, e todas suas experiências passadas seriam apenas memórias da juventude sobre as quais se ria diante da mesa de jantar e contava a seus filhos sobre. Mas, mesmo sabendo disso, incomodava-o pensar que talvez houvessem outros brinquedos dispostos em sua prateleira, apenas aguardando serem utilizados sempre que o Baratheon perdia a graça.
Nós, homens, somos tão fracos. Nossos corpos transformam até os mais inteligentes de nós em idiotas. Foi no que refletia, quando a viela pela qual caminhava abriu-se de súbito para uma alta barreira de pedra. Havia atravessado a segunda das Muralhas Sinuosas. Quando passou pela terceira e última, entrando no pátio do Palácio Antigo iluminado pelo luar, havia decidido que não mais daria atenção às inconstâncias de Sieglinde. A última coisa da qual precisava ali era mais uma razão para aborrecer-se. Mulheres eram complicadas, aquela ali especialmente, e não compreendê-la o tirava do sério. Ela o tirava do sério.
Sua atenção foi vagamente afastada de seus pensamentos quando ele ouviu o som de asas. Próximas como estavam, pareciam um estalo de um trovão. A ventania pegou-o em cheio, lançando seu cabelo em várias direções diferentes. Protegendo os olhos da poeira que ela trazia, ele pôde enxergar a silhueta imensa do animal pousando. A rainha vermelha. Apesar de seu tamanho, o animal era estranhamente silencioso – não emitia muitos ruídos voluntários. Nenhum tipo de rosnado, ou rugido, ou o que fosse. Poucas haviam sido as vezes em que ele a ouvira fazer tais manifestações. Mas não precisava disso para ser intimidante – havia algo em sua presença. Uma imponência enervante, que fazia qualquer um sentir-se como nada, como ninguém. O porte de uma rainha.
Seu cavaleiro desmontou graciosamente de seu dorso. Então fora para lá que ele havia fugido. Borys percebeu tarde demais que ainda estava parado, quando Gaemon aproximou-se com passos tranquilos. Ele era sempre tranquilo. Assim como o dragão, Borys nunca havia o visto fazer grandes demonstrações passionais, de nenhum tipo. O que também era enervante, de um modo diferente. Borys se perguntava com constância se havia algo de errado com aquele sujeito.
— Baratheon. — ele o cumprimentou, quando estava próximo o suficiente para ser ouvido acima do ruído ensurdecedor das asas. Tessarion voltara a alçar voo, para longe dali.
Borys respondeu com um aceno brusco de cabeça. Sua relação não era antipática – na verdade, de início, ele havia achado até que davam-se bem, da própria maneira. Não eram grandes camaradas, mas sabiam conviver um com o outro de maneira amigável. Mas, de uns tempos para cá, parecia que sua relação havia mudado – Gaemon parecia mais indiferente, pouco interessado em ter Borys por perto. Especialmente quando a família Martell envolvia-se no meio – sempre que Sieglinde se aproximava, ele saía de cena quase que imediatamente.
O sujeito era mesmo estranho. Tão inconstante quanto a própria Princesa. Eles se merecem, pensou, ironicamente, embora a ideia por si só fosse ridícula. Aqueles dois, juntos? Antes Borys casaria-se com a menina Taryne.
— A festa está começando. Viu Ben em algum lugar? — ele perguntou.
— Da última vez que o vi, a única coisa que vestia era um bracelete dourado. — respondeu o Baratheon.
— No pulso, eu espero.
Ele parecia estar de bom humor naquela noite.
— Talvez ele tenha tirado-o para cobrir outro lugar. Não saberia dizer, saí antes disso.
Gaemon fez uma careta.
— O bracelete era meu.
— Era? Não é mais?
O valiriano riu, e Borys sorriu, balançando a cabeça. Então, pegando-o desprevenido, Gaemon deu-lhe um aperto amigável no ombro:
— Avise que chegarei atrasado. Preciso me trocar. — e partiu, seguindo para a outra extremidade a qual o Baratheon seguiria.
Ele subiu os degraus até a cúpula da Torre do Sol decidido. Até podia imaginar como agiria caso Sieglinde se aproximasse. Não seria rude – não havia razão para ser. Ela não era má pessoa, e havia sido agradável – não, mais que agradável com ele. Mas era exasperador tê-la por perto. Exasperador e perigoso. Borys se sentia andando numa corda bamba – sabia que a Princesa Regente não apreciava muito os rumores que andavam inevitavelmente correndo os aposentos de Lançassolar. Temia ofendê-la de alguma maneira irreversível, e estragar os planos tão bem elaborados de seu pai de enviá-lo até lá.
Definitivamente, ter Sieglinde longe era mais seguro.
Quando ele chegou, o lugar já estava lotado. Aquela era uma das seletas ocasiões em que todo o pessoal do Palácio Antigo estava junto – dos protegidos da Princesa, aos membros do conselho dela, dos guardas à criadagem. Era o tipo de comemoração familiar – para todos, menos para Borys. O ar estava espesso de fumaça, pelas carnes exóticas que eram assadas em brasas num canto, trazendo lágrimas aos olhos dele, que não estava habituado. Em algum canto do salão, uma trupe de bardos tocava uma música animada, e alguns poucos casais corajosos arriscavam-se em seguir os passos da dança típica. As mesas estavam servidas com todo tipo de especiaria estranha – cobras com molhos picantes, escorpiões em espetos. Mas também haviam pratos mais comuns – um porco inteiro untado em mel, faisão guisado, e jarras de tinto dornês desfilando de um lado para outro nos ombros de servas jovens.
