#A Cidade Queimava AU
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Nós vamos salvar o mundo – E ao redor deles a cidade queimava
Ou o Apocalipse!AU
(É bem longo, vou logo avisando)
O mundo acabou
É, eu sei, tamo no caminho já
O mundo acabou numa chuva de bombas e ondas de fogo. Começou no Estados Unidos, apenas porque tudo começa lá.
Os países participantes da ONU vinham discutindo isso faz um tempo, mas foi numa reunião rotineira que tudo deu errado. Os Heróis estão ganhando muito poder, seu vínculo com a Associação de Heróis não é forte suficiente para controlá-los, temos que tomar novas medidas, o embaixador da China anunciou. Bobagem, os Heróis estão bem, é você que não sabe como mantê-los na coleira, o embaixador dos Estados Unidos retrucou.
E começou assim. Vozes levantaram, mesas viraram, seguranças tiveram que separar os dois à marra, alguns embaixadores tomaram partido, outros apenas observavam a cena.
Uma semana depois a China foi atacada, e começou assim.
O Japão não demorou para virar um alvo, apesar de ter alianças com os Estados Unidos e Heróis excepcionais, a China ainda era maior, e menos piedosa. Em alguns meses o Japão tinha sido invadido e dominado pela outra nação, All Might foi inútil, ele não estava no país durante a invasão, e seus afiliados nos EUA não o deixaram voltar.
A guerra não durou muito, quando praticamente todas as cidades do planeta foram reduzidas a pó, as duas nações pararam com as bombas nucleares e as chuvas de ácido, mas não houve um cessar fogo completo. Bombas de menor escala ainda eram jogadas em acampamentos, militares ainda marchavam em vilas e destruíam plantações, tendas, matavam, estupravam, arrastavam as crianças para se tornaram soldados. Mesmo com o documento constatando a paz entre as duas nações, o dano já estava feito, outros países que sobreviveram também começaram a atacar, era eles ou os outros, e os Governos não estavam dispostos a sucumbir
Izuku lembra do começo com uma clareza mórbida e um peso no coração. Tinha doze anos, um futuro incerto e uma vida triste (antes diria miserável, mas ah, ah pobre pequeno Izuku, descobriria o que miséria).
Quando a guerra começa, Inko passa a ensinar tudo que ela sabe sobre medicina para o menino. Izuku começa a ler livros no assunto que Inko lhe dá. Chame de Intuição Materna, mas Inko tem um bolo em sua garganta que se recusa a desmanchar. Ele nunca vai embora.
Quando o Japão é invadido Izuku para de ir à escola. Ansiedade rasteja sob sua pele. Com a promessa de a qualquer momento uma bomba cair em sua cabeça, a rotina escolar faz seu estômago pesar, ele vomita no banheiro quase duas semanas depois, uma tensão se formou na sala, nas ruas, nas lojas. Ele começa a estudar em casa, indo à instituição apenas para provas e outros afins
Inko o leva em seus turnos agora, acompanhando a enfermeira fielmente, segurando a bile que o sufocou a primeira vez que viu uma mulher chegar com o estômago aberto. De noite ele pega uma mochila velha e a enche com itens de kits médicos, a violência aumentou nos últimos dias, e esse é o único jeito que ele consegue pensar em ajudar ao menos algumas pessoas.
Depois da primeira vez que ele é esfaqueado ele começa a usar uma cruz vermelha na frente de sua camisa branca. Ele ainda é cuspido e empurrado, mas agora a maioria das pessoas o deixam em paz, a maioria não quer ver mais gente morta.
Quando Musutafu é bombardeada Izuku não sabe o que pensar, ele não estuda mais. Inko o acompanha nas ruas agora, de dia e de noite, o hospital não existe mais.
Inko não sobrevive dois meses.
Agora, mais do que nunca, sua Individualidade era tudo, se você seria acolhido por um grupo, se você seria tomado pelos militares, se você seria deixado para apodrecer após ter sido despido de todos seus pertences, por que Você vai morrer rápido de qualquer forma, a gente merece isso mais que você. Não é difícil saber em qual grupo Izuku encaixou.
Katsuki sumiu duas semanas após os primeiros bombardeiros, um mês e meio antes de Inko— Izuku tenta ignorar os pesadelos de olhos vermelhos, cabelo loiro, uniforme camuflado e explosões estourando em palmas manchadas de sangue.
Após a morte de Inko, Mitsuki o acolheu por um tempo. Izuku não suportava.
Ele fugiu antes de uma semana completar.
Izuku aprendeu a sobreviver de um jeito que ele nunca precisou antes. Pelo menos fugir de bullys o ajudou a fugir de armas e tiros raspando em sua bochecha. Izuku tenta ignorar os pesadelos de sorrisos irônicos e Por que você não morre logo? e olhos vermelhos queimando sua pele e Ele vai me matar Elevai me matar Ele vaimematar Elevaimematar. Izuku aprende a fazer fogo rápido, e esconder seus rastros, e a evitar pessoas, mesmo que não usem o traje camuflado, Eles não querem um inútil como você, que não tem nada a oferecer e só vai atrasar o grupo.
É quase um ano depois que ele fugiu de Mitsuki e Masaru que ele ouve os sussurros (Izuku sabe que já vai fazer um ano por que tem uma caneta velha e um caderno quase destruído, chamuscado e com letras borradas que ele anota as datas, pelo menos isso, pelo menos isso. As folhas estão acabando, a tinta também.). Os sussurros entretanto, os sussurros não param, um lugar inatingível pelo exército. Izuku ri a primeira vez que ouve.
Mas os rumores continuam, Perto do mar, eles sussurram, Estão construindo um acampamento. Izuku faz de tudo para massacrar a esperança crescendo em si.
No outro dia ele já está a caminho da costa.
Eles não te querem lá. Sua cabeça zomba. Eles só devem aceitar pessoas úteis, com Individualidades boas, que podem ajudá-los. Izuku tenta ignorar tudo.
Naquela noite ele sonha com mãos em volta de seu pescoço, olhos vermelhos queimando sua pele e o traje camuflado.
Após meses ele chega, nem sabe como. Um grande muro de concreto parece o encarar, o atrevendo a fazer alguma coisa. Izuku dá meia volta entrando no matagal que acabou de sair. Impossível que eles me deixem entrar.
