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BRUXARIA CONVENIENTE
“Nós somos as netas das bruxas que queimaram não sei quando”.
Com todo respeito à nossa ancestralidade, que por sinal viver forte por aqui, que canseira dessa romantização. Será que estamos mesmo dispostas à “bruxaria”? Já experimentou os ônus do processo, ou só quer meter discurso instagramável?
Serviço não é dom. É de dentro para fora, e a reforma demora. Cada passo dura uma dureza. Ele custa a quem o presta e não deve cobrar de quem dele precisa. Não há mérito, mas há a escolha de trabalhar ou não, levar adiante ou não (salve a bênção do livre arbítrio). Bruxaria (e seus outros nomes - eu aqui me valho da significação), portanto, é somente sobre servir.
Mas saber (e saber-se) pode machucar horrores. “Não, é melhor não mexer nos traumas, já faz tanto tempo…” - pois não há bruxaria possível. Não existe espiritualidade saudável que não esteja vinculada ao genuíno desejo de se conhecer, a um profundo compromisso firmado consigo mesmo: melhorar-se. É preciso escancarar as janelas e deixar que o Sol da consciência invada a casa e ilumine tudo, inclusive a escuridão. O dia revela “A Noite Escura da Alma” (João da Cruz), primeira parte que nos cabe deste latifúndio.
Quer saber se é bruxa? É preciso duvidar muito de si mesma. Então, frequente regularmente um psicólogo, relate com honestidade suas supostas experiências. Vá a um, dois, três psiquiatras, ouça o que a ciência diz sobre elas. Vá também aos centros espíritas (terreiros, templos, igrejas), converse com médiuns experientes, não pague por isso, escute o que eles tem para dizer sobre você (muitas experiências se assemelham). Quando médicos e sérios religiosos confirmarem o que se chama de mediunidade ostensiva (existem muitos tipos), então, comece por baixar a cabeça e se despir do ego (ponto fraco dos bruxos, magos, sacerdotes, etc). É preciso sempre lembrar que você não é superior a ninguém, nem foi escolhido a dedo pelas divindades. Trata-se, apenas, de uma escolha pré-encarnatória que você fez para acelerar o seu processo evolutivo, e ajudar na evolução do mundo através do serviço prestado às pessoas.
Lute para fazer o bem, sabendo que a força (neutra) que carrega pode construir, bem como destruir, tudo que há dentro e fora de si. Estude (não importa o método escolhido, no fundo, todos eles caminham para se encontrarem em um mesmo ponto). Faça cortes necessários para manter a sua saúde, são miliuma concessões. Abdique dos excessos, largue vícios, cuide da tríade mente-corpo-espírito de forma regrada. Suporte a energia dos lugares e das pessoas atravessando a sua sem dó (ou recolha-se um pouco). Conviva com a enxurrada de informações que lhe invadem através dos sonhos, percepções e outros meios, muitas delas absolutamente desconfortáveis. Saiba que máscaras bonitas cairão, a começar pela sua. Atente em não alimentar preconceitos, apesar de sofrê-los. Evite julgar mesmo sendo julgada/o. Não pratique bullying, mas aguente os dedos apontados. Chore, mas resigne-se. Compreenda o gaslighting de alguns e tenha compaixão por quem faz disto uma prática para se manter protegido/a. Para ser bruxa neste mundo, parece-me que a lição n. 01 é passar pela fogueira.
Dado isto, quero ver quem queira.
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HOJE EM DIA
Sei que para cada homem mediano há, no mínimo, sete mulheres de respeito. Dizem que o homem moderno gosta das mulheres trabalhadoras. Sinto que, dentre as trabalhadoras, elege a mais trabalhadeira para o sacramento do amor sem fim, a fim de que ela trate de não se ocupar do amor e assim não lhe dê trabalho.
