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A docilidade da vida deve estar em algum lugar. Somos tão responsáveis pelo que fazemos… Somos tão responsáveis e não-facultativamente comprometidos com o que somos…
Deriva dessa responsabilidade, a angústia. Os suspiros nos foram concedidos sem que pedíssemos. Fomos lançados a própria sorte no mundo.
Mundo louco, mundo plural. De que vale a nossa angústia se o que exigem de nós é ânsia?
Ânsia e vontade de vida.
Ah, como ansiar a vida bruta?
Acolher a própria humanidade que em nós é particularmente incutida, é trabalho, trabalho na sua acepção mais primitiva. É ‘tripalium’, tortura.
É penoso admitir paixões, é nauseante aceitar os afetos que borbulham a alma. Arrepiam a espinha as quedas súbitas da roda da fortuna.
A angústia acende chamas. Chamas que iluminam o banal. Que mecanismo, Universo! Desbanalizar o banal e notar detalhes cativam o anseio pela vida.
Belíssima fórmula.
É o que me cabe. Observar ativamente. Participar lenta em decorrência do peso da responsabilidade de me ser, mas ainda assim, participar.
arq. 1
01/09/24
cobs
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HEMEROTECA
esses dias estive em uma hemeroteca. confesso que não fui a biblioteca com o propósito de encontrar uma coleção periódica de notícias e conteúdo atemporal e específico demais, velho demais e intocável demais, afinal, antes de entrar em uma hemeroteca eu não sabia o que era uma hemeroteca. bom, é uma coleção periódica de textos jornalísticos e fontes bibliográficas em potencial para o estudo da história e de outras ciências.
os velhos livros exigem um manuseio delicado ou uma sorte grande o bastante para que o diário oficial do segundo semestre de 1901 tenha sido digitalizado pelo Estado, que, para ser sincera, me parece não querer veicular tais fontes ao público geral.
com que propósito você precisaria acessar algo tão específico? você provavelmente se perguntou.
conhecer, talvez. entender um contexto. provar dos desastres decorrentes de um determinado acontecimento, viver a história e recontá-la tão somente através de uma leitura despretensiosa.
o interesse por essas referências parece restrito aos estudiosos, mas posso lhe assegurar que o conteúdo vai de A a Z e alcança tudo aquilo que é biótico.
os livros eram enormes e alguns caiam aos pedaços. o cheiro de uma hemeroteca é único. tem cheiro de gaveta. de roupa guardada. guarda o cheiro de duas guerras e de suas reverberações. uma hemeroteca cheira a tudo e a nada concomitantemente.
estar lá junto a todos aqueles catálogos organizados em ordem cronológica me fez querer não ser esquecida. me fez querer ser catalogada. me fez querer uma gaveta. pode ser só o cantinho da gaveta, já está de bom tamanho. posso ser uma pequena partícula de poeira no fundo do fundo da gaveta. me basta.
o acaso me convidou a um despertar perplexo diante de um montão de papel velho. eu aceito o convite, acaso.
compartilho, a partir de agora, tudo o que há na minha poeirinha, no fundo do fundo da gaveta. o que sou e o que hei de ser; as consequências do existir; arrisco dizer que as experiências da minha consciência e inconsciência.
arq.1
28/02/24 (02/28/24)
cobs
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