planafestival-blog
planafestival-blog
biblioteca plana
5 posts
planafestival.org
Don't wanna be here? Send us removal request.
planafestival-blog · 8 years ago
Text
Fotolivros e a melancolia dos apartamentos
Por:  Bia Bittencourt | Publicado na Zum em: 06 de novembro de 2017
A quantidade (e qualidade) de livros na biblioteca da Plana nos diz muito sobre o espírito de um momento. É pela repetição de temas e abordagens que entendemos melhor o que atrai os olhares de fotógrafos e artistas. E isso é cada vez mais dinâmico e verdadeiro, sobretudo quando lidamos com produções independentes, que passam rapidamente da imaginação e intenção do fotógrafo para o papel, o fanzine, o livro e as estantes. A facilidade de criar e publicar imagens na era digital acelera a circulação de livros e fanzines, o que encurta (e confunde) a distância entre quem produz e quem vê.
Foi com esse olhar que, entre tantos filtros possíveis, reparei que nossas casas, nossa intimidade, nosso pequeno espaço particular começou a ficar mais evidente. Nós, crias da metrópole, artistas de playground, andarilhos de quarteirão, estamos domesticados, em nossos poucos metros quadrados, a enxergar tudo de muito perto, sem recuo nem binóculo. Reza a lenda que os marinheiros têm visão boa porque não tiram os olhos do horizonte. Já nossa visão de alcance encurtado limita-se às paredes, aos muros e às empenas.
Encontrei algumas publicações com marcados traços de melancolia e solidão, sintomas prováveis da falta de distância e horizonte para observar a vida, coisa de gente da cidade. Nos nossos apartamentos, o que é sujeira do cotidiano vira monumento. Mínimos movimentos e gestos se transformam em poses. A revolução é doméstica, por entre cobertores, almofadas e canecas. Temos buscado a realidade ao redor com curiosidade, cautela e educação. Avisamos antes de clicar. Assim, a vida velada dentro de um apartamento pode ser tão exótica e interessante quanto a natureza. Será que passamos da fase de observar a miséria social emoldurada por uma janela?
No livro Estão preparando algo imenso na costa, a argentina Mariana Pacho López tenta dar sentido a essa intimidade doméstica de forma delicada. Isso é tão claro quanto a luz natural que entra pela janela, filtrada por cortinas de tule, e ilumina os rostos das meninas, suas mãos e o silêncio das relações. A publicação é permeada pela força de ondas quebrando na orla. As imagens remetem a apartamentos que já vimos antes: os tons de rosa claro, as peles sempre brancas, desbotadas, o cigarro e o café sem açúcar, lençóis desarrumados e olhares perdidos. Alguns psicanalistas afirmam que a solidão provoca isolamento dos outros, mas também distância e estranhamento de si mesmo.
Já em Branca, a fotógrafa brasileira Ligia Jardim não explica nada ao leitor. Mas posso contar aqui que são imagens da casa de sua falecida avó Branca. E novamente a mesma luz natural a entrar pela mesma janela coberta por cortinas de tule. Mas diferente de Mariana, que escolhe retratar meninas, Ligia olha para objetos: joias, caixas e louças. Uma memorabilia banal, doméstica, carregada de cheiros e lembranças prestes a serem encaixotadas, anuladas e catalogadas. “Muitas separações objetivas (como o luto) mostram-se retrospectivamente apenas uma ação para reintroduzir parênteses de solidão em uma vida poluída por ocupações e tormentos”, pontua o psicanalista Christian Dunker no capítulo “Solidão e solitude”, do seu livro de ensaios Reinvenção da intimidade.
Já em Aproximando-se do encapsulado, da artista de Sarajevo Sumeja Tulic, notamos mais explicitamente uma sensação de “não lugar” nesses apartamentos espalhados pelo mundo, como espaços de transição e de relações afetivas simuladas. No apartamento de Sumeja, canecas também servem de cinzeiros, lençóis bagunçados são iluminados através de tules e o naturalismo de flores falsas tem muito mais vida que mãos e rostos frágeis e juvenis.
No livro Sempiternamente, da argentina M. Virginia Molinari, amigos se reúnem em festas, viagens, em volta da Coca-Cola e do cigarro, com um sentido de solidão que é visto no olhar dessas pessoas, alheias de um convívio social. Há um fascínio que coloca o retratado não só dentro de um vazio espacial, como também existencial.
