#desafiocriativo
Explore tagged Tumblr posts
causos-e-contos · 4 years ago
Text
Imaginário?
Desafio de escrita dia um: Um amigo imaginário precisa convencer a criança que ele é real para que ele não desapareça. Proposta por @desafiodeescritadiario. 
Eu roubei um pouquinho e escrevi pelo ponto de vista da criança, mas acho que tá valendo assim mesmo, né? E também me apressei um tanto no final, porque quando vi já estava com duas mil palavras e não era pra ser tão grande.
Imaginário
Júlia observava o amigo, Otávio, em tom de desconfiança desde a última conversa que teve com sua mãe a exatamente três dias, nove horas e dezenove minutos, e sabia o tempo exato por dois motivos igualmente importantes.
O primeiro, muito simples, era que acabara de aprender a ver as horas em relógio de ponteiro ensinada por seu pai. Já estava forçando os miolos tentando entender a conversa corriqueira de seus pais onde a mãe gritava da cozinha perguntando as horas a modo de saber se estava adiantada no preparo do almoço e recebia como resposta do marido “dez ‘pra meio dia”. As vezes eram cinco ‘pra meio dia, em outras quinze, mas o que lhe deixava encucada mesmo era o fato dele responder isso tão rápido e com tamanha certa após olhar por alguns segundos para seu relógio de pulso prateado. Júlia, que não era boba nem nada, já tinha pego algumas vezes o celular do pai para mexer nos joguinhos que lá estavam esperando por ela, e, enquanto jogava, via uns númerozinhos lá no topo da tela. Já tinha aprendido sobre números na escola, conseguia contar de zero a dez de trás para frente (do onze em diante não, porque os nomes se complicavam e era muito fácil trocar dezesseis e dezessete quanto se conta de trás pra frente), e sabia também que aqueles números do celular eram a hora do dia. As vezes eram treze horas e oito minutos, em outras dezesseis e três, mas nunca viu enquanto jogava a telinha mostrar “dez ‘pra meio dia”. Acresce que o relógio de seu pai nem número tinha, só uns risquinhos — uns grossos e outros mais finos — e três ponteiros que pareciam estar ali só pra dar um nó na sua cabeça.
Num dia, enquanto almoçavam os três juntos na mesa, não tirou os olhos do relógio, tentando entender como funcionava. Nem prestava atenção no que comia, sujou a boca toda de feijão causando risadas a Otávio e esporros da mãe que a lembrava de ter modos na mesa. No fim o pai percebeu sua curiosidade e a ensinou sobre os ponteiros, e que “dez ‘pra meio dia” significava que faltavam dez minutos para o meio dia, e que o meio dia eram as doze horas, por que o dia tem vinte e quatro horas e a metade de vinte e quatro é doze. Estava tão orgulhosa de suas novas descobertas que passou a contar o tempo o tempo todo, ganhou um relógio de pulso como o de seu pai, porém rosa e feito de plástico, e descobriu que levava dois minutos inteiros escovando os dentes, meia hora da sua casa até a escolinha, mas que só duravam quinze minutos os episódios de seu desenho favorito. Todas essas descobertas compartilhava com Otávio, seu melhor amigo e confidente, presente em todas as horas e demonstrando sempre surpresa equivalente à dela para com as coisas novas do dia a dia.
Mas havia um segundo motivo para saber o tempo exato em que passou a ver o amigo com um olhar diferente, e este era o assunto da conversa que tivera com sua mãe...
Veja bem, Júlia e Otávio se conheciam desde sempre, e desde sempre brincavam juntos, conversavam, brincam e as vezes brigam também, trocando farpas em uma birra tipicamente infantil, mas a amizade tinha lá suas peculiaridades. A começar que Júlia não conseguia se lembrar como conheceu o menino. Ele não estudava na mesma escolinha que ela, embora aparecesse por lá de vez enquanto; não era seu vizinho nem morava no mesmo bairro que ela, se tinha pais estes não eram amigos dos pais de Júlia e ela sequer tinha ouvido menção de adultos na vida de Otávio. Ele simplesmente aparecia as vezes, ninguém sabia de onde vinha ou para onde ia. Além disso, tinha o estranho fato de que apenas Júlia era capaz de vê-lo, embora se lembrasse de dezenas de vezes que o garoto passara dias inteiros em sua casa quando resolviam fazer festas de pijama, lembrava-se com clareza dele se debruçando sobre o relógio prateado de seu pai para também aprender a ver as olhas e de ir com ela e a mãe até o camelô para escolher o seu de plástico rosa bonito. Nem as outras crianças pareciam capazes de vê-lo, mesmo com suas tentativas constantes.
