Sou formada em Letras pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, sou técnica em Comunicação Visual pelo Senac Santo André. Aqui você encontrará textos sobre literatura, cinema, música e outros assuntos interessantes.
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As Crônicas de Nárnia são as crônicas de tudo!
Resenha escrita por Gabriela Ramalho
Comprei o volume único de As Crônicas de Nárnia porque estava em promoção, nunca nem tinha assistido os filmes, mas como sempre falavam que era bom e o exemplar estava por 15 reais, segui meu impulso consumista. O livro (ou os livros) ficou (ficaram) algum tempo na minha estante até eu descobrir que era uma obra de muitas referências cristãs, como me interesso pelo assunto, comecei a leitura.
O primeiro livro dentro do volume único, "O Sobrinho do Mago" (1955), não é de fato o primeiro, ele veio depois para explicar a origem da terra do guarda-roupa, da feiticeira e de todos os outros “mundos “ que Lewis criou dentro das Crônicas. A edição de volume único traz as histórias em ordem cronológica e não na ordem de publicação.
No livro conhecemos Digory e Polly, as primeiras pessoas desta Terra a pisarem em Nárnia. Eles chegam lá exatamente no dia de sua criação. Ali percebi as primeiras influências cristãs (inclusive na própria criação do mundo e na forma como os meninos são tratados – filho de Eva e filho de Adão), achei interessante e continuei a ler partindo então para o famoso "O Leão, a Feiticeira e o Guarda-roupa" (1950).
Nesse volume eu comecei a perceber que a obra vai além dessas referências, os livros tem influências de grandes nomes da literatura universal, desde mitos gregos e romanos até a Divina Comédia, de Dante. Li todos os outros livros: O Cavalo e o seu Menino (1954), O Príncipe Caspian (1951), A Viagem do Peregrino da Alvorada (1952), A Cadeira de Prata (1953) e A Última Batalha (1956). Não vou resumir um por um aqui porque o post vai ficar muito longo e por que tem filme de uma boa parte, é só assistir caso queiram.
Depois de completar a leitura de todas as histórias fiquei encantada e mexida, o tipo de sensação que leituras muito prazerosas causam. Tinha um preconceito enorme com literatura fantástica e infantil, mesmo tendo lido muitas coisas boas do subgênero na faculdade e gostando muito de Ficção Científica/Distopías, que de certa forma, são “primas” da fantasia, mas "As Crônicas de Nárnia" me fizeram engolir boa parte dele.
Os livros são muito bem escritos e as referências vão do primeiro ao último livro. Eu via coisas que eu tinha lido na Bíblia e na faculdade de Letras e isso me deixou maravilhada. O texto é bem fluido apesar da linguagem, por ser voltada para crianças, ser um pouco cansativa às vezes, principalmente em O Cavalo e seu Menino, que é bom, porém é meio que um spinn-off da história e te faz querer pular um trechos para voltar para as aventuras dos personagens principais (mas não deixa de ter suas referências).
Ler estes livros parecia uma dança de alguma das coisas que eu mais amo ler e é até engraçado em algumas partes como a Bíblia e literatura universal conseguiram, nesta obra, andar lado a lado. Um exemplo disso são as Musas e as Ninfas que aparecem na história logo depois de uma referência claramente bíblica e bonita, sem desrespeitar ou debochar de nada.
Resumindo: eu gostei muito da leitura, não é aquele livro cheio de críticas sociais, entretanto não deixa de ser bom e bem escrito, te faz pensar, viajar, procurar ler outros livros e acho uma pena ver as pessoas por ai desprezando as Crônicas. Vi pessoas falando mal por ter referências cristãs e vi gente falando mal por “não ser tão cristão assim”, todavia a literatura vai muito além disso e talvez a “crítica” de Lewis seja justamente esta: conhecimento não é uma arma contra a fé e fé não é coisa de gente ignorante, são as pessoas (adultos) que sempre estragam tudo.
