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quindins
Quindins de iaiá p 133 1 libra de açúcar (500 gramas), 1 quarta de manteiga (120 gramas), 16 gemas (sendo 3 claras), 1 coco ralado, cravo, canela, água de flor de laranjeira. Bate-se tudo, bota-se meia libra de farinha de trigo, torna-se a bater. Depois de pronto, bota-se em forminhas untadas de manteiga e leva-se ao forno. O sol da tarde amolece os corações das iaiás da cidade, que molemente sentam-se comportadamente a beira dos janelões com seus bordados, buscando mostrar ao mundo seus dotes de linha e agulha enxovalhando a esperança de um casamento futuro, buscando com o canto dos olhos um pretendente a disposição de ser laçado para um nó. A fraqueza depois do almoço só permite o trabalho de agulha. O trabalho de agulha e a espera de um bom moço passante na rua. Um bom moço passante na rua e os quindins de Rita que chegam frescos para animar a indisposição da siesta. O ritual de Rita inicia-se antes mesmo de ter conseguido a compra de sua liberdade. Desde sempre metida na cozinha do engenho, descascando cocos, ralando mandioca e batendo ovos, colocando gemas douradas onde poderiam ser colocadas. Ovos férteis de felicidade que fecundados e batidos com açúcar, enchem os corações daquilo que não podemos impor do outro e é base para qualquer coisa boa de se comer: o amor. Ovos dourados e aquosos, repletos de fertilidade e sedução, ovos de Oxum, sua mãe das águas que lhe fez e lhe criou na fartura líquida do rio, seu único e verdadeiro leito. Filha de Oxum, filha de água, filha de ovo, Rita vai toda reluzente com suas contas no pescoço e pulseiras nos braços, tilintando a beleza da fartura de suas ancas e de seus seios, a firmeza de seus braços experientes no movimento frenético do vai e vem do ralar do coco, do bater dos ovos, segurando as bacias entre suas coxas duras de firmeza, hábeis em segurar, quase como braços. Na fluidez de sua voz, ela canta encantando o ponto de venda do tabuleiro da tarde, e as moças das agulhas são seduzidas pelo canto das águas da mãe e do amor e se debruçam nos janelões apertando seus decotes entre os batentes para escutar de onde vem Rita com a magia doce de seus quindins para as iaiás. Com o sorriso branco, Rita se firma em frente a escadaria de igreja, tirando de cima da cabeça o tabuleiro enfeitado de renda de papel de seda, repleto de quindins dourados. Apruma-o sobre um cavalente e o quadril farto sobre um banco. Como abelhas, juntam-se os moços ao seu redor, hipnotizados por sua doçura, desejando beijar suas flores que se sacodem para dar espaço para os meninos que se aproximam com os tostões das iaiás ansiosas, debruçadas nos janelões, desejantes, com a compra de um quindim de Rita, em adquirir um pouco de sua magia. Seu encanto seduz o ouro que vem de todos os lados: dos moços, dos moleques enviados pelas mocinhas casadoiras, de qualquer passante que se encontre desavisado e desprevenido, no entorpecer do calor da tarde. Troca-se ouro por ouro e, ao colocar na boca o doce de gemas, sente-se o coração bater no frenesi da batida dos ovos e o sangue voltar a esquentar nas veias como se todos acordassem dum torpor de sol e mergulhassem num torpor de amor. E se olham deslizantes enquanto molemente o doce escorrega para o interior do fundo da garganta e se encontram os olhares, as vezes primeiros, as vezes já acostumados de se encontrarem… e enquanto moços e moças se encontram, Rita se desencontra do encantamento. Desapercebida desmonta sua magia e volta rebolante para sua casa de único leito de rio, onde sua mãe Oxum lhe espera todas as tardes com o amor verdadeiro do que é cozinhar, do que é amar, do que é ser mulher. Autores : Relbert Ferreira e linguaeliteratura_ Acompanhe a nossa comunidade no Instagram : https://www.instagram.com/
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