#obrpov: tisífone
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#obrpov + #happyfrostalia, parte III: tisífone.
▸ tw: cobras, alucinação.
24 de dezembro de 2023, aproximadamente 07h27.
O ambiente era preenchido por aquele cheiro típico de canela queimada, ervas e transformações químicas. Ela provavelmente tinha estado ali mais vezes do que qualquer outro aluno nas últimas semanas. No feriado de Frostalia, o laboratório estava vazio. A única companhia da terrarium naquele começo de manhã, fora a guia espiritual que a observava de uma mesa próxima à que trabalhava, era a neve que conseguia enxergar através da janela.
Como em todos os últimos anos, nevava no Frostalia de Northerna. Ela estava feliz por isso. Diante de toda a loucura que sua vida tinha se tornado nos últimos meses, era bom ter um pouco de normalidade, mesmo que soubesse que isso não era realmente um alívio se começasse a pensar sobre tudo o que a agoniava. O não significava que ela estava infeliz; muito pelo contrário.
Se Arianrhod pudesse ranquear seus anos, 2023 tinha sido o melhor de todos os que já vivera; havia forte apego emocional pelos quase cinco anos que compartilhou com a mãe, mas as memórias, ainda que marcantes, eram poucas demais para que conseguissem ser comparadas as que colecionou desde então. Ela agora sabia, mais do que nunca, que não estava mais sozinha. Sem contar os pormenores de tudo isso, o fato por si só já era quase como ganhar uma guerra em que lutou cega por eras. A terrarium tinha finalmente provado da verdadeira felicidade durante aquele ano, mas isso não a livrava do caos.
Talvez ela dependesse dele para existir, na verdade. Os últimos meses tinham sido um prato cheio para isso.
Era quase curioso que dez anos depois de ter descoberto a real causa da morte de sua mãe, ela estivesse com a vingança na ponta dos dedos, como num jogo de palavras que se entrelaçam até todas as partes estarem preenchidas. Na semana anterior, ela tinha marcado duas: o mordomo e o assistente. Um realmente como vingança, o outro como efeito colateral, uma praga que precisava ser arrancada pela raiz antes que causasse problemas.
Na noite anterior, ela tinha descoberto outra ponta daquele jogo: o médico. Na verdade, era exatamente nisso que se concentrava naquele momento, misturando os ingredientes de uma poção que jurava de pés juntos para a maioria das pessoas não saber fazer. Contudo, assim como num jogo de palavras, havia uma linha que vinha cuidando discretamente, marcando à caneta as letras que sabia serem as corretas, deixando que se montasse sozinha, como num mistério a ser revelado.
Na sexta-feira, Arianrhod tinha cuidado de um presente para seu pai.
Ela não tinha sido convidada para ir passar o Frostalia em casa nesse ano, o que significava não ser bem-vinda, mas isso não era de nenhuma forma ruim. Owen e os irmãos não a queriam por perto, mas ela também não os queria... o que poderia fazer, contudo, se gostava de dar presentes?
Um sorriso brincou em seus lábios conforme inseria aquele fio de cabelo na solução dentro do frasco escuro. Pelo que se lembrava de seu pai, aquele homem tão ciente de sua própria importância que jurava não ter medo de absolutamente nada, ele ficava bem apavorado com qualquer coisa relativa à escorpiões ou cobras. Arianrhod não enxergava motivo para isso, afinal, eram bichinhos tão gentis. O mero pensamento a fez rir.
Pelos diários de Farwa, Owen constantemente a chamava de louca. Bom, ela era, não era? Mulheres eram loucas, dissimuladas, histéricas. Owen Llewellyn nunca quis ter uma filha e Aria suspeitava que tinha se casado somente pelo acordo e por ter uma mulher bonita para serví-lo. Deve ter sido uma decepção quando descobriu a cobra peçonhenta que rastejava por baixo de seu nariz.
Ela se lembrava de quando o pai a chamava de louca, também. Na verdade, ele a xingava tanto em suas sessões de agressão que depois de um tempo tanto os machucados quanto as palavras deixaram de doer, mas o pensamento ainda martelava. Sua mãe era louca, ela era louca, a avó era louca também. Estava na hora do patriarca dos Llewellyn ser louco. Estava na hora dele começar a provar do próprio veneno, ou melhor, do veneno dela.
Tinha pensado em tudo já há algum tempo. Era melhor que não estivesse em casa, porque não sabia se iria querer se livrar da culpa de seu feito, afinal... era uma coisa terrivelmente bem feita.
Enquanto Arianrhod estivesse na Academia, desfrutando da Véspera de Frostalia com seu namorado, irmão e amigos mais próximos, com as pessoas que amava, Owen Llewellyn se depararia com um presente bem em cima de sua cama. Ele chamaria por algum empregado para reclamar daquilo, já que odiava presentes; se frustraria pela ineficiência de quem tinha contratado, ficaria furioso por causa daquele embrulho, porque não passava de um velhote mimado e estúpido. Então, num gesto de chilique, daria um tapa forte o suficiente para jogar a caixa no chão, mas que não causaria absolutamente nenhum mal à sua estrutura por ser de madeira rígida.
Enquanto Arianrhod estivesse brindando e sorrindo e quem sabe até mesmo cantando, Owen Llewellyn seria tomado pela curiosidade e destamparia a caixa sem cerimônia alguma, somente para dar de cara com uma dúzia de víboras do deserto se enrolando umas nas outras, doidas para saírem daquela caixa o quanto antes, sedentas por sangue como o dele. Ela tinha feito um bom trabalho, contudo.
Apesar de sedentas por sangue, aquelas víboras não tinham mais veneno nenhum. Arianrhod tinha tomado o cuidado de que tudo que pudesse matar um ser humano tivesse sido extraído antes que as víboras seguissem para seu destino final, carregando somente raiva e talvez alguma poção consigo.
Enquanto Owen Llewellyn estivesse preocupado demais caindo nas garras do medo, achando que iria morrer, tentando em vão acertar os lindos r��pteis de chifres com seus raios de voltaico, a poção gasosa ativada pela abertura da caixa preencheria todo o seu quarto e entraria por suas narinas, o levando direto para seu pior pesadelo por muito mais do que algumas horas.
Se todas aquelas mulheres eram loucas, o presente do artífice naquele Frostalia era semelhante loucura. Loucura tão grande que seus gritos seriam escutados por todos os cômodos da casa, mas ele estaria sozinho com tantos empregados desacordados. Antes de tudo isso, contudo, ele já teria sido perturbado o suficiente pelo bilhete impresso colado ao laço da caixa, um bilhete do qual nunca se esqueceria, por mais simples que fosse.
“Feliz Frostalia, Owain. - Umbra.”
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