Borys tomou seu lugar na esquerda da mesa principal, onde ficavam os protegidos de Selaena. Como de hábito, ele comeu pouco, e falou muito menos. Algum tempo depois, Gaemon se sentou a seu lado. As crias Martell chegaram após ele, e Borys evitou encarar Sieglinde, embora tivesse notado que ela mantinha os olhos ansiosamente sobre ele, como se aguardando uma brecha para conversarem. Hoje não.
Ela pareceu perceber que era deliberadamente ignorada. Porque em determinado momento, ele notou, aliviado e decepcionado na mesma medida, que ela pareceu cansar de tentar capturar sua atenção. Levantou-se com sua irmã, Jaelyn, e se afastou decididamente em direção ao centro do salão. De canto de olho, ele pôde observá-las encontrando pares em duas Lanças que protegiam o palácio e indo rodopiar energicamente pelo salão.
Ele franziu os lábios e desviou os olhos. Permaneceu alguns minutos tentando atentar-se ao prato à sua frente; uma fatia gordurosa de porco untado no mel, com alguns filés de cobra picante e grãos cozidos até desmancharem. Mas havia perdido a fome. De modo que se virou para seus companheiros.
— E então — ia dizendo Benjicot, que havia chegado na festa já parcialmente bêbado, embora – graças aos Deuses – inteiramente vestido. — chegou a serviçal da taverna e ela tinha umas...
— As damas estão do outro lado da mesa, Ben. — Daemon interrompeu-o, na mesma hora em que Jaelyn exclamou:
— Benjicot!
O ruivo olhou para onde as gêmeas estavam sentadas, e Jaelyn também, agora que retornara de sua dança. Com a culpa escrita no rosto, colocou as mãos em concha diante do peito, para demonstrar o tamanho do que estava dizendo, e acrescentou:
— Perdão.
— Está comprometido. — Gaemon brincou, indicando com a cabeça a Martell do meio, que corou efusivamente diante da sugestão.
— Nós não estamos... — ela começou.
— Comprometido, sim, mas não cego. — Benjicot interrompeu-a, abrindo um sorriso jocoso. Deu uma piscadela para a jovem, que ficou ainda mais vermelha – Borys duvidava que isso fosse possível, até ver acontecer diante de seus olhos.
— E você...! — incapaz de atingir o seu verdadeiro alvo, ela voltou sua raiva, de repente, para Borys. Ele ergueu as mãos, pronto para se defender:
— Eu não estou...
— Está sim, mas não cego. — repetiu o Dayne. — Jaelyn, — ele continuou, com um tom de superioridade. — há coisas impossíveis de não se ver. Especialmente quando se é homem.
— É verdade. — admitiu Borys. — Vi com meus próprios olhos.
Jaelyn os olhou horrorizada, tentando encontrar no rosto de algum deles um pouco de prudência. Seus olhos se detiveram em Gaemon que, a julgar por seu aspecto, não estava bêbado – nem perto de ficar. E que permanecia calado, somente assistindo ao desenrolar do diálogo.
— Sor Gaemon? — perguntou, esperando que ele dissesse algo aceitável.
Entretanto, o valiriano apenas pigarreou.
— Sei de quem estão falando. — disse. — Estive nessa taverna algumas vezes. A moça é famosa em toda aquela área da cidade sombria.
— Eu cheguei a ouvir dela até fora daqui. — concordou Benjicot.
Borys se inclinou em direção a ele, com os olhos azuis faiscando:
— E você, alguma vez...?
— Sor Borys! — Jaelyn gritou. Aquilo parecia ser demais para ela. Não tinha qualquer pingo de pudor normalmente, o Baratheon sabia. Aquele tipo de diálogo nunca a incomodava. Mas parecia que a última coisa que queria saber era se Benjicot havia se deitado com uma serviçal de taverna com uns seios do tamanho de uma sopeira. Ela levantou-se novamente, irada, e marchou para longe, para o outro lado do salão de onde tinha vindo.
Borys continuou olhando Benjicot, em expectativa. Mas ele apenas meneou a cabeça.
— Ela é casada. — falou.
— Não ficou nem um pouco tentado?
— Claro que não. Jaelyn me cortaria o pescoço.
— Não estou falando do que Jaelyn faria se descobrisse, embora duvide que ela fosse começar por seu pescoço.
Benjicot fez uma careta. Sabia que o Baratheon tinha razão.
— Só quero saber se sentiu-se tentado.
— Não. — admitiu ele, balançando a cabeça novamente. — Mas não diga a ninguém. Eu tenho uma reputação pela qual zelar. Não quero que acreditem que fui domesticado... Tão cedo.
Borys riu com vontade. Contudo, o gesto durou só um momento. Pois no segundo seguinte, Sieglinde surgiu a seu lado, quase como uma aparição. Mas ela provavelmente havia se aproximado com tranquilidade – ele era quem estivera distraído demais para notar. Ele olhou-a – não tinha como evitar fazer assim, tão de perto.
— Sor Borys. Gostaria que caminhasse comigo pelo salão. — ela pediu, com doçura. Chegou a bater os cílios daquela maneira adorável que as mulheres faziam. Mas, por trás de seus olhos, ele enxergou uma certa urgência. Estava brava. No mínimo, estava incomodada por ser ignorada. E parecia querer uma explicação.
Borys suspirou discretamente. Então se levantou e deu-lhe o braço. Ela o segurou com apenas um ligeiro toque da ponta dos dedos na parte interior de sua manga de linho. Era mesmo bem alta. Talvez fosse por isso que ela tivesse chamado sua atenção quando se conheceram. Cheirava a sabão.
