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Sair do conforto é desconfortável
Já sentiram uma sensação de que algo vai acontecer, mas que você não sabe o que é? Eu sempre tive esses momentos, mas de uns tempos pra cá tenho sentido cada vez mais. Não diria que é uma angústia, mas de certa forma incomoda um pouco. Às vezes se parece com ansiedade, ou empolgação, mas parece não ter motivos aparentes para que me sinta assim. Às vezes é como uma intuição, quando eu sinto realmente que tem algo por vir, e fico levemente feliz, como se tivesse pelo que esperar, mas aí reflito e concluo não tem nada de realmente empolgante à vista. Eu não sei muito bem o que isso significa, mas sei que, apesar de ser estranho, de alguma forma estou “felizinha”. Talvez seja só um bom momento para mim. Talvez seja minha intuição tentando me dizer algo mesmo. Ou talvez seja só uma leve ansiedade pelo futuro. Tem dias (como hoje) em que eu me sinto completamente animada, ou empolgada, ou feliz, ou de bom humor, eu não sei definir, mas acho que me sinto bem. E esses momentos são tão raros, que eu acho tudo meio esquisito, porque não tem nada preocupante acontecendo. Parece que eu não estou acostumada com as coisas mais tranquilas, que mesmo sabendo que está tudo ok, é como se minha mente não aceitasse isso muito bem. Não estou tentando desvalorizar essa situação, e nem quero me trazer pensamentos ruins, mas a desconfiança de que está “faltando alguma coisa” é frequente. Quando falo sobre sentir que algo vai acontecer, não falo de coisas ruins. Falo da sensação de que coisas boas estão por vir, mas não sei o que é, e a incerteza do que vai acontecer na minha vida me deixa extremamente ansiosa (dessa vez pro lado ruim). Minha necessidade de controle é tão grande que eu sinto que se não souber de tudo, nada vai dar certo. Aí eu penso: a beleza da vida não é exatamente as surpresas que ela pode nos oferecer? É. Mas quem disse que eu consigo ficar de boa o suficiente para deixar as coisas fluírem, deixar a vida acontecer como deve ser? Tenho passado por tantos dias de cão que eu nem consigo mais imaginar a vida sendo mais leve. Que merda! Será que minha cabeça não pode me deixar em paz pelo menos um pouquinho, para que eu possa aproveitar esses momentos de ócio, de tranquilidade? Talvez não. Talvez, tudo o que minha mente quer é me confundir e me deixar pra baixo, porque já é um lugar conhecido, é confortável. Mas realidade, é que eu não quero estar mais num conforto ruim. Eu quero um conforto bom. Eu quero o desconforto de coisas boas também. Quis tanto me movimentar que, agora que estou conseguindo fazer isso aos poucos em algumas áreas da vida, me sinto completamente desconfortável. E isso é bom. Estar desconfortável com certos movimentos, nesse momento da minha vida, significa que eu estou agindo, e era isso que eu queria. Mas aí vem o medo. Medo do que pode acontecer de ruim. Medo de não dar conta de tudo. Medo de não conseguir chegar aonde eu quero. Medo de absolutamente tudo. Em um vídeo do Professor Leandro Karnal, ele comenta sobre zona de conforto de uma forma bem interessante. Usando a analogia entre esforço e banho (sim, banho mesmo, aquele que a gente toma todos os dias), ele diz que “esforço é banho, é diário”, o que me pegou muito sobre essa questão de me sentir estranha com todas essas movimentações da vida. Precisamos toma banho todos os dias, às vezes até duas vezes. Então o esforço que você precisa fazer para sua evolução e movimentação só vai se fazer eficiente se for aplicado todos os dias. E não estou falando de um esforço estrondoso, que te deixa exausto, ansioso e incapaz de se levantar no próximo dia. Mas sim aquele esforço necessário. E fiquei pensando: o quanto eu me esforço todos os dias para fazer minhas tarefas de casa? Quanto eu me esforço todos os dias para estudar? Quanto me esforço todos os dias para ter tempo de qualidade com meu filho, e até comigo mesma? Quanto eu cuido de mim todos os dias? E acreditem, no meu caso, todas as respostas foram: MUITO POUCO. Eu realmente reconheço que não me esforço o suficiente todos os dias. Sei que não preciso estudar seis ou sete horas. Sei que não preciso ler um livro inteiro por dia, ou faxinar a casa em qualquer momento vago. Sei que não preciso ficar em função do meu filho vinte e quatro horas, sete dias por semana. Mas quem disse que eu consigo colocar isso na minha cabeça? Eu posso até saber de tudo isso. Saber que não preciso ter medo do futuro, porque ele não existe. Saber que eu não preciso ser isso ou aquilo. Saber que não é minha nota em uma matéria X do curso que vai dizer o quanto eu aprendi ou não daquele conteúdo. Sei que muitos dos meus comportamentos falhos não me fazem uma pessoa ruim, só me fazem humana. Eu sei de verdade, e entendo. A grande questão é aceitar tudo isso e me sentir em paz com as minhas decisões, com o melhor que pude dar de mim mesma para cada situação. Sair da zona de conforto é sim desconfortável. Mas precisa acontecer. E eu não preciso ter medo de ser quem eu quero ser. Não preciso ter medo do que eu quero para mim. Não preciso ter medo de ser feliz, mesmo que o caminho para isso seja desafiador e muito assustador.