Dias depois ele ajuda um trio a se livrar de uma pequena tropa. Um deles é baleado mesmo assim. Os outros dois se recusam a deixá-lo pra trás, não que Izuku fosse. Ele faz uma oração para sua mãe, a única pessoa que ele ainda direciona fé, e a agradece, mais uma vez, por todo conhecimento médico que ela lhe deu. O trabalho é sujo e meio desajeitado pela falta de recursos na hora, mas é suficiente para parar o sangramento e evitar uma infecção severa até eles voltarem para o acampamento. Izuku congela na hora que eles param na frente de um portão, muros de concreto dos dois lados.
[Ele entra.]
Izuku vira um dos três médicos da pequena vila, eles dizem que é trabalho suficiente, mas Se você não fizer nada eles vão de expulsar, afinal, você— Izuku acaba ajudando nas lavouras, nas construções e em qualquer coisa disponível quando pode.
Izuku descobre que foram três famílias que se uniram para criar o acampamento, uma tinha Individualidade medicinal, um dos médicos era descendente dela, infelizmente falecida, a Individualidade pode curar qualquer machucado, tirando anos de vida do usuário, Muita gente chegava aqui com casos irreversíveis, Yuuma explica, a morte dos membros faz mais sentido. Outra família, a de Yuuma, tinha uma linhagem de Individualidades relacionadas a velocidade, Yuuma diz que não achava muito útil antes, mas depois de certo… Eventos, ele passou a apreciar. E a última, a que traz segurança a esse lugar, esse pequeno paraíso, a última família tinha diversas mutações de uma espécie de telecinese, permitindo a construção de um escudo invisível ao redor da vila, eles não pode sair por muito tempo, ou fazer trabalhos pesados que os cansem, o escudo fica em pé quando eles dormem, mas sempre fazem turnos durante a noite por precaução. Izuku quase chorou quando uma bomba explodiu acima deles, mas causou apenas um brilho roxo no céu e uma dor de cabeça em Himari.
Quando eles perguntam qual sua Individualidade, Izuku pensa em mentir, inventar alguma coisa relacionada a medicina, ele pode não ser o melhor médico do mundo, mas tem conhecimento suficiente para passar por um pelo menos decente.
Mas ele nunca foi um bom mentiroso, foi?
Ele conta.
[E fica]
Mais um tempo passa, Izuku não tem certeza quanto, um anos talvez? Mais? As folhas de seu caderno acabou, a tinta da caneta também, e essas duas coisas são luxúrias que ele não pode induzir, não tem como. Parece que faz uma eternidade que tudo isso começou, mas não parece que passou tanto tempo assim
Mas um dia, um dia os portões abrem em gritos, um trio de reconhecimento e coleta trazendo uma pessoa semiconsciente e uma pequena frota armada, a frota carrega diversas mochilas e quatro deles um palete com caixas empilhadas. Izuku tem um mini ataque cardíaco quando vê os uniformes camuflados, ele não é o único, mas Calma Izuku, calma, a patrulha da Borda tem armas, se eles fossem uma ameaça já estariam mortos, né? É Izuku acha que está se acalmando, mas é tudo em vão quando ele vê Cabelo loiro, olhos vermelhos queimando sua pele e o traje camuflado— Seu cérebro trava, bem, não exatamente. Quando eles passam por Izuku, entrando na casa que serve de ala hospitalar, Izuku apenas entra em modo automático. Eles colocam o menino— Menino? Céus, ele, ele é quase um jovem adulto agora! Izuku ignora seus pensamentos, apenas, apenas faz o que ele tem que fazer. No final de algumas horas o loiro está numa cama, estabilizado e sendo vigiado por Shinji, e todo mundo se reúne para entender o que está acontecendo.
Os soldados são desertores, eles trouxeram suprimentos como barganha para um lugar na vila. Katsuki se feriu ao despistar outros soldados que tentavam os impedir. Yuuma chama por um Conselho, os soldados são levados para outro lugar.
No final, eles ficam, algumas pessoas aceitam logo de cara, estar no exército deve ser um pesadelo, outras se convencem aos poucos, outras saem com a promessa de que vai ter vingança de houver uma traição. Não é ideal, Izuku pensa, conflitos são complicados, principalmente com pessoa de fora, Izuku assistiu muitas séries antigas sobre isso.
Katsuki acorda quando Izuku está checando nele. Izuku percebe imediatamente quando o corpo dele endurece e sua respiração falha. Izuku faz nada mais a não ser piscar, neste momento ele é um médico, e Katsuki é seu paciente. Ele empurra memórias de Olhos vermelhos queimando em sua pele, gosto metálico em sua boca, sangue em mãos que explodem—
– Sua condição tá estável por enquanto, você ficou quase uma semana inconsciente, e terá que ficar mais um tempo de cama – Izuku dita, se sente clínico, impessoal, mas… Não é como se ele pudesse clamar algum tipo de relação com Katsuki, não mais.
– Izuku – O tom fraco, quase sussurrado toma o outro de surpresa, a dor e alívio também – Você, você tá vivo… ? – Katsuki parece descrente, mais uma pergunta do que afirmação.
Izuku hesita por um momento, pesadelos de olhos vermelhos ainda o assombram. Mas, Katsuki parece tão pequeno? nesse momento, tão… Quebrado e perdido.
– Katsuki – Izuku começa, para logo parar com o recuo que causa no loiro, como se alguém tivesse lhe dado um soco – … Kacchan? – Izuku tenta relutantemente, o apelido deixa um gosto estranho em sua língua, loiro respira fundo, okay okay, Izuku consegue fazer isso – Eu, hm, eu cheguei aqui um tempo atrás, não sei direito quanto tempo, ãnh, dois anos? Eu acho? E-eu—
– Vai fazer cinco anos
– Ãnh?
– Vai fazer cinco anos que eu entrei no exército – O loiro explica.
– O-oh – Izuku responde inteligentemente, então, então deve fazer quase três anos que ele tá no acampamento? Não… Não parece tanto assim – Hm, Kat— Kacchan, você… Você foi levado, não? Quer dizer, um dia você sumiu, então… – Izuku descontínua ansioso.