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O Joio do trigo: A busca de uma leitura crítica da literatura infantil ideológica
O texto Ideologia e Livro Infantil de Ana Maria Machado, é um grande e bem argumentado apanhado de como se dá ideologia nos livros infantis. Em um tom um pouco mais informal, já que o texto é baseado em um encerramento de congresso sobre o assunto, a autora por meio de exemplificações ao longo de sua escrita (fala) mostra que toda obra artística infantil ou não tem uma em si impregnada a ideologia do autor e de seu contexto social e histórico.
Ana Maria Machado já inicia sua discussão dizendo que não se trata de um trabalho ortodoxo que geralmente se apresenta em congressos, mas uma conversa, “cheia de opiniões pessoais e ideias que não tem pretensão de se apresentar como verdade objetivas ou fatos inquestionáveis” e coloca sua produção realmente como uma reflexão sobre o assunto: a ideologia presente nos livros infantis e como contornar as ideologias não tão saudáveis para crianças leitoras.
A autora começa a partir de uma breve explanação de como construiu a sua resposta para a pergunta: toda obra é permeada por uma ideologia? Buscando através de seus estudos de literatura pós-guerra francesa, esta cita autores como Sartre, Camus e Malraux e questões que estes autores então discutiam, como qual seria o papel do escritor na sociedade, as funções da literatura e o espaço da ideologia na escrita.
Entre autores que acreditam na “arte engajada” e outros na “arte pela arte”, Ana Maria Machado cita um trecho de um texto de Albert Camus, citação indireta, que muito bem colocada, traduz toda a ideia central do texto de que um artista não deveria se preocupar com nada além da própria obra, entretanto nenhum ser humano é neutro e não tem direito de se omitir frente as questões sociais e políticas. Por conta disso suas opiniões e ideologias acabariam por se refletir em suas obras. Se nenhum autor é isento de ideologia e é influenciado pelas questões que permeiam seu tempo e seu grupo social, suas obras também não serão neutras.
Após este comentário, Ana Maria, vai atrelando seus argumentos a exemplos de livros infantis dando um breve contexto histórico da literatura infanto-juvenil, de modo que facilmente o leitor do texto se interessa e se convence de a ideologia sempre esteve presente nas obras literárias e ainda diz que , para o leitor, principalmente os que são crianças, é complicado notar a ideologia oculta nos livros; essa é uma colocação da autora que nos seria obvia, mas que provavelmente nunca notamos: se somos produto do que lemos, ouvimos, vemos, enfim, do que vivenciamos, essa construção não é algo que se dá depois de uma certa idade e sim desde que somos capazes de interpretar as informações que nos são dadas.
Machado ainda relembra que até um certo período da história da humanidade a infância não existia, as crianças eram como “miniaturas” dos adultos e eram tratadas como tal. Logo depois vieram os contos de fadas que tinham apenas uma finalidade moralizadora (educativa e também ideológica, no fim das contas).
Segundo Ana, a literatura infantil passa a existir como algo além de apenas uma história atrelada à uma finalidade educativa a partir do momento em que a afetividade começa a fazer parte das relações entre adultos e crianças. Isso se dá de tal forma que os adultos começam a compartilhar com suas crianças, a partir do final do século XVII e início do século XVIII, três livros que surgiram neste período: The Pilgrim’s Progress, de John Bunyan (1678), Robinson Crusoé, de Daniel Defoe (1719) e Gulliver’s Travels, de Jonathan Swift (1726), todos carregados da ideologia da época e de seus autores.
Para Ana Maria, a ideologia sempre esteve e está presente na literatura, e por vezes o autor não tem consciência de sua presença e o leitor mais desatento não a percebe, ainda diz que a ideologia presente nos livros também é, como já fora dito, a ideologia do meio político, social e histórico em que o autor vive. A autora também coloca que os livros infantis podem ser um veículo de mensagens ideológicas e essas obras, como apenas um veículo, são puramente produtos voltados para as massas e podem ser facilmente confundidos com a boa literatura.
Para evitar que as crianças acabem se deixando levar por ideologias não tão boas (se é que se podemos colocar desta maneira), em primeiro lugar, é preciso formar pequenos leitores críticos, que saibam ler as boas obras, mesmo aquelas que carreguem ideologias pouco positivas, de maneira que se absorva o que é bom nelas, sem que fiquem presas ao “politicamente correto”. Uma outra sugestão de Ana é que as opções de leitura das crianças sejam variadas de forma que estas desenvolvam um critério de qualidade ficando menos sujeitas as “prisões de mercado”.