Nenhum perfume. Nenhum óleo forte ou caro. Apenas sabão. Ocorreu-lhe, quase como uma surpresa, que queria ir para a cama dela novamente. Era melhor que banisse aquele pensamento logo. Já havia decidido que não a queria mais por perto. Tais pensamentos demonstravam muita sensatez da parte dele embora de modo algum explicassem por que, quando se aproximaram da saída do salão, ele não insistiu para que voltassem. Somente deixou-se ser levado, vendo-a pegar uma das velas que se encontrava numa mesa próxima, acendê-la na chama de outra que queimada em um suporte na parede e fazer um sinal com a cabeça para um lacaio, enquanto descia as escadas. Ele a seguiu sem emitir um único murmúrio de protesto.
A ala leste do Palácio Antigo tinha as mesmas proporções da ala oeste, com os mesmos salões, que um dia haviam se enchido de luzes e esplendor para a comemoração do dia do nome da Princesa Regente no mês anterior. Naquele momento, porém, encontravam-se às escuras e ecoavam o som de seus passos. Também estavam um tanto frios.
O que, pelos sete infernos, ele estava fazendo naquele lugar?
— Há uma tendência de ficarmos sentados tempo demais nessas comemorações. — Sieglinde disse, de repente.
— E já está frio demais lá fora para caminhar ao ar livre depois delas. — ele viu-se dizendo. Ah, então concordavam que estavam apenas em busca de um pouco de exercício depois de passar tanto tempo parados? Quanto tempo haviam ficado verdadeiramente sentados? Uma hora? Ele diria que menos que isso, contando que ela havia se levantado para dançar.
— Não devemos nos demorar muito nesse passeio. — acrescentou, após um momento. Pensou, de repente, que talvez aquele fosse o cenário perfeito para uma conversa franca acerca de suas pretensões futuras. Borys não achava que precisava de muitas palavras – só o suficiente para ela entender que não queria mais nada com ela. Que era melhor assim, para ambos. Embora, na verdade, só seja para mim.
Ela abriu um sorriso indulgente.
— Está com medo, Borys? Acha que eu o trouxe aqui para seduzi-lo?
Ele sentiu o rosto esquentar ligeiramente.
— Fez isso? — questionou, com firmeza suficiente.
— Fiz isso, Sor Baratheon. — ela admitiu. — Eu o trouxe para um salão vazio, com nenhum olhar sobre nós, para dançarmos. E para beijá-lo novamente. Só assim poderia fazer isso, imagino, já que não queria se quer olhar para mim em público.
Borys gargalhou, mas não se desvencilhou do braço dela nem virou-se para voltar para o salão o quanto antes. Chegou a pensar: Não, só vim te dizer que não podemos mais ficar próximos. Mas quando viu o rosto dela, iluminado pela luz da vela, pareceu perder o poder da fala. No fim, somente disse:
— Eu não sei dançar bem. E acredito que só poderemos enxergar do salão o que a luz da uma única vela nos permite. Além disso, não há música.
— Ah, então, teremos que nos conformar com o beijo. — ela disse, daquela sua maneira deliberadamente travessa. O sorriso iluminou seu rosto. Ela era bonita. Mas aquela não parecia ser a palavra certa para defini-la. Era muito prosaica. Beleza não era a responsável pela inteligência impetuosa que dava profundidade aos seus olhos, nem pela perspicácia por trás do seu sorriso. Ela não era só bonita – por isso ele não podia simplesmente deixa-la, antes que fosse a hora para isso. — Embora... Eu acho que consigo cantar de forma tolerável, ainda que ninguém com o juízo perfeito pensasse em me convidar para fazer um solo diante de uma plateia.
Ele deu um breve sorriso, mas ela mantinha os olhos fixos adiante.
O salão era amplo, estava vazio e, de fato, a luz de uma única vela não dissipava muito da escuridão. O ar estava gelado. Era o cenário menos romântico que ela poderia ter escolhido para seduzi-lo, se essa de fato tivesse sido sua intenção ao conduzi-lo até ali. Sieglinde pousou a vela sobre uma mesa de apoio ao lado das portas duplas.
— Sor. — disse ela, fazendo uma elegante reverência. — Poderia me dar este prazer?
Borys retribuiu com uma ampla saudação e envolveu sua cintura, mantendo uma distância muito correta entre seus corpos e olhando-a com um ar inquisitivo. A Princesa pensou por um momento, franziu o cenho ao se concentrar e começou a cantarolar com timidez, depois com mais confiança, a melodia de uma canção popular que ele já havia ouvido antes, embora não tivesse decorado a letra. Ela o guiou, rodopiando pelo salão vazio, entrando e saindo das sombras lançadas pela vela. Ele notou como a luz fraca fazia cintilar o bordado dourado no acabamento das mangas das sedas dela.
— A mulher do dornês era bela como o sol e seus beijos, quentes como a primavera. Mas a espada do dornês era feita de aço negro e o seu beijo, a mordida de uma fera.
Quando ficou claro que ele era desajeitado demais para acompanha-la tão de perto, ela afastou-se e adentrou numa dança mais enérgica. Saltitava e batia palmas, enquanto giravam ao redor um do outro, então retornava para os braços dele efusivamente. Sieglinde ficou ofegante depois de alguns minutos. Sua voz vacilou e então a música parou, sendo substituída somente pelas risadas dos dois. Mas ele continuou dançando com ela por mais um minuto inteiro, a energia e a diversão conduzindo o corpo do dois. Borys ouvia as respirações, os sons dos sapatos no piso, no mesmo ritmo, e o farfalhar da seda nas pernas dela.
Tudo era vida e alegria.
