Poeta e contista. Autor de nove livros publicados entre Brasil e Portugal.
Last active 60 minutes ago
Don't wanna be here? Send us removal request.
Text
Eu subi no caminhão já muito cansado e fui fazer a mudança de um cara que tava falindo. O bicho era um empresário bem sucedido e fora ruindo. O motorista do caminhão tinha me dito que ele perdeu a filha e a mulher de COVID e fora perdendo as forças. O desejo de viver e tava secando de depressão. Aí entrei na casa do cara e senti um baque pesado. Um cheiro de morte no abandono. Na penumbra. A geladeira do cidadão fedia mesmo de portas fechadas e o chão grudava a sola meu tênis. Estava amarelado de tanta urina e merda de cachorro. Aí tirei a camisa, amarrei no rosto e continuei carregando móveis e pastas de documentos. O vizinho estava nos vigiando. Dizia: “ele era um cara muito forte. Inteligente. O apelido dele era mago na empresa. Do nada só começou a falar em morte. Que queria morrer. E a casa foi ficando escura. As paredes criando rachaduras. Tudo apodrecendo”. Aí voltei pra casa, fiz fígado acebolado e lembrei de uma passagem da bíblia em que jesus está com fome e pára embaixo de uma árvore que está sem frutos e a amaldiçoa para sempre. Acho que era uma figueira. Ando muito irritado. Agressivo e abrindo espaço para o ódio na minha vida. Ódio é algo muito perigoso para quem pretende fazer poesia. Tempo desses atrasei o aluguel por uma semana e entrei numa discussão pesada com o dono da estância. Desejei com tanta força a morte dele que deu praga de morcegos num compartimento do lugar e o senhor ficou doente por uns dias. Mal levantava da cama. A minha literatura travou. Não saía um verso. Absolutamente nada! Aí me toquei que estava entrando num caminho tenebroso e pedi desculpa ao dono do lugar. A gente deve tomar muito cuidado com que sai de nossas bocas. Percebi que o perdão é mais do que chuva. É poesia. Perdoar deve ser um exercício. Não posso deixar morcegos se acumularem no forro da minha alma.
Diego Moraes
4 notes
·
View notes
Text
Sempre desconfie de sujeitos que se escondem em frases, estilos e manejos de grandes autores. Conheci um cara que nunca sentava nos bares. Sempre bebia de pé ou escorado em balcões "aprenda uma coisa, Diego: Hemingway escrevia e só bebia em pé! Nunca sente. O sangue coagula. Só escreva e beba em pé. Sempre!". Até que um dia o cara bebeu além da conta e me confessou que era tudo marra da parte dele "não tem nada de Hemingway, Diego. Apenas sofro de hemorróidas. Sentar inflama meu cu".
Diego Moraes
0 notes
Text
Não era sobre a gente
Não era sobre o hambúrguer
Muito menos sobre a trilha sonora de Donnie Darko tocando na lanchonete
Não era sobre a gente
Não era sobre a coca zero
Muito menos sobre o cheiro de bacon empesteando a lanchonete
Não era sobre a gente
Não era sobre o novo caso dela
Muito menos sobre o tesão que havia acabado entre a gente
Era sobre a gente
Não importava os anos de namoro chegando ao fim
Muito menos nossas bocas sujas de maionese
Era sobre a gente
Ainda existia abraços, risadas e muitos combos de lanche para pedir na lanchonete
Amizade enche barriga.
Diego Moraes
0 notes
Text
"Que o ódio atropele o amor".
Francisco Espinhara
1 note
·
View note
Text
Hoje finalizei meu décimo livro. Lançamento em 2025.
2 notes
·
View notes
Text
Hoje resolvi visitar o pai de um grande amigo que morreu de overdose. Toquei a campainha, me abraçou, ofereceu café e perguntou se eu precisava de alguma coisa. A gente cheirava muito pó junto. Eu e o Sálvio. O filho dele morto. Nunca rolou mágoa da parte do pai. Muito pelo contrário. Acho que ele gosta de me ver. Deve lembrar o quanto fui amigo do filho dele. Aí uma hora ele fora tomar banho e sentei no capô do Fiat Tempra enferrujado abandonado no quintal onde o Sálvio gostava de cheirar e morreu cheirando sua última carreira. Sentei no carro, acendi um cigarro e fiquei olhando para a mangueira que cobria de sombra quase todo o quintal. Dei umas tragadas e disse: "você faz uma falta do caralho, irmão. Queria te dizer tanta coisa" aí lagrimei um pouco e uma manga verde caiu no capô dando um puta susto em mim. Às vezes a gente sai de cena cedo. Feito fruta dura que ainda não amadureceu. Não tive coragem de pedir sal e comer a bicha. Me ajoelhei na terra preta e cavei um pouco com as próprias mãos e enterrei a fruta. Que do outro lado da vida meu amigo amadureça. A gente precisa ser doce na vida de alguém. Ele sempre foi na minha.