Ana Maria Machado termina o texto de forma, leve, simples e brilhante reforçando que o livro é um objeto ideológico sim, entretanto a exposição de alguns males ideológicos não devem se sobrepor a própria literatura criando grupos que queiram calar uns aos outros quando descordam entre si, e acabam assassinando a arte literária e para exemplificar – artimanha que a autora usa durante todo o texto – ela encerra sua fala com o texto Era uma vez , de Margaret Atword, que de maneira geral conta uma história em que uma das personagens termina por proibir qualquer história ou frase e “decreta o fim da literatura, em nome da correção política” como a própria Ana Maria diz.
Machado mostra em seu texto como a ideologia está sempre presente, não só nas obras literárias, como também em toda a parte e em outros objetos de arte. Para as crianças e nós mesmos sabermos discernir o joio do trigo é preciso ter uma leitura crítica e consciente.
Referências bibliográficas:
MACHADO, Ana Maria. Ideologia e Livro Infantil. In___.Contracorrente: Conversas sobre Leitura e Política. São Paulo: Ática,1999.
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Análise da crônica publicada no jornal gazeta de notícias em 19 de maio de 1888, de Machado de Assis
Análise escrita por Gabriela Ramalho
A obra de Machado de Assis retrata a dualidade e contrastes da sociedade brasileira no século XIX, dualidade que permanece até os dias atuais. Na crônica publicada no jornal gazeta de notícias em 19 de maio de 1888 não é diferente, o texto é narrado pelo próprio protagonista que resolve abolir um escravo antes que a lei áurea fosse instaurada de fato e por esse motivo se acha a frente de seu tempo, entretanto percebe-se no narrador valores diferentes, ele dá a liberdade ao seu escravo, mas não o liberta de fato, pagando-lhe um pequeno ordenado, mas o tratando ainda como se fosse um objeto, algo de sua propriedade.
Ao longo da obra é possível perceber que a liberdade do escravo não é algo que tenha realmente valor para o narrador, ao liberta-lo, ele apenas busca um status, algo típico do século XIX. Roberto Schwarz em seu ensaio As Ideias Fora do Lugar, explica que a escravidão presente no país na época não condizia com os ideais liberalistas vindos da Europa, mas mesmo assim foram aderidos aqui de maneira inversa, apenas como um ornato, uma fachada frente a verdadeira realidade brasileira, isso é bem ilustrado no pensamento do narrador personagem no seguinte trecho: “O meu plano está feito; quero ser deputado, e, na circular que mandarei aos meus eleitores, direi que, antes, muito antes da abolição legal, já eu, em casa, na modéstia da família, libertava um escravo, ato que comoveu a toda a gente que dele teve notícia”.
Para aderir os ideais liberalistas aqui no Brasil, foi preciso criar uma maneira de Liberalismo e escravidão para que, mesmo sendo contrários, pudessem se estabelecer ao mesmo tempo, pois como já dito, esses eram apenas um enfeite para a verdadeira face brasileira. Então, ainda segundo Schwarz, acabou por se estabelecer um mecanismo de favor: uma relação de troca de favores e dependência entre o “homem livre” e o latifundiário, o que também vai contra todos os ideais liberalistas. Vemos esta relação também no texto de Machado, quando o narrador promete ao seu escravo, agora empregado, um ordenado para que ele fique e mesmo antes do protagonista terminar Pancrácio aceita as condições de seu agora patrão.
O texto demonstra também que aqui se gera uma dependência de Pancrácio, pois o narrador lhe deu a “liberdade”, lhe prestou um “favor”, enquanto o narrador precisa de um empregado, mas com mão de obra barata. Entretanto, para os valores do narrador, Pancrácio ainda é seu escravo ele o trata como tal: “Tudo compreendeu o meu bom Pancrácio; daí pra cá, tenho-lhe despedido alguns pontapés, um ou outro puxão de orelhas, e chamo-lhe besta quando lhe não chamo filho do diabo; cousas todas que ele recebe humildemente, e (Deus me perdoe!) creio que até alegre.”
