#necroterio de marte
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paradoxialismo · 3 years ago
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Julho
É o primeiro dia fora do hospital.
Tomei muito soro então minha bexiga está solta e o intestino também. Toca Could It Be Another Change e lembro das Vantagens de Ser Invisível e de quando eu tinha 12-14 anos, como estava deprimida, que naquela época nem imaginava que chegaria aos 18, tenho 20, faltam 30 dias para eu ter 21 anos. Também faltam poucas horas para a consulta com meu psiquiatra e é a primeira vez que minha mãe vai. Eu gosto do meu psiquiatra, é o primeiro de todos que tive que confio, que me sinto confortável, ele é bonito. Sinto falta de ter 14 anos, porque aquela foi a primeira e única vez que alguém em contexto romântico cuidou de mim e estraguei tudo, claro. Nada é por acaso.
No sábado, antes de tudo, tinha sonhado com ele, meu ex, e fazia tanto tempo que não o via no surrealismo, por sorte, tinha terapia pela manhã para compensar que não consegui fazer na semana, então contei para a terapeuta sobre ele, sobre você. A verdade é que se passaram tantos anos e ainda sinto falta de contar alguma besteira da minha vida para ele como se isso importasse. Nós morremos juntos um para o outro, mas parte minha lá no fundo, bem no fundo onde tem petróleo nesse oceano, espera que ele volte, que você volte, como se fosse a primeira cena de Closer, em que somos dois estranhos que não conseguem ignorar a existência um do outro.
Eu não deveria falar sobre ele, você, nesse texto, mas só consigo lembrar da última vez que nos vimos e ele perguntou “o que você faria se soubesse que eu teria me matado? Ou que me matasse hoje?”, porque enquanto eu fazia aquilo queria mandar mensagem para você uma última vez, então perguntei para a minha amiga já entorpecida se deveria fazer isso, só que ela não respondeu, então também não te mandei nada. Mas dormi.
Apesar de algumas crises espontâneas, no domingo tudo parecia ok. Não estava doendo tanto.
Chegou segunda-feira e com o mesmo sentimento do sábado fiz aquela coisa. No meio do caminho tinha uma pedra, no meio do oceano tinha uma rocha, e, foram nessas rochas que eu sabia que bateria, que nada me aconteceria e só dormiria mais um pouco. Mas e se a rocha fosse pequena? Se o recife de corais estivesse fraco por causa do gás carbônico? E se, mesmo com tudo isso, uma das ondas passasse esses obstáculos e chegasse a um lugar inexplorado por mim no oceano? Se no meio de tantas súplicas escutassem a ecolocalização da baleia? Foi isso que pensei. Então tudo pareceu se tranquilizar, minha família entenderia que fui com calma, até deixei uma carta. Mas no meio do caminho tinha uma pedra, acabei escutando outra baleia, uma ecolocalização diferente e avisei minha amiga e minha terapeuta.
Foi assim que parei no hospital segunda-feira e saí ontem, quarta. Hoje acordei na minha cama, embora tudo se repita na cabeça, a sonda sendo colocada, depois de muitas horas tirada, ser internada na UTI, uma parte ainda sente a mesma dor física, angústia, raiva e medo. Uma parte quase vencendo porque quero chorar sem parar sozinha. Então, hoje sei a resposta da pergunta, ele, você, não me avisaria, nem mesmo um conhecido faria isso, porque seja no presente quanto no passado, nós estamos enterrados, melhor, nos tornamos pó.
A história parece repetir ou se intensificar.
Estou irritada, não quero falar com a minha mãe ou irmão porque me atrasaram para a consulta e gosto do meu psiquiatra, ele é uma boa pessoa e odeio atrapalhar boas pessoas, ser o mesmo estorvo de sempre.
Parte do meu sistema está sem todo o medicamento que ficava dentro de mim nos dias que esquecia de tomar ou ficava sem dinheiro pra comprar, a irritação juntamente com a TPM deixam tudo mais sensíveis aos ventos. Não queria ser fraca, nessas horas tenho medo de reiterar o estereótipo machista que a mulher já carrega em sociedade, porém, sou sensível, não há como recusar isso.
Meu corpo ainda treme com a falta deles no sistema, com o excesso de emoções que sinto.
Confesso, há muitas coisas que ainda não me fazem sentindo e que não tenho ideia do que falei aos médicos ao longo desses dias, de alguma forma estou aqui e não numa clínica. E odeio depender das pessoas. Fazer tudo por nós mesmos. Tirar tudo de nós mesmos. Tirar o amor de nós mesmos. Fazer tudo por amor a nós mesmos. É um sistema falho.
