Photo
Quando PERCIVAL ‘PERCY’ ERNEST RAINEY hospedou-se no Pera Palace, jamais imaginou que VINCENT VAN GOGH o escolheria como receptáculo. Agora, o JORNALISTA E FOTÓGRAFO DE CONFLITO de 40 anos não se preocupará apenas com relaxar em Istambul, mas também ajudará nos mistérios que estão ai por vir. O mais engraçado de tudo? Além disso, ele também se parece muito com LEE PACE!
SOBRE VINCENT:
Desde a juventude tivera olhos envelhecidos, como se uma alma mui antiga e já exausta habitasse seu corpo. Poderia passar por tímido, dado o silêncio e reserva com a qual tendia a portar-se. Lhe era característica a seriedade, mesmo durante a infância, sendo um dos adjetivos mais atribuídos a Vincent pelos demais. Fosse isso talvez apenas um reflexo da existência austera, fria e estéril à qual parecia condenado desde a concepção.
Austera, fria e estéril, à despeito da conexão as belas artes que a família sustentava e o consequente incentivo para dedicar-se à mesma. O próprio Vincent descobrira sua inclinação para tal ainda muito jovem, dedicando-se a desenhos com um que de entusiasmo. No entanto, como há de esperar-se, seus primeiros trabalhos não detinham nada de extraordinário, consistindo em composições carentes do estilo que um dia haveria de consagra-lo. Com o tempo, não perdera o hábito de dedicar-se ao mesmo, almejando transformar a descoberta paixão em uma carreira e, por vezes, até mesmo alcançando conexões profissionais dentro do ramo, graças às próprias origens. Chegara a ter algum sucesso como negociante de arte, no entanto, frustrações de natureza pessoal terminaram por desviá-lo de seu caminho. Havia, também, sua profunda rejeição por convenções, fator responsável por fazê-lo desprender-se de inúmeros empregos ao longo de sua vida. Isto não o impedira de dar continuidade às próprias criações, amoldando tudo aquilo que assimilava ao próprio estilo, que ganhara forma progressivamente, vindo a ser tão vivo quanto o próprio Van Gogh jamais conseguira.
Vicent era tomado por uma tristeza profunda. Não havia método ou propósito à melancolia, sendo esta apenas um lamentável reflexo da desolação e a consequente dormência dos instintos destinados à autopreservação. Deixar de alimentar-se ou trocar tudo por álcool em seus piores dias, em algum momento que sequer conseguia pontuar, passara a configurar-lhe um hábito. Percebia haver deixado seus melhores anos há muito tempo, e percebia, também, ser incapaz de apontá-los. Não acreditava em felicidade, mas em momentos felizes. E para seu desespero, os próprios pareciam distantes. Por longo tempo cultivara certa ciência de que algo em si, especificamente, em sua cabeça, não era correto. ‘Vim ao mundo quebrado’, por vezes pensava momentos antes de adormecer, 'ou talvez me tenham arruinado ao longo dos anos’. Qual fosse a razão, reconhecia ao menos intrinsecamente que não funcionava bem. Viam-no como louco, louco e malsucedido, e doía-lhe atestar a natureza dos adjetivos impiedosos. Era difícil não fazê-lo, trás dedicar-se imensamente ao que fazia e, apesar de seus melhores esforços, sempre deparar-se com desventuras. Ora não abriam-lhe portas por não ser bom o suficiente, ora estas eram abertas apenas para que pudessem empurrá-lo para fora novamente. Mesmo quando adaptava-se às convenções, havia um profundo sentimento de derrota em seus resultados.
Buscara mesmo em deus com o que preencher o vazio em si, havendo encontrado nada que não o silêncio trás preces vazias. Embora não fosse propriamente um andarilho, tampouco tinha aquilo que conseguia chamar de lar, seu laço mais profundo e significativo sendo com Theo. Almejava pertencimento a despeito do sangue e a satisfação que haveria de vir com este, um local no mundo donde lhe fosse possível criar raízes e conhecer o sentido da própria existência. Necessitava atribuir uma serventia à si, quase como do oxigênio. O abismo em seu interior, no entanto, não parecia retrair-se, deixando de ser uma tímida rachadura para tornar-se um cânion majestoso, exibindo um riacho de incerteza, minúsculo desde a distância da beirada, embora seu perigo fosse perceptível. Estendera as mãos a tudo o que pudesse alcançar, agarrando-se com desespero mesmo às pequenas coisas. No entanto, a própria cabeça parecia configurada para fugir de qualquer noção de estabilidade, tornando impossível a plena dedicação a uma única coisa. Vincent saltara de carreira em carreira, de objetivo a objetivo, de cidade a cidade, qual um pássaro saltando entre galhos, tudo para trilhar um caminho permeado por fracasso em sua obsessiva busca por um propósito que sequer começava a compreender. Desejava ser algo, alguém. Ansiava por reconhecimento de uma forma que ninguém parecia capaz de entregar. Tudo lhe era raso, insatisfatório, indigno de paixão e esforço. Austero, frio e estéril.
Despertara com uma intensa dor no lado esquerdo da cabeça, sem memória de haver mutilado a própria orelha com uma navalha. Talvez isto fosse um dos marcadores da fragilizada saúde mental, e em seus momentos de coerência, sentia um nó a formar-se na garganta, talvez pressagiando o que haveria de vir. Ouvira, pois, crendo ser em um de seus delírios, sobre um hotel e viagens no tempo, e a possibilidade de fazer algo. E o que resta a um homem desesperado à beira do desequilíbrio, se não a esperança? Não abandonara, afinal, a obsessiva busca por um propósito. E assim, partira para o hotel.