Esse trecho é o retrato do Brasil e do mecanismo de favor no século XIX: Pancrácio aceita tudo, mesmo que levar um “peteleco” não seja algo que um homem livre deva aceitar. O narrador continua o tratando da mesma forma de antes justificando isso por conta de seu mau humor ou por efeitos de liberdade, mantendo sua fachada de homem moderno, como o Brasil e mantinha a escravidão e o mecanismo de favor com uma fachada idealista e liberalista.
Machado faz uma crítica a todo este sistema e a essa contradição retratada no texto através da ironia. Valentin Voloshinov em seu ensaio Palavra na Vida e a Palavra na Poesia. diz que a ironia é uma maneira de crítica, , a ironia está posta aqui no texto em um narrador-personagem que se diz abolicionista, um “homem bom” mas na verdade continua sendo o mesmo senhor de escravos que trata seu empregado como objeto.
Referências:
SCHWARZ, Roberto. A Poesia Envenenada de Dom Casmurro. In: _____. Duas meninas. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. p. 9-41.
VOLOSHINOV, Valentin Nikolaievich. A Palavra na Vida e a Palavra na Poesia: Introdução ao Problema da Poética Sociológica. In:_____. A Construção da Enunciação e Outros Ensaios. São Carlos: Pedro & João Editores, 2013.
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Os Melhores Contos Brasileiros de Ficção Científica são os melhores mesmo?
Resenha escrita por Gabriela Ramalho
Durante e depois que cursei Letras, por ter um contato maior com literatura e música brasileiras, eu entrei em uma onda nacionalista e comecei a buscar por produções nacionais ou pelo menos de língua portuguesa dentro das coisas que gosto. Uma delas é a literatura de ficção científica. A ideia surgiu quando precisei fazer um trabalho de tema livre e pensando no que eu iria pesquisar me dei conta que eu nunca tinha lido nenhuma distopia brasileira ou qualquer outro tipo de FC que fosse do Brasil, muito menos alguma pesquisa sobre o assunto.
Iniciei algumas pesquisas e encontrei trabalhos que citavam um pesquisador e escritor de ficção cientifica brasileira chamado Roberto de Sousa Causo. Entre textos, pesquisas e elogios achei uma coletânea organizada por ele chamada Os Melhores Contos Brasileiros de Ficção Científica, coloquei o livro na minha lista de desejos, mas esqueci a ideia de pesquisa porque tinha minha iniciação científica (também bem brasileira) para me dedicar.
Tempos depois, finalmente comprei o livro. Ao dar uma olhada na capa já me surpreendi ao ver o nome de Machado de Assis na lista – pasmem, Machado fez FC e ninguém contou para gente! - Li a introdução escrita pelo organizador que faz um apanhado geral da produção de textos de ficção científica no Brasil e ela é muito mais ativa do que a nós pensamos, tanto com grandes nomes da literatura como o já citado Machado de Assis que produziu algumas obras com o tema, quanto com autores que são mais, digamos, exclusivos da FC.
O autor faz todo esse resgaste citando obras e grandes marcos desta literatura como as publicações da Geração GRD (que leva este nome por ter livros publicados pela editora de Gumercindo Rocha Dorea) que também são chamados de “A primeira onda da FC Brasileira” e outra publicações e marcos importantes. Gostei muito da introdução por me interessar cientificamente pelo assunto e por descobrir mais sobre ele.
Mas indo finalmente ao “recheio do bolo”, o livro é composto de 11 contos com os mais variados temas dentro da Ficção científica, contato alienígena, pós apocalipse, objeto que permite ver o futuro, o duplo, imortalidade, viagens espaciais, etc. Cada conto tem uma introdução que contextualiza o texto e seu autor, não vou falar os nomes de todos os contos aqui para instigar a procura pelo livro e não pesquisar os contos individualmente. Só citarei os meus favoritos.