– Não – Katuski suspira – Eu, eu pedi – As palavras parecem causar dor física no loiro – Eu achei— E-eu achei… – Sua voz treme, uma mão sobre para bagunçar seu cabelo, curto, e mesmo após ver Katsuki por vários dias a vista ainda é estranha, o corte padrão do exército não encaixa muito bem nele – Eu pensei que faria uma diferença, que, que se eu fosse para a linha de batalha eu seria um herói – Ele cospe as palavras – Ha, eu era tão ingênuo, tão— Tão burro e idiota
– Kacchan— – Izuku tenta tocá-lo
– NÃO! – O loiro bate na mão dele – Você não entende, eles— Eles colocaram armas na minha mão e jogaram em patrulhas! Eles e-eles disseram Faça o necessário, use sua Individualidade se for preciso, mas não deixe ninguém escapar, e eu fiz! Eu fiz Izuku! – Katsuki é recebido com silêncio, sua respiração irregular após os gritos – Eu fiz – Ele sussurra – Eu matei eles, Izuku, eu matei…
Soluços enchem o quarto. Katsuki cobre seu rosto com suas mãos, lágrimas escapando por entre seus dedos, e suspiros trêmulos por sua boca. Izuku sente suas bochechas molhadas, mas não faz nenhum som.
– Você devia ter me deixado morrer – Katsuki murmura, mas Izuku apenas fecha seus olhos – Me perdoa – E sai do quarto.
Eles não falam muito depois daquilo. Izuku dá algum tempo antes de avisar que Katsuki acordou, os seus companheiros da tropa vão juntos com Yumma, Shinji e Yua, irmã de Himari.
Eles saem tempos depois e somem dentro da casa de Haruto. O ex-psicólogo entra minutos depois.
As coisas não voltam ao normal por um tempo, uma tensão ainda presente por ter ex-soldados andando em seu paraíso, é difícil, mas depois de… Bem.
Uma traição acontece.
Surpreendentemente não foi um dos ex-soldados. Ada, uma mulher que tinha sido acolhida semanas antes da tropa estava infiltrada. Ela chegou na Borda e pediu abrigo, e eles deram. Ela fazia parte de um grupo relativamente grande, eles queriam tomar a vila.
Izuku não gosta de pensar muito sobre esse acontecimento. Principalmente por que algumas vezes eles teve que deixar o bisturi improvisado para pegar outro tipo de faca. Não foi bonito, nem limpo, nem nada. Mas no final, eles venceram, Izuku só esperava que não fosse às custas de outras vidas. Seus pesadelos agora eram cheios de cabelos verdes, olhos vermelhos, uma arma em suas costas e sangue em suas mãos.
Após esse fiasco os ex-soldados foram finalmente reconhecidos em meio a vila, mesmo os mais relutantes pareciam contentes em deixá-los agora. Lutar por sua vida lado a lado faz isso com as pessoas
Eles criam um código Que a paz que contigo vai, faça-te retornar para mim, não é muito, mas apenas pessoas que que sabem podem entram, o que quer dizer que eles tiveram que encontrar com alguém da Borda, que os confiou a mensagem. As pessoas ficam mais desconfiadas de forasteiros.
Ele e Katsuki não estão… Normais. Izuku acha que nunca vai ser, ele reconhece a desculpa que o loiro faz de joelhos, e reconhece seu esforço em ser melhor, mas Izuku acha… Ele acha que não quer aceitar. É cruel, é egoísta e é imbecil, mas se apegar ao pequeno ódio que sente por Katsuki às vezes parece ser a única coisa o mantendo são, a única coisa para se lembrar no passado.
Tempo é difícil de contar, Izuku desistiu quando seu caderno acabou. Eles tem um relógio do sol na vila, e essa é a única perspectiva que ele tenta seguir. Então depois de algum tempo, que ele nunca sabe dizer quando, Izuku larga um pouco as ataduras, se junta com mais duas pessoas mais experientes e os três entram na rotação de coletores. Izuku estava em treinamento, após uma certa quantia de missões e a autorização dos outros dois ele é permitido a sair sozinho. Os trios com os treinados não vão muito longe, os com três experientes chegam a ir para outras cidades. Mas são as missões de estado que Izuku almeja, para sair do estado é só uma pessoa, é arriscado, mas os outros estados são mais vigiados por soldados, tem mais pessoas dispostas a matar, a área perto da borda é a mais segura, alguns nômades e pequenos acampamentos espalhados, mesmo que tenha seus bombardeamentos vez ou outra. As missões para outro estado são sozinhas, pela regra silenciosa de que é melhor que uma pessoa morra do que três ou duas. Se a pessoa voltar viva, ela passa tudo que viu para o grupo, e juntos formam um grupo maior para ir buscar mantimentos se for viável.
Então Izuku ganha suas missões solo, e mesmo que ele passe semanas, e uma vez quase um mês, fora, Izuku sempre volta, sempre.
Foi em uma dessas missões que ele encontrou a menina, Eri
Izuku não sabe como ela sobreviveu tanto tempo, ela estava sozinha e apavorada, quando Izuku perguntou ela não respondeu suas perguntas, então Izuku trata seus machucados o melhor que pode ignorando, por enquanto, as cicatrizes que dizem de coisas que Izuku não quer nem pensar.
Eri não fala sobre seu passado, Eri não fala muito, ponto. Quando se conhecerem ela disse seu nome, não sabia sua idade, e apenas. Izuku acha que ela deve ter uns sete? Mas como está desnutrida e não parece ter tido a melhor infância pode ser que seja mais velha e seu crescimento foi interrompido. De qualquer forma, Izuku vai aos poucos humanizando a menina, ensinando coisas do mundo, contando sobre o Mundo Antigo quando ela pergunta, mesmo que doa, ela merece. Quando ela dá uma imitação estranha de um sorriso, Como se ela não soubesse a cabeça de Izuku xia, pela primeira vez ele quase cai chorando, apenas não faz por que assustaria a menina.
Izuku distantemente percebe que ela não gosta de tocar e ser tocada.
Mas o passado dela vem a tona quando eles encontram uma dupla falando sobre ela, se ela sobreviveu, se o chefe acabou com ela. Eles não os veem, mas é por pouco. Após isso, eles preparam um acampamento no segundo andar de um prédio e ela sussurra sobre o que lembra.