Sei que o homem mediano - e moderno - gosta das mulheres que andam vestidas de dignidade. Tão moderno, afina-se às que se esforçam, na labuta dos dias, em causas nobres. Ofícios que fortalecem os músculos do mundo, tais como medicina, advocacia, engenharia, política. Tão mediano, mediante suposto encantamento, flertam vez ou outra com as artistas. Contanto que a arte não as revele escandalosamente artistas. Contanto que não sejam dadas à poesia. Contanto que seus olhares não estourem em rubro sangue, novo ou velho. E que a Beleza dos seus métodos caiba com folga em um hall de hotel, ou em uma sala de esperas de um consultório de psicologia. Um amigo me disse a verdade: artista é quem faz dinheiro. Acho que o homem moderno - e mediano - deve adorar temas florais, paisagens, natureza morta. Talvez não se dê conta de que toda mulher, mesmo as de respeito, é uma florzinha murcha, desde a nascença, compondo a trama de uma paisagem inválida. E eis a sua natureza (viva).
O homem mediano, para ser moderno, precisa gostar das mulheres que vivem rodeadas de amizades frívolas, rejeitando constantemente o grito coeso de suas próprias percepções, sacrificando a bruta harmonia do caos interior em nome da colação de grau, do ménage à trois, do carnaval fora de época, da confraternização da empresa. Não sentindo não sentindo não sentindo - aquilo que não tem nome e que a umas e outras é dado de presente em segredo, presente de grego, e que a estas só lhes resta aceitar.
O homem moderno, para ser mediano, precisa gostar das mulheres que diluem suas dores no álcool, mas não o bastante ao ponto de fazê-las sentar-se à mesa do bar sem delicadeza trajando minissaias. É preciso que elas tenham o corpo tão liso e a mente tão sã, e que não fumem cigarro porque o cheiro do cigarro é horrível, e além de tudo o cigarro mata - assim como a vida mata, mas disto ele se esforça em não lembrar. O homem gosta, dizem, das mulheres que fazem a própria comida, feito sua avó. E que nunca se esquecem de alimentar os gatos, feito sua bá. E que ao dormirem não adivinham eventos que se sucederam às escuras, feito sua bisa. E que acordam tão repugnantes e belas quanto sua mãe. E que amamentam por longuíssimos anos o seu filho, seu filho homem, mas cuidam em não deixar cair o seio sobre seu sonho de verão. E que lhe disponham dos corpos em ruína para que ele não se sinta oprimido, mas que saibam gozar com ele para que não se sinta opressor.
O homem mediano gosta das mulheres que soam adequadas para um jantar em família, tal como o piano no canto do salão do estaurante: nem tão tímido ao ponto de se fazer ausente, nem tão obsceno ao ponto de comprometer a hora sagrada. Gosta das mulheres que pensam feito flauta doce. E, no quarto, das que dissolvem a boa conduta em líquidos límpidos, urgentes, agudos, tal como uma guitarrinha (há alguma obsessão masculina por instrumentos musicais; rapazes nunca se demitem da alegria juvenil da bandinha de garagem; dentro de cada homem mediano há um jovem astro sempre a despontar).
O homem moderno parece gostar das mulheres que não minguam. Que dormem tarde, companheiras de astúcia, e que se levantam às seis para fazer ginástica, antes de partirem, beijando-lhe os olhos, rumo às atividades cotidianas, quase atrasadas (o quase é o grande charme das moças inteligentes, pois viver tão verdadeiramente faz com que assumamos ares de megera, ou de fracasso, ou de tormento). Os homens modernos gostam das que saem de casa com os cabelos molhados, deixando pelo corredor o rastro perfumado de um shampoo invulgar; e que à noite voltam inteiras para os braços do marido meio-mole-meio-rijo; e que no cerne da madrugada, por motivos tantos, choram baixinho defronte ao espelho do banheiro para não acordá-lo.
Sei que o homem mediano moderno gosta das mulheres declaradamente trabalhadoras. E ai daquelas que travam certa batalha invisível, para aplacar outra espécie de fome, cujo afã consiste em golpear na própria barriga, diariamente, o monstro triste do trauma, encarando-se sem máscara: violadas, ultrajadas, rejeitadas, assombradas, derramadas no chão umbralino de uma infância - que tanto perdura, meu Deus.
#prosa poética#poesia#arte#literatura feminina#amandamoraes#cronica#crônica brasil#crônica#texto autoral#texto feminino#mulheres que escrevem#literatura feminista#literatura#saúde mental
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ÁRDUA
põe seu ouvido em meu peito
e escuta:
vivo em função do Desejo
e o Desejo também é labuta.
compreenda
quando houver pedras, suores, lampejo.
e sorria:
a labuta também é Desejo.
põe seu ouvido em meu peito.
percebe:
no túmulo onde nasce a dor
renasce a verve.
