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Avril afundava as unhas na palma da mão direita cada vez mais forte. Ao seu lado, o garoto Samos continuava dobrando vigas de silÃcio, desmanchando-as do painel e as conduzindo para três das caixas amontoadas que aguardavam abertas pelo conteúdo uma vez abrigado. Ela sabia que cada um daqueles caixotes escondiam materiais distintos, peças decorativas do que esperavam transformar em um grande espetáculo. Ainda assim, sua mente só conseguia focar no tipo de brincadeira de mal gosto que haviam feito com ela.
Quando atravessou o gramado, esperava com toda sua graça encontrar a bajuladora da famÃlia real. Estava ciente que provocar intrigas antes mesmo do inÃcio da Prova Real poderia ser um risco grande a correr, e não era como se ela realmente tivesse um motivo concreto para justificar sua petulância. Mas Nora Samos não perderia a chance de mostrar à curandeirinha o seu lugar. E ela não queria ser como Nora?
Para sua surpresa, outra pessoa a aguardava. Um Capitão. Um Arven. Um Silenciador.
— Seja bem-vinda, senhorita. — Ele tinha projetado a voz cordialmente, como se ela precisasse da sua educação. O que viria depois, olhares de pena?
Eram poucas as coisas que os Samos temiam, e inevitavelmente os silenciadores estavam entre elas. A ideia de ter seu poder desligado e ser reduzida a um mero rato vermelho era sufocante só de imaginar. Avril quase não mais lembrava a sensação de ser atingida por um deles, mas o temor daquele dia nunca a abandonou. De certa forma, o branco dos Arven lhe era ainda mais intimidante do que o vermelho e preto dos Calore.
E tinham posto um deles bem à sua frente.
— Senhorita Samos? — Hayden quebrou seu raciocÃnio, sua voz grave trazendo-a de volta ao presente.Â
Avril se deu conta que o cenário da sua fotografia já tinha sido inteiramente desmontado, e que neste momento ela era a única peça em desarmonia no panorama. Percebeu também o olhar atento do Capitão em sua mão, e pela primeira vez sentiu a palma molhada. Pequenas gotÃculas de sangue prateado pingavam no gramado.Â
Hayden se aproximou alguns passos e ela precisou de todo o autocontrole para não recuar. Ele puxou um lenço alvo do bolso e o ergueu em sua direção, a cor combinando opressivamente com as faixas que percorriam as duas mangas do uniforme. Por um momento, ela queria gritar e espernear, chutar aquele maldito lenço branco para longe e acertar o imbecil silenciador com a própria bala de aço que ela sentia na pistola presa ao coldre na cintura dele. Ela queria berrar aos quatro cantos o quão era forte, e que, assim como o metal, não se curvaria para ninguém.Â
Ela aceitou o lenço.
Demonstrar fraqueza não era uma opção, mas mesmo ela sabia que não deveria desafiar um protegido do rei, independentemente do que Nora teria feito. Além do mais, ansiava não ter deixado claro o mÃnimo resquÃcio de sua aflição.Â
Hayden acenou para o garoto Magnetron, o mesmo que continuava a acompanhando — e o mesmo que ela não tinha se importado o suficiente para ouvir o nome —, mas antes que pudesse emitir qualquer ordem ela o interrompeu, levantando a mão.
— Posso encontrar a saÃda sozinha.
Avril forçou suas botas a tomarem o caminho oposto que tinha percorrido para chegar até ali. A mente fervilhava em um misto de raiva e vergonha, porém nada era mais angustiante do que assistir o sangue prateado sobre o tecido pálido. Branco e Prata. Sua cor mais odiada de encontro a mais amada. Se os poderes das demais Casas concerniam a uma benção, então os da maldita Casa Arven deveriam ser uma maldição.Â
Avril atirou o lenço na grama.