Se ele fechasse os olhos, talvez pudesse imaginá-los num salão cheio. Com centenas de olhares postos sobre ambos. Mas eles se movimentariam pelo salão como se fossem um, e pareceria, pensou ele, como estar dentro da música e cria-la com todo o corpo em vez de apenas com os dedos sobre um par de cordas. Pareceria criação em todos os sentidos em vez de apenas som. Haveriam candelabros e as luzes das velas suspensas refletindo na decoração. Haveria os perfumes de várias pessoas misturadas ao suor e ao aroma da comida. Haveria sons de música e pés movendo-se ritmicamente no chão e vozes e risos. Ele quase sentiu o sabor de vinho na boca. E a sensação das costas dela sob a sua mão, de seus dedos entrelaçados, e de nenhum resquício de receio por estarem sendo observados.
Era estranho como tal elevação de euforia poderia seguir tão de perto o terror ameaçador de vida. Os dois extremos da vida. Ou talvez não tão estranho. Não quando se tratava de Sieglinde.
Quando pararam de dançar, ele não conseguia pensar em nada para dizer, e não lhe ocorreu a ideia de soltá-la. Ficou com uma das mãos em sua cintura e a outra segurando-a pela mão. Olhou-a até que Sieglinde baixou a cabeça e afastou uma poeirinha invisível do decote do vestido com a mão que estivera pousada no ombro dele. Devolveu a mão ao mesmo lugar e encarou-o.
Ele a beijou, mantendo-se, a princípio, na posição da dança, embora a mão na cintura gradualmente a apertasse contra ele. A mão dela apertava a dele de um modo quase doloroso. O interessante era que ela o beijava com evidente prazer, até mesmo com desejo, mas nenhuma paixão. Não havia qualquer coisa semelhante a essa ali, pelo menos não da parte dela. Os termos de sua relação eram claros e evidentes. Quando notou, havia soltado a mão dela para envolve-la em seus braços. Ela passara um dos braços em torno de seus ombros e apertava sua nuca com a mão. Mas havia autocontrole em sua entrega – o que talvez fosse um tanto contraditório.
E se ela perdesse aquele controle? E se ele fosse a razão pela qual ela o perdesse? Ele seria capaz...?
Levantou a cabeça e pôs as mãos de volta na cintura de Sieglinde.
— Eu não compreendo a mulher do dornês. — viu-se murmurando, dando-a um olhar muito direto e franco então.
— Precisa compreender? — ela perguntou-lhe, suavemente. Ele sabia o que ela estava perguntando. Sua relação, afinal, necessitava ser tão segura? Tão certa? Havia futuro naquilo?
Ele parou, por um momento. Olhou-a com muita atenção. Dos olhos cinzentos e perspicazes, aos lábios largos e generosos, aos cachos castanhos que emolduravam seu queixo. Então, por fim, balançou a cabeça.
— Não. Não preciso.
Ela sorriu.
— Ah, como sou descuidada. Estou quase certa de que ouvi alguém falar sobre bolos de morango para a sobremesa.
— Isso é verdade. Daemon comentou comigo mais cedo.
— Foi ele quem pediu aos servos, creio. Devemos refazer nossos passos e ver se sobrou algo nas mesas?
Ele ofereceu-lhe o braço.
— Seria uma ótima ideia, Alteza.
#pela princesa#conto#sierys#borys baratheon#sieglinde martell#game of thrones#got#a song of ice and fire#asoif/got#asoiaf#extra
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t e r c e i r a f a s e
fogo e sangue
#gotedit#got edit#game of thrones#got#a song of ice and fire#asoiaf#pela princesa#house targaryen#fanfiction
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t i l d a h i l l
leoa sem garras - por @holtzm-ann
#talvez tenha haver com próximos acontecimentos#obrigada holtz#pela princesa#game of thrones#got#a song of ice and fire#asoiaf#gotedit#extra#edit#house lannister#tilda hill
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Dia de Seu Nome - Spoiler
“Seu nome foi chamado em um sussurro.
Ela hesitou, mas por fim aceitou.”
#pela princesa#game of thrones#got#a song of ice and fire#asoiaf#george r r martin#kingsland#iron throne#edit#extra#spoiler
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Sieglinde & Borys - Edit
está belezura sem limites foi feita por @robinsu e @holtzm-ann e ficou a coisa mais linda e perfeita, sem palavras para o talento desse povo viu
a autora mais mimada :3
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O Que Elas Encontraram na Floresta
capítulo 18 - prévia
#apenas para mostrar que eu não estou morta kkkkkkk#se tudo der certo o cap saí até segunda#pela princesa#extra#got#game of thrones#a song of ice and fire#asoiaf
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MEMES
hahahahahahhha eu adoro quando vocês fazem conteúdo sobre a história XD
esses aqui feitos pelo Thiago! @justicereborn
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tumblr
Capítulo 12
ahahahahahhahahah
meme? temos!
esse aqui feito por @holtzm-ann
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Sempre Seria Gelo e Fogo...
eu sempre perplexa com o talento desse leitores, essa linda peça aqui foi feita por @robinsu
#BELISSIMO#extra#edit#pela princesa#got#game of thrones#a song of ice and fire#ASoIaF#daeron targaryen#casa targaryen#house targaryen#rowena stark#casa stark#house stark
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l i l i a n a t u l l y
filha de correrio - feito por @holtzm-ann
#o edit mais lindo que vcs irão ver hoje#liliana tully#house tully#riverrun#got#game of thrones#a song of ice and fire#asoiaf#pela princesa#extra#edit
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Conto III
Finalmente estamos de volta e aqui está o conto sobre a Sieglinde e o Gaemon escrito por @holtzm-ann ! Espero que gostem :D
Sieglinde apreciava o calor.