Diego Moraes
16 notes
·
View notes
Text
Dia desses fui fazer limpeza na cozinha de um restaurante e tocou belchior na Rádio Tiradentes. Fiquei segurando o choro. Ando emotivo. Crise financeira é foda. A falta do básico faz qualquer pai de família ou vagabundo chorar. Ando feito porco que sabe que vai virar bacon natalino. Tava eu e um cara que não falava muito e ficava olhando de vez em quando para o chão. Eu disse: "Tenho um livro chamado Meu coração é um bar vazio tocando Belchior" ele continuou calado. Pegou o rodo e continuou empurrando lama e gordura para o ralo. Aí pensei: "Tenho que parar de dizer que já escrevi livros. Ninguém está interessado" aí ele largou o rodo, lavou o rosto na pia: "Você escreveu esse livro mesmo?" "Escrevi! Pode acreditar" aí ele me encarou com os olhos vermelhos e disse: "Eu não tenho tenho mais coração. Também não bebo mais e não gosto mais de música" aí suas mãos gordas voltaram a empurrar água suja no ralo e terminou assim junto com a música Alucinação que tocava no Rádio: "Eu só tenho o vazio, Diego. Só tenho o vazio. Ele vale alguma coisa?"
Diego Moraes
4 notes
·
View notes
Text
Tinha prometido a mim mesmo que pararia de contar coisas íntimas porque tem muito babaca no mundo, mas foda-se. Tenho leitores vividos e crescidos que merecem ler umas coisas bacanas de vez em quando. Minha última internação rolou em 2006. Tinha ganho um carro da minha mãe e vendi o bicho em dois dias para cheirar. Aspirei minha casa inteira até ficar só com a roupa do corpo e uma sandália havaianas no pé. Tinha um cara chamado Judão lá nesse lugar onde fiquei por quase seis meses lendo a bíblia e tratando da
minha adicção. Ele fazia ambulatorial. Passava o dia na clínica e dormia em casa. Acontece que Judão comemorava aniversário no mesmo dia de um psicólogo que ajudava os viciados. Fizeram festa e o caralho a quatro para o psicólogo. Bolo, velinhas, refrigerante e cantaram parabéns. Judão só observando tudo de longe. Meio cabisbaixo. Magoado por não ser lembrado. Aí ele deixou o celular de canto, no banco onde estava sentado, e levantou puto da vida indo em direção a um orelhão que ficava na entrada do lugar. Lá, começou a falar bem alto, gravando uma mensagem que cairia na sua secretária eletrônica: “Oi. Aqui é o Judão! Só liguei para desejar feliz aniversário, saúde e muitos anos de vida!” aí ele voltou, pegou o celular e mostrou pra galera “olha só, quero que a indiferença de vocês vá tomar no cu, porque eu sou foda e não vou me drogar por causa disso. Hoje completo um ano limpo de cocaína. O desprezo de vocês não merece minha recaída”. Nessa hora, todos correram para abraçar o Judão. Confessaram que se tratava de uma pegadinha, porque Judão sempre fazia merda quando se sentia só. Moral da história: não podemos nos torturar pelo desprezo de ninguém. Ame primeiro a si mesmo, antes de ter esperanças de ser amado pelos outros. Não se martirize por ninguém. Não fique triste pela indiferença de ninguém. Seja forte e mande os falsos amigos para a puta que pariu. Seja sua melhor companhia.
Diego Moraes
3 notes
·
View notes
Text
Eu acho a minha vida uma merda. Tem dias que acho realmente que já deveria estar morto. Não gosto nenhum pouco da minha figura. Me acho fracassado. Medíocre. Um sujeito com 42 anos que não consegue se sustentar e que de vez em quando tem recaídas alcoólicas patéticas e catastróficas. Só que mais cedo consegui fazer um bico de mudança de caminhão e fiz uma refeição decente e fui para o meu quartinho mais cedo e dormi. Gosto muito de dormir. Estou de acordo com hemingway: "gosto muito de dormir. Acordado minha vida tende a desmoronar". Pois é. Tomei um banho, li um trecho do antigo testamento e capotei num sonho lindo. Nele eu era um prestigiado poeta e contista. Aí num dado momento eu ligava para meu editor e dizia: "Eu quero uma poeta que não se vitimize diante de um tiro e não tenha medo de morar embaixo da ponte" meu editor ria e respondia que essa mulher já existia e o nome dela era uma tal de Roberta Ilha e que gostaria de me conhecer. Aí o sonho cortava para algumas entrevistas comigo em sacadas de hotéis em beiras de praia e muitos autógrafos em eventos literários. A tal Roberta Ilha aparecia e dizia: "autografa minha alma. Fode comigo. Quero um homem de verdade! Está faltando homem de verdade no mundo! Hoje em dia até os cachorros de rua são fake" ela parecia a baby do brasil com vinte e poucos anos. Linda! E suava muito. Parecia estar derretendo no deserto. Aí a porra de um cachorro na rua começou a latir muito e me acordou. Fiquei um tempo na minha rede olhando a escuridão do teto e escutando o barulho do ventilador. Percebi que estava num sonho com a Roberta Ilha. A sósia da baby com vinte e poucos anos. Tomei um pouco d'água e senti vontade de chorar. A minha vida é uma merda. É melhor dormir. Sonhar. Acho que vou fazer isso agora antes que minha alma desmorone feito um casebre em cima de um barrranco em dia de chuva.