Tive que dar uma pausa na escrita porque finalmente o psiquiatra me atendeu.
Foi a primeira vez na vida que um homem me estendeu a mão para que levantasse do chão enquanto chorava. Ele segurou forte. Também não tive coragem de encara-lo por muito tempo por causa disso. Mamãe sempre disse para não demonstrar fraqueza na frente deles, mas tudo é diferente quando é um profissional de saúde que vê nitidamente o caco que você se encontra. Também é a primeira vez que meu pai ouviu um profissional sobre a minha saúde mental, isso significa muito.
O pintor e escultor renascentista conseguiu explicar a eles como funciona o vasto oceano e como tenho nadado sozinha entre fendas escuras. Estava encolhida e chorando em silêncio e conseguia ver parte do seu rosto se tornando vermelho. Nós dois não entendíamos que merda me havia acontecido, porque é um limbo entre querer dormir e querer morrer, mas ficou claro que queria passar de uma das pedras que tinha no caminho. Que fique claro que as pedras de Drummond possuem sentidos diferentes e extensos.
Não importa quantas voltas dê, John Mayer sempre estará no meu aleatório contando alguma verdade sobre meu subconsciente. Os pais deveriam ser bons com suas filhas porque um dia elas serão mães e terão que ser boas com suas filhas. É o que se encaixa no momento com a minha situação, falta gentileza e, até nas fendas mais profundas do oceano, em alguma parte, minúscula que seja, existe um pouco de luz.
Então, hoje será minha segunda noite em casa, na minha cama. Esses dias pareceram meses, as horas no hospital não são as mesmas no mundo. Na UTI as pessoas lutam com tanta força, sejam os pacientes e enfermeiros e médicos. Aliás, o pintor soube que um dia pensei em fazer medicina como ele. Há delírios que nem um hipopótamo roxo podem explicar. E assim que saí da UTI e aguardava meu pai chegar, comi um chocolate e uma gatinha de pelúcia branca me encarava, ela parecia se comunicar comigo com seus olhos azuis costurados que me lembravam o oceano que vivo e algo nela me dizia que tudo ficaria bem. Algo nela me lembrava todo o amor que minhas melhores amigas e suas famílias sentiam por mim, porque eu não imaginava quantas pessoas estavam comigo, mas a verdade é que o oceano nunca foi totalmente explorado, então a vida é muito mais bela com ele no mundo.
Agora o Elton John em seus versos canta Your Song, que é simplesmente uma declaração a quem explode de amor e não consegue colocar isso em palavras de maneira suficiente. O mundo é muito mais lindo com todas essas pessoas que me amam e que eu amo, que me fazem escolher um brinquedo mágico uma loja mágica e que vai mudar parte do curso da minha história. Eu estive nesse lugar várias vezes, e tenho certeza que em todas elas achei que essa dor que consegue se tornar física me fazia sentir que morreria até que tentei isso. Minhas mãos não tremiam mais de ansiedade. Então, com a gatinha, estou aqui outra vez para tentar outra vez, sempre, como sempre.
Posso ter sentido falta dele, você, no final de semana, porque ninguém estava comigo para cuidar de mim, segurar minha mão com força e dizer que isso iria passar. E estou aqui de novo, tentando outra vez por mim mesma porque no fim isso é tudo que temos, as pessoas que amamos dentro do nosso coração que se torna um jardim e que floresce. Sentirei medo todos os dias, mas sei que dessa vez quero apenas descobrir o oito dentro do infinito das águas. São os sonhos com você que sempre me fazem acordar um pouco perdida, porque sinto que ainda estamos deitados na sua cama enquanto o coração tenta se acalmar, mas finalmente, acredito que posso conviver com isso melhor do que tenho feito ao longo dos anos. Eu ja deveria saber que sonhar com você, nessa suposta ponte do desejo, que é sinônimo de perder um pouco de si. Eu acredito que posso ter paz comigo mesma e que saberei nadar.