Imergir num conjunto de livros como esse nos empurra para dentro da intimidade das pessoas, das paredes de um apartamento desconhecido, dos segredos e nostalgias que não pedimos a ninguém para saber. A sensação turva de controle absoluto das cenas e o despedaçamento de nossas rotinas nas capturas fotográficas banais podem ser um reflexo nocivo, entretanto, lírico de uma geração e um tempo específico nas grandes metrópoles.
Tumblr media
1 note · View note
planafestival-blog · 8 years ago
Text
Introdução ao fim do mundo
Texto curatorial publicado na ocasião da Plana Festival quinta edição
Um estatuto relacionando 12 alvarás, desmembrados em pelo menos 32 outros documentos, cada um solicitado e adquirido em diferentes pontos, prédios e repartições da cidade, custando entre R$100 a R$5.000, perecíveis em um mês, portanto, planejados, planilhados e alinhados em cronogramas de execução determinando o quanto um projeto precisa ser outorgado com ao menos um ano de antecedência, ladeado de planos A, B e C blindando todas as possibilidades de maus entendidos e possíveis complicações.
Donas de si, as instituições relativamente financeiras passam rasteiras, os capangas iludem e as máquinas, desenhadas pela obsolescência, travam os fluxos. Toneladas de papel decompõem, pilhas de cálculos mal-feitos, depósitos de objetos sólidos sem função, cápsulas de café corporativo ironicamente transformadas em presépios, bolas de natal, decorando construções simbólicas, plastificadas em tons ocres, presas no que foi um dia um pinheiro fresco de Natal autorizado pelo CIFAN, CIPA, bombeiros, brigada de incêndio do primeiro piso e muito elogiado pelo ISO9002.
Estufas corretas, com seus impostos em dia, funcionários sorriem sustentando o semblante desconfiado, regadores eletrônicos em pleno funcionamento, sementes sempre férteis, teto crespo e translúcido bloqueia ultravioleta, LUZ ingrata, abelhas, pássaros, larvas e vermes. Pinheiros crescem no solo fertilizado, aplainado, semipasto, em diferentes períodos do ano, tabelados e programados para estar disponíveis a qualquer tipo de evento. Cabem em qualquer palácio.
Dispostos em fileiras chanceladas pelo síndico, arquitetadas por uma equipe, regularizadas e asseguradas com aprovação de não um, mas três cargos oficiais, as muitas obras delicadas decoram o salão principal do palácio de estilo moderno; enquanto grupos vendem, outros compram. Ao menos 15 tentativas de financiamento foram arriscadas, 60 reuniões organizadas, jogos, disputas seguidas de frustração de ambos os lados. Razão social, CNPJ, nome completo, endereço, CPF, RG, familiares, estado civil, CCM, habilitação doravante assinatura de todos os envolvidos com firma reconhecida. Envolve pesquisa, paciência, trato, confiança e alguns carimbos holográficos.
Nessas terras a luta é constante, as demarcações vão e voltam, festa, prédio, armamento, madeira, soja, estrada, energia, petróleo, pedras preciosas, levar uma massa de gente para lá, outra para cá, faz piorar aqui, melhorar ali, esconder a parte feia, fazer monumentos, pintar a massa podre com tinta fresca, suicídio, rebelião, colapsos. Os bichos fazem o que podem. A literatura e a arte continuam suspensas e fila para o coletivo rumo ao fim sai da Praça da Sé.
0 notes
planafestival-blog · 8 years ago
Photo
Tumblr media
Nossas Núpcias, Rosângela Rennó
Residência Plana 2016 - 2017 “Mesmo em sociedades consideradas liberais e em segmentos supostamente bem informados, temos assistido a demonstrações lamentáveis de cegueira social, como por exemplo, as opiniões expressas pelo presidente do nosso país sobre o papel da mulher na sociedade nos dias de hoje. Isso, sim, me parece o fim do mundo”, diz Rosangela Rennó, artista convidada do programa de residências da Plana. Sua proposta inédita para o “Fim do Mundo” foi feita a partir do tema casamento. Os livros dos residentes estão no estágio final de produção e serão publicados no segundo semestre deste ano. Leia entrevista com a artista abaixo.