(2009)
#poesia#arte#literatura feminina#eu_a_mo#amandamoraes#poema#mulheres que escrevem#mulheres na poesia#poesia feminina#poeta
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CASTELO DE AREIA
vã e velha estrutura branca
que teima em me manter presa, vermelha:
tudo se desfaz em cinzas.
eu quero o negro vão do diastema
no sorriso amarelo do meu filho,
eu quero a senda azul do futuro.
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CHAPEUZINHO VERMELHO
não contente, o lobo voltou.
sem feiúra que o distinguisse dos outros lobos que fora,
sem clara violência que o condenasse em definitivo às amarras do meu asco.
carrasco, como sempre. mas pungente como toda a gente
que vive ardendo e rezando, escravizada em meus espaços subterrâneos
(pois há nas frias cavernas do meu corpo morno
vinte e duas operárias mal pagas, trabalhando duramente
para comover de incertezas este mundo de crenças ensimesmadas).
sim: não satisfeito, o lobo voltou.
usando óculos escuros, muito branco e fatigado, mas
exalando ainda o que lhe sobrara do cheiro da maldade,
disposto ainda a proferir um último golpe de língua.
contra mim, contra mim, deus meu - logo eu, logo eu
que me pusera a estudar em segredo
a ciência das sendas de sua dialética maliciosa.
ele falava de Chet Baker enquanto eu o ia compreendendo.
sob a farsa daquela úmida floresta de pelos havia um único e sincero apelo:
que eu guardasse no meu coração a sua sequidão,
a sua solidão etílica, a sua doença fálica,
a festa falaciosa de um menininho desamparado.
o lobo deve ter sorrido, insistindo na mentira da matéria.
e, despedindo-se ligeiro, disse-me, com sua imensa boca de lobo cerrada
(mas deixando escapar pelas brechas da dentição
uma baba que falava, articulada): estamos sempre fadados ao fim.
talvez, ele quisesse ser revelado. talvez, quisesse ser parido por mim.
e foi por isso que me privei de lhe mostrar a força do meu ventre:
porque estaria, estupidamente, entregando-lhe nas mãos a minha glória,
quando ali eu queria lhe dar, sabiamente, a minha burrice,
a minha preguiça, a minha desonestidade.
não cuspi o menino nas fuças do lobo - meu jeito de devorá-lo.
deixei-o afogar-se em sua própria seiva lamacenta de dúvidas,
fazendo, assim, com que ele pendurasse em minha parede uterina mais uma dívida.
pois que agora quero falar com você, lobinho
(lobo mau, tão mau, tão bonzinho): sim, eu o sei.
apesar do meu modo de vida vermelho, e da cesta cheia de frutas podres,
eu também sou lobo. e, em um dia de escandalosa fome, engoli a minha avó.
hoje, com a perícia ancestral de quem carrega uma velha na barriga,
posso farejar a sua presença dentro de qualquer silêncio.
-
(texto e ilustração de amanda moraes)
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A ROSA REAL
estou solta dentro
desta hora triste.
estou triste mas solta,
feito uma estrela.
morta mas viva.
estou triste dentro
desta hora solta.
esta hora estrela
em que a máscara
do mundo
não resiste e cai.
a máscara minha,
a máscara do mundo,
mundo triste,
vivo mas morto.
mas estou solta solta
nesta hora pálida pálida
feito a flor verdadeira.
sem estrelas,
infância nenhuma,
muitos algozes,
um só herói.
herói só,
triste mas vivo,
vendo o mundo
solto mas morto.
feito a verdadeira estrela
olhando a flor pálida
sem a máscara infantil.
como é vil, por vezes,
a face do mundo.
como é terrível ver
o que se viu.
-
(certas horas, quero voltar.
ter de novo nas mãos
a rosa tingida da infância.
viver um pouco mais a mentira
da beleza sem espinhos).
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CRIME DELICADO*
Do meu espírito, o veneno.
Lambes o miolo do tutano, róis o osso.
Sei que sonhas não somente a fruta, o feno,
mas também o pólen do meu seio insosso.
Há dura paisagem nas minhas euforias.
Sigo sendo a parte escarlate do amor.
Por vezes, mulher das mais sombrias.