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paradoxialismo · 3 years ago
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querer viver
eu quero viver uma vida.
quero viver o carpe diem sempre.
viver uma vida sem crueldade.
uma vida legal.
uma vida boa em que posso voar e ficar bem.
uma vida em que meu rosto não é vermelho
que minha pele um pouco amarela
não seja machucada,
machucada por outros e por mim.
parece que eu nunca aprendo,
que a minha casa é abandonada.
que essa casa não é bem cuidada.
quero voar sabendo que alguém está me vendo no céu.
viver minha vida com meus amigos.
mas não sei, nunca aprendo.
nunca mudo.
meus ossos, meus membros, tudo doem.
se tornou física a dor.
e penso em duas pessoas que quero,
mas não posso nessa vida.
posso ver esses cenários o dia todo e todos os dias,
a gente nunca muda, né?
eles disseram que seria melhor eu nunca ficar sozinha,
viver em um lugar onde o sol se põe.
eu não posso fugir nem morar sozinha.
sei que isso soa divertido, mas não aguento a dor.
essa dor que me faz ficar imóvel.
eu queria me deixar como eles fizeram.
eu fiz tudo que podia,
tudo que não podia
e ainda faço por mim sempre.
porque no fim do dia quem me tira da cama sou eu mesma.
odeio domingo.
acorrentada ao real e odeio o real.
o real é domingo.
e minha cabeça diz que todo fim é um começo e todo começo é um fim.
eu queria me deixar hoje.
eles dizem que não sou fácil de lidar,
que não sou capaz de tomar conta de mim,
eu sei disso,
eu não queria estar na minha pele.
por isso meu rosto é tão vermelho.
eu queria ser livre.
odeio essa versão carpe diem.
meu choro parece uma guitarra, estou em prantos.
sou tão fácil que todos me deixaram.
sei que sou um estorvo.
nós nunca mudamos.
e me pergunto todos os dias por que continuo se no fim será como o começo, como agora,
será apenas eu.
porque agora estou só e no fim também estarei.
não faz sentindo viver uma vida sem o amor que queremos.
ou ao menos experienciar.
não tem Moon River pra mim.
sou um fardo um fardo grande demais pra mim mesma.
e o que eles farão?
não consigo cantar.
queria cantar até sentir que meus pulmões estão sangrando,
porque mais uma vez penso nisso,
que não sou o que pensava ser,
nem o sou o que quero ser,
deixe ir.
eu só quero paz, aquela dormência,
aquela sensação de não existir o controle,
porque tomei tudo e tudo se esvai lentamente,
eu quero ir.
queria cantar mas é dez e meia da noite e não estou sozinha fisicamente.
ninguém fala dessa dor como ela me deixa imóvel.
eu queria margaridas.
eu queria estar coberta de margaridas.
só a voz dele me acalma.
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paradoxialismo · 3 years ago
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Caixa de presentes
O garoto olhava na prateleira a borda verde do velho livro que deixou ali antes de poder sair definitivamente da casa. A gravidade em si o puxava cada vez mais pra baixo. Fazia tanto tempo que ele lutava contra aquilo, afinal, não era mais o mesmo garoto, era um homem. Essa gravidade queria deixá-lo ali, sem saber o que fazer, qual ritmo ou passo fazer, sonhava sempre em jogar tudo para o alto, mas a gravidade fazia com que essas coisas todas voltassem, pois trabalhava contra a sua vontade.
A borda verde do livro ficava no canto extremo da prateleira. A última garota que entrara ali em seu quarto quase o pegou. Ele não deixava ninguém tocar ali. Deveria ter jogado fora? Uma vez é suficiente? Duas vezes? Quantas vezes a vida, a gravidade, o faria voltar até ali? O deixaria de joelhos implorando para ficar longe de tudo isso? A gravidade é um caos. E tudo que queria era ficar na luz.
O homem havia esquecido a garota, ou melhor, a mulher, fazia tanto tempo. A verdade é que memórias existem e a gente sempre retorna vez ou outra, seja em um dia ou pelo resto de nossas vidas, mas isso fazia sentido? Ele sempre achava que estava com tudo, melhor, forte, como se finalmente estivesse conseguindo. Ele tem a coisa? Talvez da última vez tenha sido o suficiente para acabar porque não precisava ser certo ou errado, desde que acabasse naquela noite. As vezes temos o que queremos quando fazemos do nosso jeito.
Vocês se lembram como foi o primeiro amor? O homem não sabia como expressar, mas para a mulher ele tinha sido a única pessoa que tinha conseguido amar e se apaixonar em toda sua vida, uma pessoa real e, por isso ela continuava meio quebrada, meio torta, meio perdida, porque nunca soube se esse amor era real ou uma brincadeira. A mulher questionava o que tinha sido o início, o nascimento do interesse, do amor, do apaixonar, do fim, do reencontro, do segundo fim.