Óbvio que, quando excessivo, acabava se tornando incômodo. Mas dificilmente isso ocorria, visto que a maior parte das trilhas que percorria em Dorne eram paralelas ao litoral, que oferecia sempre uma brisa fresca e salgada para acalentar o sofrimento dos transeuntes. Naquele momento, a Princesa desfrutava desse agradável equilíbrio, conforme os raios de sol banhavam sua pele, fazendo espectros alaranjados reluzirem em suas pálpebras fechadas.
De olhos fechados, ela se atentava mais às descrições que seus outros sentidos providenciavam acerca de seus arredores. Por essa razão, era preenchida pelo calor do sol, pelo aroma ácido das laranjas sanguíneas, maduras naquela estação, que despencavam no chão de pedra e nas lagoas dos Jardins de Água. Era, ainda, capaz de ouvir o som das crianças brincando na água; o estardalhaço que faziam sempre que alguém era derrubado, as gargalhadas que seguiam-se ao evento.
Normalmente, esse cenário seria deliciosamente agradável a ela. A recordava de tempos já passados, em que era dona de uma daquelas alegres vozes, uma menina cheia de astúcia mas que, quando ralava o joelho, corria para os braços do pai procurando alento.
Pai. A palavra pendeu em seus pensamentos por um momento, tão frágil que ela achava que se quebraria em mil estilhaços que a arrastariam de volta à agonia. Não achava que conseguiria esquecê-la, algum dia.
Lembrava dele todos os dias, normalmente em momentos em que não estava preparada para o impacto da memória. As coisas mais simples do dia a dia tinham esse poder sobre ela; a sensação de um livro em suas mãos, o som das ondas e o cheiro do sal, as gargalhadas de suas irmãs mais novas. Tudo de bom e gentil no mundo a recordava do sorriso caloroso de seu pai, do peso de sua mão sobre sua cabeça quando ele bagunçava-lhe o cabelo e dizia, com o leve sotaque estrangeiro que nunca tinha perdido: "Me dê um sorriso, Sif".
Me dê um sorriso. Essas quatro pequenas palavras, ainda que aparentemente simples, significavam uma infinidade de coisas para ela; eram afeto, encorajamento, ensino. Saudade.
Era impossível não sorrir quando se lembrava delas, mesmo que Sif tivesse todas as razões do mundo para não fazê-lo, naquele momento. Abriu os olhos, focalizando de imediato na sua perna que estava esticada para frente, repousada sobre um banco almofadado para que ficasse na altura de seu coração. Ao visualizar o tornozelo inchado feito uma ameixa, fez uma careta.
Sua visita aos Jardins havia sido requisitada pela sua mãe. Sif não havia se importado nem um pouco em cumprir com a tarefa; não havia lugar em Dorne que adorasse mais, e sempre era um prazer visitar seus jovens residentes, incluindo suas irmãs mais novas. Não fazia muito tempo desde que havia sido parte daquele grupo, e ao mesmo tempo, pareciam ter-se passado um milhão de anos desde então. Ás vezes vê-los a fazia se sentir velha e enfadonha, mesmo que o décimo sexto dia de seu nome ainda estivesse por vir.
A viagem desde Lançassolar não era longa. Se partissem cedo na manhã, chegavam no máximo ao anoitecer. Mas Sieglinde nunca tinha sido fã de cavalgadas, mesmo as mais breves, e ao mesmo tempo não estava disposta a se trancar numa liteira durante todo o percurso. Queria sentir o vento no cabelo, ver as ondas se quebrarem na costa, mesmo que isso lhe gerasse umas assaduras depois. Dessa vez, no entanto, as assaduras haviam se tornado o menor de seus problemas.
Seu corcel do deserto, como os demais, era acostumado ao terreno arenoso e ao clima árido sob os quais outros cavalos sucumbiriam rápido. Mas dessa vez pareceu não se atentar o suficiente e, ao descer um declive, perdeu o equilíbrio e, Sif, o controle de suas rédeas, sendo lançada para fora da sela e aterrissando desajeitadamente sobre um único pé que cedeu, dobrando
de maneira quase inumana para o lado.
Realizou o resto da viagem na liteira que trazia seus pertences e uma única serva, vendo o tornozelo inchar de um modo assustador enquanto tentava não demonstrar como a dor estava a consumindo. Seria mais fácil se fosse algo localizado, mas ela se espalhava em ondas por toda a extensão de sua perna, fazendo-a estremecer de tempos em tempos, apesar de seus esforços para manter a compostura.
Quando chegou nos Jardins, o sol só começara a se pôr, mas ela foi imediatamente exilada para a própria cama, onde o Meistre Alyn imobilizou sua perna do joelho para baixo e ditou que ela ficaria ali em repouso por, no mínimo, dois dias. Apesar da dor, ela bufara alto, um gesto que faria qualquer outro servo repensar suas atitudes. Mas não Alyn. Ele rira de sua reação, o homenzinho traidor.
Se havia alguém que entendia como o confinamento incomodava Sieglinde Martell, esse homem era o Meistre. Afinal, haviam convivido durante toda a infância dela e, quando ela havia retornado de Tyrosh, nada em sua relação parecia ter mudado. Ela ficara grata, inicialmente. Agora, irritava-se que ele ainda a visse como a garotinha imberbe que havia educado para ser a futura governante de Dorne.
Para seu desespero, ele realmente cumpriu sua palavra. Mas, no terceiro dia, ela havia conseguido convencê-lo a lhe dar alguma liberdade. Logo, nos dias posteriores ela pôde escolher um lugar para passar o dia que fosse diferente de seu quarto. Não podia se dirigir sozinha a ele, é claro, por isso era carregada por um dos guardas para onde quer que escolhesse; o arranjo inicialmente havia sido constrangedor, mas agora ela e o sujeito já pareciam ter se adaptado à rotina, e até trocado palavras e gracejos sobre isso sempre que ele ia buscá-la no quarto de manhã.
