A vontade de ultrapassar os limites é o que nos permite ver além. �� o que abre os nossos olhos para o que há do outro lado do ponto de vista. Amplia a visão, realça o foco e põe sentimento em nossa interpretação de mundo. Nos permite ver além do óbvio, e do máximo. Além do menor e do maior. Além do menos, além do mais.
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minha promessa pra esse ano era diferente dessa vez. eu lembro que quando soltaram os fogos eu só me concentrei naquele momento mesmo, sem pensar nas estratégias ou em planos objetivos. eu queria era comprar mais ingressos. é, isso. queria comprar ingressos. conversando com algumas pessoas, eu percebi que muito pouco as vontades delas se distanciavam das minhas. todas cansadas, todas querendo sentir alguma coisa diferente, não só fazer planos. o que muda talvez seja só o nome, mas todas desejando viajar, um tempo a mais pra descansar em algum lugar longe da tremenda turbulência do produzir.
o ano seguiu e com ele tantas versões mais cansadas vieram. tanta coisa capaz de fazer repensar. mas claro, sem parar pra isso, porque os momentos já não esperam mais que a gente pare pra refletir como era antes. a gente tem que conciliar os sentimentos com a correria e a correria com o desejo de só... parar um pouco.
aí eu parei, sabe. eu comecei a parar mais, fazer mais pausas. e nas outras horas, comecei a correr mais pra vida ao invés de correr pra parecer produzir algo importante. sabe, às vezes a gente quer ser importante demais. mais do que deveria. às vezes eu sinto saudade da desimportância das coisas.
dos meros detalhes, das pequenezas, dos momentos pausados do dia. eu sinto falta de não sentir pressa, de recuperar de novo o fôlego pra uma tranquila noite de sono.
só que às vezes eu também sinto falta de que nessa desimportância, eu arrume tempo pra viver essa vida que não volta. essa vida com V maiúsculo. V de ver. de ver a rua, ver gente. ver gente feliz, ver gente triste. ver gente apaixonada, ver gente se desapaixonando..
e acho que é pra esse fim que a gente compra ingressos, no fim das contas. não só ingressos mas passagens, tem gente que tira passaporte, tira uma folga, tira um tempo pra si, que diferente do que costumava ser antigamente, agora precisa ser com antecedência, com data marcada na agenda pra não comprometer os compromissos.
aí no "anotar na agenda", já se cria aquela expectativa de como vai ser viver aquele dia que a gente encomendou pra ser feliz. só que se tem uma coisa que esse ano me ensinou é que os ingressos prévios, as passagens compradas, o passaporte.. eles, às vezes parecem meio videntes vocês não acham?
eu não sei se eu sou muito paranóica com o efeito borboleta ou sei lá mas o que me prendeu a atenção nesse ano foi a sensação esquisitíssima de que essas 'agendas' parecem já saber o que vai acontecer enquanto nós, meros mortais, ingenuamente fazemos planos mentais sobre como será que a vida vai se parecer quando aquele dia chegar.
eu só entendi a intensidade disso quando comprei o ingresso pra uma festa na semana em que perdi o que não estava pronta pra perder. aí ficou parecendo que eu tinha encomendado aquela perda. quando eu comprei o ingresso, quanta coisa eu imaginei pra aquela semana.. nenhuma delas sobre aquela perda. essas coincidências fazem de primeiro, a gente pensar em rasgar o bilhete. mas aí ainda mais cômico que isso é você perceber que a vida segue apesar da sua perda. as pessoas estão nas ruas pra serem vistas, sendo felizes, sendo tristes, se apaixonando e desapaixonando do jeitinho que você tanto desejava ver. a sua perda inesperada tá doendo mas agora você pode escolher entre deixar doer só por doer ou deixar doer enquanto você assiste aquele mundo todo que você tanto tinha esperado pra ver nesse dia.
claro que não é simples fazer essas escolhas no meio da dor, mas quando a gente cresce começa a entender que na realidade tudo a sua volta não passa de uma grande agenda de compromissos — alguns inadiáveis, outros que você quer muito, alguns imprevisíveis mas inevitáveis. a gente só não sabe a ordem de nenhum deles, nem tem noção nenhuma de quanto tempo eles vão levar... e no fundo eu acho que essa história toda é mesmo sobre isso sabe, sobre.. comprar ingressos. comprar passagens. continuar tentando tirar passaportes.