Agora que a mulher estava começando a envelhecer sentia que tinha acordado de um sonho, um sonho que se perdurava e se transformava em pesadelo. Embora não acreditasse em Deus, perguntava sempre o lugar: onde estava indo? Onde aquele trem iria parar? Já anoitecia e ela só conseguia cantarolar. Ela acordava se perguntando se de fato havia sido amada, se tinham gostado dela por ser quem é, não por sua aparência, cultura, seu jeito de viver. Deus, aonde isso vai? Deus, aonde estamos indo? Parados na plataforma eles encaravam um ao outro. Continuam a cantarolar até o amanhecer.  
Mas o homem gostou dela? A amou? A viu mais que sua pele? Amou o gosto em sua boca? A torre que ela parecia e ele deveria escalar? Falar sem levantar a voz, apenas com sussurros e sentindo o veneno do tempo? Eles ainda cantarolavam um para o outro até o amanhecer? O tempo sempre os matou.
O primeiro amor.
O amor que nos faz correr e girar, sentir a barriga doer e ficar ansioso, ser puxado pela gravidade, ficar no chão e se levantar como um lutador. Ela estava longe, longe e ainda corria para se levantar. Porque amar o próximo também é a capacidade de amar a si mesmo. A mulher parecia não acordar desse sonho e o homem lutava com a gravidade com respeito. Ele venceu. Ela tentava vencer todos os dias.
“O que você faria se eu morresse essa noite?”
O homem conseguia sentir o perfume vindo daquele livro de bordas verdes. Ninguém poderia tocar nele, porque era como tocar na mulher. Por isso foi para o lixo. Não tinha mais nada nele que o fizesse continuar marcado pela mulher, pelo amor saxofônico que sentiu por ele. Pois muitas vezes não podemos salvar quem não quer ser salvo.
Não adianta viajar tão longe. Em sua frente, na outra plataforma ali estava ela. Não precisava parecer mais forte do que era.
Mas ninguém pode mudar o sentimento, o valor, a forma como o primeiro amor nasce. Como ele é parido no universo e o jovem tem que aguentar o peso. Eram o amor da vida um do outro e se deixaram. Não podiam voltar, eles nunca souberam o que significaram um para o outro e isso que é triste.
O homem quando garoto implorou para que não fosse deixado e talvez esse amor tenha sido sim sincero. O único amor que a mulher de fato sentiu. Porque ela não se amava. Amores assim não voltam, amores assim a gente nunca sabe o que significam. Só sabemos que eles passam e que nunca mais volta.
Os amores das nossas vidas nos deserdam, nos machucam e a gente nunca vai saber o que significam. Por que Deus nos tira isso? Agradecemos.
O poder da juventude é esse, amar e lembrar que parece que os momentos são eternos, que não pensamos no depois e que cresceremos e lembraremos do como amamos esses amores e que, talvez, continuaremos a amar. Nós ainda amamos? E são tantos amores. Tantas maneiras de se apaixonar, se encantar.
Esses amores não voltam, não voltam rápido, não voltam nunca mais. Os amores das nossas vidas nunca vão saber o significado que tiveram nem que um dia foram nossos amores desse jeito. E é essa intensidade que machucava a mulher em seu interior.
A mulher se deitou com apenas um homem. Um homem ruim que não queria saber do seu amor nem de quem ela era. A mulher só se deitou no chão ao seu lado e pensava que finalmente podia amar outra vez ou que pudesse ser amada, que tinha esperança. Ela tentou seu melhor. Queria ficar no pescoço dele e pensar que pudesse ser um novo lugar para se esconder, por mais que tivesse medo do toque, ela não pedia por muito. Mas aquilo não era amor. Quando estavam deitados e ela pensava em tantas coisas, ele estava ao seu lado dormindo e sonhando que estava deitado com outra garota. Porque para o homem mau aquilo era um jogo. A desonra a manchou de uma maneira que não conseguia se olhar. E onde se esconder?
A mulher queria voltar a ser jovem e lembrar daquele amor inocente. Pelo menos algo puro que a fizesse levantar do colchão que estava no chão. Ela se deitava. Aquele homem jamais entenderia a alma dela, o jazz, o blues, suas motivações. Porque ele não queria entende-la, queria o corpo dela e só isso. Não era um amor instrumental, era qualquer coisa, menos amor. Mas a mulher não via isso, ela estava cega de esperança. Talvez seu primeiro amor o tivesse enviado para que ela aprendesse o que era dor. Aprender mais do que já sabia sobre isso.
A solidão conversava com a mulher todos os dias e sentia-se abraçada por um corpo frio, já estava acostumada. O passado e o presente eram tão confusos e ela pensava tanto no futuro. O passado e futuro era tudo para a mulher, o que era o presente?