Eri sussurra de quando era mais nova e esse Homem ia desfazê-la e refazê-la de novo, dizendo como ela era terrível, e todos eram doentes e ele tinha que achar a cura. Conforme ela descreve, Izuku vagamente liga os pontos, alguém que odeia Individualidades e quer acabar com elas? Amarga ironia queima em sua garganta, isso ou bile. Eri fala de quando alguma coisa mudou, o Homem ficou mais agitado e agressivo, até que, até que um dia pegou ela para mais uma das consultas, como ele chamava, tudo parecia normal, mas depois daquela vez ele só voltou uma vez, pra dar uma vacina para ela, dizendo que agora ela estava curada e todo mundo ia ser também, depois disso ele nunca mais voltou. Mesmo assim, mesmo ela estando curada Eri tem medo de tocar nas pessoas, por que, e se eles de alguma forma pegassem a doença dela? E se ele se enganou e ela ainda está doente e a doença dela machucar mais alguém e—
– Eri – A menina para, os olhos cheios de lágrimas, as mãos, tão pequenas, apertando os braços – Eu vou te tocar, okay? – Izuku espera uma confirmação.
– Na-não – Ela balança a cabeça freneticamente.
– Eri, eu tenho certeza que você não vai me machucar, eu tenho uma ótima saúde! Aliás, duvido que você esteja doente – Ela olha duvidosamente para ele, Izuku lhe lança um sorriso que ele espera que seja encorajador – Eu vou te tocar, tá bom?
Dessa vez ela aperta a boca e lentamente acena com a cabeça. Izuku a puxa para um abraço, ele quer dizer que ela não está doente, nunca esteve, que ela não é horrível, que Eri é uma menina maravilhosa e muito forte, mas não agora, agora ele precisa saber o que aconteceu, para saber o que fazer.
Eri não lembra de muitos detalhes, ela era muito nova, e Izuku suspeita de memórias suprimidas por trauma, mas o que ela diz com o conhecimento prévio de Izuku o ajuda a construir uma história mais ou menos linear.
Ela diz que após a vacina tudo era muito silencioso, ela sentia tremores no chão e paredes, e rachaduras se formaram no teto. Ninguém vinha mais lhe dar água ou comida, e quando ela achou que seu estômago se comeria um estrondo forte trouxe o teto à baixo, por sorte ela sobreviveu (Izuku não acredita em Deus, ou deuses, Izuku acredita em sua mãe, e ela nunca deixaria uma criança em perigo, ele agradece à ela, e apenas ela). Quando Eri saiu do buraco o mundo estava em chamas e ela não sabia o que fazer, ela comeu algumas coisas que achou jogadas e as que cheiravam menos pior, bebeu a água de poças até que Izuku a achou.
Izuku a aperta mais forte em seus braços, seu coração aperta. Eri não devia estar vivendo isso, Eri devia ter uma família que a amasse, que a desse sorvete e brinquedos, deixasse ela assitir desenhos, que ela fosse uma criança como qualquer outra.
Eles dormem abraçados, e no outro dia eles começam a viagem de volta para a Borda. Izuku conta sobre o lugar para Eri, das pessoas, das coisas engraçadas. Izuku começa a ensinar pequenas coisas que ele aprendeu antes, ele não lembra muito, mas o que ele conta faz os olhos de Eri brilharem, então Izuku vasculha e vasculha sua memória a procura de tudo que consegue lembrar.
Eles se aproximam, Eri ainda não sorri muito, mas quando faz o peito de Izuku se enche de amor de um jeito que ele nunca sentiu antes além de sua mãe. Ah, ele pensa, Eu queria que você tivesse aqui mãe, você ia amar ela, ele chora uma noite. A cada dia que passa Eri é se encaixa mais na irmã mais nova que ele não teve e nem sabia que queria.
Então é claro que tudo ia dar errado, e eles estavam tão perto.
Quando os dois chegam na cidade antes da floresta que dá na Borda, um ataque começa. Como dito, apesar de raros, eles ainda acontecem, então é claro que quando Izuku está voltando com uma criança e mil e uma promessas ele é baleado múltiplas vezes.
Então, encolhidos num canto, com a melodia de tiros e acampamentos nômades queimando, Eri mancha suas pequenas mãos com o sangue de Izuku.
– We were playing in the sand – Izuku cantou baixinho, a primeira música que lembrou que era calma o suficiente - And you found a little band - Trazendo a garota mais próximo de si, Izuku abraçou a menina, escondendo os olhos da criança em seu peito - You told me you fell in love with it, hadn't gone as I'd plan—
Um soluço o interrompeu. Ele podia sentir sua camisa molhando e tremores assombrando o corpo da menina.
– I-Izuku – Ela choraminga, agarrando a blusa outrora branca com mais força. Depois de tantos dias correndo e caindo e rolando e tentando apenas sobreviver… é, a blusa já teve dias melhores.
– When you had to bid adieu – Izuku ignorou a própria garganta trancada e o jeito que sua voz falhou, apenas apertou mais forte a garotinha em seus braços e passou a afagar seu cabelo gentilmente – Said you'd never love anew – Fechou os olhos, apoiando sua cabeça em uma das únicas parede restantes, atrás de si, ignorou a ardência em seus olhos ou o molhado escorrendo por suas bochechas – I wondered if I could hold it, and fall in love with it too
Uma bomba explodiu mais perto, o som dos tiros cada vez mais alto apesar do ruído ensurdecedor dos zeppelins. Eri se encolheu mais ainda em seu colo, suas pequenas pequenas mãos meladas de sangue, sangue dele. Uma onde de tosse ameaçou partir seus lábios, um gosto de bile-metálico subindo-lhe à garganta.
Começou a hum'eiar a melodia, quase podia imaginar sua mãe cantarolando na cozinha enquanto fazia a janta, cheiro de curry apimentado invadindo seus sentidos. Por um momento, se deixou levar, cantarolando a canção, imaginando que o calor que sentia era do sol e não do mundo queimando ao seu redor, imaginando que ele, Inko e Eri eram uma família. Mas tiros o despertou do encanto, um bolo impossível de engolir alojou-se em seu peito.