Cedo ou tarde ela teria que dar um jeito de se movimentar, de qualquer modo, pois na noite do terceiro dia de sua visita - e agora período de convalescença - um visitante havia chegado nos Jardins. E, como anfitriã, ela precisaria recebê-lo e fazer companhia a ele. Assistia da janela de seu quarto o céu estrelado quando, no horizonte, avistara a silhueta familiar de asas abertas.
No dia seguinte, quando desceu para o desjejum nos braços do guarda, o Meistre Alyn confirmou que Tessarion havia descido nos Jardins, somente para voltar a alçar voo na mesma noite. Seu cavaleiro, no entanto, havia ficado.
A vinda de Gaemon Targaryen foi uma surpresa agradável. Quando se encontraram naquela manhã, ele explicou que quando as notícias de seu pequeno acidente chegaram em Lançassolar, se disponibilizara para vir visitá-la e conferir como estava indo, apesar de todos confiarem que estava em boas mãos. Sif achou que talvez ele só quisesse vê-la.
O pensamento trouxe uma sensação nervosa ao seu estômago. Ela queria estar certa. Ou achava que queria, e isso a fazia se sentir uma tola. Gostava da presença de Gaemon, e achava que ele gostava da dela. Esperava que gostasse, porque ele a deixava ansiosa sempre que chegava perto. Havia qualquer coisa de inquietante na sua presença, no modo tranquilo como ele se movia e na maneira lenta que um sorriso sempre surgia em seu rosto, tomando conta dele aos poucos.
Ele a deixava inquieta só de olhá-la, e ela não sabia a razão. Por isso, sempre que ele tentava alguma aproximação, recuava, insegura. Mas pelas poucas vezes em que haviam interagido, achava que eram amigos. Pelo menos, conhecidos que se davam suficientemente bem para desfrutarem da companhia um do outro, como começou a acontecer quando ele chegou.
Normalmente se encontravam durante as refeições, onde era mais fácil manejar um diálogo na presença de outras pessoas. Gaemon a deixava descansando durante o resto do tempo, como devia fazer, e sempre que ela constatava sua ausência era invadida em iguais proporções por alívio e decepção.
Naquela manhã, ela se preparou para receber a percepção como no dia anterior, e no anterior àquele. Por isso foi pega de surpresa quando, ao terminarem o desjejum, Daemon se prontificou em levá-la até onde passaria aquela manhã. Levantou-a da cadeira como se não pesasse nada e, ainda assim, segurou-a com leveza, como se com medo de machucá-la de alguma forma.
Lembrando de toda a cena, ela se remexeu na cadeira, e olhou-o de soslaio, sentado no chão, encostado numa coluna próxima. Tinha uma das pernas flexionada junto do corpo, a outra esticada. Seus olhos se prendiam nas lagoas, onde as crianças brincavam, e suas feições pareciam relaxadas. Quase felizes.
Era bonito. Sif sabia disso, já havia percebido isso antes, mas naquele momento pareceu redescobrir o fato. Não tinha nada da beleza valiriana comum, mas era inegavelmente atraente. Seu nariz tinha uma curvatura alta, quase como se fosse um bico, e o cabelo reluzia no sol como ouro. Mas o que mais chamava atenção eram seus olhos.
Olhos oceânicos. O pensamento flutuou distraidamente até sua mente e, nesse momento, ele pareceu notar sua inquietude, pois se voltou para ela, o cenho levemente franzido.
— Está desconfortável? — essa era a primeira palavra que lhe dirigia desde que haviam vindo do desjejum. Se colocou de pé, prestes a checá-la, mas ela acenou com a mão.
— Não, está tudo bem. Só... A almofada está meio torta. — indicou o próprio tornozelo, ainda que não houvesse nada de errado. Só precisava de uma desculpa para seu remexer repentino.
— Ah, sim. — ele afofou a almofada em questão, tornando a se sentar onde estava antes. Então, quando ela achou que retornariam ao silêncio anterior: — O que faz para se divertir, Alteza?
— Para me divertir?
Parecia uma palavra estranha dirigida a uma mulher crescida. Ou melhor, para uma garota que vivia uma vida de mulher crescida.
— Faço as coisas de sempre. Leio, desenho um pouco, pratico arquearia.
Ele pareceu achar graça.
— Arquearia não é uma coisa de sempre.
— Para mim, é. — ela conjecturou, franzindo a testa. — E você, Sor, o que faz para se divertir? Além, é claro, dessas ocupações masculinas ordinárias de treinar no pátio.
— Não me divirto no pátio.
— O vejo muito lá. Seu desempenho é notável.
— Só porque me querem ali. — o rapaz respondeu, encolhendo sutilmente os ombros. Então pensou por um instante. — Gosto de voar.
Ela suspirou.
— Entendo bem por quê. — murmurou baixinho, mas ele a ouviu, porque pareceu conter um sorriso.
— Entende, é? Já teve a oportunidade de montar num dragão, Alteza?
— É claro que não. — ela disparou, irritada por ele ter prestado atenção em seu breve devaneio desejoso. Mas não parecia caçoar dela, somente estar curioso pelo comentário. Continuou, hesitante. — Imagino... Como deve ser estar lá nas alturas. Acima de tudo e todos, como se o mundo não significasse nada. Como se não houvesse limites para a liberdade.
