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bananascrait-blog · 8 years ago
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São Paulo em palavras
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bananascrait-blog · 8 years ago
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Desatino
Primeiro ato
{Cenário: uma grande pedra}
{Luz sobe lentamente revelando o rosto da atriz que dorme
numa pedra. Desperta lentamente}
{fala sentada}
Quando toco em uma pedra sinto como se o universo
me acariciasse silenciosamente.
Me sinto forte e renovada.
É apaixonante o silêncio das pedras.
Um reverente silêncio de mais de quatro bilhões de anos.
A nobreza está nos minerais.
 {começa a se deitar}
Sempre que eu posso, durmo com a cabeça encostada numa pedra.
Tenho meus melhores sonhos.
 {Fala com a cabeça encostada na pedra}
Quando eu era criança me divertia com as pedras,
agora eu comungo com elas.
Amanhã serei inteiramente pedra.
 {sentada}
Só quem conhece as pedras pode entender o tempo.
{levanta-se}
Eu digo por que eu sei das pedras.
{começa a andar em cima da pedra}
Eu sei andar em pedras.
Nasci com esse dom.
Todo o nosso planeta é uma grande pedra.
A civilização é o lodo que faz escorregar
quem não tem atenção
ao andar em cima de pedras.
O limo é o homem.
 {em cima da grande pedra}
No meio da pedra tinha um caminho.
Os homens, pra seguir mais rápido, começaram a cortar caminho.
Escravizaram, aprisionaram, explodiram, deformaram as pedras.
Desde a construção das tumbas em forma de pirâmides,
até as suntuosas catedrais, erguidas em nome da fé,
o homem aprisiona as pedras.
Os fortes militares, e os castelos medievais,
só foram construídos graças à fortaleza e obediência das pedras.
Nas esculturas, a pedra, moldada pelo homem, deforma a obra da natureza.
Não gosto de homens escultores.
A liberdade é uma pedra bruta.
Não é pedra mexida, moldada, carregada, deslocada, empilhada, lapidada.
 {grita}
Sísifo.
 {Luz começa a cair}
{deita, com o rosto encostado na pedra}
A morte é a vingança da pedra na lápide esculpida.
 {escuro}
    Segundo ato
{Cenário: um spot de luz, com tripé, voltado para o rosto da atriz 
e outro spot idêntico, voltado para a platéia}
{escuro}
  Quem de nós será absolvido depois da morte?
 {Ascende o spot no rosto da atriz}
Eu já roubei.
 {cara de desdém, minimizando o fato}
Eu roubei chocolate das lojas americanas.
Bom, mas os americanos são os americanos…
E foi o Álvaro, um português, quem me instigou.
Eu ficava andando louca atrás de sonho de valsa
pelas prateleiras das lojas americanas.
Ele cochichava baixinho no meu ouvido:
Come chocolate, pequena;
Come chocolate!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
 {gritando}
Come, pequena, come!
Há, há, há, ninguém nunca me pegou.
Americanos são muito americanos.
 {Spot apaga e ascende novamente}
Eu já avancei sinal de trânsito.
Quem é que pode ficar parado na esquina e ser um
alvo fácil dos brasileiros?
Brasileiros são muito brasileiros.
 {Spot apaga e ascende novamente}
Eu já colei na escola.
Era prova de química.
Pra que ensinar química na escola?
Deviam ensinar coisas práticas:
Amamentação.
Seria muito mais útil ter aulas de amamentação em vez de
decorar a tabela periódica…
Li na Kapa da Rebista coisas Francesas…
Quem aprendeu o que era colostro na escola?
Quando meu filho nasceu, teve uma ignorante que me disse
que meu leite não prestava.
E eu acreditei.
Eu não tinha aprendido o que era colostro.
 {Spot apaga e ascende novamente}
Eu já cheirei cola no banheiro da escola.
Isso foi influência dos amigos.
Uma mãe, se for zelosa, devia ensinar o filho em casa.
Depois ele ia direto trabalhar.
O meu filho agora está fora da escola.
Ele não vai aprender coisa errada na escola.
A escola é ruim.
Lá ou se aprende coisa inútil ou coisa errada.
 {spot apaga e ao ascender revela atriz com as mãos na cabeça}
Tanto tempo que eu não vejo meu filho…
 {continua intranqüila}
No tempo em que eu dormia, eu sonhava com ele.
Quando eu queria estar com ele, eu dormia.
Pra mim, o sono era meu suborno.