Plana: Como o projeto se desenvolveu durante os últimos meses? Rosangela Rennó: Nos últimos meses venho tentando ampliar a abrangência da minha coleção e estudando sobre os diversos tipos de intervenção pictórica, não apenas sobre fotografias de casamento como também sobre as demais fotografias de caráter vernacular. Os indianos, por exemplo, são espetaculares no que diz respeito ao retrato de estúdio: as pessoas se fazem representar carregando objetos de consumo de todo tipo e fazem poses inacreditáveis. No momento estou fazendo várias colagens e várias ilustrações, todas manualmente. As fotos serão reproduzidas digitalmente apenas no final do processo. P: Porque você escolheu o tema casamento para falar sobre o fim do mundo? RR: Me parece que existe uma ansiedade geral provocada pelos "excessos". Excesso de tudo: de comunicação, de acessibilidade, de consumo, de contraste entre pobreza e riqueza e entre desejo e realização; esse excesso empurra a satisfação e, consequentemente, a felicidade, para muito longe, muito além do nosso alcance. Entre tantas frustrações, casamentos se tornam imperfeitos por muito pouco; me interesso pelo documento daquilo que foi sacramentado e depois desfeito, tanto pelo tempo quanto pelo próprio ser humano. Casamentos hoje não parecem valer muita coisa, apesar do ainda alto valor simbólico da cerimônia e do altíssimo preço que se paga para realizá-las. É impressionante a quantidade de fotos de casamento que tenho encontrado nos mercados de pulgas, só não superada pela quantidade de fotos que são realizadas hoje, digitalmente, nas inumeráveis cerimônias, cuja pompa e circunstância variam em conformidade com o poder de compra das diferentes classes sociais. Por outro lado, percebo que nesse século as sociedades de maneira geral têm sinalizado, de várias maneiras, mudanças radicais no modelo tradicional da união amorosa. Como exemplo, temos visto com maior frequência a oficialização de uniões entre casais homossexuais e os esforços de vários segmentos da sociedade em compreender e aceitar as variantes nos modelos de gênero. Digo vários segmentos, mas não todos. A aceitação dos novos modelos não é unânime e muito menos universal. No Brasil, por exemplo, o que parece ser natural para muitas pessoas ainda é considerado uma doença ou um desvio comportamental abominável, e em alguns países da África ou da Ásia, até mesmo crime. Estamos ainda muito longe da harmonia e da sabedoria e, infelizmente, talvez a humanidade pereça antes de atingi-las. Finalizando, mesmo se consideramos as uniões entre casais convencionais, isto é, homens e mulheres, os papéis sociais exercidos por eles vêm se modificando ao longo dos séculos e principalmente a partir do final do século 19. Entretanto, o que muitos consideram como um avanço na história da cidadania, como por exemplo a importância do papel da mulher nessa construção, parece ser obscurecido e até ignorado por vários. Mesmo em sociedades consideradas liberais e em segmentos supostamente bem informados, temos assistido a demonstrações lamentáveis de cegueira social, como por exemplo, as opiniões expressas pelo presidente do nosso país sobre o papel da mulher na sociedade nos dias de hoje. Isso, sim, me parece o fim do mundo. Porém, ainda sou otimista. Acima de tudo e no final das contas, ainda acredito que poderemos ser salvos pelo amor. P: O que inspirou, mudou o percurso e motivou a experiência de editar um livro com a Plana? RR: Trabalhar e editar com a Plana é uma delícia; a Plana é um dos bons sintomas da reação ao descontrole geral, aos excessos. Uma feira onde as pessoas se encontram pra compartilhar ideias impressas, sentir o cheiro de papel, trocar figurinhas e falar de amor. P: Quais são as suas expectativas de vocês para o livro? RR: As expectativas são as melhores: salvar a humanidade! Viva o amor!
0 notes
planafestival-blog · 8 years ago
Photo
Tumblr media
Em agosto, visitei o estúdio da Rollo Press (Zurique - Suiça) e seu criador Urs Lehni, impressor-professor-editor de livros como Hotel Nacional e O. Niemeyer. Abaixo, breve entrevista que fiz.
Bia. Você pode contar sobre como você decidiu criar a Rollo, quando e o que você estava fazendo da sua vida naquele momento?