– Izuku… – Eri parecia implorar, mas ele a tinha falhado, já não sentia suas pernas e o movimento de seus braços eram cada vez mais lentos e desajeitados.
– Eri – Suprimiu mais uma tosse, a garota apenas balançava a cabeça em negação, sua testa causando uma pressão desconfortável em seu peito – Eri, você pode olhar pra mim? Hm? – Um soluço escapou por entre os lábios da menina, lágrimas caindo mais rápido – Por favor?
Relutantemente a garota se afastou, lentamente subindo seu olhar, as mãos ainda firmementes entrelaçadas na blusa do menino. Apesar do sangue secando em sua boca e os rastros de lágrimas em suas bochechas ele a direcionava um sorriso gentil, em outra situação borboletas voariam no seu estômago, seu peito esquentaria na noção de ter alguém que se importasse com ela. Agora, o sorriso só fazia algo frio se formar no fundo de sua garganta.
– Eri você tem que ir—
A menina já balança a cabeça em negação, um coro de nãos rolando por sua língua, mais lágrimas brotando de seus olhos, as sobrancelhas franzidas, a bochecha manchada, as roupas sujas, o sangue em seus pequenas pequenas mãos.
– Eri, Eri por favor – Sua voz falhou, lágrimas ressurgindo em seus olhos, Pelo menos ela, por favor, pelo menos ela tem que sobreviver – Você tem que sair daqui.
– Não, não sem você – A voz dela era tão pequena.
– Você tem que ir Eri, por favor, se você—
Um soluço o interrompeu, não sabia dizer se era seu ou dela.
– Se você correr até a Borda você vai estar segura, ainda dá tempo – Mãos trêmulas se levantaram até o rosto da menina, acariciando gentilmente.
– Mas e você—?
A fala foi cortada por uma bomba, tão próxima que o coração fraquejante de Izuku pareceu pular em sua boca. A menina se encolheu, mais uma vez grudando desesperadamente em Izuku. Eri tinha que sair dali agora.
– Eri – Forçou suas mãos a segurarem os pequenos pequenos braços da menina – Eri, vá, corra o mais rápido que puder, corra até não aguentar mais e depois corra mais um pouco – Respirou fundo tentando estabilizar um pouco seu pulso e braços – Diga, quando chegar lá, diga que me conhece, diga que eu te mandei – Mais um suspiro trêmulo – E se duvidarem, diga, diga Que a paz que contigo vai, faça-te retornar para mim – Tirou um pouco de cabelo do rosto dela, um desejo súbito de trançar as mechas, tentou limpar a mancha na bochecha dela mesmo sabendo ser inútil – Pode repetir pra mim?
– A-a – Eri engoli um soluço, suas mãos mexendo nervosamente.
– Que a paz que contigo vai, faça-te retornar para mim, eu sei que é grande, mas você consegue, você é muito inteligente.
– Que-que a paz que conti-go vai, f-façate retornar pra mim…? – Ela repete em meio a lágrimas e soluços.
– Bom, bom – Izuku a aproxima, braços circulando a forma pequena pequena da menina, um dois, três segundo ele a afasta, dando um beijo desajeitado em sua testa – Agora vá – Eri começa a balançar sua cabeça, Izuku a segura, olhando eu seus olhos – Por favor, por mim? – Ele a solta, relutantemente tão relutantemente Eri se levanta e começa a dar passos hesitantes pra trás, soluços tremendo seu corpo todo, o rosto distorcido em agonia e medo – Eu te amo – Izuku diz, dando um último sorriso encorajador para a menina.
– Te amo – Ela sussurra de volta, antes de mais um passo tímido e se virar correndo na direção da floresta, lágrimas infinitas queimando seus olhos, apertando seu peito, congelando sua garganta.
Izuku mais uma vez encosta sua cabeça na parede.
– You told me to buy a pony but all i wanted was you – sussurrou com uma risada triste – hmmm-mmm – Os olhos fechados, ele sonha em um sol num dia de verão, uma família de três, ele sentado no sofá com um desenho colorido na tevê, sua mãe rindo enquanto faz katsudon, uma garotinha com longos cabelos brancos trançados e sorriso tão raro que ele—
Ah, Izuku pensa, Eu não lembro do seu sorriso.
E ao mesmo tempo que lágrimas incontáveis caiam de seu rosto, uma bomba caiu do céu.
—————
Um dia de madrugada eu tava escutando Hidden in the Sand e eu pensei “Uh, seria legal uma cena do Izuku cantando essa música pra tentar acalmar Eri por que eles iam morrer”.
E como eu já tinha programado de fazer um AU de apocalipse eu pensei “HM” e daí foi ladeira abaixo e eu escrevi todo aquele backstory só pra poder colocar a cena do Izuku cantando pra Eri.
Eu escrevi isso bem no comecinho da pandemia, mas tamo aí né
( Extra 1: Eri não queria soltar Izuku no final por que ela estava tentando fazer a Individualidade dela voltar, por que ela sabia, de certa forma, que ia ajudar ele.)
( Extra alternativo: Overhaul não levou em consideração que como a vacina foi criada com o DNA da Eri ela não teria o mesmo efeito. A Individualidade dela nunca foi embora, mas quando Overhaul disse que a ‘curou’ ela acreditou e subconscientemente a suprimiu. Quando ela chega no acampamento ela começa a ter visitas com Haruto, o ex-psicólogo, numa dessas sessões ela destranca alguns traumas e usa sua Individualidade sem querer. Então ela começa a se culpar, porque ela podia ter salvo Izuku.)