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A arena parecia um cemitério, ausente de suas decorações suntuosas. O cÃrculo central estava iluminado e movimentado, mas o vazio em cada curva do anfiteatro ainda instaurava um clima mórbido pela parte superior do lugar. Belle tinha ouvido histórias sobre a majestosidade daquele local, todos ouviam, então foi uma enorme surpresa encontrá-lo tão simples.Â
O Jardim Espiral havia sido designado para a propaganda da Prova Real. Vermelhos corriam de um lado para o outro sobre a grama verdinha da base, preocupados em acomodarem cada prateada que chegaria para finalizar sua inscrição. Um pequeno Conselho havia sido improvisado em uma das bordas, composto por mesas apinhadas de documentos e rodeado por caixas de diversos tamanhos, armazenando sabe-se-lá-o-quê. Próximo a eles, um grupo distinto aguardava em formação, as cores de seus uniformes sobressaindo-se como um arco-Ãris organizado à s cegas.Â
Nada muito surpreendente, entretanto.
— Pelas minhas cores, você está parecendo uma cobrinha. — Cobrinha não era um elogio ao qual Belle estava acostumada, porém bastou um relance do olhar de apreço alheio para ela saber que aquele poderia ser uma exceção. Como membro da casa Viper, ser chamada assim significava alguma coisa para a sua imagem.Â
— Obrigada — Belle virou para a garota, seus olhos encontrando rapidamente as faixas prata e vermelha que decoravam seu uniforme preto. Skonos. Não era preciso ser um gênio para descobrir quem ela era. Os Skonos mais próximos do rei. Todo mundo ouvia sobre isso também.Â
— Sou Brenda, e imagino que você seja Belle Viper. Deve vir comigo primeiro, Belle, para tirarmos sua fotografia. — Brenda estendeu a mão, e não conteve um arquear de sobrancelhas quando Belle a apertou de volta.Â
Ela sabia o porquê: seu aperto era breve mas firme. Muitas pessoas costumavam se levar pela sua aparência suave e delicada, mas para bons entendedores, um aperto de mão era suficiente para revelar muito sobre a força de alguém.
Elas seguiram até o grupo uniformizado, onde foram recebidas com reverências. Belle fez uma leve mesura em retribuição, mas Brenda dispensou os gestos com um aceno de mão.
— Poupem suas saudações e depois as troquem por uma bebida. Me fará muito mais feliz.
— Senhorita, o Capitão nos informou que não poderÃamos permitir — Um dos cinco jovens tomou a frente. Belle reconheceu o verde e ouro dos Verdes. Ele não parecia ter mais que treze anos. Olhando de perto, os outros também aparentavam a mesma idade.
 — O que o Capitão não vê o Capitão não sente — Ela piscou. — E, por sinal, eu não o vejo em lugar algum por aqui. Você o vê, Belle?
Belle sorriu e balançou a cabeça. Não era muito aberta com quem acabava de conhecer, mas alguma coisa no jeito da Curandeira a fazia se sentir confortável.
Brenda sorriu e bateu duas palmas. — Muito bem, voltaremos ao trabalho. Ren, ela é Animos. Preciso que providencie uma pequena floresta como plano de fundo. Lucas, quero a luz focada no rosto dela. Vamos apresentar uma selva e deixar claro quem é o Leão.
Às ordens de Ren, plantas cresceram num piscar de olhos, a folhagem densa e padronizada atrás de uma única árvore, respeitosamente. Quando Belle encontrou seu lugar no panorama, sentiu a claridade oscilar ao seu redor. Lucas continuava manipulando as mãos, procurando uma posição exata para os feixes de luz; vez ou outra ele era pego envolto nas sombras, fundido pelo preto dos Haven.
Quando acabaram o trabalho, Brenda tinha uma foto em mãos.
— Isso fica comigo. E, se tiver sorte, você fica com o prÃncipe — disse ela, despretensiosa, como se não estivesse falando não apenas do futuro de duas pessoas, mas também de um reinado. Ela se despediu de Belle com um novo aperto de mãos, e antes que pudessem se separar completou: — Boa sorte.
Sorte. Alguns supunham que era construÃda. Outros julgavam que era encontrada. E Belle acreditava que cruzaria o seu caminho.Â
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