omeulirico

[omeulirico]

Eu me sinto apodrecendo

enquanto penso demais em nada.

Sento-me na varanda

e converso por horas a fio

comigo mesma,

mas é como estar solitária

no meio de uma multidão.

Meu próprio eu

é péssimo em conselhos,

mas confortável demais

para ignorar.

Mas o desconforto

vem com o conforto,

e sempre fico desconfortável

sozinha comigo,

e eu sempre estou

sozinha comigo mesma.

[omeulirico]

ontem, enquanto chovia lá fora,

eu percebi que tudo tinha mudado.

meu cabelo, meus olhos, meu sorriso,

minha voz, minhas roupas

e até minha mania tosca

de gesticular com a mão

para explicar meu ponto de vista.

e só aí eu me dei conta

de que promessas, na maioria das vezes,

são só palavras vazias

juradas no calor do momento.

porque você disse que,

mesmo que tudo mudasse,

jamais poderia deixar de me amar.

era sua promessa eterna.

agora eu estou sozinha,

e tudo mudou.

[omeulirico]

eburne

eu poderia, depois de uma bebida quente,

te dizer tudo o que está entalado na minha garganta?

se eu confessasse que tudo o que me fazia te amar

agora me faz odiar,

seria esse o ponto final

das minhas noites de pânico?

eu poderia olhar para trás

e não me odiar?

queria que você não pudesse mais andar,

lento e deliberado,

pelo meu coração.

[omeulirico]

me apaixonei pela minha solidão, pelo meu silêncio e pelo meu vazio, e depois disso nunca mais o preto e branco me assustou.

[omeulirico]

não há nada que eu possa fazer

para superar isso que sinto por você,

para deter meu fascínio,

pela escuridão no seu coração.

[omeulirico]

inócuo

[…]

eles dizem que estou feliz, mas eles sabem que não.

só que na melhor das hipóteses, eu consigo fazer parecer que não estou triste.

e no pior das hipóteses, a esperança é algo que alguém como eu não pode manusear e muito menos a ter.

então não me pergunte se estou feliz, porque o melhor que conseguirei dizer é que não estou triste.

mas eu estou triste pra caralho.

[omeulirico]

lúgubre

não sei ser sem você.

não sei onde devo estar sem você.

tenho tentado dormir desde que se foi,

mas passo as noites revirando tudo em minha cabeça.

não quero que ninguém saiba

que fui o melhor que pude ser,

mas não quero continuar sendo.

acho que nunca vou conseguir

permanecer quem sou

se não for por você.

[omeulirico]

fissura

há algo tragicamente bonito em te amar.

tua total falta de tato

faz minhas lágrimas virarem cristal,

e onde você toca, brotam crisântemos —

roxos, depois azuis e depois amarelos —

até sumirem,

e tudo voltar a ser só pele.

as palavras, afiadas na tua boca,

me fazem chorar.

soam como amor de verdade,

porque amar dói, não é?

e toda vez que você está gritando encima do pedestal,

e meus olhos embaçados mal te enxergam,

chego à conclusão:

meu amor nunca vai ser o suficiente.

[omeulirico]

desvario

nunca senti isso quando era criança,

e agora não sei de onde vem.

mas sinto—um furacão, um tornado,

levando tudo dentro do meu peito.

é difícil não sentir.

no começo, parece uma cascata de diamantes,

mas logo desbota, como tinta velha na parede.

rouba meu fôlego,

corre queimando em minhas veias.

não quero sentir medo.

não quero viver assim.

[omeulirico]

inércia

eu caminho sempre em círculos,

passando pelas mesmas ruas,

virando nas mesmas esquinas.

dou a desculpa de que preciso comprar uma bebida

e, então, paro na mesma esquina de sempre,

sob a árvore grande.

digo a mim mesma que não posso mais errar o caminho,

mas, no fim, lá estou eu,

prestes a seguir pela mesma rua errada.

isso nunca foi sobre errar o caminho.

[omeulirico]

Eu sei o quão ruim tudo isso é,

mas fecho os olhos, tampo os ouvidos e tremo de medo.

