Dia 8 de novembro 1799 - Conjuração Baiana/A Revolta dos Alfaiates
Publicado por: Paulinho (do futuro) Ishizuka, Secretário de comunicação PCdoB de Guarulhos
Conjuração (con·ju·ra·ção)
substantivo feminino
1. Compromisso solenemente contraído entre vários indivíduos contra um governo constituído ou as instituições vigentes.
2. Conspiração.
3. Trama.
4. Conjura.
Conjuração Baiana, também denominada como Revolta dos Alfaiates (uma vez que alguns participantes da trama exerciam este ofício) e recentemente também chamada de Revolta dos Búzios, foi um movimento de caráter emancipacionista, ocorrido no final do século XVIII (1798-1799), na Capitania da Bahia (hoje estado da Bahia), no Brasil Colonial. Diferentemente da Inconfidência Mineira (1789-1792), foi difundida pela historiografia tradicional enquanto sendo um movimento de caráter popular em que defendiam a independência e mais igualdade racial, um governo republicano, democrático, com liberdades plenas
Contexto
No ano de 1798, Portugal e a Europa como um todo, passavam por problemas e mudanças políticos, que anos mais tarde resultaria na vinda da família real para o Brasil. Vale ressaltar que a França — um grande agente histórico dessas mudanças — teve alguma participação direta na Conjuração Baiana. Recentemente, pesquisadores tiveram acesso à documentos franceses, onde há uma comunicação entre autoridades francesas, sondando a possibilidade de que a França revolucionária pudesse intervir militarmente e politicamente para apoiar o movimento que se desenvolvia na Bahia contra a monarquia e o domínio português.
A população se encontrava em um nível muito grande de insatisfação. Esse cenário começou alguns anos antes, quando foi decidido que Salvador deixaria de ser capital e que o Rio de Janeiro seria o novo local central da colônia. Com a diminuição da atenção para a Bahia, recursos passaram a ser menores, o que provocou grandes dificuldades.
Com a intenção de controlar mais o comércio da Bahia, a coroa portuguesa criou algumas leis. Uma delas obrigava o cultivo de determinados alimentos para evitar o desabastecimento e a fome. Como o lucro era a principal preocupação, os grandes latifundiários da época resistiam, focavam apenas no cultivo da cana e descumpriam a lei.
Isso provocou o aumento considerável dos preços da mandioca, por exemplo, gerando crises de abastecimento para uma população que tinha na farinha da mandioca um de seus principais componentes nutricionais. Com o aumento da população escrava trazida para a indústria do açúcar, a fome e o contato com as ideias radicais da revolução francesa, haitiana e estados unidenses, as tensões sociais na Bahia começaram a transbordar.
Revolta
O monopólio dos comerciantes portugueses, o alto lucro com o açúcar e a elevação exorbitante da renda dos senhores de engenho, ajudaram a deteriorar a situação em Salvador. Incidentes espalhados como o saque de armazéns e até o incêndio do pelourinho, espalhavam-se pela região. Notícias de revoltas e movimentos vindos de lugares como Haiti, Estados Unidos, França, outras colônias e até Minas Gerais, formaram o caldo da revolta
Os revoltosos pregavam a libertação dos escravos, a instauração de um governo igualitário (no qual as pessoas fossem vistas de acordo com a capacidade e merecimento individuais), por meio da instalação de uma república na Bahia. Defendiam a liberdade de comércio e o aumento dos salários dos soldados. Tais ideias eram divulgadas sobretudo pelos escritos do soldado Luiz Gonzaga das Virgens e pelos panfletos de Cipriano Barata, cirurgião e filósofo, conhecido como médico dos pobres e revolucionário de todas as revoluções.
Entre os principais líderes do movimento destacaram-se os soldados Luís Gonzaga das Virgens e Lucas Dantas e os alfaiates Manuel Faustino dos Santos Lira e João de Deus Nascimento.
Estes quatro conjurados eram negros e pardos.