 {O segundo spot ascende para iluminar a platéia}
E vocês? aceitam suborno?
 {blackout}
{desolada}
O sono de vocês me angustia.
   Terceiro ato
{Cenário: quatro manequins}
{Atriz parada no centro do palco}
 Uma indagação, viciado eleitor:
Você confia mais no seu traficante ou no seu senador?
 {Atriz correndo pelo palco, passeia por entre os modelos}
Atenção traficantes:
O cerco vai se fechar.
 {Para}
Atenção congressistas!
O circo vai começar.
 {começa a andar}
Já chega de palhaçada.
 {parada}
Fechem o congresso!
Não é ordem,
É pedido de progresso.
 {olhando pros modelos}
E pro povo feliz?
Castigo duro:
Governar o próprio nariz!
O povo decidindo seu próprio destino?
 {risos sarcásticos. Fala enquanto rodeia os modelos, examinando-os}
Esse aqui não sabe ler.
Esse aqui não tem educação.
Esse outro não é capaz de ganhar dinheiro pra manter a própria família.
Esse não sabe o que é planejamento familiar.
Esse só sabe planejar a cachaça do sábado.
Nem a de domingo ele planeja.
Isso vai depender da surra que ele der ou levar da própria mulher.
Ah, isso todos eles têm muito. Mulher e amante. E filho. Muitos filhos.
Esse não sabe votar.
Esse não sabe o que está acontecendo.
Esse é massa de manobra.
Esse é voto de cabresto.
Esse não saberia votar em si mesmo.
Anularia seu próprio voto. Ignorante que é.
 {olhando com desdém para os modelos}
O povo desgovernaria o próprio nariz…
 {vai à platéia}
Qual a sua ideologia?
Socialismo?
Capitalismo?
Cristianismo?
Alcoolismo?
Islamismo?
Liberalismo?
Populismo?
Budismo?
Ateísmo?
Romantismo?
Reumatismo?
Daltonismo?
Ceticismo?
Comunismo?
Catolicismo?
 {gritando}
No fim é tudo igual.
 {insegura}
Meu professor de filosofia me disse que Aristóteles, o antigo filósofo grego,
profetizou que eu nasceria um animal político.
 {fala com voz de homem e imita um diálogo}
Essa nobre Comissão Parlamentar de Inquérito, está vigilante e atua 
visando o bem maior da nossa valorosa coletividade.
 {tentando interromper a si mesmo}
Vossa excelência me concede um aparte?
 {volta}
É nosso dever fiscalizar com retidão impoluta e inexpugnável coragem
as ações vis praticadas por uma minoria opulenta,
que vela seus interesses próprios e, mais importante, escusados de ética;
e, agindo assim, transformou nossa nobilíssima Comissão Mista de Orçamento
num misto de furna e cofre.
 {tentando interromper a si mesmo}
Questão de ordem vossa Excelência…
 {volta}
Outro caso sobre o qual não poderemos calar é o recentemente ocorrido
na Comissão de Constituição e Justiça, onde, aliás, só há justiça nas redondezas
dos interesses das grandes corporações aquinhoadas com o vasto capital mundial,
e que tentam, em vão, subjugar uma minoria proba, na qual este relator que vos fala
humildemente se inclui estacionário ad infinitum, sob os olhares vigilantes de Marco Aurélio,
o Imperador, de quem aprendi que erra não apenas quem faz, mas também quem deixa
de fazer alguma coisa.
 {tentando interromper a si mesmo}
Questão de ordem vossa Excelência…
 {volta}
Podemos acusar, sem  medo de serem falsas as ilações, que, esses detentores do ouro,
só garantem sua vitória folgada nesta casa, mediante o interesse com frescor quase juvenil que os venais nutrem pelo fausto dourado e a eterna  sofreguidão que sentem por tudo que seja relativo ao universo pecuniário.
 {tentando interromper a si mesmo}
Um aparte, por obséquio, vossa excelência:
 {volta}
Aparte concedido a vossa excelência.
 {andando encara a platéia}
No Conselho de Ética,
Quem ganha mais?
 {anda até a boca de cena e fala baixinho apontando para os modelos}
O relator ou os que ficam calados?
 {histérica, grita e aponta para os modelos}
O relator, ou os que ficam caladinhos?
 {volta a falar olhando para a platéia}
Aqui fora, quem sofre mais?
Os que botam a boca no trombone ou os que ficam vendo a banda passar?
Os ignorantes ou os que só ficam lendo e estudando?