Ana Cora.
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Fila de espera
E não é que eu decidi escrever um texto enquanto estava na fila de espera de uma entrevista de emprego online? Parece besta, mas eu não participo de uma seleção há quase dois anos e isso me deixa extremamente nervosa. Não só porque eu preciso de um emprego para sobreviver, mas porque essa vaga significa muito mais para mim. A verdade é que passar nesse processo me traz um pouco de esperança, a sensação de recomeço, e de liberdade.
Voltar a trabalhar me faz sentir como se tudo pudesse se tornar possível de novo. Me sentir melhor comigo mesma, me sentir útil no dia a dia. Fora todas as questões financeiras que, em relação a minha realidade, me deixam muito mais segura.
Quando meu filho nasceu, eu demorei muito pra me adaptar (coisa que ainda estou fazendo), meu processo foi muito difícil em vários aspectos, e antes de voltar da minha licença maternidade, eu não queria retornar ao trabalho. Queria ficar perto do meu filho, queria estar com ele o tempo todo, porque tinha a sensação de que se eu não estivesse observando cada passo, cada etapa, estaria faltando algo. Hoje, depois de quatro meses em casa, com o auxílio do seguro-desemprego, consegui ter essa participação contínua nos cuidados em relação a ele. O problema é que eu estou num momento em que eu já não aguento mais. As coisas se adaptaram, ele está na creche em período integral e, mais do que nunca, eu preciso voltar a ter uma vida profissional e social. Preciso voltar a me mostrar para o mundo, voltar a planejar e construir coisas que também são importantes para mim.
Eu sinto falta de muita coisa. Sinto falta de interagir com pessoas que não sejam a minha mãe. Sinto falta de conhecer gente nova, de passear pelas ruas da cidade, de comer em algum restaurante pequeno e fofo no meu horário de almoço. Sinto falta de ter uma rotina, de ter horário para acordar, para sair, para voltar, de me arrumar para trabalhar. Sinto falta até mesmo de pegar o transporte para chegar em algum lugar. Sinto falta de ter uma vida fora de casa, fora da maternidade. Porque eu sei que sou mais do que isso. Sei que antes de ser mãe, eu sou mulher, profissional, um ser social, e eu também preciso disso.
Ana Cora.
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Sobre auto cobrança e inseguranças
Como iniciar um texto depois de tanto tempo sem escrever por aqui? Não sei por que me cobro tanto para atualizar pequenos projetos pessoais, mesmo sabendo que não tenho a visibilidade de pessoas públicas da internet. E sempre foi assim. Sempre que começo algo que considero importante para mim, eu ajo como se fosse a pessoa mais vista do mundo e que todas as duas pessoas (ou menos) que pararem para ler qualquer coisa que eu me proponho a escrever vão me julgar amargamente, ou então, se gostarem, vão me cobrar arduamente por mais palavras escritas por mim. Quando na realidade, essa cobrança vem inteiramente de mim. Todo esse sentimento de depreciação e de falta de autoconfiança vem de mim, e de mais ninguém.