SOBRE PERCIVAL:
Um de seus primeiros almejos foi ser artista plástico, especificamente pintor, partindo de uma alegria juvenil ao ganhar em seu sétimo aniversário um estojo de aquarelas que careciam de qualquer qualidade. De devaneios absurdos partia o impulso — as belas-artes não são uma escolha viável de carreira para garotos de origens menos abastadas — pois faltava talento às mãos para algo além de um ou dois rabiscos ao final de um caderno de páginas amareladas, rabiscos estes que jamais haveriam de ser vistos por olhos que não os seus, visto que mesmo a caligrafia lhe configurava uma arte impossível. Não obstante, se bem não pudesse criar com carvão ou grafite as imagens que lhe habitavam a mente — ou mesmo reproduzir aquilo defronte com razoável competência — detinha bons olhos para a beleza até no mais ordinário, e aprendera como capturá-la através de uma lente. O que começara como uma atividade corriqueira de lazer progressivamente adquirira relevância, tornando-se algo fundamental para Percy. E de certa forma, influenciara-o na escolha — desta vez realista — de carreira. A fotografia levara-o à escrita que, por sua vez, o guiara ao interesse pelo jornalismo, âmbito em que a associação de dois de seus interesses era possível, se não necessária.
Devido à origem humilde, construiu o próprio caminho com esforço solitário, passando por todas as dificuldades que todos eventualmente enfrentam. Passara por todas as etapas necessárias à construção de uma vida própria, conciliando empregos colaterais à carreira que o diplomara. E de fantasias também traçara os objetivos, pois uma parte de si — talvez um resquício da criança de olhos cheios de luz e alma velha, como se soubesse aquilo por vir — ainda tinha esperanças de alcançar renome e conforto suficientes como para dedicar-se ao jornalismo cultural. Apesar de todo o idealismo e os anseios quase ingênuos, não tardara para que o plano de carreira fosse desviado. Entre idas e vidas cuja descrição sequer compensa, pegara-se em uma sequência de anos de jornalismo puramente político, terminando como correspondente de guerra e fotógrafo de conflitos, ramo que lhe cairia muito melhor se fosse um niilista, coisa da qual estava surpreendentemente distante. O reconhecimento em tal área, afinal, trazia consigo um gosto amargo. Por anos devaneara com congratulações por feitios de beleza e a conseguira com algo completamente oposto.
Era ciente da própria incapacidade de ilustrar qualquer fosse a coisa por intermédio das usuais ferramentas. No entanto, descobrira portar um talento bastante sólido para traçar imagens sobre o papel por intermédio de palavras mais subjetivas do que as que costumava fazer mão, sendo plenamente capaz de derramar dor, esperança e tragédia em orações dotadas de cor, a letra horrenda a desenhar todas as histórias gestadas pela própria angústia. E assim, escrever ficção a partir de demônios muito reais tornara-se outra de suas atividades necessárias para manejo da sanidade. Se bem durante o dia fotografava os horrores e relatava a crua realidade de zonas maltratadas pelo egoísmo da criação humana, à noite despejava seus lamentos mui reais e falsas alegrias sobre o papel, e reservava o olhar das lentes à pouca beleza esperançosa que conseguia encontrar. Embora a fotografia de natureza menos crua não lhe houvesse servido de muito, a ficção de uma emotividade indócil atraíra olhares de certa importância, e chegara a publicar — sob um pseudônimo — uma compilação de contos de êxito considerável.
Terminou no Pera Palace Hotel motivado exclusivamente por frustração. Não lhe faltava nada. Ao menos, não no sentido fundamental, desde um ponto de vista puramente socioeconômico. Contava com comodidade e liberdade financeira, tendo assim a possibilidade de atender a grande maioria de seus impulsos, desde que não extrapolassem limites do que há de considerar-se razoável. Era relativamente bem conectado socialmente, detendo um círculo de amizades deveras sólido para alguém um tanto quanto reservado. No entanto, a um nível espiritual e muito mais particular, há muito encontrava-se insatisfeito. Como se atender às necessidades humanas esquematizadas não mais lhe servisse. Sentia-se incompleto, raso, e contemplava a integridade da própria trajetória como um fracasso. Uma sombra do homem que sonhara com ser, quando enfrentado ao reflexo da realidade. Em um impulso, tirara as férias acumuladas ao longo de anos, não tendo intenção inicial de retornar. Desejava viajar, atravessar fronteiras que antes não ousara e, talvez, registrar seus últimos relatos em uma busca quase obsessiva por um propósito
ETC:
É vegetariano há 14 anos, especificamente, ovolactovegetariano, afirmando haver ‘visto coisas ruins demais como para que a carne não revolva o estômago’.
Possui perda parcial de audição esquerda induzida por ruído. Embora a constante exposição devido ao trabalho em campo, esta foi o resultado de um disparo efetuado em proximidade significativa de si.
Dificilmente vai a algum lugar sem ao menos uma câmera descartável, um pequeno bloco de notas e caneta, dados os hábitos adquiridos ao longo da carreira.
4 notes
·
View notes
Photo
Loving Vincent (2017) dir. Dorota Kobiela, Hugh Welchman
46K notes
·
View notes