Por tudo isso e mais um pouco a mãe de Júlia disse a ela que — talvez — Otávio fosse um fruto de sua imaginação, um “amigo imaginário” como ela havia chamado.
      — Eu tive uma na sua idade. — Ela disse a fim de aquietar os nervos da filha que se recusava a acreditar naquela nova descoberta. — Acho que se chamava Emília. — Riu-se pondo o pano de prato nos ombros e a mão na testa acenando a cabeça em uma negação divertida. — Por causa do Sítio do Pica-Pau, sabe? Aprendi a ler e a imaginação corria longe...
      — Otávio não é imaginário não. — Protestou pela quinta vez desde que ouviu a palavra “imaginário” pela primeira vez desde aquela conversa começou.
      — Como que não é, Júlia? Cadê ele agora? Porque do seu lado é que não tá! — A mulher se irritou um tanto, assustando Otávio que estava do lado dela. — Olha que ‘cê tá ficando grandinha demais pra isso, hein? Tinha é que usar essa imaginação aí pra fazer alguma coisa boa, quem sabe num cresce e escreve livro ou uma novela dessas da Globo.
“Só não pode é continuar assim não, já é uma mocinha e o povo é falador. Vou é te dar uns livros que isso sim que é bom e você esquece disso de uma vez.”
E saiu resmungando de volta pra cozinha por que tinha trabalho pra fazer.
Nos três dias, nove horas e dezenove minutos que se sucederam Júlia ganhou os tais livros — Bisa Bia, Bisa Bel; O menino maluquinho; Chapeuzinho Amarelo e Reinações de Narizinho, onde estava a tal Emília que fora amiga de sua mãe —, ganhou um caderno bonito e canetas coloridas para fazer um diário e “por ‘pra fora essa imaginação toda aí”, mas ganhou também uma pontinha de dúvida que cutucava seus miolos tipo espeto. Durante três dias, nove horas e dezenove minutos vigiou Otávio de pertinho para ter certeza de que estava realmente lá, mas sempre que queria que ele estivesse ele estava e isso não ajudava em nada.
      — ‘Cê mora aqui perto? — Perguntou ela verbalizando sua desconfiança.
      “Moro pertinho!” Ele respondeu. “Aqui do lado, aí dá pra chegar aqui rápido.”
Ela assentiu, era uma explicação plausível, exatamente o que ela pensou que seria.
Mas o espeto não lhe saia dos miolos de jeito nenhum, tentava e tentava tirar, mas ele continuava lá incomodando. A resposta de Otávio foi exatamente o que ela havia imaginado, e lá estava aquela palavra novamente: IMAGINAR.
Pediu emprestado a mãe um dicionário velho e empoeirado que ficava guardado na gaveta da bagunça naquele armário ainda mais velho e empoeirado que ninguém usava, a mãe lhe emprestou de bom grado imaginando que os livros que comprou no sebo já estavam fazendo efeito na cabecinha da menina. Em meio a dúzias de palavras complicadas — nem sabia que existiam tantas palavras assim — e encontrou lá pelo meio o que procurava.
Descobriu que imaginar era verbo transitivo, embora não soubesse o que “transitivo” era, e que significava conceber algo, fantasiar, criar a partir de sua mente. Seria por isso que Otávio conseguia dizer o que ela pensava? Porque ela pensava ele?
Foram também durante esses três dias, nove horas e dezenove minutos que Otávio se desesperou. Tentou de tudo um pouco para convencê-la de que era tão real quanto o dicionário empoeirado que ela segurava. Finalmente contou sobre seus pais, eles eram super-heróis e passavam o dia todo combatendo o crime e por isso nunca apareciam, mas Júlia já tinha pensado nisso antes. Disse que era órfão e não tinha nem pai nem mãe para apresentar, mas se isso era verdade; perguntou Júlia; como poderia morar em uma casa perto da dela como havia dito a pouco?
      “Moro com meus tios.” Ele novamente deu uma explicação que Júlia podia acreditar e ela aquietou por mais um tempinho.
Mas o espeto não parava de incomodar seus miolos.
Se Otávio fosse imaginário e a imaginação voasse longe, como dizia sua mãe, então ela podia ter imaginado a explicação também, não podia?
Pensando nisso foi ter uma conversa com seu pai que estava sentado no sofá assistindo a novela que dizia apenas aturar por causa da esposa, mas ao mesmo tempo não perdia um capítulo.
      — Pai... — Chamou sentando do lado dele.
      — Hm? — Resmungou sem tirar o olho da televisão.
      — Como é que a gente sabe que não tá imaginando que imagina as coisas? — Perguntou com toda a seriedade que seus seis anos lhe permitiam.