:)
#bnha#mha#izuku midoriya#Eri#bakugou katsuki#AU#A Cidade Queimava AU#Izuku adota a Eri#Izuku tem depressão#e um pouco de culpa de sobrevivente#katsuki pede desculpa#izuku não perdoa katsuki#eri é um anjo#eu pensei em tentar encaixar alguns outros personagens no Acampamento mas fiquei com preguiça#nem katsuki era pra estar ali#ele apareceu do nada#brasil#português#pt/br#apocalipse#personagens originais não são importantes mas eu amo eles mesmo assim#talvez traduza pra inglês#mas vai demorar
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a terra devastada (de t.s. eliot)
I. O Enterro dos Mortos
Abril é o cruelíssimo mês, criando Lilazes da terra morta, mesclando Memória e desejo, atiçando Raízes toscas com chuva de primavera. O inverno nos aqueceu, cobrindo A terra de neve esquecida, nutrindo Um pouco de vida com tubérculos secos. O verão nos pegou de surpresa, vindo pro Starnbergersee Com um aguaceiro; paramos na colunata, E seguimos na luz do sol, ao Hofgarten, E tomamos café, e conversamos uma horinha. Bin gar keine Russin, stamm’ aus Litauen, echt deutsch. E na nossa infância, lá na casa do arquiduque, Meu primo, ele me levou de trenó, E eu fiquei com medo. Ele disse, Marie, Marie, segura firme. E morro abaixo. Nas montanhas, é lá que você se sente livre. Eu leio, a noite quase toda, e vou pro sul no inverno.
Quais são as raízes que cingem, que ramos crescem Desse entulho pétreo? Filho do homem, Não podes dizer, ou supor, pois conheces apenas Uma pilha de imagens partidas, onde o sol bate, E o tronco morto não oferece nenhum abrigo, o grilo nenhum alivio, E a pedra seca nenhum som de água. Apenas, há sombra debaixo desta pedra rubra, (Vem ficar debaixo da sombra desta pedra rubra), E vou mostrar-te algo diferente tanto da Tua sombra ao amanhecer avançando às tuas costas, Quanto da tua sombra ao anoitecer emergindo ao teu encontro; Vou mostrar-te o pavor num punhado de poeira. Frisch weht der Wind Der Heimat zu Mein Irisch Kind, Wo weilest du? "Você me deu jacintos a primeira vez faz um ano; "Eles me chamavam de menina dos jacintos." — Mas quando voltamos, tarde, do jardim de jacintos, Seus braços plenos, e seu cabelo molhado, eu não pude Falar, e meus olhos falharam, eu não estava vivo nem morto, e não sabia de nada. Olhando dentro do coração da luz, o silêncio. Oed’ und leer das Meer.
Madame Sossóstriz, famosa clarividente, Tava bem gripada, não obstante, É conhecida por ser a mulher mais sábia da Europa, Com um baralho traiçoeiro. Esta, disse ela, é sua carta, o Marujo Fenício afogado, (Aquelas pérolas eram seus olhos. Veja!) Esta é Belladona, a Senhora dos Rochedos, A senhora das situações. Este é o homem dos três cajados, e esta é a Roda, E este é o mercador caolho, e esta carta Que está em branco é algo que ele leva nas costas, Que me é proibido ver. Não encontro O Enforcado. Tema a morte pela água. Vejo grandes multidões, rondando num círculo. Obrigada. Se você vir a dona Equitone querida, Diz que eu levo o horóscopo em pessoa: Hoje em dia todo cuidado é pouco.
Cidade Irreal, Sob a névoa marrom de uma aurora de inverno, Multidões escoaram sobre a ponte de Londres, tantos, Não considerei que a morte já desatou tantos. Suspiros, curtos e esporádicos, eram soltos, E cada um fitava à frente de seus pés. Escoaram morro acima e desceram a Rua King William, Pronde Santa Maria Woolnoth mantinha as horas Com um baque morto no último toque das nove. Ali vi um conhecido, e o detive, rogando: 'Stetson! 'Tu que estiveste comigo nas naus em Milas! 'O cadáver que plantaste ano passado no teu jardim, 'Já está brotando? Florescerá este ano? 'Ou será que a geada repentina perturbou seu leito? 'Ó, afaste o Cão para longe, que é amigo do homem, 'Ou com suas garras ele desenterra de novo! Tu! hypocrite lecteur! — mon semblable, — mon frère!'
II. Uma Partida de Xadrez
O assento que ocupava, qual um trono lustrado, Brilhava sobre o mármore, onde o espelho Sustido por pés talhados de vinhedos em fruto Dos quais um Cupido dourado lançava uma olhadela (Um outro cobria os olhos por trás da asa) Duplicava as chamas de castiçais de sete braços Refletindo a luz sobre a mesa enquanto O resplendor de suas joias alcançava-o, De estojos de cetim jorrando em rica profusão; Em frascos ebúrneos e vidros de cores Destampados, espreitavam seus estranhos perfumes sintéticos, Untos, pós ou líquidos — turbavam, confundiam E afogavam os sentidos nos aromas; atiçados pelo ar Que refrescava pela janela, eles se alçavam Assoberbando as chamas alongadas das velas, Lançavam sua fumaça contra a laqueária, Atiçando os motivos do teto ornamentado. Imenso lenho marinho nutrido de cobre Queimava em verde e abóbora, emoldurado pela pedra de cores, Em cuja luz triste nadava um boto cinzelado. Acima da lareira arcaica se expunha Como se uma janela desse para a cena silvana, Filomela mudada, pelo bárbaro rei, Compelida rudemente; mas lá o rouxinol Enchia o deserto de sua voz inviolável, Ainda assim lamentava, ainda assim o mundo perseguia, 'Chut Chut' para ouvidos sujos. E outras épocas definhadas nas tábuas Contavam as paredes; formas que fitavam Curvadas, curvando-se, calando a sala encerrada. Passos tocavam as escadas. Sob a lareira, sob o pente, seu cabelo Espalhando-se em pontas flamejantes Brilhou em palavras, e então ficou loucamente imóvel.
'Estou mal dos nervos hoje. É, mal. Fica comigo. Fala comigo. Por que você nunca fala? Fala. O que você tá pensando? Que pensando? Que? Eu nunca sei o que você tá pensando. Pensa.'
Eu penso que estamos no beco dos ratos Onde os mortos perderam seus ossos.
'Que barulho é esse?' O vento debaixo da porta. 'Que barulho é esse agora? O que o vento tá fazendo?' Nada novamente nada. 'Você ‘Não sabe nada? Não vê nada? Não lembra 'Nada?'