é sobre tentar continuar preenchendo a agenda com eventos em que a gente se promete ser feliz. e até anota a promessa. faz uma nota mental. planeja. aumenta a expectativa pensando. transforma realmente aquilo numa jura a si mesmo que tem que acontecer apesar de qualquer pesar. porque aí independente do caos que esteja ao redor, você olha pra aquela agenda e sabe que nesse dia você tinha marcado com a felicidade. não porque nos outros dias você não pudesse ser feliz, mas porque nesse dia em especial, você tinha se prometido ser.
e aí aquela dor que tá doendo tanto, ela pode nem parar de doer, mas ela vai ter que competir com essa vontade súbita e maior de tentar, pelo menos nesse dia. eu sei que às vezes no meio da tristeza isso pode parecer meio injusto mas.. são escolhas ingratas que a gente tem que se ver fazendo sempre na vida pra burlar o sistema e dizer que você ainda tá no jogo de alguma forma. no fim das contas vencer os dias difíceis é tentar vencer a si mesmo de alguma forma, de qualquer forma. mesmo que a máxima vitória que você tenha pra entregar naquele momento seja só... ver a vida. mas ver mesmo, de olhos abertos, se preparar pra vista, sabe? sair e ver a vida. ver paisagens, ver gente.. rindo, chorando, amando, vivendo.. comprando passagens, ingressos sem saber nem que dia e nem que horas as suas felicidades não serão só simplesmente felicidades, mas talvez, em dias específicos sejam o antídoto pra alguma dor que você tem que anestesiar.
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às vezes me perguntam sobre meu relacionamento com a minha família. é que visto aos olhos nus, quando paro pra pensar eu realmente acho que seria curioso pra quem vê de fora. na correria, às vezes é difícil perceber o quanto sou privilegiada e o quanto realmente pode acontecer de você encontrar tudo que precisa sem precisar sair de casa. mais difícil ainda é ter que admitir que as coisas realmente podem ser assim, mais práticas do que a gente imagina. acho que existe uma convenção muito forte que faz a gente pensar que as relações de fora é quem vão trazer sentido e delas é que vai nascer as nossas histórias mais intensas de troca, de reciprocidade, de alguém que vai estar lá quando você precisar se lembrar de quem você é num domingo à noite, em plena crise existencial. quando te falta o fôlego e você não consegue segurar uma enxurrada de emoções que estavam presas em você e tudo que você consegue é chorar. mas eu descobri que talvez algumas poucas pessoas, raras, conseguem ter essas pessoas mais próximas do que se imagina. e ter descoberto isso sobre mim tem me feito finalmente enxergar a vida sob uma outra perspectiva, isso já faz um bom tempo. eu começo a repensar todas as minhas outras relações. sou mais crítica dentro delas, mais exigente. acho que porque mesmo inconscientemente, vivo pensando que não teria sentido que as minhas relações externas mais valorosas não fossem tanto pra mim quanto a relação que tenho com minha irmã e meus pais. em outras palavras acho que aquela frase popular "que o santo de casa não faz milagre" pode cair por terra para algumas pessoas. pra mim, por exemplo. porque os santos da minha casa fazem por mim o que ninguém fez. os santos da minha casa estão comigo quando freio da vida me puxa e me deixa aparentemente imóvel, estática. quando me esqueço de tudo que está ao meu redor e tudo que sinto é um medo absurdo de viver, são os santos de casa a quem recorro, mesmo depois de muito hesitar só porque não quero parecer fraca a mim mesma. e aí quando receber esse carinho e ouço que poderia ter pedido antes, eu finalmente percebo o quanto ser forte o tempo todo não parece ser muito inteligente. às vezes, no auge de crises assim, é melhor voltar a ser aquela criança que só precisa de colo e daquele cuidado que não vida adulta, vão ficando mais raros porque a gente precisa estar sempre correndo, mas ali naquele momento em que nada mais fez sentido e você teve aquele colo pra se refugiar, é que você entende o quanto a gente complica as coisas ao invés de apelar pro lado mais simples da vida. o lado que no fundo, é o que realmente interessa.