O mundo deve muito mais a um dia de trabalho de um motorista de
ônibus do que a produção completa de todos os filósofos gregos.
Eu acho. Só não tive coragem de dizer pro meu analista.
 {com os olhos de doida}
Fiquei com medo que ele me convidasse pra frequentar a sua turma
de estudos sobre Heidegger.
 {anda impaciente pelo palco, de repente estaca}
Qual será a melhor ética?
 {passeia graciosamente, como se fosse uma menina feliz}
Certamente é a poética!
Alexandrina, concreta, lírica, romântica, épica, metafísica.
Eu quero ser poeta.
 {olha com alegria e cochicha}
Pra sonhar mais que poeta, só dormindo a eternidade.
 {para de repente e grita}
Eu não sou doida.
Eu quero ser poeta.
 {tentando ficar tranquila, explica:}
Os loucos subvertem a lógica.
Os poetas vertem a ilógica.
Os loucos ficam surdos, de tanto gritar pra fora.
Os poetas, ficam mudos, de tanto escutar pra dentro.
 {anda pelo palco a pensar. Fala angustiada }
Eu não quero ser poeta.
Os poetas morrem cedo.
Eu quero viver. Eu não quero morrer.
Eu sou louca, não sou poeta. Eu sou louca.
 {olha pra cima e pergunta suplicando}
Eu sou lúcida? Álvaro, responda, eu sou lúcida?
 {chegando muito perto da platéia com olhos de doida}
Meu pensamento é ao contrário:
Quando eu escuto com o nariz, cuidado!
Não cochiche enquanto eu espirrar.
Quando eu olho com o pé,
Minha visão alcança mais, muito mais.
Quando eu falo de ouvido,
Cada palavra sai de uma orelha diferente.
A boca grita eternamente assim:
A morte é o fim!
{blackout}
  Quarto ato
{Cenário: Divã. projeção de uma ultra-sonografia}
{fala empolgada andando e gesticulando}
 Eu vi o começo de tudo.
A gente nasce coração.
Só um coração batendo cento e setenta vezes por minuto.
Tutututututututututututu.
Tudo é uma questão de ritmo.
Tutututututututututututu.
Nada mais interessa.
Tutututututututututututu.
E esse ritmo do coração que bate a cento e
setenta por minuto é que faz a gente desenvolver coragem
pra enfrentar a saída da primeira caverna: o útero.
Eu não me lembro do dia em que eu saí de dentro do útero.
Mas eu me lembro do dia em que eu descobri que estava dentro
de uma outra caverna: o universo.
E com o passar do tempo eu entendi a abissal diferença entre
os seres humanos: os poucos, que mesmo percebendo
a imensidão da segunda caverna se sentem enclausurados,
e os muitos, que não percebem nada e se sentem livres.
 {começa a dançar}
Os que se sentem livres nem suspeitam que moram numa caverna.
O homem nunca saiu da caverna.
Não existe nave espacial capaz de tirar ninguém da caverna.
 {sarcástica}
Nem os americanos, que são os americanos, e que dizem até que já foram pra lua, conseguem sair da caverna.
 {para, enfática}
O homem está preso.
Pode chorar.
Pode rezar.
Pode gritar.
Pode inventar.
O homem não para de inventar coisas pra ajudar a vencer
o desconforto do porvir.
Nem assim ele mudará o destino de ser homem das cavernas.
O homem ainda é o homem das cavernas.
 {Fala rodeando o divã}
Esse é o seu destino.
 {senta no divã}
O meu destino é o meu desatino…
 {levantando-se}
Questão metafísica relevante: livre-arbítrio.
Se a gente puder escolher, não existe problema.
Mas se não há opção, existirá outra solução?
 {quase cochichando para a platéia}
Dizem que um dos sintomas da loucura é a dificuldade de escolher.
 {gritando}
Para!
Eu não quero mais.
Eu não agüento ter que pensar.
Ter que discernir entre o certo e o errado.
Eu não quero escolher mais nada.
Escolher é um problema pra mim, sim.
 {volta a falar num tom eufórico}
Ser ou não ser?
Ter ou não ter?
Ser o filho ou ter um filho?
Se tiver, é melhor:
Um ou dois?
Três ou quatro?
Homem ou Mulher?
biológico ou adotivo?
Matar os pais?
Ou adotá-los para sempre?
Cedo ou Tarde?
Perto ou longe?
Grande ou pequeno?
Levantar pra viver a vida?
 {deita no divã}
Ou ver a vida passar deitada em um divã?