Eu, particularmente, gostei mais dos contos A Espingarda (1966), de André Carneiro, que tem um tom mais pós-apocalíptico e trata de um homem tentando sobreviver sozinho em meio as ruinas de uma cidade aparentemente tóxica; O Último Artilheiro (1965), de Levy Menezes que é ambientado em um cenário pós-guerra; A Mulher Mais Bela do Mundo (1997), de Roberto de Sousa Causo que fala da realidade terrestre/brasileira em confronto com a impressão que os governantes querem passar para visitantes extraterrestres e A Nuvem (1994), de Ricardo Teixeira que é um misto de contato extraterrestre com uma reprodução das etapas da evolução da vida na Terra em uma vila remota no interior (não, o conto do Machado não foi o meu favorito, desculpem-me).
Ler literatura de ficção científica brasileira foi diferente para mim, é bom, mas é algo com que não estamos acostumados. O que percebi em boa parte dos contos é exploração do tema guerra nuclear. Segundo o organizador, isso se dá por conta do próprio contexto histórico em que foram escritos. É bem nítido como as bombas nucleares e o temor à elas são alvo de preocupação de alguns autores abordados no livro.
Os autores nacionais se inspiram em autores internacionais consagrados, porém eu não percebi semelhanças exageradas, não em minha experiencia em leituras do gênero, pelo menos. Aliás achei os contos muito originais, é bom ver nossa terra representada em um “território” tão internacional da literatura. Enfim, eu recomendo a leitura e já comprei o volume seguinte para conhecer mais sobre o universo da ficção científica brasileira. Quando eu ler, posto outro textão aqui relatando a experiência de leitura. Até a próxima.
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Link que leva ao artigo Sofrimento Amoroso e Finitude do Amor na Canção Brasileira Contemporânea: Análise de Duas Canções escrito por mim, Gabriela Ramalho e meu professor orientador, que foi publicado em no e-book Letras, Linguística e Artes: Perspectivas Críticas e Teóricas 2.
Resumo:
A canção, enquanto expressão artística, possui especificidades estéticas e necessita de uma abordagem técnica específica que possa contemplá-las. Essa abordagem deve prestigiar o seu modo de integração entre melodia e letra e sua relação com a posição discursiva do enunciatário. Este artigo pretende estudar o sofrimento amoroso e a finitude do amor nas canções brasileiras passionais separando-as em duas subcategorias: canções passionais que enfatizam a perda e o sofrimento amoroso em si e canções que enfatizam a possibilidade de restauração dos vínculos rompidos. Analisamos as canções Quase um segundo, de Os Paralamas do Sucesso e De janeiro a janeiro, interpretada por Roberta Campos e Nando Reis. Para a análise, empregamos diagramas melódicos próprios da metodologia da semiótica da canção. Adotamos como base teórica as perspectivas de Diana Luz Pessoa de Barros (2005; 2011) no que diz respeito a definição de texto sincrético, e de Luiz Tatit (2007; 2012; 2016) e Luiz Tatit & Ivã Carlos Lopes (2008) no que diz respeito ao método de análise e proposição da tricotomia passional. Também utilizamos alguns pressupostos teóricos de Peter Dietrich (2008) no que diz respeito à mesma teoria. Como resultado e conclusão vimos que os sofrimento amoroso produz sentido, nas canções analisadas, de duas maneiras, remetendo a dois tipos de passionalização, com Quase um segundo, exemplificando características da primeira categoria e De janeiro a janeiro associada à segunda.
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Análise do conto “Os Objetos” de Lygia Fagundes Telles
Análise escrita por Gabriela Ramalho
O conto é um gênero textual que quase sempre nos prende até o final por conter uma “tensão” ao longo da história. No conto “Os Objetos” da autora Lygia Fagundes Telles não é diferente, o texto desde o inicio tem um desenrolar de casualidades que nos faz querer chegar ao fim.
Ele é narrado em 3ª pessoa, narrador onisciente e que não faz parte da história, o ambiente é uma casa comum, mas que também não é muito descrito. São duas personagens Miguel (O marido) e Lorena (a esposa), a autora não foca muito nas descrições físicas das personagens, a sua descrição parece estar mais focada realmente nos objetos e nas ações e diálogos dos personagens, como nesse trecho:
“Ela esticou entre os dedos um longo fio de linha vermelha preso à agulha. Deu um nó na extremidade da linha e, com a ponta da agulha, espetou uma conta da caixinha aninhada no regaço, enfia um colar.”