Panfletos foram fixados na esquina da Praça do Palácio, nas paredes da cabana da preta Benedita, na Igreja de São Bento, entre outros locais de grande circulação, pontos centrais da cidade e convocavam a população para revolução que atenderia às demandas do povo, separando a Bahia do domínio de Portugal.
Um desses panfletos declarava:
O império reage com violência e terrorismo.
Em 12 de agosto de 1798, o movimento precipitou-se quando alguns de seus membros, distribuindo os panfletos na porta das igrejas e colando-os nas esquinas da cidade, alertaram as autoridades que, de pronto, reagiram, detendo-os. Tal como na Conjuração Mineira, interrogados, acabaram delatando os demais envolvidos.
Durante a fase de repressão, centenas de pessoas foram denunciadas - militares, clérigos, funcionários públicos e pessoas de todas as classes sociais. Destas, quarenta e nove foram detidas, a maioria tendo procurado abjurar a sua participação, buscando demonstrar inocência.
No dia 8 de novembro de 1799, procedeu-se à execução dos condenados à pena capital, por enforcamento, na seguinte ordem:
Lucas Dantas do Amorim Torres - soldado
Manuel Faustino dos Santos Lira - aprendiz de alfaiate
Luís Gonzaga das Virgens - soldado
João de Deus Nascimento - mestre alfaiate
O quinto condenado à pena capital, o ourives Luís Pires, fugitivo, jamais foi localizado. (E que muito tenha vivido em liberdade.)
Os demais envolvidos foram condenados à pena de degredo, agravada com a determinação de ser sofrido na costa Ocidental da África, fora dos domínios de Portugal, o que equivalia à morte.
José de Freitas Sacota e Romão Pinheiro, deixados em Acará, sob domínio holandês
Manuel de Santana em Aquito, então domínio dinamarquês
Inácio da Silva Pimentel, no Castelo da Mina, sob domínio holandês
Luís de França Pires em Cabo Corso
José Félix da Costa em Fortaleza do Moura
José do Sacramento em Comenda, sob domínio inglês
Cada um recebeu publicamente 500 chibatadas no Pelourinho, à época no Terreiro de Jesus, e foram depois conduzidos para assistir a execução dos sentenciados à pena capital.
A estes degredados acrescentavam-se os nomes de:
Pedro Leão de Aguilar Pantoja degredado no Presídio de Benguela por 10 anos
O escravizado Cosme Damião Pereira Bastos, degredado por cinco anos em Angola
os escravizados Inácio Pires e Manuel José de Vera Cruz, condenados a 500 chibatadas, ficando seus senhores obrigados a vendê-los para fora da Capitania da Bahia
José Raimundo Barata de Almeida, degredado para a ilha de Fernando de Noronha
os tenentes Hermógenes Francisco de Aguilar Pantoja e José Gomes de Oliveira Borges, permaneceram detidos por seis meses em Salvador
Cipriano Barata, detido a 19 de setembro de 1798, solto em Janeiro de 1800
De acordo com o frei, tropas militares ocupavam a Praça da Liberdade e havia ampla presença do povo, que se reuniu para assistir. Havia banda de cornetas e tambores. A cerimônia começou por volta das onze horas, com os presos caminhando com as mãos algemadas nas costas.
Pela sentença, todos tiveram os seus nomes e memórias "malditos" até à 3a. geração. Os despojos dos executados foram expostos da seguinte forma:
a cabeça de Lucas Dantas ficou espetada no Campo do Dique do Desterro;
de Manuel Faustino, no Cruzeiro de São Francisco;
a de João de Deus, na Rua Direita do Palácio (atual Rua Chile);
e a cabeça e as mãos de Luís Gonzaga ficaram pregadas na forca, levantada na Praça da Piedade, então a principal da cidade.