Vazia, vou esperando um deus me recompor.
E ainda assim, sábio e ciente
dos meus horrores angulares, meu vil desprazer,
abres com a devoção de mil altares clementes
a tua imensa boca de me ver.
És meu espanto diante de mim mesma, aberta.
Refletida, encontro-me na prata da tua bandeja.
Viajo em teu braço e a tua veia me acerta:
nosso sangue se alinha sob um céu que lampeja.
Tu me desvendas e me matas e não paras.
Para decifrar a existência da flor, não te agüentas:
Passas a faca nas minhas partes mais raras,
salivas abrindo sulcos em minhas suculentas.
Tu, assim, no pós-atentado, em contrassenso
(eu vazando e te irrigando com meu suco cítrico),
vês em mim a graça d’um pássaro feio denso:
do meu veneno, o espírito.
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(Poema escrito aos 17 e mexido aos 32. De lá para cá, muita coisa não mudou).
*Crime Delicado (2005): filme brasileiro dirigido por Beto Brant, baseado no livro de Sérgio Sant’Anna.
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MISCELÂNEA
A pluralidade me emociona. Seres são de diferentes maneiras de ser. Por isso, talvez, eu mesma resista em ser apenas uma, e mais ainda resista em ser um conjunto de várias igual aos outros conjuntos de tantos. Encontramos semelhantes, com eles partilhamos identificações, mas jamais seremos idênticos - e são os detalhes, tão particulares, que definem a nossa assinatura no mundo. Ainda que haja coincidências no caminho, cada pessoa se acede e se apaga por suas próprias razões. Para mim, é o lindo da vida.
Embora a ideia de estar sempre compactuando com os outros seja muito sedutora, porque me encontrar em alguém parece autenticar o meu ego, o mundo não precisa ser o meu espelho, tampouco eu pretendo ser o espelho do mundo. Ao contrário: sou autêntica quando consigo chegar à minha essência. Estamos aqui, também, para que consigamos aprender a compreensão através do que nos distingue. Afora as lutas sociais coletivas, verdadeiramente necessárias, toda padronização me soa tóxica. Um desserviço emocional, que nada nos ensina além do delírio desesperado do pertencimento. É bom se sentir acolhido. Mas pertencer a que? Para que? Por que? Qual rei mandou?
Desde menina, nunca pertenci a nada nem a ninguém. A indefinição seria então o meu caminho. Nem branca, nem preta, nem indígena. Doida, mas sã (ou sã, mas doida). Nem puta, nem santa (mas puta, e também santa, a depender de quem definia). Sexualizada, mas romântica de dar dó, coitada. Burra e sabida, dependendo do parâmetro. Os poemas que eu, adolescente, escrevia, já ouvi que “só podiam ser traduções de poemas gringos”, não podiam ser meus, já que eu parecia meio superficial, contente da vida. Mas, ao mesmo tempo, um tanto melancólica para se dizer “feliz”. Profunda ou exibida? Intelectual, jamais; artista, tampouco, já que eu não ganhava dinheiro com arte, não movimentava máquina nenhuma. A palavra que mais escutei sair da boca dos homens: exótica. “Exótica”, no dicionário, quer dizer “estrangeira; importada”. Mas estrangeira eu também não era (inclusive, se o Brasil tivesse uma cara, bem poderia ser a minha).
Enfim, nunca pertenci a coisa alguma. E deve ser por isso que, quando eu era pequena, o meu avô, homem bastante sensível, apelidou-me de “absoluta”, o que, no dicionário, significa “que se apresenta como acabada; plena”, e também “que recebeu absolvição; perdoada; inocentada”. Porém, eu não me perdoava por me sentir meio oca por dentro, e a luta constante que travei comigo mesma, para caber dentro de alguma coisa que eu nem sabia o que era, veio me adoecendo ao longo dos anos. Eu queria ter dito ao meu avô que a tal plenitude demoraria mais que o esperado, que o que ele já via em mim, na verdade, era um vislumbre. Custou. Agora, talvez, comece a entender que o vazio também é um lugar de pertencimento. Aprendo que os desejos variam.