Eu posso atribuir essas questões a todos os meus traumas vividos. Por ter sido criada por pais narcisistas e autoritários, por ter vivido vários relacionamentos amorosos tóxicos, por ter sido depreciada durante toda a minha vida. Mas o ponto que eu quero chegar aqui é o quanto isso tudo me impede de continuar algumas coisas que eu sei que são boas para mim, pelo simples fato de achar que nada é bom o suficiente para mostrar para o mundo. E assim todos os meus talentos, todas as minhas alegrias, e todas as coisas em que eu sei que sou boa, ficam todas engavetadas, escondidas em arquivos da nuvem, e caem no meu próprio esquecimento, porque não tenho a mínima coragem de mostrar para o mundo quem eu realmente sou.
Eu ando muito reflexiva sobre muitas coisas na minha vida, e isso ébem frequente. Sempre que posso parar para pensar em coisas que estão me incomodando, ou no que eu estou vivendo no momento, muitas percepções aparecem como um soco no meu estômago. E não são novidades. São apenas coisas que eu sempre vi, mas nunca quis enxergar. São apenas comportamentos e sentimentos que eu já deveria ter dado atenção há muito tempo, mas por não ter a autoconfiança necessária, eu acabo simplesmente deixando de lado, porque sobreviver, pagar as contas e alimentar meu filho sempre saem na frente de qualquer coisa que seja boa pra mim. Eu nunca soube me priorizar e, apesar de saber o quanto isso é importante, eu ainda insisto em postergar essa ação. E digo ação, porque a decisão eu já tomei várias vezes, mas nunca consigo seguir com ela. Nunca consigo assumir o que eu escolhi para mim como propósito. E isso só me trás cada vez mais a sensação de incapacidade para realizar qualquer sonho ou desejo que tenha.
Eu queria me sentir mais apta para isso tudo. Queria saber lidar melhor com as minhas escolhas, com os contratempos da vida. Soltar o controle e deixar que a energia flua. Ter a paci��ncia de esperar as coisas acontecerem. Porque eu sempre soube que tudo precisa de tempo. A diferença é que nos tempos de vídeos instantâneos de quinze segundos, redes sociais e informações mastigadas, eu desaprendi a esperar. Desaprendi a confiar no processo. Desaprendi a aceitar que para qualquer semente se tornar um broto, um botão e depois uma flor, é necessário tempo. Isso se acrescenta à toda minha falta de auto amor e confiança, e vira uma montanha de insegurança onde, se eu não conseguir o resultado esperado em poucos dias, eu decido desistir e guardar tudo para mim. E assim, tudo o que eu queria materializar se torna só uma lembrança de sonhos que um dia eu tive, e que eu roubei de mim mesma.
Ana Cora.
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Aperte o botão e passe para a próxima fase
Tive um belo surto ao inventar de pedir para minhas amigas da época de colégio me enviarem as nossas fotos antigas nessa semana. Eu estava dando uma olhada em coisas que eu gostava na adolescência e percebi que não tenho mais nenhum registro dessa fase depois que o meu primeiro notebook foi pra assistência e nunca mais voltou. Então solicitei reforço das meninas, procurei minhas contas antigas do twitter, achei tantas coisas e recebi tantas relíquias que decidi montar um álbum físico, pra não correr o risco de perder tudo de novo. Voltei a ouvir artistas que sempre gostei, voltei a escrever, voltei a ler (mesmo que muito pouco), e também estou assistindo séries de tv de dez anos atrás. Sei lá o porquê de tanta nostalgia. Acho que estou me despedindo da minha adolescente interior.
Passei pela primeira vez em uma consulta com uma psiquiatra e iniciei a medicação necessária para estabilizar meu estado. Um antidepressivo leve, mas que me fez pensar sobre muitas coisas e ter insights bem significativos. A Dra. me falou muitas coisas que eu já tinha noção, mas que não conseguia acreditar muito por motivos de: sou insegura demais para me enxergar com carinho. Acho que foi a primeira vez que eu ouvi de alguém o quanto eu estou sendo forte depois de tudo o que eu passei. Claro que processos difíceis não são exclusividade minha, e nunca serão. Mas finalmente ouvir alguém sendo acolhedor comigo me deixou tão bem. Além da alegria de estar tendo a atitude de cuidar melhor de mim e da minha saúde. Também decidi parar de fumar. E percebi que talvez eu finalmente esteja me tornando uma pessoa adulta. Talvez eu finalmente esteja aceitando o fato de que eu preciso crescer, que as coisas mudaram e que apesar de sentir muita falta de momentos em que eu não tinha boletos pra pagar e um filho pra criar, a vida adulta chama sim por mim, e eu não posso simplesmente ignorar isso. Acho que cresci um pouco mais refletindo sobre isso. E talvez esta seja a razão de estar revisitando minha adolescência. Saudade, e uma forma de me despedida daquela garota cheia de sonhos e vitalidade, e dizer à ela que ela passou de fase, e que agora as coisas ficam mais sérias e complexas, mas que também pode ser maravilhoso.