O homem ficou em silêncio um tempo, tirou os olhos da discussão épica que acontecia na tela entre Leonor e Ruth por causa do marido de uma e amante de outra, deixou o queixo barbudo cair e encarou a filha por longos segundos antes de se desmanchar em risada. Chamou a mulher e contou a estória sendo interrompido várias vezes pelas próprias risadas, e a mulher riu também até não aguentarem mais, ficarem vermelhos e necessitados de ar.
Júlia, por sua vez, ficou vermelha de raiva e vergonha. Porque riam de uma coisa séria dessas? Era a existência de seu melhor amigo que estava em jogo ali! Otávio, coitado, já estava apavorado e pedia desesperadamente que fossem no quarto descobrir o que tinham naqueles livros novos e deixassem essa coisa toda dele existir ou não de lado.
A coisa toda era que Otávio queria existir, se não existisse o que aconteceria com ele? Júlia sabia que algumas coisas só não existiam e era assim mesmo. Os dragões, por exemplo, cuspidores de fogo voadores e ferozes, não existem e sabia disso porque pediu um de aniversário e a madrinha explicou que isso não seria possível, o que não sabia era como os dragões se sentiam por não existir. Ficavam tristes com isso? Ela não queria que Otávio ficasse triste, e Otávio não queria também não.
      — É sério! — Protestou as risadas dos pais com as bochechas infladas e braços cruzados, e repetiu a pergunta: — Como é que a gente sabe que não tá imaginando que imagina as coisas?
      — Ih, eu não sei não. — Disse o pai tentando se recuperar o fôlego. — Isso aí parece até questão de prova de filosofia.
      — O que é filosofia?
      — Ah, é uma matéria que eu estudava na escola. — Coçou a nuca ficando meio desconcertado com tanta pergunta.
      — Se você estudou então porque não sabe? — O pai ficou vermelho que nem pimentão, a mãe voltou a rir com vontade e Otávio espiava tudo por detrás do ombro de Júlia.
      — Filosofia é mais pergunta do que resposta. — Disse ele tentando se defender. — Era tipo história, um pessoal de antigamente que perguntava os negócios que não sabiam e tentavam responder.
Júlia pensou e pensou...
Ela não sabia que tinha perguntas que não tinha resposta. Sempre que ela perguntava pra alguém alguma coisa eles respondiam, as vezes meio atravessado, mas respondiam. Era até estranho não ter resposta depois que se acostumava com elas.
E como descobriu que aquela pergunta tentou outra:
      — Oque que acontece com as coisas que não existem?
O pai pensou e pensou...
A mãe ficou em silencio olhando para o marido com um sorriso divertido e dava pra ouvir os miolos dele fritando dentro da cabeça.
      — Oque não existe só não existe mesmo. — Ele respondeu simplista. — Não tá aqui e pronto.
      — Mas como é que a gente imagina algo que não existe? — Insistiu, Otávio sorrindo de orelha a orelha.
Ele estava ali, então ele existia.
Não é?
      — Imaginação serve pra inventar coisa que não existe mesmo. — Interveio a mãe. — Só existe na sua cabeça.
O sorriso de Otávio morreu.
Se ele fosse imaginário e só existisse na imaginação de Júlia, então se ela parasse de imaginar ele ia desaparecer?
Júlia pensou e pensou...
Largou os pais na sala e foi pro quarto sem perguntar mais nada.
Otávio, que queria muito existir, disse todo tipo de coisa com medo de desaparecer.
      “Eu sou um fantasma.” Ele disse convicto, Júlia se arrepiou toda com o pensamento. ��Não, eu não sou fantasma não.”
      — Mas você acabou de dizer que era. — Pontou.
      “Mas eu não tenho medo de fantasma.”
      — Eu tenho medo de fantasma.
      “Eu também.”
      — Mas é você que tem medo ou eu que tenho?
      “Nós dois, ué.”
      — E se eu imaginei que você tem medo de fantasma que nem eu?
Júlia pensou e pensou...
      “E se eu for sua imaginação?” — Perguntou Otávio.
Otávio não era imaginário, era imaginação e a imaginação não podia deixar de existir não.
