#pisar fora ja pisou rsrs
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O silêncio na borda do abismo era tão profundo que Gabriel quase podia ouvir seus próprios pensamentos ecoarem, multiplicando-se até se tornarem ensurdecedores. Ele andava pela linha tênue como um funâmbulo condenado, cada passo guiado por um equilíbrio que parecia mais uma maldição do que uma dádiva. O Caos o chamava como um velho amigo perdido, sussurrando promessas de liberdade, de ruptura, de verdade crua e sem ornamentos. E ainda assim, a Ordem o prendia, um grilhão de responsabilidades que apertava mais a cada dúvida que ousava nascer.
Can anybody hail themselves a preacher?
Ele já havia visto muitos. Homens e mulheres proclamando verdades que mal compreendiam, segurando tochas que iluminavam apenas seus próprios rostos. Ele também havia falado em nome de algo maior, tantas vezes que as palavras às vezes lhe pareciam pedras — pesadas e ocas. Como saber se o eco de sua voz era a verdade ou apenas mais um som perdido no vento?
Can anybody call themselves a saint?
Santidade. Era um conceito que sempre o cercava como um manto pesado, mas Gabriel nunca se sentiu digno de vesti-lo. Os santos eram aqueles que sofriam pelo bem maior, que encontravam glória no sacrifício. Mas e aqueles que duvidavam? E aqueles que se perguntavam, no silêncio da noite, se o sacrifício era mesmo necessário?
Can anybody call themselves a healer? Can anybody really make you safe?
Ele havia curado feridas, físicas e emocionais. Mas sempre havia uma que ficava de fora, uma que não podia ser alcançada pelas mãos de um arcanjo. Como se pudesse ouvir o choro abafado de um mundo que continuava a se despedaçar, mesmo com todos os seus esforços. Quantas vezes ele havia prometido segurança, apenas para ver o chão ruir sob os pés daqueles que confiavam nele?
Can anybody look up at a leader and find a world that's full of faith?
Gabriel olhava para Miguel, como sempre fizera, e via a força de um líder que não era inabalável. Ele via as escolhas difíceis, os erros nunca admitidos, as razões mascaradas pela autoridade. Miguel fizera o que acreditava ser necessário, mas, aos olhos de Gabriel, isso nem sempre significava o que era certo. O que restava, então, para ele, um irmão que oscilava entre apoio e questionamento, que carregava as próprias falhas enquanto buscava uma luz que parecia sempre distante?
Can anybody call themselves a saviour in this world about to break?
Salvar era uma palavra tão pesada quanto qualquer outra que ele carregava. Ele podia sentir a fragilidade do mundo nos ossos, o desespero pulsando como um coração prestes a falhar. Ser um salvador implicava em assumir que havia um caminho certo, uma escolha que apagaria todo o sofrimento. Mas ele sabia — oh, como sabia — que as escolhas eram tantas quanto as estrelas, e cada uma delas vinha com um preço.
Havia um momento, um espaço entre batidas de asas e suspiros, em que Gabriel se via imóvel, como se o próprio tempo o tivesse abandonado. Era um instante tão breve e tão vasto que parecia conter o peso de eras, uma eternidade comprimida em um único fôlego. Não havia um limite claro entre ser e estar, entre cair e levantar. Ele existia em uma interseção onde todas as verdades eram relativas e todos os caminhos, bifurcações. Cada escolha parecia uma pedra lançada ao mar, o impacto ecoando em ondas que ele jamais poderia conter. E nessas ondas, ele sentia o reflexo de possibilidades perdidas, de futuros que nunca se concretizariam. Era uma dança constante entre o inevitável e o evitável, uma luta contra as correntes de si mesmo.
O peso de cada passo que dava era quase sufocante. Cada decisão tomada ou adiada parecia carregar uma gravidade única, como se o próprio universo segurasse a respiração. Ele sabia que sua queda, caso acontecesse, não seria abrupta, mas lenta e cheia de significados, carregando consigo todas as escolhas e não-escolhas que o levaram até ali. Havia um precipício invisível sob seus pés, e nele, era impossível distinguir quem julgava e quem era julgado — o reflexo no espelho ou o homem por trás dele? Talvez ambos, talvez nenhum. Ele se perguntava, em meio ao silêncio, se a linha entre justiça e hipocrisia era tão tênue quanto a que ele caminhava.
A linha onde ele andava tremia, ameaçando se partir a cada momento de hesitação. O Caos sorria de um lado, braços abertos, um convite sedutor envolto em promessas de liberdade e autodescoberta. Do outro lado, a Ordem permanecia imóvel, seu semblante tão calmo quanto opressor, o peso das responsabilidades tão inescapável quanto um juramento antigo. Gabriel parou, olhos fixos no horizonte infinito, onde céu e terra se misturavam em tons indistinguíveis, criando um borrão de possibilidades.
Talvez fosse isso. Talvez o equilíbrio não fosse uma escolha, mas um eterno estado de ser. Uma corda bamba que nunca cedia, mas também nunca oferecia descanso. Ele não era um pregador, nem um santo, nem um curador. Não era um líder, nem um salvador. Era apenas Gabriel, o eterno viajante da linha, condenado a andar, passo a passo, até que a própria linha desaparecesse e ele finalmente encontrasse o que quer que o aguardasse além dela. Mas será que ele realmente iria se contentar apenas com isso?
#divagações apenas#o minimo vai começar a derrubar a bacia#pisar fora ja pisou rsrs#se alguém quiser o gab menos angelical é só falar rsrs
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