Ana Cora.
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Isolamento tardio
Em tempos de ócio no trabalho durante meus dias de readaptação, eu andei pensando que, depois de cinco meses de licença, se tornou muito difícil pra mim, o movimento de sair de casa. Seja para algum compromisso, para interagir com as pessoas, ou mesmo para trabalhar e fazer coisas banais. Claro que tem toda a questão de ficar longe do meu filho por muitas horas, mas confesso que tem sido muito mais profundo. Voltar a ter uma vida “normal” com o adicional de ser mãe me trouxe mais conflitos do que eu poderia imaginar.
Quando estourou a pandemia, em março de 2020, eu trabalhava normalmente como qualquer proletariado que não tinha o privilégio de ficar em casa, pegava transporte público e tudo, então não senti tanto com um lockdown rigoroso. Logo que as vacinas começaram a ser aplicadas eu já não morava mais na casa da minha mãe, que vive numa cidade pequena nos arredores de Curitiba, num bairro afastado. Eu dividia um apartamento com alguns colegas no centro da capital e isso me fazia ter que interagir todos os dias mesmo sem querer. Toda essa sequência de acontecimentos fazia com que eu não tivesse consciência daquele famoso isolamento que o mundo estava vivendo.
E eis que descobri minha gravidez nada planejada, mas isso é assunto para outro texto. O ponto que eu quero chegar é que eu só entendi o que era me sentir afastada do mundo durante a minha gestação. Foi naquele momento que eu vivi o maior isolamento da minha vida. Trancada em casa, trabalhando no home office, já morando com a minha mãe de novo.
No início eu até gostei, achei até necessário para que eu pudesse digerir toda aquela mudança que estava acontecendo na minha vida. Eu precisava mesmo de um tempo. Daí as coisas foram acontecendo, meu filho nasceu, e então veio o isolamento do puerpério (que também é assunto para outro texto), e depois fui me sentindo cada vez mais como um ermitão morando numa caverna. Em alguns momentos eu queria gritar por não aguentar mais, e em outros, quando fazia qualquer movimento para sair de casa e viver qualquer outra situação fora daquela rotina, vinha aquele sentimento de angústia, de medo, de saco cheio. Eu queria sair da monotonia, mas não queria agir.
Fiquei presa naquela sensação, e mesmo meses depois com poucos movimentos que realizei por necessidade, ainda não consigo ter um prazer genuíno para eventos sociais, todas de conversa, vida acadêmica ou profissional. Às vezes acho que viciei na solidão. E apesar de ter plena consciência de que isso não me faz muito bem, ainda é mais confortável que enfrentar qualquer desafio que eu possa ter e encarar o mundo de novo.
Ana Cora.
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Eu emburreci?
Estava exausta como na maioria dos dias, quando me dei conta de que estava caindo de sono, mas ainda assim não conseguia sair do celular. Isso me fez refletir sobre como esse aparelho tenebroso e as redes sociais me sugam até o último fio de cabelo.
Eu tenho tanta coisa pra fazer. Um bebê de seis meses pra cuidar, uma casa pra organizar, além de trabalhar fora e ainda ter que arranjar um tempo pra descansar. E mesmo tendo tantas responsabilidades, quando dou por mim já passei duas ou três horas vagando pelo feed do instagram.
Além de todos os desgastes físicos que tenho pelo uso excessivo das telas, tenho também aquele sentimento de que eu "emburreci". Percebi que não consigo mais ver filmes que me façam pensar ou questionar, não consigo ler sobre assuntos mais complexos, por mais que eu tenha muito interesse. Minha capacidade de raciocinar não é mais a mesma, assim como a minha concentração que também foi pro limbo. É como se eu tivesse perdido toda a minha capacidade cognitiva.
