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jornalismoliterarioegonzices · 11 years ago

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O Brasil Acordou?

por Vinicius Costa

Todos os dias, sempre por volta das 7:00 da manhã e depois às 8:20 da noite, passo pela linha amarela do metrô de São Paulo. O local é bonito, considerado como a linha mais moderna do Brasil, cheia de televisões em seus corredores e vagões de alta tecnologia. Mas uma coisa me incomoda bastante, mais até que as filas gigantescas e as panes da máquina de carregar o Bilhete Único (que já viraram rotina): a TV Terra.

Para os que não conhecem, os corredores e escadas do metrô (que possui pelo menos quatro andares pra baixo em cada estação) sempre possuem alguma tela gigantesca patrocinada pelo portal Terra, que veicula notícias com imagens e pequenas notas explicativas no rodapé. A princípio isso lembra até o Big Brother de George Orwell pelo alto númuro de aparelhos televisivos que praticamente mandam quem passa por ali ler sobre o que está escrito na tela. Mas a realidade mesmo está mais para um Big Brother da Globo, já que a maioria das notícias que a TV Terra publica são relacionadas às celebridades nacionais ou internacionais. E sim, é isso que me irrita.

Nada contra a vontade de saber sobre a vida alheia, muito menos se o filho do Ronaldo Fenômeno está bonito de penteado novo ou se a Mariah Carrey está com uns quilinhos a mais. Mas um local de utilidade público não deveria ser espaço para notícias de celebridades, pelo menos não em sua maioria. Notícias veiculadas em um local como o metrô de uma das maiores cidades do hemisfério sul deveriam dar mais prioridade ao que é de fato importante para o andamento da cidade, como notícias sobre o trânsito, legislativo municipal, eventos e exposições, ou qualquer outra coisa relacionada de fato à São Paulo.

Fico pasmo com valor que o considerado maior portal de notícias online do mundo dá para essas notícias. Notas que não dizem respeito a nenhuma informação relevante, que não exigem qualquer contextualização, muito menos disseminam qualquer mensagem que agregue ao menos uma racionalização. São apenas palavras conexas formando um significado vazio e irrevelante, com função nenhuma a não ser a da publicidade, e, como George Orwell dizia, “jornalismo é tudo aquilo que alguém não quer que se publique”,

Quando Adorno se disse apocalíptico em suas perspectivas futuras, ele e seus colegas de Frankfurt davam a responsabilidade pelo veiculação e entendimento da mensagem para o emissor, o que poderia desenvolver uma possível alienação informativa em massa pelos meios de comunicação. O que se vê hoje é o contrário desse princípio apocalíptico da mensagem (teoria da agulha hipodérmica), já que meios de comunicação passam a pautar seus interesses no que podem ser considerados conteúdo simples e de maior aceitação pelo público, o que faz, desse modo, o interesse do receptor ser prioritário na emissão da mensagem.

Informações de interesse público, consideradas jornalisticamente como o conteúdo relevante para a convivência em sociedade, como informações sobre o governo, leis, trânsito, economia e cidade vem sendo deixadas de lado para dar espaço ao entretenimento, o que é guiado por pesquisas de audiência e marketing que representam o interesse do que o público quer receber. O resultado dessas pesquisas e a consequente orientação para os intesses do público tem deturpado a cobertura política, extremamente necessária para entender e participar da sociedade em que vivemos.

Segundo Bourdieur, filósofo contemporâneo francês, assuntos políticos em geral têm um problema grave para sua compreensão: a difícil contextualização em vida que possa aproximar o entendimento para o leitor mais leigo. Porém, esse não é o único entrave.

Para Bordieur, a cobertura política vem se deturpando primeiro pelo trabalho preguiçoso por parte de muitos jornalistas, que ao não encaixarem sua cobertura num interesse público, algo que exige um trabalho mais apurado e técnico pelo teor de aprofundamento necessário, compõem informações rasas de um modo conflitante que entram no entendimento do leitor como nada mais que uma briga entre os lados políticos opostos da cobertura, o que se entende assim como uma espetacularização dos conflitos no ambiente político e um decorrente conhecimento ilusório do que realmente se passa nesse cenário e interessa para o leitor.