Urs. Acho que houve um pouco de decepção ou frustração quanto ao meu papel como designer gráfico no quadro de colaborações institucionais. Eu senti que muito dessa tomada de decisão foi política, motivada por um esforço colaborativo para produzir um bom livro, catálogo, monografia. Como uma reação a isso, decidi fazer uma tentativa de me publicar e, para manter os custos baixos e o processo mais simples possível, adquiri uma máquina de impressão Risograph. Isso foi no final de 2007.
Você trabalha sozinho? Como você faz escolhas e decisões editoriais desde que você começou?
Embora Rollo seja principalmente uma "one man band", eu nunca trabalho sozinho. Dependo de inúmeras opiniões e conselhos de amigos e companheiros, restrições definidas pelo dinheiro (ou a falta) e oportunidades de produção limitadas, chance e sorte, e principalmente, claro, os autores com os quais trabalho. Não posso dizer como as decisões editoriais são tomadas, apenas que elas são sempre o resultado de uma troca e diálogo com várias pessoas.
O que mudou de quando você começou até agora?
A única coisa que realmente mudou são os métodos de impressão e produção. Durante os primeiros dois anos fazendo Rollo, eu produzi todos os livros à mão, imprimi-los no Riso, depois dobrava, colocava as capas, o grampo, ou costurava, encadernava. Isso foi muito gratificante, mas também limitativo em termos de impressão e, portanto, o público que podia alcançar. Depois disso, mudei para métodos de impressão mais convencionais, mas tenho uma habilidade para processos prosaicos produzidos em massa, como a impressão em brochura. Nunca fui interessado em criar livros objeto e livros únicos.
O que você acha sobre os novos estúdios e a produção atual na Suíça?
Difícil de dizer em geral, mas existem novas pessoas. Para ser sincero, penso pessoalmente que os dias de design gráfico estão contados - mas não falem pra ninguém! Além disso, ainda estou espantado de que existam estúdios dentro, mas principalmente fora da Suíça, que conseguem empurrar as coisas para frente. Eu acho que você poderia dizer que a Suíça tem um problema de bem-estar e está saturado demais, por isso muito designer se sente isolado, arbitrário, substituível e genérico. Ou talvez eu apenas esteja numa crise de meia-idade...
Você tem alguns bestsellers que eu já vi disponíveis em muitas livrarias fora da Europa. Como você distribui? Como você achou que criou esses best-sellers? Escolhendo os artistas certos?
Até agora, toda a minha distribuição é feita pela Idea Books de Amsterdã, eles são ótimos e estou feliz que eles conseguem se livrar de minhas coisas. É verdade que tenho um monte de livros que felizmente vendem bem, mas também tenho outros, chamados queimadores lentos que estão em estoque por anos! Eu apenas publico o que eu acho que gostaria de um livro e, aparentemente, meu gosto é bastante importante pras pessoas.
1 note · View note
planafestival-blog · 8 years ago
Photo
Tumblr media
Acqua Alta é o fenômeno em que a água do mar, durante a maré alta e primavera, entra nas ruas de Veneza obrigando os moradores e turistas a caminharem de galochas e alguns comércios a serem evacuados. Acqua Alta também é o nome da livraria de Luigi Frizzo que entre as perturbadoras e alagadas vielas lotadas de turistas, preserva mais de cem mil livros.
Acqua Alta foi aberta há 15 anos. É a terceira loja de livros que Luigi abriu em Veneza. As outras duas que teve eram muito pequenas e ele decidiu vendê-las para procurar esse grande espaço.
Luigi começou a comprar livros novos e de segunda mão há 40 anos, segundo Lino Frizzo, seu filho, "decidiu abrir uma livraria, porque ele queria passar uma mensagem Steiner porque ele é Steineriano (Rudolph Steiner)". Luigi queria salvar os livros da maré alta e por isso estão todos guardados em gôndolas, navios, caiaques e banheiras. Do lado de fora, pilhas de livros formam muros e com a água que vai e vem, os livros formaram uma massa tão resistente quando tijolos.
Comprei um livro italiano infantil de 1840, todo impresso em tipografia em três cores por 15 Euros. No caixa, Luigi diz que pareço uma estrela de Hollywood. Agradeço. Lino me conta "Meu pai é um homem muito engraçado e ele ama muitas mulheres. Ele é muito gentil com as mulheres na livraria."
Acqua Alta: Calle Longa S. Maria Formosa, 5176/b, 30122 Castello, Veneza, Itália
0 notes