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os meus amores nascem e morrem comigo, mas em vidas diferentes. sinto que os amores que cultivo separam em mim, as versões do que vou me tornando com o tempo. e saudosa como sou, poder revisitar o passado me lembrando com cuidado de cada detalhe que me fez amar alguém sempre me traz um certo conforto de que no fim das contas, tudo passa. não porque eu me lamente muito das pessoas que amei nem dos amores que já senti, mas porque dessa forma consigo me recordar muito facilmente que a vida é feita de estações que costumam amplificar ou amenizar o que foi sentido numa temporada anterior. claro que as sensações são só um exemplo e a gente pode usar esse mesmo raciocínio pra pensar em absolutamente qualquer coisa que envolva os amores que a gente sente. e amar alguém sempre envolve muita coisa. envolve muito da gente também, às vezes, quase sempre até muito mais do que a gente pensa. e às vezes, quase sempre, a gente só consegue enxergar esse muito depois que o amor já foi embora. aí aqui nesse ponto, eu também gosto de me lembrar que em determinado ponto da minha vida, também tive o prazer de conhecer o poder de não se culpar ou se vitimizar por esses amores despedidos: eles são naturais. eu particularmente sou alguém muito receptiva as coisas naturais. mas ser receptiva as coisas naturais é lidar com a finitude das coisas e a sua total independência do que a gente queira. mais ainda quando se trata de amor. sim, porque os amores, eles normalmente são pensados aos pares neste mundo sedento pela reciprocidade. e não, aqui não há nenhum intuito de incentivar que alguém ame aquele não ama de volta, pelo amor de Deus. mas a reciprocidade não encontra você pelo caminho do desespero, nem mesmo de um pedido suplicado que você deseje com toda a sua força do pensamento. a reciprocidade é assim como amor, indomável. ela existe, simplesmente. e quando existe coroa um amor já existente em um amor a dois, trivial, aquele que todos conhecem. só que na minha opinião isso nunca vai invalidar um amor ímpar. o amor dos que aprendem a amar de longe, e a enxergar todos os detalhes e belezas que possam existir nas lonjuras. quem ama de longe, não se parece em nada com quem só consegue amar de perto. quem ama de longe, nem sempre espera o amor de volta. ama, na simples vontade de amar. para nós, o amor existe e só existe. torna bonito tudo a nossa volta, nos faz sorrir sorrisos bobos, consomem nosso dia com alegrias involuntárias, e às vezes também se apresentam em forma de furacões dos quais nunca saímos ilesos porque o amor ímpar não é menor que os amores pares. ele é tão intenso quanto... e não seria ousadia demais dizer que é às vezes até mais maluco do que qualquer outro. mas para nós, fiéis acostumados dos amores de lonjuras, dos amores ímpares e solitários, talvez seja mais fácil e simples e natural entender que nesta vida estes amores, assim como todos os outros, também não duram pra sempre. eles invadem nossa vida, deixam rastros e mudam sempre alguma coisinha dentro da gente que é perfeitamente notável. e depois, quando chega a hora de ir embora, você entende que é hora mesmo que ele vá, mesmo que também não seja de pronto, tão fácil superá-lo. só que apesar disso, você reconhece que é hora do fim porque sabe que você também não é o mesmo. fim das contas a gente percebe que em amores como esse, essa questão territorial costuma ser muito decisiva. e talvez você não sendo mais o mesmo, não exista espaço. nem em você pra esse amor, nem nesse amor pra você.
logo em seguida já vem uma calma misturada a uma vontade de pegar as coisas, arrumar numa mala pra ir embora, sabe?
você por algum motivo sente que já sabia há muito tempo que não tem mais espaço. e segue sabendo que ao botar os pés pra fora desse sentimento, não é mais você quem saiu dele.