24 notes · View notes
geizarte · 4 years ago
Photo
Tumblr media
Este desafio é para você, não importa se você se considera artista ou não! Comente sobre esta frase aqui abaixo, no vídeo anterior ou faça seu próprio post me marcando (@geizarte) com a sua resposta. Use a sua criatividade! . . . #geizabarreto #desafiodecriatividade #desafiocriativo #criatividade #criatividadenapratica #exercitandoacriatividade https://www.instagram.com/p/CB6hAEyHykD/?igshid=1gqqf0avommdl
0 notes
lukaluluka · 5 years ago
Photo
Tumblr media
No perfil do @austinkleon você encontra o link para baixar este PDF com um desafio pessoal de 31 dias. Você define um hábito que quer mudar ou adquirir e controla nesta planilha. Legal imprimir em escala menor e colocar na agenda, planner ou bullet journal. Meus objetivos diários serão: criar e beber 2 litros de água. #austinkleon #creativekleptomania #31daychallenge #desafiocriativo #vidacriativa #creativelife https://www.instagram.com/p/B9NJNoTjY9z/?igshid=ecg43h6xa8v0
0 notes
eduardouzae · 7 years ago
Photo
Tumblr media
Quero a resposta de cada um! Posto a resposta do livro as 18h! #design #semiotica #desafiocriativo
0 notes
acciomoonlight · 8 years ago
Photo
Tumblr media
Ainda da tempo de fazer o de segunda??? #desafiocriativo #desafiobujodepobre #fansbujodepobre
0 notes
mulher-de-roxo-blog · 12 years ago
Photo
Tumblr media
http://desafiocriativo.blogspot.com.br/2013/02/ilustracoes-em-aquarela-por-anneli.html?utm_source=BP_recent
0 notes
fragmentoscotidianos · 12 years ago
Photo
Tumblr media
#desafiocriativo #creativechallenge making of (Taken with Instagram)
0 notes
daniellanavarroarts · 3 years ago
Photo
Tumblr media
Muitos universos existem em mim, aqui são representados por meus cantinhos favoritos que chamo de cidades. Cidades que me iluminam me encantam e me constroem a ser esse ser humano que busca incansavelmente o impossível porque acredito que posso sempre mais em tudo que faço. Bem vindos às minhas cidades 🥰 @desafiopapelelinhabr #desafiopapelelinhabr #cadernosartesanais #daggazatellier #encadernação #desafiocriativo #feitoamao #livrodeartista (em Jardim Da Penha) https://www.instagram.com/p/CL2kbN3DYT9JYNw7O-urLEBPF1LAYZM1Lg7ELI0/?utm_medium=tumblr
0 notes
fragmentoscotidianos · 12 years ago
Photo
Tumblr media
#mikiscreativechallenge #desafiocriativo #mikipupils #pupilosdamiki (Taken with Instagram)
0 notes
fragmentoscotidianos · 12 years ago
Photo
Tumblr media
tem como não amar? ganhei de presente da minha pupila 😍😍😍 | my pupil gave me as a birthday gift (she's so cute i can't bear) 😍😍😍 #mikipupils #pupilosdamiki #desafiocriativo #mikiscreativecoaching (Taken with Instagram)
0 notes
fragmentoscotidianos · 13 years ago
Photo
Tumblr media
#desafiocriativo de mim para minha pupila | #mikiscreativechallenge from me to my sweet pupil #coachingcriativo #mikiscreativecoaching (Taken with instagram)
0 notes
fragmentoscotidianos · 13 years ago
Photo
Tumblr media
fechado | closed #desafiocriativo #mikiscreativechallenge #creativecoaching #coachingcriativo (Taken with instagram)
0 notes
fragmentoscotidianos · 13 years ago
Photo
Tumblr media
detalhe | detail #coachingcriativo #creativecoaching #mikiscreativechallenge #desafiocriativo (Taken with instagram)
0 notes
fragmentoscotidianos · 13 years ago
Photo
Tumblr media
finished, aberto | finished, open #desafiocriativo #mikiscreativechallenge #creativecoaching #coachingcriativo (Taken with instagram)
0 notes
fragmentoscotidianos · 13 years ago
Photo
Tumblr media
e esse foi o desafio criativo com o qual minha pupila me desafiou | my sweet pupil challenged me with this subject #creativechallenge #desafiocriativo #coachingcriativo #creativecoaching (Taken with instagram)
0 notes
fragmentoscotidianos · 13 years ago
Photo
Tumblr media
nas sessões de coaching criativo com meus pupilos, proponho um desafio criativo: a partir de um mote dado, o coachee faz uma criação livre. este foi o tema da vez. quem quiser brincar, está convidado! inspirado por @kekeiasvezes 😘😘😘 | in the creative coaching classes that i hold to my pupils, i challenge them with a creative challenge: from a preliminary incentive, they are invited to create something. this was last week's challenge. everyone who would like to play is invited ☺☺☺. work inspired by @kekeiasvezes #creativecoaching #coachingcriativo #desafiocriativo #creativechallenge (Taken with instagram)
0 notes