Sempre me achei tão inteligente. Sempre fui muito autodidata em qualquer assunto da vida. Se eu tinha interesse, ou se precisava aprender algo por algum motivo, eu me virava numa boa. Ia atrás de tutoriais, livros, artigos ou qualquer outro tipo de material que me ajudasse a chegar em um objetivo específico. Hoje em dia eu nem consigo me concentrar pra ler um folheto de supermercado. Isso tudo me deixa extremamente desconfortável, porque eu não quero ser alguém totalmente alienada, alguém que parou no tempo e que não expande os horizontes. Gosto de aprender, sempre gostei, e queria voltar a exercitar minhas faculdades mentais. Acho que essa preocupação também é parte da motivação para voltar a escrever. Minha afinidade com as palavras sempre foi gigantesca, minha conexão com os livros é maior ainda, e é esse tipo de hábito que eu quero repassar para o meu filho, afinal, a leitura e a escrita são dois grandes aliados do conhecimento.
Ana Cora.
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Caillou e o primeiro dia de creche
Estava em pleno final de tarde de uma sexta-feira, quando decidi colocar meu filho de cinco meses para assistir Caillou, aquele desenho do menininho careca de quatro anos que está crescendo e aprendendo como qualquer outra criança. Sim, eu coloco meu filho para ver desenho animado, porque sou mãe solo, e muitas vezes essa é minha única rede de apoio. Tive essa ideia porque quando era pequena eu adorava esse desenho e sempre achei muito fofo. Me passou tanta coisa pela cabeça desses momentos que tinha depois da escola assistindo o canal Futura pra passar o tempo. Mas o que realmente me pegou, é que Caillou é um menino doce e cheio de curiosidades como todas as crianças que existem, e cada episódio mostra algo novo que ele aprendeu com cada situação.
Em um dos episódios que me chamou a atenção, a mãe do Caillou está levando-o para a creche pela primeira vez para ter que trabalhar. Ele, a princípio, fica isolado, inseguro, pede pela mãe, diz que quer ficar com a avó, porque era ela quem cuidava dela quando os pais precisavam. Fiquei pensando sobre mim e sobre minha situação atual, já que, há poucos dias voltei para o meu trabalho depois de quatro meses de licença maternidade e um mês de férias. Confesso que isso acabou comigo. Mesmo que seja com alguém de confiança, me deixou completamente mexida depois de tanto tempo com ele. Durante minha gravidez eu imaginava como seria amar e cuidar daquele bebezinho que estava dentro de mim, mas não fazia ideia do quanto esse sentimento seria grande. Não tinha dimensão do tamanho nem da intensidade dele. E deixar meu filho com minha mãe ou com a babá para trabalhar, me fez experimentar isso. O tamanho da saudade que eu senti, o tanto que meu peito doía por não estar com ele. Os próximos planos é sair do meu trabalho para conseguir ficar com ele pelo menos até ele conseguir vaga em uma creche de confiança, e aí passarei por isso de novo. Deixar meu filho pela necessidade de trabalhar e poder sustentá-lo da forma mais confortável possível. São várias questões envolvidas. Mas o ponto que eu quero chegar é que, eu vou precisar passar por isso várias vezes. Para o bem dele e para o meu.
Ana Cora.
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Coração frio, alma cinza e mente chuvosa
Tive muitos flashbacks nesses últimos dias sobre minha adolescência. Pra falar a verdade, eram sentimentos que vinham com essas lembranças rápidas. Tive alguns gatilhos por conta do tempo frio, cinzento e chuvoso. Me lembrei daquele frescor que eu sentia quando comparava o clima do Sul do Brasil com o de Londres, mesmo sem nunca ter pisado lá. Dalí pra frente me reconectei com a sensação que eu tinha quando pesquisava coisas sobre a Inglaterra e todas as minhas influências musicais e artísticas de lá. Peguei a época que era moda gostar de bandinhas britânicas e desenhar a bandeira do Reino Unido por todos os cadernos da escola. Acho que isso tudo começou com a morte da Rainha Elizabeth II. Era tanta notícia e cobertura sobre o cortejo e as homenagens pra Betinha que isso tudo me trouxe vários sentimentos dos meus deliciosos e também dolorosos quinze anos. E assim as lembranças foram vindo, a vontade de ouvir artistas que eu curtia na época, a vontade de voltar a escrever, ler livros de fantasia, vestir roupas diferentes. Tudo isso me fez pensar também no quanto eu mudava com facilidade. No quanto eu adorava o novo. No brilho no olhar que eu tinha na época, apesar de todas as questões que me afligiam, ainda assim, eu me sentia viva, e foi isso o que mais mudou em mim.