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ouvi num vídeo um querido apontando o conceito de "pessoas inaugurais", basicamente aquelas que trazem pra sua vida uma experiência nunca vivida e o impacto que essas experiências acabam desenvolvendo na vida da gente. sabe, se a gente for considerar o efeito borboleta, essas pessoas inaugurais seriam parcialmente responsáveis por terem "conduzido" nossas vidas até onde hoje elas se encontram. mas isso eu acredito até já ter comentado em um ou dois outros desabafos. mas hoje, acho que pensei sobre como essas pessoas inaugurais podem sim apresentar sentimentos e sensações exclusivas e que são intensas por serem as primeiras, as inéditas, só que o tempo ele faz a gente também aprender a desenvolver uma certa resistência que vem da necessidade de se criar anticorpos pra certas dores ou sei lá... tudo aquilo que existe pra chegar na nossa vida em decorrência de algo novo, inédito, nunca experimentado e por consequência nunca sentido também, enfim, tudo aquilo do que não temos ainda como nos desviar ou saber lidar... tudo que venha desse desconhecido que nos deixa ingênuos e submissos ao que tiver que ser porque não estamos prontos praquilo ainda. se parar pra ver, acho que as pessoas inaugurais, apesar das lições que elas deixam, e das memórias e de tanta coisa que depois a gente sofre com vontade de resgatar, acho que é bizarro e ao mesmo tempo engraçado como no fim das contas é como se elas se transformam de repente numa espécie de sinal de fumaça que sinaliza onde a gente tá e vai embora, simplesmente vai sumindo no ar.. a transição é um tanto assustadora, vamos combinar. porque do mais absoluto nada, alguém que chegou na sua vida te apresentando um outro lado do mundo e que você aprendeu a amar justamente por essas tantas coisas novas que ela trouxe, ela simplesmente passa desse alguém estreante pra alguém que você já não sabe muito bem como encontrar. saber, até que sabe, conhece o endereço ou como achar numa rede social e você pode fazer isso a qualquer momento e até tenta algumas vezes... mas você não encontra mais aquela pessoa nela mesma. e o sentimento é tão devastador no começo. é justamente aquele alguém que você acreditou que nunca sairia daquele espaço, nem por reza brava. mas aí o tempo, muito sábio, ele vai conversando com a gente e cicatrizando o luto dessa perda. vai mostrando que aquela pessoa já fez o que tinha que fazer na sua vida e agora já tá pronta pra seguir. tinha que ser aquilo ali mesmo. e normalmente a gente só entende a magnitude desse vai-vem de vindas e despedidas quando outra pessoa aparece trazendo a mesma sensação. e você reconhece de cara porque não é mais tão leigo assim. você já sentiu isso antes, sabe do que se trata. não sabe como vai ser agora, talvez a intensidade seja totalmente diferente agora mas você sabe. e é bonito como as coisas passam a ter mais significado quando esse momento passa a existir na vida. quando seus olhos finalmente enxergam que sentimentos iniciais são iniciais e precisavam de pessoas inaugurais pra que fossem iniciados. mas que depois de iniciados, a sensação de se encontrar alguém que te desperte o mesmo é inconfundível. você sabe que agora não é um teste. agora é agora, é pra valer. você solta uma risadinha pro passado, pras pessoas inaugurais que sem elas não seria possível viver o que tem pra viver agora. e agradece porque o que tem pra viver agora é real, sem dúvidas e completo. você se sente pronta como antes não conseguia sentir. as coisas, aos pouquinhos, vão se encaixando onde precisam ficar.
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