Depois do cumprimento das penas de morte, devido ao calor intenso de Salvador, os pedaços dos corpos começaram a entrar em decomposição. Segundo o frei, a cidade foi tomada por urubus. No dia 11 de novembro de 1799, o relato é de que o “ar da cidade era irrespirável; a podridão invadira todas as casas e a população temia por sua saúde”. Esses despojos ficaram à vista, para exemplo da população, por cinco dias, tendo sido recolhidos no dia 13 pela Santa Casa de Misericórdia (instituição responsável pelos cemitérios à época do Brasil Colônia), que os fez sepultar em local desconhecido.
Um movimento que ecoa na eternidade.
O movimento envolveu indivíduos de setores urbanos e marginalizados na produção da riqueza colonial, que se revoltaram contra o sistema que lhes impedia perspectivas de ascensão social. O seu descontentamento voltava-se contra o sistema escravista colonial, o que tornava as suas reivindicações particularmente perturbadoras para as elites. A revolta resultou em um dos projetos mais radicais do período colonial, propondo idealmente uma nova sociedade igualitária e democrática.
Barbaramente punida pela Coroa de Portugal.
Este movimento, entretanto, deixou profundas marcas na sociedade soteropolitana, a ponto tal que o movimento emancipacionista eclodiu novamente, em 1821, culminando na guerra pela Independência da Bahia, concretizada em 2 de julho de 1823, formando parte da nação que emancipara-se a 7 de setembro do ano anterior.
A escravidão no Brasil deixou um legado de desigualdade racial profunda. Os descendentes de africanos escravizados enfrentaram discriminação sistêmica e exclusão social ao longo dos anos.
Há uma correlação clara entre raça e classe social no Brasil. A população negra tende a ser desproporcionalmente representada nas camadas mais baixas da sociedade, com menos acesso a oportunidades econômicas. Atualmente os negros representam menos de 5% dos que ocupam cargos de liderança, mesmo sendo 56% da população total.
Até os dias de hoje a população negra sofre de forma desproporcional com a violência de estado, com casos frequentes de abuso de poder e um genocídio velado de jovens negros e lideranças indígenas em todos seu território.
As marcas desse passado persistem e continuam a afetar a sociedade brasileira.
O papel do Partido Comunista do Brasil frente a história.
O PCdoB tem compromisso perene com na luta contra o racismo, sendo um dos partidos com mais integrantes negros e em cargos de direção, pois percebemos que o Brasil tem uma história de séculos de escravidão, que durou até 1888, quando a escravidão foi oficialmente abolida.
Dado o nosso entendimento coletivo da história do Brasil o nosso partido defende:
Divulgação da memória e preservação da história dos povos negros e originários.
Políticas afirmativas de educação, emprego digno, saúde, moradia e renda.
Amplo aporte financeiro a para empreendedorismo negro e de povos originários dentro do contexto de um novo plano de desenvolvimento nacional.
Programas para inclusão digital.
Fomento a cultura e os modos de produção tradicionais e contemporâneos dos povos negros e originários em suas múltiplas expressões.
O fim da violência de estado direcionada aos povos aqui citados, em destaque o genocídio da juventude negra e de lideranças indígenas.
A afirmação do direito a autodeterminação dos povos.
Ampla solidariedade internacional aos povos oprimidos pelo imperialismo neo-colonialista.
Filie-se ao PCdoB e ajude a construção da nossa agenda de lutas contra o racismo, por uma sociedade mais justa e igualitária.
Fontes:
TAVARES, Luís Henrique Dias. História da Bahia (10a. ed.). São Paulo: Editora UNESP; Salvador (BA): EDUFBA, 2001. 544p. il. mapas. ISBN 8571393702
Inconfidência Baiana. Revista Impressões Rebeldes. Universidade Federal Fluminense
Conjuração dos Búzios Arquivado em 28 de setembro de 2017, no Wayback Machine.. Instituto Búzios.
1° Conferência nacional de comate ao racismo PCdoB
https://pcdob.org.br/conferencia-de-combate-ao-racismo-2023/
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