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Growing Pains: Noor Klein
Avisos: todas as referencias que eu tenho sobre pessoas atípicas, são em cima das pesquisas e artigos que eu li da área, e pra desenvolver esse e demais plots, que debatem diagnóstico de autismo em meninas e como eles são completamente diferentes dos de meninos, eu estou me guiando principalmente em relatos de pessoas com o diagnóstico e psicólogos que vem se especializando sobre. Então pode, e vai, conter muitas coisas que eu só interpretei.
Espero que seja didático e interessante, além de legal de ler, claro. Só não é um debut porque a personagem no geral é um experimento meu, mas faz parte da linha das nossas novas rodinhas.
Meus amigos e meu namorado se levantam dos pufes e sofazinhos da sala de espera da Dra.Cravalho, e pareço ter acabado de correr uma maratona.
Minhas mãos estão suando, estou sentindo dificuldade de respirar e meu cérebro não para de girar e girar entre todo tipo de dúvida e perguntas sobre o que acabou de acontecer.
Será que eles perceberam que eu não estava ouvindo?
— Noor.
Será que eles perceberam que eu estava entediada?
— Noor…
Será que eles perceberam que não estou animada pra isso?
— Noor?
Será que perceberam… Qualquer coisa?
— Noor! — Percebo que minha psicóloga não gritou de verdade, porque está com aquele sorrisinho sutil e gentil que percebi que ela sempre tem, mas soou tão alto na minha cabeça, que me pergunto onde é que eu fui parar.
— Quem eram aqueles?
— Meu namorado e os meus amigos, aqueles que te mostrei naquele dia. Estão na cidade pra me ver.
— Você parecia super animada, vão fazer algo hoje? — Dra.Cravalho pergunta, uma mão apoiada nas minhas costas.
— Eles querem ir a um show ou coisa assim. — Respondo em um tom monótono, antes de completar muito diretamente, me afastando do afago dela. — E são eles que estão animados. Eu não.
No carro, eles escutam mais músicas daquela banda que eu não suporto, mas não quero dizer que eu não gosto, porque eles gostam e estão cantando todos juntos e eu não quero atrapalhar. Fico nervosa por causa dos instrumentais e do volume muito alto, então começo a contar na minha cabeça, nunca querendo tanto estar dentro de um shopping em toda a minha vida.
— Acho que você sabe porque estamos aqui de novo. — Liana começa, me oferecendo uma garrafa de água que aceito por educação. — Seus pais e seus professores acham que seu interesse no seu curso continua caindo.
— Em minha defesa, eu não perdi o interesse em ser musicista, e muito menos em ser pianista… Eu só não to mais afim de fazer isso em um palco. — Explico pra ela num tom que não costumo usar em voz alta, mas venho me sentindo mais confortável em expressar depois que começamos a nos falar. A assistente da Dra.Cravalho diz que pareço estar morta por dentro. — Era fácil quando eu tinha cinco anos e minha única plateia era o pessoal idoso da casa de repouso da minha avó, mas agora, na faculdade…
Gente demais. Gente pra caramba. Concertos e shoppings se tornaram duas coisas que eu odeio desde que percebi que tem pessoas demais. Estão todos falando ao mesmo tempo, todos rindo ao mesmo tempo, e parece que a gravidade da terra foi arrancada de uma só vez e estou flutuando pra longe, quando sinto os dedos do meu namorado se enrolando com os meus, e é como se ele estivesse me puxando de volta.
— Tudo bem? — Ele pergunta, provavelmente querendo saber a verdade.
— Estou. — E eu respondo o que ele precisa ouvir.
Dra.Cravalho sempre me olha como se estivesse tentando pescar coisas no ar, nas coisas que eu falo, na maneira como eu sempre mexo no meu cabelo. Ela parece at�� cansada, e eu me sinto mal por deixar ela assim.
— E quanto aos seus colegas? Conseguiu falar com alguém essa semana? Fez algum amigo novo? — Ela pergunta, de repente esperançosa esperando minha resposta, e eu não faço o menor esforço pra não decepcionar ela.
Descobri que não consigo mentir pra Dra.Cravalho.
— Acho que metade acha que eu sou muda, e a outra me odeia depois que eu abro a boca e falo algo. Acham que eu sou rude.
Mas eles me fazem perguntas, e eu as respondo.
— O que achou desse? — Minha amiga me pergunta no provador enquanto os meninos estão nos esperando do lado de fora, e entre os comentários e elogios da vendedora, solto de uma vez só.
— Ridículo. Mas se você gosta…
E só percebo depois que as duas estão olhando pra mim. A vendedora meio chocada, e minha amiga… Magoada, talvez?
— Você me perguntou o que eu achava!
— Não precisava ter falado então!
Ela me fez uma pergunta, e eu respondi. Era mesmo um vestido ridículo.
— E como você está se sentindo, hoje? — A mais velha pergunta, e eu me sinto afundar na cadeira.
Eu tinha certeza que ela só estava perguntando por perguntar, e esperava que eu respondesse só por responder, mas eu precisava dizer.
— Como se todo mundo esperasse tanto de mim, que essas expectativas estão me puxando pro centro de um buraco negro. — Começo a dizer, desviando meu olhar do seu enquanto me concentro no teto. — Meus pais, meus professores, meus amigos, meu namorado. Parece que parei de respirar faz anos, e estão me obrigando a estar aqui desde então. E não é porque eles gostam de mim.
É porque eles gostam do que eu pareço. Do que eu faço pra gostarem de mim.
Passo horas na frente do meu espelho treinando sorrisos, expressões faciais e frases prontas pra perguntas superficiais. Então treino maquiagens e conjuntos de roupas na internet, pesquisando como as meninas da minha idade se arrumam pra eventos assim. Me esforço até a aprender alguns passos de dança e pulinhos que devo dar no meio da platéia. Aprendo todas as músicas do último álbum.
Sou como eles, respiro como eles, existo como eles. Me divirto como eles, me comporto como eles, e por um segundo, pareço fazer parte deles.
— Eu gostei muito de hoje a noite. — Meu namorado diz com os braços em volta da minha cintura, demorando minha idade para trás da porta do meu dormitório.
— Eu também. — E eu sei que ele espera uma resposta sincera, por isso o beijo rápido, abro a porta, fecho a porta e me deixo cair no chão. Exausta.
Não tinha mais energia pra fingir aquilo também. Não tinha mais nem uma energia pra fingir ser a namorada que gostou do show.
— Estou cansada. Muito cansada, e eu só acho que você devia me receitar uns remédios. Faz parte do tratamento, não? — A questiono do meu lugar na poltrona do outro lado de sua mesa, sorrindo muito sutilmente, quando ela me responde, sorrindo muito sutilmente também.
— Faz, sim. Mas não vou ser mais a única te ajudando a partir daqui. — Liana diz, me deixando confusa, apesar da sua aura um tanto orgulhosa, como se tivesse chegado em algum lugar depois de semanas. — E eu prometo que em breve, não vai mais precisar se sentir assim.
E foi aí que o meu mundo todo virou de cabeça para baixo de vez, e eu descobri que a caminhada ia ser enorme, mas eu faria qualquer coisa pra ser só… eu.
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