Eu lembro Aquelas pérolas que eram seus olhos. 'Você está vivo, ou não? Não tem nada na sua cabeça?' Mas U U U U essa Batida Shakesperririana Tão elegante E tão brilhante 'O que eu tenho que fazer agora? O que eu tenho que fazer? Eu tenho que disparar pela rua como eu estou De cabelo solto, assim. O que temos que fazer amanhã? O que temos que fazer nesse mundo?' A água quente às dez. E se chover, carro fechado às quatro. E deveremos jogar uma partida de xadrez, Apertando olhos sem pálpebras e esperando baterem na porta.
Quando o marido da Lili foi dispensado, eu disse — Falei sem meias palavras, eu mesma disse pra ela ANDA LOGO TÁ NA HORA O Alberto tá voltando, se arruma um pouco. Ele vai querer saber o que você fez com o dinheiro que ele te deu Pra arranjar seus dentes. Deu sim, que eu vi. Arranca tudo, Lili, e arruma uma dentadura, Ele disse, eu juro, não suporto nem te olhar. E nem eu, eu disse, e pensa no coitado do Alberto, Ficou quatro anos no exército, quer aproveitar, E se você não agradar, tem quem agrade, eu disse. Ah se tem, ela disse. Ou coisa parecida, eu disse. Aí eu já sei quem agradecer, ela disse, e me encarou. ANDA LOGO TÁ NA HORA Se você não gosta pode deixar, eu disse. Tem quem se dá o luxo de escolher, diferente de você. Mas se o Alberto se mandar, não vai ser por falta de aviso. Você tinha que ter vergonha, eu disse, de parecer tão arcaica. (E ela só tem trinta e um.) Não é culpa minha, ela disse, fazendo beicinho, É os comprimidos que eu tomei, pra tirar ele, ela disse. (Ela já teve cinco, e quase morreu do Jorginho.) O farmacêutico disse que ia ficar tudo bem, mas nunca fui a mesma. Você só pensa bobagem, eu disse. Bom, se o Alberto não te deixa quieta, é isso aí, eu disse, Você se casa pra quê se não é pra ter filho? ANDA LOGO TÁ NA HORA Bom, no domingo o Alberto tava em casa, assaram pernil, E me chamaram pra jantar, pra pegar a coisa quente — ANDA LOGO TÁ NA HORA ANDA LOGO TÁ NA HORA Boa noite, Gui. Boa noite, Lu. Boa noite, Mei. Boa noite. Tchau tchau. Boa noite. Boa noite. Boa noite, senhoras, boa noite, doces senhoras, boa noite, boa noite.
III. O Sermão do Fogo
A tenda do rio está partida: os derradeiros dedos de folha Engolfam-se e afundam na margem úmida. O vento Cruza a terra escura, despercebido. As ninfas se foram. Doce Tâmisa, corre suave, até acabar minha canção O rio não leva garrafas vazias, embalagens, pontas de cigarro Ou outros rastros de noites de verão. As ninfas se foram. E seus amigos, os herdeiros vadios dos diretores da City; Se foram, sem deixar endereço. Junto às águas do Leman eu sentei e chorei... Doce Tâmisa, corre suave, até acabar minha canção Doce Tâmisa, corre suave, que não faço barulho nem falação Porém às minhas costas ouço um baque frio O chocalhar dos ossos, e riso de orelha a orelha.
Um rato rastejou suave pela vegetação Arrastando sua barriga gosmenta na margem Enquanto eu pescava no canal opaco Numa noite de inverno nas cercanias do gasômetro Meditando sobre o rei meu irmão naufragado E o rei meu pai finado antes dele. Corpos brancos nus sobre o solo baixo e úmido E ossos atirados num sótão baixo e seco. Chocalhados apenas pelo pé do rato, ano a ano. Porém às minhas costas às vezes ouço O som das buzinas e dos motores, que levarão Sweeney para Dona Porter na primavera Ah estava a Dona Porter sob a lua Com a filha sua, Lavaram o pé na coca-cola Et, o ces voix d’enfants, chantant dans la coupole!
Piu piu piu Chut chut chut chut chut chut Compelida rude Tereu
Cidade Irreal Sob a névoa marrom de um meio-dia de inverno, O seu Eugênides, o mercador de Esmirna, Barba por fazer, com o bolso cheio de passas C.i.f., Londres: documentos em vista, Me convida em francês demótico Para um almoço no Cannon Street Hotel Seguido de um fim de semana no Metropole.
Na hora violeta, quando olhos e espinhas Erguem-se da mesa, quando a máquina humana espera Como um taxi tremendo esperando, Eu, Tirésias, conquanto cego, tremendo entre duas vidas Velho com seios enrugados de mulher, posso ver Na hora violeta, a hora vespertina que almeja O lar, e traz o marujo do mar ao lar, A secretária em casa na hora do chá, limpa o desjejum, acende O fogão, e serve comida na lata. Estendidas arriscadamente pela janela, Suas combinações secam-se com o toque dos últimos raios de sol, No divã empilhadas (à noite sua cama) Meias, chinelos, camisolas e espartilhos. Eu, Tirésias, velho de tetas enrugadas Notei a cena, e pressagiei o resto — Também eu aguardava o convidado. Ele, moço carbunculoso, chega, Um funcionário de corretora, de olhar ambicioso Um desses tacanhos em quem a confiança cai Como uma cartola num milionário. É a hora propícia, assim ele supõe, Acabaram a refeição, ela com tédio e cansaço Arroja-se por envolvê-la em carícias Que são admitidas, se por ventura indesejadas. Corado e decidido, ele ataca de vez; Mãos intrometidas não são repelidas; Sua vaidade dispensa reações, E faz boas-vindas da indiferença (E eu, Tirésias, sofri tudo de antemão Efetuado nesse mesmo divã ou cama; Eu, aquele que sentou às muralhas de Tebas E vagou entre os mais tacanhos dos mortos.) Outorga um último beijo condescendente, E se vai tateando pela escada escura...
Ela vira e detém o olhar no espelho Quase alheia ao amante que partiu; Sua mente permite um meio pensamento: 'Agora está feito: e que bom que acabou.' Assim a amável mulher inclina-se vacilante e, Vagando pelo quarto, solitária, Afaga seu cabelo com mão automática E põe a bolacha no toca-discos.