Sua descrição está focada também em um perfil psicológico das personagens, não há uma só descrição física, mas há varias descrições psicológicas e comportamentais. O conto é condensado e direto. Apesar das descrições das ações não há nenhuma descrição longa, por exemplo.
Segundo Piglia, o conto sempre apresenta duas histórias: uma aparente e uma oculta, neste conto, a história contada em primeiro plano é a de uma conversa entre o casal Lorena e Miguel sobre objetos:
“Finalmente pousou o olhar no globo de vidro e estendeu a mão.
- Tão transparente. Parece uma bolha de sabão, mas sem aquele colorido de bolha refletindo a janela, tinha sempre uma janela nas bolhas que eu soprava. O melhor canudo era o de mamoeiro. Você também não brincava com bolhas? Hein, Lorena?”
Nesse trecho, a personagem já começa falando sobre um objeto e comparando-o a uma bolha de sabão. A segunda história contada é a de que Miguel, aparentemente, sofre de um desequilíbrio mental e por esse motivo acha que a esposa não o ama mais e de se tornou um incômodo para ela, dando indícios de irá se suicidar, ainda antes da segunda história vir claramente �� tona, a personagem dá “pistas”:
“[...] Os objetos só tem sentido quando têm sentido, fora disso... Eles precisam ser olhados, manuseados. Como nós. Se ninguém me ama, viro uma coisa ainda mais triste do que essas, porque ando, falo, indo e vindo como uma sombra, vazio, vazio. É o peso de papel sem papel, o cinzeiro sem cinza, o anjo sem anjo, fico aquela adaga ali fora do peito. Para que serve uma adaga fora do peito?”
Ainda neste fragmento, a personagem Miguel faz uma comparação dos objetos com as pessoas, partindo do individual, do objeto em si e suas funções, dizendo que eles só ganham função quando lhe damos uma função, para uma reflexão mais ampla da existência humana, só somos algo quando somos amados. Segundo Cortázar, o conto tem esse aspecto da abertura do individual (pequeno) para a essência humana (amplo).
A segunda história de fato começa a vir à tona no seguinte trecho:
“[...] _ Porque ele quer que você me interne e você está resistindo, mas tão sem convicção. Você está cansada, Lorena querida, você está quase chorando e diz que estou melhor, que estou melhor...
Ela endureceu a fisionomia. Limpou a unha com a ponta da agulha.”
Até essa parte do conto, não havia certeza de que Miguel sofria de alguma transtorno mental e de como ele se sentia com relação a isso e agora já temos, porém ainda não há como saber como será o desfecho da história, é um dos momentos de intersecção das duas histórias, é também um momento intenso, quando ele conta o que vê dentro do globo de vidro cria essa atmosfera. Lorena, a esposa, é claramente afetada pelo que Miguel diz “Ela endureceu a fisionomia”, talvez porque seja o que realmente pode acontecer dentro do contexto da história, Miguel talvez tivesse que ser internado, mas não fica claro, apenas suposto.
A segunda história realmente é descoberta no final, quando Miguel sai com a adaga e a sua esposa o grita perguntando onde esta a adaga, não é deixado claro se Miguel realmente pretendia se matar, mas pelos fatos relatados é possível se pressupor.
“[...] Quando ela gritou, só seus olhos se desviaram na direção da voz vindo lá de cima e tombando já meio apagada no poço.
- Miguel, onde está a adaga?! Está me ouvindo, Miguel? A adaga!
Ele abriu a porta do elevador.
- Está comigo.
O porteiro ouviu e foi-se afastando de costas. Teve um gesto de exagerada cordialidade.
- Uma bela noite! Vai passear um pouco?
Ele parou, olhou o homem. Apresou o passo na direção da rua.”
Um dos objetos foi essencial para o desfecho do conto: a adaga, que parece sem importância em uma história, é algo importante em outra. Ela é a chave para se pressupor o que Miguel provavelmente pretendia fazer: cometer suicídio. É a história construída pelo não-dito.