 {resignada, senta no divã}
Desistir, ou desistir de desistir?
Eu só queria uma pausa. Uma pausa na vida.
 {blackout}
{aparece em pé, ao lado do divã}
Quando eu disse pro Álvaro que queria dar um tempo ele
me olhou com  desprezo…
 {vai andando até a platéia}
… Como se eu fosse uma vaca louca, e me disse com aquele
ar sereno dos que se dizem normais:
 {imita voz de velho}
Um mergulho mais profundo na alma não tem volta.
Na dúvida, permaneça feliz.
Boiando na superfície.
 {música: Uma valsinha}
{Luz vermelha ilumina todo o palco. Começa a dançar girando pelo palco}
É isso.
Eu quero ser feliz sim.
Feliz, feliz, boiando na superfície.
Um tempo.
O meu próprio tempo.
Feliz, boiando na superfície.
 {encarando o teto}
Algum problema?
 {sarcástica}
Algum problema ai, Doutor Álvaro?
 {volta a olhar a platéia}
Eu quero ser feliz.
Eu não vou mais mergulhar.
Eu  vou ficar só boiando.
Na superfície.
 {olha para o teto de novo e fala enfática}
Vou ser feliz.
 {volta a andar em direção ao divã. Grita, deitada no divã}
Eu vou sentir saudades do divã.
Mas, doutor… agora,  eu quero temperar a vida.
 {blakout}
{Grita no escuro, e depois dá uma gargalhada}
Eu quero temperar a vida. E viver destemperadamente.
 {música agitada e paranóica}
Eu fui feliz.
Boiar era muito bom.
Eu ficava só na superfície. Boiando.
 {para em frente ao divã}
Não havia preocupação.
 {irônica, olhando para o alto}
Não havia como se afogar, eu não ia mais pro fundo. E eu sabia boiar.
 {corre em volta do divã. Pára e se ajoelha}
Boiar era mais fácil do que se deitar num divã.
 {Inicia uma melodia triste e repetitiva, com poucas variações de notas}
{luz torna-se azul em fade in}
{atriz fala deitada no divã}
Eu to me afogando.
Alguém me ajuda.
Eu não quero morrer agora.
 {anda pelo palco, angustiada}
Eu não sei boiar assim tão bem.
Alguém me ajuda, por favor.
Eu não quero morrer tão nova.
 {Deita no divã e olha desesperada para cima, voz angustiada}
Doutor me ajuda hem?
Diazepan, dormonid ou lexotan?
Me ajuda doutor.
Uma receita azul, por favor.
Resolve o meu problema, doutor.
 {levanta do divã, olhando para todos os lados}
Alguém me ajude, por favor.
Alguém tem receita azul?
valium, rivotril, ou diempax, doutor?
 {grita}
Alguém, por favor, me ajuda.
Aquele papel azul.
prozac, ocadil ou lorax?
 {Para e fala resiliente}
Eu me sinto melhor!
 {anda ao encontro da platéia}
Pergunta aos depressivos:
Deixar a vida ainda
Mal passada
Ou viver até passar do ponto?
 {blackout}
{Luz volta branca}
{Gritando}
Eu quero fugir.
 {sussurrando}
Fugir pra qualquer lugar.
De qualquer um, inclusive, de mim.
 {deitada no divã, olhando pra cima}
Que paralisia.
Não consigo fugir nem de mim mesmo.
O verdadeiro covarde é o que fica:
Falta-lhe coragem até para fugir!
 {levanta e vai em direção à platéia, olha para cima depois para 
a platéia e depois para cima novamente}
As únicas exceções, são as relativas aos casos de Sócrates, o filósofo, e Jesus, o mestre, e mais ninguém, ouviram?
 {Gritando}:
ninguém!
 {indignada}:
Eu não quero ser covarde.
Eu quero ser sábia.
O que eu faço pra ser sábia, doutor Álvaro?
 {sorrindo com ar de superioridade, imita voz de homem}
Para isso bastaria que a ação se efetuasse depois da precipitação
tola e antes da hesitação covarde.
 {deitada no divã}
Eu só consigo ficar parada.
Eu não consigo agir.
Eu só consigo pensar.
 {levanta séria}
Outro dia eu tava pensando:
Eu acredito num mundo melhor.
 {depois de uma pausa, gargalha cínica e debochadamente}
Pra imaginar mais que uma criança, só mentindo.
Eu minto.
O homem inventou o conhecimento, a metafísica e a moral.
É tudo mentira.
Toda invenção humana não passa de uma grande mentira universal.