Ele a encarava diretamente, atento a suas palavras. Seu olhar teve o efeito ordinário, fazendo-a prender a respiração, desejar fugir e se esconder. A analisava, olhando-a com uma certa curiosidade e mesmo algum fascínio. Como se tivesse feito alguma descoberta intrigante.
— Liberdade. — repetiu, solene. Então, lentamente, abriu um sorriso. — Têm descrições muito interessantes, Alteza. E acredito que se aproximem bastante da realidade.
Ela retribuiu com um pequeno sorriso, acreditando que suas palavras passavam de mera gentileza ou cordialidade. Havia algo de extremamente honesto nele, sempre houve. Talvez fosse essa honestidade que a deixasse tão inquieta quando próximos. Nunca sabia o que esperar dele e, ao mesmo tempo, sabia que qualquer coisa que viesse seria completamente franco. Ao menos em seu caso.
Passado o breve momento de identificação, o silêncio voltou a descer sobre eles. E ela não o rompeu. Não sabia se ele queria continuar a conversa. Havia se voltado novamente para as lagoas, reflexivo, e tornado a se esquecer de sua presença. Então, quando Sif já convencia a si mesma de fechar os olhos novamente, ficou de pé.
— Vou dar um mergulho. — disse.
Sif ficou um tanto estarrecida e, então, começou a rir.
— Você nem trouxe outra muda de roupa.
— Posso pedir para algum servo buscar nos meus aposentos. — ele respondeu, enquanto tirava as botas e o gibão. Por um momento ela ficou aflita, achando que talvez ele decidisse se despir mais, mas não foi isso o que ocorreu.
— Bom. Vá em frente e molhe seus pés. O assistirei com inveja.
Ainda com a camisa de linho e as calças, caminhou para a Lagoa Grande. Primeiro a água estava na altura de seus pés, então nos tornozelos, joelhos e coxas. Era alto e, por essa razão, quando alcançou o nível mais fundo onde nem as crianças mais velhas iam, o nível ainda estava abaixo de seu peito.
Sieglinde observou-o dar braçadas numa linha paralela ao horizonte, virando o rosto de tempos em tempos para respirar, fazendo com que as crianças gravitassem ao seu redor, curiosas e risonhas. Então ele retornou pelo mesmo caminho, sem desembaraço, saindo da água. O cabelo curto estava grudado na cabeça. Sorriu divertidamente quando percebeu que ela o encarava.
Sif desviou os olhos tardiamente.
— Disse que me assistiria com inveja. — Gaemon disse.
Ela realmente dissera aquilo?
— Ah, o que está fazendo? — indagou a Martell, de súbito.
Ele se inclinara e a pegara nos braços, com a mesma facilidade com que havia feito na sala de jantar. Dessa vez, contudo, sua pele estava fresca e exalava um forte cheiro de sal. Sif sentiu a umidade de suas roupas impregnando nas suas perfeitamente secas, e passou os braços em volta do pescoço dele, arquejando.
— Não. — pediu.
Mas ele tinha voltado a caminhar para as lagoas, e a maré parecia mais alta que quando havia saído. Devia estar prestes a mudar.
— Por que ficar perto do litoral se for apenas para sentar e observar? Melhor que tivesse ficado no quarto lendo.
— Ah, por favor. — implorou ela.
A essa altura ele já havia entrado na água, e Sif podia sentir os salpicos gelados em seus braços desnudos.
— Por favor, Sor, não me jogue na água. Não tenho nenhuma muda de roupa perto, não posso subir escadas. E parece estar frio.
— Está. — ele confirmou, sem dó.
A Princesa o agarrou com mais força ainda, apertando o rosto contra o pescoço dele e rindo incontrolavelmente.
— Pode parecer que estou me divertindo. Mas não estou. Por favor. Ah, por favor, Gaemon.
O valiriano a ergueu um pouco mais. E a segurou com firmeza. Um truque? Para lhe dar uma falsa sensação de segurança?
— Não vou jogá-la. — disse ele, em voz baixa em sua orelha. — Não seria tão cruel. Mas não há nada como estar aqui, ver a luz criar muitas cores e nuances na água, ouvi-la e inspirar seus perfumes.
Ele virou para a direita quando Sif ergueu a cabeça e então deu duas voltas enquanto ela ria de pura euforia. Estava mais fresco ali, embora não chegasse a fazer frio, ainda que ela suspeitasse que o calor do corpo dele tivesse alguma relação com o fenômeno. Sif perdera o gosto pelo mar desde a morte de seu pai. Mas os dois pareciam estar num vasto mundo cintilante e líquido, feito de pura beleza e nenhum perigo. O mundo pareceu encolher, até que fosse somente o calor, o som das ondas atingido a costa dornesa, e o cheiro da pele de Gaemon. Por baixo do sal, ele tinha cheiro de sol, como se passasse tempo demais sob ele, e ela pegou-se inalando aquele aroma silenciosamente. Sentia-se perfeitamente segura nos braços de alguém que sabia que não a deixaria cair, que nunca faria isso.
Ela o havia chamado de Gaemon, percebeu. Será que ele havia notado?
— Sieglinde. — disse ele, quando parou de girar.
Tinha notado.
Os olhares se encontraram, separados por alguns centímetros. Mas ela não conseguiria suportar aqueles olhos. Baixou a cabeça para descansá-la no pescoço dele novamente e fechou os olhos. Ele soltou um suspiro profundo, mas ela negou-se a respondê-lo. Não queria começar uma conversa. Queria apenas aproveitar as sensações que profusamente a preenchiam. Ergueu a cabeça somente o suficiente para apoiar a têmpora no rosto dele, e os dois contemplaram a água em conjunto. Conseguiria lembrar da excêntrica conexão estabelecida naquele momento? Ou essa percepção não passava de besteira de sua mente eufórica?