O conto só é encerrado quando as duas histórias se unem. Quando a segunda vem à tona e se desfecha, a primeira automaticamente também tem um desfecho, se tornando uma só, o que se encaixa na teoria de Poe: “a história secreta é a chave da forma do conto e de suas variantes.” E “o conto moderno conta duas histórias como se fossem uma só”. O conto é um instante capturado pelo autor.
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A Invenção de Morel: entre real e o virtual
Resenha escrita por Gabriela Ramalho
Na última bienal do livro que fui, achei uma promoção maravilhosa de livros da coleção Grandes nomes da literatura da Folha por 5 reais cada exemplar. Até aquele dia, mesmo estudando literatura, nunca tinha ouvido falar de Adolfo Bioy Casares. Na pilha de livros vi A Invenção de Morel e li a sinopse com a frase “é um clássico da ficção científica latino-americana”, essa frase me bastou para deixar um outro autor famoso e leva-lo no lugar simplesmente por amar ficção científica.
Há algumas semanas embarquei nessa leitura. Fazia alguns meses que não conseguia terminar algum livro e tentei retomar meu hábito literário com Casares, já que a obra em questão pertence a um dos meu gêneros favoritos, já supracitados, e consegui. O livro me prendeu e me fez escrever este texto. Segue a sua sinopse:
Um homem se isola em uma ilha deserta com a intenção fugir de uma condenação injusta a prisão perpetua, entretanto essa ilha possui construções estranhas e que aparentemente estão abandonadas. Um certo dia, desconhecidos aparecem na ilha. Aos poucos, o refugiado se aproxima do grupo e se apaixona por uma mulher, porém uma coisa acontece ali que ele não entende: aparentemente os estranhos não o veem e nem o ouvem e isso parece estar relacionado a um sujeito chamado Morel e a sua máquina que pode ter criado uma espécie de imortalidade, mas por meio de imagens.
De início, o texto parecia só mais um daqueles romances de viagem, o moço começa a narrar seu dia a dia ali na ilha e nos conta como foi parar naquele local, mas mesmo assim a história me cativou. Apesar de uma linguagem um pouco rebuscada, Casares sabe bem prender o leitor, não é à toa que Borges, outro autor importantíssimo e genial, cita Casares como um grande escritor.
O Refugiado tenta se aproximar do grupo e até parece a gente quando não se toca que não é bem vindo em um local. Ele tenta vários contatos com Faustine, a moça por quem se apaixona, e, apesar disso, ela nunca o responde, até que ele começa a desconfiar que não é só uma evitação comum e que ela realmente não o vê. Toda esta tentativa frustrada de conquista é , de certa forma, interessante, engraçada e bem triste ao mesmo tempo.
Todavia o mais legal do livro é quando o mistério da máquina é revelado e ele finalmente descobre todos os porquês e um detalhe sóbrio da máquina de Morel. É essa revelação e o que se segue depois os pontos altos do livro. Sei que isso parece meio óbvio, entretanto não é o ponto alto como clímax em si, mas sim a reflexão que nos traz e até a reflexão do próprio ilhéu sobre a máquina e suas consequências.
Não posso detalhar muito do que se trata a famigerada invenção de Morel, contudo o que posso dizer é que concordo plenamente com que Sylvia Colombo fala na sinopse, que a obra lança “um questionamento sobre os limites entre o real e o virtual, extremamente válido ainda hoje”. E digo mais, nos leva também a um questionamento sobre o amor em tempos virtuais.
Qual é o limiar do saudável na vida virtual? Será que ainda sabemos diferenciar o real do virtual? Até onde vai o contato nos tempo atuais? Até que ponto nós somos aquilo que postamos?
Para terminar: Super indico a leitura, o livro foi lançado em 1940, porém consegue ser muitíssimo atual e maravilhoso. Não espere um livro de ficção científica clichê ou extremamente sobrenatural; a narração é tão natural e as reflexões tão nossas que o enredo, de certo modo, parece aquela noticia que vemos no jornal que nos surpreende, mas que ao mesmo tempo a gente já sabia que podia acontecer a qualquer momento. Não acho que minhas palavras fez jus a obra, mas espero que faça as pessoas encontrarem esse livro e se encontrarem nele.
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