A vida adulta me tornou alguém que nunca pensei que seria. Não é de todo ruim, mas confesso que eu esperava um pouquinho mais de alegria no dia a dia.
Para além dos traumas e patologias adquiridas durante a vida toda, o que me faz refletir é que eu me tornei alguém completamente sem vida, retraída, introspectiva e ranzinza. Pra falar a verdade, eu não me lembro mais o que é me divertir e rir de algo. Não me lembro mais como é me sentir leve, sem preocupações. Não me lembro mais como é estar viva. Me sinto completamente fria, cinzenta e chuvosa, assim como o céu que me fez lembrar de quem um dia eu fui.
Ana Cora.
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Tua Melodia
Chegar em casa debaixo de chuva já se tornara parte da rotina de Tereza. Todos os dias são chuvosos nesta temporada em Londres. Mas, apesar de saber disso, e de viver há anos na capital inglesa, ela nunca se lembrara de comprar um guarda chuva.
Tereza não se lembrava de muitas coisas, como de tirar o lixo às vezes às segundas feiras antes de sair para o trabalho. Ou então de desligar a televisão antes de dormir. Mas isso nunca a incomodou, ela parecia se sentir muito confortável com suas pequenas falhas de memória. Também não se importava de chegar em casa com as roupas úmidas - muitas vezes até encharcadas da chuva. Às vezes conseguia uma carona com algum colega de trabalho, mas quase sempre caminhava sozinha tranquilamente pelas ruas da cidade até em casa.
Tereza vinha de uma municipalidade do departamento Santander, na Colômbia. Havia se mudado para o Reino Unido há três anos, quando finalmente decidiu enfrentar o mundo - ou melhor, o seu próprio mundo. Elas jamais imaginaria que as coisas aconteceriam da forma como aconteceram, nem mesmo que chegaria a pisar na Inglaterra. Sua jornada fora um tanto quanto conturbada, mas, com toda certeza, ela jamais poderia se arrepender do passos que havia tomado. Até a noite em que ouviu Thomas tocar pela primeira vez.
Ao acender as luzes, Tereza percebeu que seus sacos de lixo estavam no canto direito da porta, assim como ela havia deixado antes de sair para o trabalho pela manhã. Sim, ela esquecera de colocá-los para fora de novo.
- Mas que grande porcaria! - reclamou para si mesma.
Então levou o lixo até a caçamba nos fundos do prédio. O que a irritava não era ter que levar o lixo para fora, e sim ter que subir novamente oito lances de escada depois de um dia corrido na cafeteria que trabalhava.
Quando finalmente estava livre de sua última obrigação do dia, ela se deitou no sofá, totalmente esparramada, e estava tão cansada que esqueceu de retirar os sapatos que ainda estavam molhados pela chuva. Seus olhos pesaram quase que de imediato, se fechando logo em seguida. Por alguns segundos, Tereza caiu num profundo sono, mas logo se lembrou da garrafa de vinho que havia deixada reservada para o fim de semana. Ela raramente tinha dinheiro para um vinho caro e de qualidade, muito menos um italiano branco, mas decidira comprá-lo noutro dia para aproveitar a folga que estava por vir.
Apanhou o saca rolha na segunda gaveta no armário da cozinha. Seu lar era um pequeno apartamento, no quarto andar de um antigo prédio em meio ao Chrouch End, no lado norte de Londres. Com certeza era um ótimo bairro para Tereza. Ela adorava passear pelas livrarias da vizinhança e observar coisas que ainda não conhecia.
Enquanto abria a garrafa, ela se distraiu assoviando uma doce melodia. Geralmente não era muito boa nisso, pois achava que não possuía tal noção de ritmo. Ao encher a taça que estava em cima do balcão, a música que assolava de seus lábios foi tomando forma em notas que pareciam ser de um piano muito bem tocado do outro lado da parede que a separava do outro apartamento.