Após alguns minutos, como num acordo silencioso, Gaemon levou-a de volta para a margem, para a varanda, onde repousou-a no próprio assento. Assim que recostou-se, uma pontada lânguida percorreu toda a perna de Sif, dissipando por fim toda a magia do momento estranhamente íntimo que ocorrera há pouco. Ela franziu a testa e estremeceu, conforme a triste realidade de sua condição decaía novamente sobre seus ombros.
Não notou que ele ainda permanecia ao seu lado.
— Não gosto de vê-la abatida, Alteza. — Gaemon murmurou. — Ora, vamos lá. Me dê um sorriso.
Sieglinde levantou o rosto de súbito, encarando-o. Então começou a gargalhar. Explodiu de dentro dela num arquejar, como se não fosse planejado. Quando fôlego lhe faltava e o riso ameaçava cessar, outra pungente onda de felicidade invadia-a e deixava-a sem fôlego, fazendo-a ter certeza que se lembraria, sim. Para o resto de sua vida.
#extra#conto#game of thrones#got#a song of ice and fire#asoiaf#house martell#sieglinde martell#house targaryen#dorne
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MEME
eu rachei com esse feito por @robinsu, e o próximo capítulo vai sair logo, eu prometo e junto dele vai vir um conto também!
beijinhos <3
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Conto II
O segundo conto está entre nós! Escrito por Cloto sobre a Erinya Arryn.
Boa leitura!
Falcão E Serpente
Desde o falecimento da mãe e o novo casamento do pai Erinya sabia que a vida não seria mais a mesma no Portão Da Lua.
A preferência de seu pai por ela era muito óbvia para os outros filhos e sua madrasta. Harrion, seu irmão mais velho e Myke, o caçulinha da família não ligavam muito. Mas Havenna e seus outros filhos, Elyssa e Ellyot, se incomodavam demais.
A família se dividia, as brigas eram cada vez mais inevitáveis.
(...)
–Você vai largar a aula de costura de novo? - falou Elyssa com antipatia.
–Vou sim, odeio costurar. Prefiro treinar no pátio. Além disso, papai deixou.
–E o que ele não deixa quando se trata de você? - ela fala com amargura, deixando Erinya desconcertada enquanto a irmã saía para a sua aula.
Erinya decidiu deixar para lá e foi até o local de treinamento.
Pegou a lança dupla, a desmontando para se separar em duas partes.
–A lança de novo?
–Exatamente.
O Mestre De Armas a levou até Ellyot.
–Prontos?
–Sim! -gritaram os dois.
Erinya esperou. Seu irmão deu o primeiro ataque, que ela desviou usando sua velocidade. O segundo também, ele tentou ser mais rápido, mas Erinya também desviou de sua espada. Então com a cotovelo esquerdo ela acertou o braço do irmão, o fazendo gritar de surpresa e dor, enquanto com a esquerda ela atingia a mão que segurava a espada, o forçando a soltar a arma. Então pôs as duas partes da lança em seu pescoço.
–Parece que eu venci, irmão.
–Não vale! Você trapaceou!
–Na verdade ela não trapaceou, pequeno senhor Arryn. Por que são duas pequenas lanças contra uma espada. Você subestimou a velocidade de sua irmã e se esqueceu que em um campo de batalha seus inimigos não vão se importar com regras. Não se esqueça disso da próxima vez. Pode ser a diferença entre vida e morte no campo de batalha.
Symon observava de longe, satisfeito.
Decidiu chegar mais perto e bagunçou o cabelo de Erinya.
–Parabéns minha princesa. Sua mãe estaria orgulhosa de você. -ele disse com carinho.
Ela viu Havenna olhando para eles, com uma expressão sombria.
(...)
Naquela noite Erinya foi dormir com tranquilidade.
Enquanto se remexia na cama, sentia algo se mover ao redor dela.
Quando abriu os olhos, viu uma enorme cobra preta sibilando, pronta para dar o bote.
Ela não sabe como, mas conseguiu agarrar a cobra pelo pescoço impedindo por um triz que ela a mordesse.
Ela gritou, lutando contra a cobra que se enrolava nela.
A cobra tentou mais uma vez picá-la, passando por milímetros perto de seu nariz, e ela aumentou o aperto na garganta da cobra, que por sua vez a apertou com mais força como reação.
Assim foi até seu pai e Harrion invadirem finalmente seu quarto.
Aí ver a cena, Symon puxou uma faca do bolso e atingiu a cobra com um golpe na cabeça, a matando.
O aperto se desfez e ela finalmente pode respirar com alivio, enchendo seus pulmões doloridos com ar.
(...)
–Como uma mamba negra entrou no quarto de Lady Erinya? -indagou um criada para outra.
–É meio óbvio não? -provocou outra. - Do nada aparece uma cobra venenosa? É claro que lady Havenna pôs uma das suas parentes lá!
Erinya também suspeitava. Estava óbvio no olhar frio e irritado da esposa de seu pai.
Bom, ela estava de olho na mulher de agora em diante. Ela sempre estaria um passo atrás com a madrasta.
Mas Havenna que não tentasse de novo. Erinya é um falcão. Se Havenna queria bancar a serpente venenosa era melhor tomar cuidado.
Falcões devoram cobras.
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Recomendação
Enquanto não temos novos capítulos gostaria de apresentar a todos uma outra história maravilhosa no universo de ASoIaF.
https://fanfiction.com.br/historia/795964/Sands_of_Time/
Eu recomendo a todo mundo ir lá dar uma olhadinha nessa lindeza!
@noxiousfemme
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