Só os homens acreditam nela.
Os animais ignoram.
Os vegetais ignoram.
Os minerais ignoram.
No fundo somos ignorantes ignorados por tudo à nossa volta.
 {black out}
Quanto mais apegado ao conhecimento, mais ignorante é o homem.
  {atriz rasga a roupa}
{luz volta branca muito tênue, um sopro.}
Ninguém vestido pode ser verdadeiro:
Desde que o homem se cobriu esconde algo na alma.
  {descrente}
Mas eu não tenho alma.
Eu não acredito em alma.
Meu pai me dizia pra eu não acreditar em alma.
Minha mãe dizia pra eu não acreditar em homem.
Eu não acredito em nada.
 {aparentemente tranqüila, mas lamentando}
Eu só queria acreditar que quando a gente dorme
o sono dos justos, sonha.
 {caminha em direção ao divã e deita. Fala com voz suave}
Eu tô cansada… mas eu não quero dormir agora.
 {fade out de luz}.
{grito de desespero}
Eu tenho medo do escuro por trás das minhas pálpebras.
 {Fade in de luz branca}
{levantando num ímpeto}
Se o corpo cansa
O espírito
Desprende e avança…
Eu não acredito em nada.
Espírito é alma.
Eu não acredito em alma.
Eu não acredito em mim.
Eu quero nascer de novo.
Gado.
Com pasto verde e água fresca.
Se for pra passar fome, aí mesmo é que eu quero ser gado.
Com capim seco e pouca água.
Eu prefiro a vida de gado.
Eu não quero ser gente.
Eu odeio gente.
Mesmo a gente sagrada eu odeio.
Se tiver um duelo final no mundo, será o da marcada gente
contra o feliz gado.
E eu quero estar do lado da felicidade.
Chega de gente.
gente vermelha,
Gente preta,
Gente amarela,
Gente branca.
Tem tanta gente pra comer
que se fosse matar a fome de todo mundo
ia  faltar gado pra morrer.
Mas como tem muita gente que pasta na vida,
ainda tem muito gado que vive feliz.
 {blackout. Luz ressurge lentamente. Atriz olha para a platéia e fala}
 É ou não é triste saber que já fomos felizes?
   Quinto ato
{Cenário: uma grande pedra e um cartaz que se utiliza para praticar tiro}
{luz sobe dramática}
{como se retornasse de um sonho}
 Meu caminho era de pedra…
Isso eu me lembro.
Eu andava em pedras. Era muito boa nisso.
Agora já não posso mais.
Eu não me lembro bem por quê.
Se eu acordar no meio do sonho posso até me lembrar.
Mas esquecer é tão confortável.
É bem quentinho o nosso pensamento esquecido.
O frio é a lembrança.
Eu quero sonhar, não quero acordar.
Eu posso voar sentada, sem sair do lugar.
As pedras eram a minha companhia.
Eu andava sobre elas.
Isso foi antes de eu aprender a sonhar.
Agora eu vivo sentada nas nuvens.
E me esquento com o meu esquecimento.
As pedras eram a minha companhia.
 {luz desce até o escuro. Volta suave: Penumbra}
Mas que caminho é tão doce assim que só tem pedras?
A vida não é feita só de pedras, infelizmente o homem não vive só com as pedras.
Balas desocupadas voam livremente por aí.
 {falando alto, vai aumentando o tom de revolta}
Balas sem ocupação passeiam pelas ruas das cidades.
Balas solitárias estão por ai, carentes, à nossa procura.
Balas desocupadas estão ai, pra arranjar ocupação.
 {luz cai novamente. Escuro}
No meio do caminho tinha uma bala.
 {grita}
Eu não quero ouvir mais essa voz…
 {fala com desespero, olha pra cima}
Eu não aguento mais essa voz imunda, inundando meus ouvidos
todos os dias. Eu prefiro o barulho dos tiros.
 {blackut: forte barulho de seis tiros}
{luz sobe dramática revelando atriz numa cadeira de rodas. Ela roda até o cartaz de tiro}
O estampido parece que foi agora a pouco.
O gemido, eu ainda consigo ouvir.
No meio da bala tinha um caminho.
 {atriz começa a rodar pelo palco na cadeira de rodas até chegar perto
do cartaz de tiro novamente}
Que tristeza infinita.
Acordar todo dia e refazer esse mesmo caminho.