'Tal música apanhou-me pelas águas' E pelo Strand, subindo a Rua Queen Victoria. Ó, City citadina, por vezes posso ouvir Ao lado de um bar em Lower Thames Street O agradável plangor de um bandolim E o tumulto e o vozerio lá de dentro Onde pescadores repousam ao meio-dia: onde os muros De Magnus Martyr sustentam O inexplicável esplendor em ouro e branco jônico.
O rio sua Óleo e piche As barcas vagam Virando a maré Velas rubras Amplas A sota-vento, pendem da verga pesada Barcas lavam Troncos à deriva Pelo Greenwich Reach Depois da Ilha dos Cãos, Eialalá laiá Uialalá laialalá
Elizabeth e Leicester Batem remos Popa formada Em concha dourada Carmim e ouro A vaga forte Vento sudoeste Leva rio abaixo O dobre dos sinos Torres brancas Eialalá laiá Uialalá laialalá
'Bondes e árvores empoeiradas. Highbury me gestou. Richmond e Kew Me aniquilou. Em Richmond ergui os joelhos Indolentes ao chão da canoa estreita.'
'Meus pés estão em Moorgate, e meu coração Sob meus pés. Depois do acontecido Ele chorou. Prometeu um 'novo começo'. Nem falei nada. Que mágoa eu teria?
'Em Margate Sands. Não posso conectar Nada com nada. As unhas quebradas de mãos sujas. Meu povo, meu povo humilde que não espera Nada.' la la
A Cartago então cheguei
Ardendo ardendo ardendo ardendo Ó Senhor Vós me arrebatais Ó Senhor arrebatais ardendo
IV. Morte pela Água
Flebas, o Fenício, morto há uma quinzena, Esqueceu o grito das gaivotas e a funda vaga do mar E os ganhos e perdas. Uma corrente sob o mar Colheu seus ossos num sussurro. Enquanto alçava-se e afundava Passou as fases da idade e da juventude Entrando no turbilhão. Gentio ou judeu Ó tu que giras o timão e mira a barlavento, Considera Flebas, que um dia foi belo e alto como tu.
V. O Que Disse o Trovão
Após a tocha rubra em rostos suados Após a geada silenciosa nos jardins Após a agonia em lugares pétreos A gritaria e a choradeira A prisão e o palácio e a reverberação De trovão de primavera sobre montanhas distantes Aquele que estava vivo agora está morto Com um pouco de paciência
Aqui não há água, apenas pedra Pedra e nenhuma água e a estrada arenosa A estrada subindo como vento entre as montanhas Que são montanhas de pedra sem água Houvesse água deveríamos parar e tomar Entre rochas não se pode parar ou pensar Suor seco e pés na areia Houvesse água entre as pedras Montanhosa boca morta de dentes cariados que não sabem cuspir Aqui nem se pode ficar de pé nem deitado nem sentado Nem mesmo há silêncio nas montanhas Só seco trovão estéril sem chuva Nem mesmo há solidão nas montanhas Só soturnas faces rubras zombam e rosnam Nas portas de casas de pau a pique Houvesse água E nenhuma pedra Houvesse pedra E também água E água Uma fonte Uma poça entre as pedras Houvesse som de água apenas Não a cigarra E grama seca cantando Mas som de água sobre a pedra Onde o tordo-eremita canta nos pinhais Plic ploc plic ploc ploc ploc ploc Mas não há água
Quem é o terceiro que caminha sempre ao teu lado? Quando eu conto, há apenas eu e tu juntos Mas quando olho adiante pela estrada branca Há sempre um outro caminhando a teu lado Deslizando envolto em um manto marrom, encapuzado Não sei se homem ou mulher — Mas quem é aquele do outro lado de ti?
Que som é aquele que se eleva no ar Murmúrio de materna lamentação Quem são aquelas hordas encapuzadas abarrotando-se Sobre infindas planícies, vacilando na terra fissurada Circundada pelo horizonte apenas O que é a cidade sobre as montanhas Fissuras e reformas e estouros no ar violeta Torres tombadas Jerusalem Atenas Alexandria Viena Londres Irreal
Uma mulher puxou as cordas da cabeleira negra E, tangendo-as, fez música sussurrada E morcegos com faces infantis sob a luz violeta Assoviaram e bateram asas E arrastaram-se de cabeça baixa por um muro enegrecido E penduradas ao contrário no ar havia torres Dobrando sinos evocativos, que cuidavam das horas E vozes cantando em cisternas vazias e poços exauridos.
Nesse buraco decadente entre as montanhas No luar turvo, a grama está cantando Sobre as covas reviradas, junto à capela Eis a capela vazia, lar apenas para o vento. Não tem janelas e a porta balança, Ossos secos não ferem ninguém. Apenas um galo na cumeeira Co có ricó co co ricó Num clarão de relâmpago. Então uma úmida rajada Trazendo chuva
O Ganga afundou, e as folhas murchas Esperavam chuva, enquanto as nuvens negras Reuniam-se bem distantes, sobre Himavanta. A selva se curvava, encolhida em silêncio. Então falou o trovão DA Datta: o que demos? Meu amigo, o sangue que agita meu peito A terrível audácia de um momento de entrega Que uma idade de prudência jamais poderá retirar Graças a isso, e apenas isso, existimos O que não se há de achar nos nossos obituários Ou em memórias veladas pela aranha benévola Ou sob selos rompidos pelo advogado esquálido Em nossos quartos vazios DA Dayadhvam: eu ouvi a chave Girar na porta uma vez e girar uma vez só Pensamos na chave, cada um em seu cárcere Pensando na chave, cada um confirma seu cárcere Só ao cair da noite, etéreos rumores Revivem por um momento um Coriolano alquebrado DA Damyata: O barco respondeu Alegremente, à mão perita em leme e remo O mar estava calmo, seu coração teria respondido Alegremente, quando convidado, golpeando obedientes As mãos no controle.
Sentei-me na praia Pescando, com a árida planície atrás de mim Devo ao menos pôr minhas terras em ordem? A ponte de Londres está caindo está caindo está caindo Poi s’ascose nel foco che gli affina Quando fiam uti chelidon — Ó andorinha andorinha Le Prince d'Aquitane à la tour abolie Com esses fragmentos eu escorei minhas ruínas Why then Ile fit you. Hieronymo’s mad againe. Datta. Dayadhvam. Damyata. Shantih shantih shantih
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