- Uau... - ficou impressionada. - Isso é loucura! - duvidou dos próprios ouvidos. Já que havia pensado que, se alguém a estava ouvindo assoviar, era bem possível que já tivesse também ouvido suas conversas consigo mesma diariamente. Em seguida sorriu achando aquilo tudo muito engraçado. Por um momento, ela realmente havia gostado daquilo, e talvez tivesse mesmo despertado a curiosidade de Tereza em conhecer a pessoa que a acompanhava pelo piano, mas decidiu deixar a história de lado para o dia seguinte indo se deitar logo depois de terminar sua taça de vinho.
No dia seguinte, Tereza se levantou muito cedo. Pouco depois do céu dar seus primeiros sinais de luz. Uma luz cinzenta, mas que ainda assim a agradava muito.
Ela costumava colocar uma música empolgante enquanto preparava seu café da manhã, mas naquela manhã de sábado não o fez. Algo dentro de Tereza parecia querer um pouco de silêncio. Algo parecia pedir por um pouco de paz. Talvez fosse o cansaço que ainda sentia da dura semana de trabalho. Ou então a simples necessidade de querer mudar um pouco sua rotina barulhenta e atordoada. A verdade é que, ela já não se sentia mais a mesma, desde a última noite, quando ouviu as doces melodias de piano que haviam atravessado as paredes de seu apartamento e preenchido seus ouvidos, invadindo sua mente, e fazendo com que ela jamais as esquecesse.
De alguma forma, havia acordado naquele dia pensando naquele som que a fizera sentir um máximo de estímulo por si mesma. Era como se Tereza sentisse a necessidade de descobrir quem era a pessoa que tocava tão bem e de maneira tão angelical. Ela não o conhecia, não sabia seu nome, nem como havia virado seu vizinho. A única coisa que Tereza sabia, é que alguém havia se mudado para o numero 403, ao lado de seu apartamento no quarto andar, há algumas semanas. Porém, ela jamais cruzara o caminho do novo morador em nenhum momento desde então, pois a mesma vivia correndo para todos os lados durante esse tempo.
O chá preto com leite estava perfeito. As torradas estavam no ponto certo, e ainda havia um pouco da sua geleia de morango favorita na geladeira. Tereza era o tipo de mulher que adorava apreciar seus pequenos prazeres da vida, e comer era um deles. Ela era apaixonada por sabores, independente se eram simples e modestos, ou complexos e sofisticados. Sua paixão pela comida era de muito tempo atrás, pois desde muito nova ela apreciara os sabores criados por sua tão amada avó, que era uma grande chef, muito conhecida na Colômbia. Infelizmente, apesar de amar os sabores da vida mais do que tudo em sua vida, isso também a trazia para a lembrança da trágica morte de sua avó, causada por uma pneumonia repentina há quatro anos.
Ao finalizar sua primeira refeição do dia, Tereza até pensou em abrir um livro para passar o restante da manhã viajando em seu mundo literário, mas ao terminar de se trocar, se percebeu cantarolando a mesma canção da noite passada, e, por algum motivo, pensou ter ouvido algo muito parecido com o piano que a enfeitiçou enquanto bebia sua taça de vinho. Por um momento, ela realmente pensou estar ficando maluca, pois não era possível que toda vez que sua mente fosse tomada por aquela canção, o piano simplesmente começasse a acompanhar perfeitamente, como um arranjo feito especialmente para ela. Foi então que ela, de maneira completamente impulsiva, decidiu bater na porta do novo vizinho, para que pudesse finalmente olhar para o causador daquela confusão toda em sua cabeça.
Sem pensar muito, Tereza tocou a campainha do número 403 de forma tão ansiosa, que a fazia parecer uma moça um tanto quanto desesperada. Ela suava frio. Sentira seu coração acelerar de tal maneira, que não havia nem pensado no que iria dizer para a pessoa que abriria aquela porta. Mas seu peito logo se acalmou, quando viu pela primeira os olhos de Thomas através dos óculos de grau. Eles eram castanhos claro. Pode-se dizer até que tinham cor de amêndoas. Parecidos, talvez, com duas doces e brilhantes avelãs. Ela não sabia muito o que pensar, pois sua mente estava paralisada. Seus lábios estavam secos, e seus olhos fixados nos dele.
Ele lançou à Tereza um olhar tão doce quanto a cor de seus olhos, e com a mesma doçura em sua voz sorridente a cumprimentou.
- Olá.
Ana Cora.
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