O travesseiro deles sabiam de tudo, ao repousar sua cabeça ali, pesada ou leve, ele sabia o que ambos pensavam, nas dores, nos sonhos e pesadelos. Como saberiam o que sentiram um pelo outro? Era como contar carneirinhos todas as noites. Eram passageiros no sonho um do outro. Se tornando melhores amigos e querendo salvar do que quer que fosse. E se ele contasse que ela era boa demais para ser verdade? Que a amou de verdade? Como eles saberiam disso? A mulher morreria acreditando que talvez nunca foi amada na vida e que não era sequer amável, que não passava de um pedaço de carne, de um rótulo e que a usariam e depois correriam para outra mulher. Porque foi isso que o homem mau fez, a tocou mesmo que de início tivesse dito “não” e a fez acreditar que aquilo era bom, era prazeroso, ele só queria sentir o corpo dela e deixa-la no lixo.
Quantas vezes a bebida caía na roupa da mulher durante as festas? Ela sempre bebia para não pensar em mais nada, para não ter controle. Porque amantes também se derrubam e se sujam. Os pais dela estavam fora e sabiam que o irmão precisava olhá-la. As conversas divinas... ela odiava o tempo e não ter controle disso, por isso misturava bebidas e remédios para sentir que viver fosse algo mais doce. Ela nunca se sentiu tão sozinha assim. Porque envelhecer é assustador. A mulher sabia que morreria sozinha e com medo, não tinha medo de morrer, tinha medo de passar o resto da sua vida sozinha sem ter alguém para dar todo seu amor, para entende-la e respeita-la. Quem diria que teria alguém atrás dela? Suas amigas era tudo que tinha e era suficiente. Tinha que ser suficiente. Era tudo que precisava desde sempre. Mas ela nunca se sentiu suficiente.
E por que tínhamos que morrer sozinhos? Ela não entendia por que tinha que ficar sozinha sem amor. Porque a mulher amava amar.
O homem mau nunca mais voltou.
Seu primeiro amor sempre a visitava de madrugada e tocava em seus cabelos. Ela não aguentava mais dormir.
O homem e seu livro de bordas verdes se encaravam. Ele nunca leu o livro e nunca ninguém tocou nele.  
A mulher se jogaria da ponte porque a altura estava a assustando menos.
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paradoxialismo · 4 years ago
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Cápsula em Marte
Hoje acordei com essa saudade uma melancolia e angústia no peito uma lembrança que assola o subconsciente.
Exatamente como um fantasma, como um morto que vem lembrar da vida em conjunto, da vida que tivemos juntos.
Acordei assim porque no mundo dos sonhos, em que achava que podia arquitetar o espaço, pareceu que estava em Inception com ele.
Isso tem acontecido com frequência, desde que fugi e parei em Marte tudo que resta são as lembranças.
Do que seríamos e não fomos, que existimos e não existimos, não mais.
Navegamos pela jubarte e outras baleias, nos comunicamos sempre a ecolocalização a aquece.
Nós navegamos e nadamos nos desertos de Marte, em que o deserto vermelho se mistura com roxo. Elas são as únicas habitantes em Marte além do astronauta.
Quando o astronauta chegou em Marte com uma cápsula quebrada e alma partida. As baleias se comunicaram com o coração dela.
Mesmo na solidão, em meio a toda essa solidão, o mar e deserto se misturaram.
Marte é como a lembrança dela Um paradoxo com as gigantes e a única comunicação são as ondas do som.
Você já conversou com a jubarte? Com algumas das baleias? Elas escutam o coração Não há como falar em Marte, apenas sentir.
Na cápsula, que fica ao lado das baleias, a astronauta dorme e não dorme, fala sozinha, elas sempre a respondem, porque o coração fala.
Na Terra, todos tinham parado de escutar ele, Segregaram ele do cérebro e da alma, Só o astronauta conseguiu ir para Marte.
Ela, o astronauta, que é garfo e colher, estava perdida do necrotério.
A cápsula é o necrotério, dentro dela, há todos os amores, os mortos amores.
Ao fim, algumas plantas assim ela sobrevive. E há uma flor.
A flor nasce e morre quase sempre. Quase porque é quando ela sonha.
Quando sonha, ela vive. Quando não sonha, ela morre. Quando lembra, ela vive.
Especialmente nesse dia, se sentia em Marte. Perdida no necrotério e no deserto.
E sentindo essa dor, essa solidão infindável que nem as baleias e a jubarte aguentavam
Uma angústia e melancolia por lembrar dele, do seu amor. E que por isso fugiu para Marte.
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