Medo de te deixar ir,

medo de deixar de ser quem sou na tua ausência,

mesmo que tua presença, agora,

não passe de memórias turvas dentro da minha cabeça.

[omeulirico]

acho que sou um amontoado de gostar—

de música, de livros, de arte e poesia.

mas não sou um amontoado de gostar pouco;

quando gosto, gosto pra valer.

gosto tanto que quase transborda,

vira obsessão, gravita em torno,

orbita sem descanso.

gosto de saber, de sentir, de repetir,

de mergulhar sem medo no que me prende.

e acho—

acho que gosto de você.

[omeulirico]

indizível

Há uma coisa, quente e fria,

que se arrasta em mim.

Faz arder e alivia toda a dor

ao mesmo tempo.

Ela — essa coisa que não sei dizer o quê —

borbulha ácida e suave dentro de mim

sempre que penso

em tudo que já fomos,

tudo que somos

e o tudo que nunca poderemos ser.

Ora ela, a coisa, me faz querer chorar,

chorar até que todas as lágrimas

virem cascata

e depois rio

e depois mar,

até alcançar o oceano.

Ora ela, a coisa, me faz querer sorrir,

sorrir até rir,

rir e depois virar gargalhada

e depois virar timbre

e depois ser música.

Eu a sinto tanto,

com tanta intensidade,

como se fosse parte de mim.

E eu sei que é,

mas não sei o que é.

[omeulirico]

casual

você diz que é tudo casual,

mas então estamos no carro, indo para um jantar com seus pais.

eu finjo que não significa nada, mas a verdade é que meu coração acelera toda vez que você me apresenta como ‘uma amiga’.

você diz que é tudo casual,

mas eu sei todas as coisas que você conta para seus amigos quando não estou por perto.

eles sabem o que eu gosto de beber, a música que me faz chorar, e até como eu rio quando fico nervosa.

casual, você diz, mas me pergunto quantos segredos seus eu conheço por acaso.

você diz que é tudo casual,

mas então você segura minha mão toda vez que saímos e sorri sempre que elas balançam juntas.

eu sei que você vê os olhares de quem passa, que ouve os sussurros.

ainda assim, você aperta minha mão como se não quisesse me soltar.

você diz que é tudo casual,

mas, às vezes, você me olha como se estivesse procurando algo que perdeu há muito tempo.

eu odeio admitir, mas você me faz acreditar, por um momento, que encontrou isso em mim.

você diz que é tudo casual,

e eu odeio ter deixado isso se arrastar por tanto tempo.

porque cada sorriso seu, cada toque, cada palavra dita no silêncio me fazem esperar algo que talvez nunca venha.

e eu sei que, um dia, casual vai ser a única palavra que sobrará entre nós dois.

[omeulirico]

há uma árvore de plástico, e embaixo dela você diz que me ama, segura meu rosto em suas mãos e me beija. há uma colina de mel, e no topo dela você canta aos quatro ventos que sou seu mar, seu sol, sua luz, o único caminho que você vai trilhar.

existe uma casa… não, um lar, o meu lar, o seu lar. lá, você promete que sempre estaremos juntos. você pega meu coração em suas mãos e jura que protegerá todo o meu amor por você.

agora estou aqui, apenas esperando o dia de outro sonho.

[omeulirico]

você é muito além de um amontoado de dores e cores neutras. você é arte viva, poesia nua e crua, é casa de inspiração, é bem mais do que se lê e se vê e também do que se crê.

[omeulirico]

episteme do ser eu

matéria pura, rara e única. do pó de estrelas que já brilharam, das explosões que forjaram o universo.

sou uma cadeia infinita, um quase de tantas conexões, o tudo que já foi, é e será.

minha morada é feita de átomos, habitada por partículas subatômicas, e metade de mim nasceu de estrelas que viveram e morreram bilhões de anos atrás, para compor este amontoado que sou.

quando sonho com as estrelas, é porque delas vim, sou parte, sou feita delas.

de natureza íntima e profunda, carrego em mim tudo que já existiu e tudo que ainda existirá.

sou poeira cósmica.