 {blackout}
  Final
 {escuro}
{luz sobe revelando aos poucos a atriz. Já não há nenhuma
cadeira de rodas. Ela começa a andar por cima das pedras como
se estivesse perdida no palco}
{Atriz segura um grande vaso com muitos lírios. Coloca-o delicadamente no chão, 
ao seu lado e desabafa de forma serena}
 Sonho é destino…
Eu tinha medo da morte.
Mas isso foi antes de aprender a sonhar.
Eu sonhei que estava rodeada de flores, muitas flores.
Arranjos delicados e bem feitos.
Crisântemos de todas as cores, tulipas, margaridas, girassóis gigantes,
todos voltados pra mim.
Um campo de girassóis esperava por mim.
Azáleas formavam um labirinto colorido pra eu caminhar
alegremente até me perder.
Pra me achar, o cheiro do jasmim.
Pra repousar um campo de papoulas, onde eu podia observar
a tarde inteiramente rubra.
Meu sonho não era angustiado como esses sonhos sobre a vida. Não!
Foi muito lindo.
Eu sonhei que encontrava meu filho.
Eu tinha todas as flores que sonhei ter pra mim,
e tinha o meu filho de volta.
Qual será o meu sonho de hoje?
Eu tenho a sensação de que não faço nada além de dormir e sonhar.
Será esse o meu destino?
O meu caminho eu não lembro.
Mas eu não preciso saber mais nada.
Eu posso fazer outro caminho.
Só que antes eu quero escutar uma valsa.
Eu me lembro de ter lido que o cérebro humano continua
processando impulsos elétricos depois da morte.
E que a audição é o último dos sentidos a morrer.
Depois de tudo acabar, a gente ainda consegue escutar
uma música inteirinha.
 {grita}
Eu quero escutar agora.
 {mais tranqüila}
Não quero perder mais nem um segundo.
Eu já perdi muito tempo.
Eu sei o valor exato. Mas eu não preciso mais falar isso,
e nem fazer mais contas. 
Agora eu quero ficar quieta, no meu cantinho.
Descansar na pedra, que eu adoro.
Ficar quietinha escutando uma valsa tocada
especialmente pra mim.
Não vai ser triste não. Vai ser muito bonito.
Eu vou descansar na pedra, rodeada de flores,
escutando uma música só pra mim.
É tudo o que eu sonhei:
 {empolgada}
Assistir à estréia da lucidez no asilo dos meus pensamentos.
 {joga as flores ao redor da pedra, como quem joga flores em uma sepultura. 
Toma entre as mãos o vaso e derrama o líquido, que se revela vermelho, 
suavemente sobre seu corpo. Fica completamente manchada de vermelho}
{deita na pedra}
Pra quem não sabe sonhar, a morte é o fim.
 {A valsa começa a tocar por alguns minutos. Música acaba com blackout}.
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bananascrait-blog · 9 years ago
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Lola por Daniel Arruda
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bananascrait-blog · 9 years ago
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carrossel_2 por Daniel Arruda
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bananascrait-blog · 9 years ago
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bananascrait-blog · 10 years ago
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Um Voo com o Banana Scrait pra quem quiser dar um tempo na vodka com remédio controlado.
E aí que dia desses caiu no meu colo o disco da banda Banana Scrait, Vôo e eu, agitada/perturbada que sou, demorei um pouco pra parar e ouvir, mas quando sosseguei o facho foi uma experiência interessante.
Interessante porque percebi que não precisava chegar mais a métodos tão extremos pra aquietar a cabeça quando o corpo está pedindo arrego. Ou quando estiver amuada, esparramalhada no chão da cozinha sofá. 
Eles misturam músicas em inglês com português, e umas faixas são mais ~soturnas que as outras, mas o que bateu uma onda forte mesmo foram as músicas mais de bouas, quase um lounge de fundo pra tomar um drink numa taça de martini enquanto espera seu date que está atrasado, e que provavelmente irá furar de novo (aquele filhodaputa).
Os destaques perfeitos para minha mente perturbada dentro dessas realidades não tão paralelas, são as músicas “Butterflies in my Mind” e “All the Stars”.
Pra quem quiser ouvir o som ao vivo, marcar um date, tomar uma cerveja, e ver se minha teoria está correta, vai ter show deles dia 11 na Sensorial:
Banana Scrait @ Sensorial Discos Data: 11/07 (sábado) Horário: 19h Endereço: Rua Augusta, 2389 - Jardins Ingressos: R$10
Depois me contem o sabor do pote de sorvete que vocês tomaram quando chegaram em casa.
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bananascrait-blog · 10 years ago
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