Diego Moraes
3 notes
·
View notes
Text
Como a gente volta refrescante após um mergulho no inferno.
Diego Moraes
4 notes
·
View notes
Text
Realinhar a órbita da última recaída
Jogar pérolas aos porcos é só mais uma forma de ganhar mais pérolas e porcos
Sempre toca Wish You Were Here quando perdôo o roxo dos contornos e abraço algo novo
Levantar a âncora
Alguns navios desacostumaram a desembarcar iludidos nos portos
Descascar a última ferida e amarrar os cadarços para a próxima corrida
Forrest Gump já não conta mentiras tão bem
Meu ônibus passou e continuo no ponto aguardando o milagre
Alguns bebês preferem o andajá
Ainda engatinho no amor
Realinhar a órbita da última recaída
Jogar oferendas ao mar também é só uma forma de se ofender
Sempre toca Wish You Were Here quando me olho no espelho e vejo o reflexo escuro da minha dor.
Diego Moraes
1 note
·
View note
Text
1 note
·
View note
Text
Sou tão carente e decadente que tenho ciúmes da minha amante.
Diego Moraes
2 notes
·
View notes
Text
É um pouco estranho voltar para um quartinho com janela, porta e banheiro. Sinto falta das estrelas, da esperança de ter esperança, das picas e dragões que imaginava nas nuvens, do gosto gélido de cimento das sarjetas, dos colegas de corote e dos copos de sopa doados após horas de tortura religiosa. Também sinto falta do olhar indiferente e cheio de desdém dos miseráveis. Das buzinas, dos semáforos e pesadelos com pauladas, facadas e tiros. A rua é muito mais que um poeta lido em voz alta. A rua é uma professora com vestidinho curto. Dia desses escutei de um cara mais velho que o segredo é ter humildade. Ele está certo. Eu senti muito medo nos últimos dias. Pois a rua é traiçoeira e mata também. Na calada. Só que apesar de não ser um exemplo de ser humano pra ninguém, tenho algo que acho que sempre me salva: a literatura. Ela é meu Cristo. É bom estar vivo num quarto escrevendo. Profetizando lirismo de forma humilde no meu caderno de capa dura. Que as estrelas continuem piscando lá fora e a paixão pela poesia continue.
Diego Moraes
3 notes
·
View notes
Text
Personagens icônicos de Manaus
Ali ao lado da sorveteria glacial na avenida Getúlio Vargas existia um guei parecido com o cantor Roberto Carlos. Os jovens e noias passavam pelo casarão dele de madrugada e o bicho usava o "truque do piano". Ele ficava sentado de pernas cruzadas e quando a geral passava ele metia essa: "me ajuda a afastar meu piano? É muito pesado. Não consigo" aí o sujeito entrava e ele metia a mão no pau do sujeito na maior cara de pau. Era um guei muito tarado. isso rolava lá pelo final da década de 90 e início dos anos dois mil. São detalhes muito grandes para esquecer. Tempo desses eu fui tomar um sorvete com a minha ex na glacial e passei pelo casarão dele. Só existia o piano empoerado. Calado. Em silêncio. Como uma pica imensa. Pesada. Sem bocas para chupar ou meter. Grande personagem o "Roberto truque do piano". Manaus é a cidade mais underground do mundo.
Diego Moraes
0 notes
Text
A gente se regenera quando mergulha profundamente no abismo. Quando beija de língua a sarjeta da esquina. Parece que rejuvenesci mil anos nessa minha última estadia na rua. Kerouac me batizaria um beat genuíno.
Diego Moraes
1 note
·
View note
Text
- O que é poesia, Diego?
- Um soco no estômago e depois um boquete.
Diego Moraes
0 notes