Para ele, essa constante veiculação de pareceres conflitantes é uma prática que resulta do comportamento da profissão, na qual sempre se está à procura de elementos de denúncia, furo e conclusão nos fatos noticiados. Bourdier acredita que essa característica do jornalista pode trazer prejuízos ao que é veiculado, pois não é feita a contextualização necessária para um entendimento mais completo da situação, o que já era algo visto pela Escola de Frankfurt, em 1937, como essencial para uma melhor compreensão dos fatos.

Além disso, o comportamento líquido da sociedade vem transformando as informações em algo cada vez mais rápido e passageiro, como no caso da TV Terra do metrô dito no começo do texto. Porém, a maior evidência em conteúdos de entretenimento na TV Terra da linha amarela não é totalmente normal nesse tipo de televisão com notícias curtas e imagens de ilustração. Já vi em muitos elevadores uma incidência desse tipo de conteúdo muito menor, onde em vez de cinco notícias de entretenimento a cada dez (como no metrô), se tinha uma ou duas, tendo as notícias sobre a cidade, política e economia muito mais espaço, mas essas ainda totalmente curtas e factuais. Desse modo, o que pode se observar é uma veiculação de conteúdos de mais fácil compreensão encaminhados por uma falta de interesse mútua entre empresas e sociedade. Guiados pela falta de interesse da população em informações mais aprofundadas, as estratégias de marketing que se pautam por pesquisas de audiência acabam dedicando mais espaço para o tipo de notícia que agrade o espectador.

A visão jornalística de conclusão rápida, que muitas vezes não leva em conta os desdobramentos passados e busca apenas o presente pelo sua característica de realizar publicações periódicas com rápidas conclusões para a tomada de novos assuntos, assim como a cultura da informação instantânea também são outros fortes componentes para essa baixa incidência de notícias aprofundadas e críticas. Sendo assim, pode-se dizer que o que mais influencia nesse tipo de comportamento da mídia em geral é o interesse DO público em conjunto com o fraco desempenho no exercício da profissão jornalística, algo que pode ser visto facilmente ao observar por apenas alguns minutos a TV Terra do metrô.

Nos últimos dias, essa importância da sociedade junto ao jornalismo como resultante desse tipo de informações menos relevantes ficou bem clara. Com a gigante tomada das ruas por principalmente jovens entre 16-30 anos, público que mais utiliza a linha amarela e as redes sociais, que clamavam por um Brasil melhor, foi possível perceber uma modificação do comportamento da grande mídia em comparação ao que se via até antes do penúltimo dia de protestos. A grande mídia, que se encontrava numa clara posição desfavorável aos protestos por fazer publicações que insistiam num comportamento de depredação por parte dos manifestantes em geral, depois do que foi a maior manifestação popular depois dos Caras Pintadas passou a se tornar passiva e apoiar o movimento, que não mudara em nada seu comportamento. O trânsito ficou paralisado em pelo menos seis grandes avenidas ao mesmo tempo, houve tentativa de invasão no Palácio dos Bandeirantes e mesmo assim a mídia focou suas notícias no comportamento pacífico das manifestações num tom de incentivo. Ficou evidente que a reação de apoio maciço por parte da população ao movimento colaborou totalmente para essa mudança de opinião.

O comportamento das manifestações Brasil afora fez surgir uma pauta de discussões gigantesca sobre política nas redes sociais. Desse modo, o que se pode ver nos meios de comunicação nesses últimos dias foi um claro posicionamento favorável a esse tipo de assunto em seus espaços, e esse maior interesse é passível de transformar a comunicação jornalística atual num geral caso essas manifestação continuem com voz ativa, pois a população tende a exigir conteúdos que digam respeito ao que de fato importa para ela.

A demanda informativa pode mudar. Se o Brasil acordou depois dos acontecimento da última semana, isso ficará nítido no que já começa a virar pauta principal nos meios de comunicação, especialmente na TV Terra do metrô. O povo em uníssono exclamava:” EI BRASIL, VAMOS ACORDAR, O PROFESSOR VALE MAIS DO QUE O NEYMAR!” Até as últimas semanas a principal pauta era o Neymar. Hoje não só se fala de manifestação e política. Resta saber se o Brasil acordou mesmo e vai querer mais do salário do professor do que saber do cabelo, filho ou drible do Neymar no Barcelona. Ontem o Brasil fez um jogo magistral contra o México, jogando em casa, um fato totalmente inédito para quem tem acompanhando a seleção e enquanto isso o povo estava na rua reivindicando seus direitos e falando sobre política!!! Aguardo ansiosamente a cobertura da TV Terra no metrô nos próximos dias…

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