O prazer de cada um de nós mora em casas - para não dizer países, para não dizer mundos - diferentes. Somos, então, singulares, e mesmo quando somos a soma de referências, nunca há uma soma igual a outra. O que me faz feliz pode não fazer o meu amigo feliz; o que completa o meu amigo pode não me completar - e eu não preciso estar socialmente distante do outro para que essa diferença se acentue. Às vezes, dois irmãos, nascidos do mesmo pai e da mesma mãe, que tenham recebido a mesma educação e as mesmas oportunidades, crescem e se tornam pessoas totalmente opostas.
Não existem regras para existir, a não ser aquela, básica, do respeito que se deve ter em meio à essa mistura toda. A aceitação do outro começa na aceitação de si - mas, se não sabemos quem somos, como poderemos aceitar o que somos? E, se nada somos - ou a nada nos julgamos pertencer, como é o meu caso -, por que não instituir o “nada” como sendo a própria coisa?
Chamavam-se “alternativos” os que não eram “estes”, mas “aqueles”. No boom da contracultura, isso ficou mais evidenciado: eram os que quebravam as regras estéticas vigentes, ditadas pela burguesia, e rompiam com a regularidade de suas famílias de classe média. Hoje, o lugar-comum mediano continua comum e mediano, e tudo o que era “diferente”, “alternativo”, parece-me, a cada dia, ganhar ares de reprodução. Vão todos aos mesmos locais. Falam todos sobre os mesmos assuntos. Vestem-se, inclusive, de modo muito parecido. Mesmo corte de cabelo. Mesmas músicas na playlist.
Parece óbvia esta discussão, mas é tanto o quanto ainda se mata e morre, literalmente, por conta das diferenças. É tanto o quanto vão se apagando singularidades, às vezes em um discurso despretensioso. É tanto o quanto vamos nos enlatando para que caibamos em espaços cada vez mais estreitos. São muitas as exigências sociais. E é enorme o quanto que, assim, vão-se embora potencialidades e belezas genuínas. Inconscientes, passamos a nos violentar, em troca de um “fazer parte” bastante injusto. A vida é muito mais bela em sua vastidão. Comportamentos, gostos, estilos, corpos, sonhos, vivências, alegrias, abismos - mundo mundo vasto mundo, como é vasto este mundo, já dizia o poeta, e mais vasto ainda é mesmo o nosso coração.
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#quaseumaredaçãoescolar
#textinhoinocente
#amandamoraes#eu_a_mo#mulheres que escrevem#literatura#cronica#crônica#crônica brasil#desabafo#pensamentos#pensamento#quaseumaredaçãoescolar
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PALAVRA-CHAVE
vejo que velho você vem vultoso
tentando tirano trazer à tona o trato
cavando a cova que nos coma e consagre
não sou a sanha do seu sonho solto
não sou da seita do seu santo sado
mas sou a senha para o seu milagre
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(brincando de letrinhas) :)
#poesia#arte#poema de amor#amandamoraes#eu_a_mo#poema#poesia feminina#literatura feminina#palavra-chave#poesia brasileira#palavras
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E SE NOS AMÁSSEMOS?
suturaríamos velhas
e abriríamos novas
feridas.
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#poesia#arte#poema de amor#poema#eu_a_mo#amandamoraes#literatura feminina#mulheres que escrevem#literatura#literatura brasileira#amor#feridas#poesia brasileira#poesia feminina
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ANTENA
Quem é sensível é sensível em todos os sentidos, por inteiro. Os orifícios vivem escancarados, todas as vias suscetíveis e passíveis de serem violadas. É-se sensível com o corpo, com a mente e com o espírito - o que chamo carinhosamente de coração. Quem é sensível tem que andar com cuidado pela vida - o riso é muito risco: pode-se acabar chorando; o choro é o ponto de onde se pode começar a sorrir. De um jeito ou de outro, está-se sempre em um estado de meio desespero, indo de vez em quando no banheiro para fugir um pouco do excesso de mundo. Quem é sensível é uma antena, captando o bem e o mal de tudo, as mais terríveis penas; compreendendo com certa facilidade o não-dito; deglutindo dores que não são suas - além das suas, que já são tantas. A mulher sensível parece tonta, ou louca, ou santa, mas, na verdade, trata-se de uma sentença: ser sensível é pura matemática (estranha): a soma de todas as almas, a soma da minha alma + a tua. O corpo explode em somatização, parece adoecido, parece perder a razão, mas é que ler as entrelinhas dói muito, dói mais que a crueza de um texto ruim em retidão. Saber a saída de um discurso labiríntico é deserto insuportável, então, a cabeça, algo tão maliciosamente frágil, logo processa o que a alma lê, e a carne, última instância de todos os estágios, responde em naufrágio (todas as partes estão em profunda conexão). Quem é sensível tem que andar com cuidado pela vida, e eu não andava com cuidado, somente andava pela vida, forjando um jeito de dureza que eu não tinha. Até que consegui, um dia, assumir para mim mesma a minha pequeneza, a pequeneza dos fracos-fortes, que é diferente da grandeza dos fortes-fracos. Entendi que precisaria ser um pouco sozinha, isto é, retirar-me, às vezes, dos espaços; porque eu não era aquela outra, de aço; e precisava me ser, deste meu jeito elástico, isto é, serena e cuidadosa com a vida - nem que para isto parecesse menos viva, nem que para isto parecesse só o pó. Porque, na realidade, sou muito viva, isto é, estou longe de ser uma florzinha morta, isto é, sou sensível de dar dó. Sensível com todos os sentidos, por inteiro, do fio coronário aos pés do poema vermelho: a sensibilidade é quase sempre assim uma coisa
só.
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#poesia#prosa poética#arte#literatura feminina#eu_a_mo#amandamoraes#sensibilidade#sensível#poesia en prosa#prosa#intuição#mulheres que escrevem#literatura brasileira#literatura
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ESFINGE
Quanto mais tentares me definir,
mais ágil escaparei, a seguir
por entre as brechas da tua razão.
Minh’alma verte em verde escorregadio,
sou um bichinho bem vadio,
não entro em rota de definição.
Dia cinco, cuspiram-me camaleônica.
Vim à vida anacrônica.
Estado de permanência - transição.
Quando me pões o nome que tu sabes,
tenho o nome que calas, mas te cabe:
teu cinema mudo em exibição.
Impossível me alcançares…
Não por eu ser imensa, mas densa,
e a densidade é natureza indiscriminada.
Enquanto me decifrar fores tentando,
vais tu mesmo te devorando:
sou tua esfinge antropofágica.
Se cada ser me vê de um jeito, ao seu modo,
Rarefeito em deserto me desdobro:
quem é tudo decerto não é nada.
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(a.mo)
#poeta#poetas#literatura brasileira#esfinge#deserto#poema#poemas#poesia autoral#autoral#poesia feminina#mulheres que escrevem#saúde mental#poesia feminista
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instagram
#poesia#mitologia#arte#poema de amor#eu_a_mo#literatura feminina#amandamoraes#literatura feminista#mitos griegos#mitos gregos#ulisses#mulheres que escrevem#poema#Instagram
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A POESIA É UMA EGRÉGORA LABIRÍNTICA ONDE EM TUDO HÁ ESCRITO EM NEON: SAÍDA
sigam-me os bons,
os maus também:
quem se perdeu.
todos são bons,
todos são maus,
todos são meus.
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estou sempre nascendo e parindo. nossas mãos são férteis, quando as bem usamos. com elas eu crio: desenho, escrevo, abro cartas, sou artesã da vida. dou vida. há quem com elas cure gente, cure bicho, faça uma petição, liberte pessoas, traga neném ao mundo, plante & colha, toque instrumentos, alivie tensões musculares. através delas, vem o carinho. por elas acesso o meu ouro de dentro. nelas estão as linhas (in)certas dos meus (des)caminhos.
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(fotografia ilustrada de Amanda Moraes,
disponível para venda, impressão em FineArt).
#ilustraçaodigital#ilustrações#fotografiailustrada#fotografia#textos#mãos#poesia#ilustradora#ilustrador#procreate#arte#artedigital#art#poetas#literatura brasileira#ilustracao#ilustração#arte feminista#artecontemporanea
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DOMINGO
uns vão à missa, santos
outros dançam, tontos
todos esperam
um deus chegar
ele não vem
e manda dizer
que um deus nunca chega
aonde já está
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(fotografia ilustrada e poema
de Amanda Moraes)
#literatura feminina#poesia#fotografiailustrada#eu_a_mo#arte#mi poema#poemas#mulheres que escrevem#amandamoraes
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