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Por cada homem enfurecido há sempre dois ou três que o acalmam com palmadinhas nas costas, por cada chorão, muitos mais limpadores de lágrimas, por cada homem feliz, uma profusão de infelizes a querer aquecer-se no calor da sua alegria.
E todas as noites pelo menos um homem não consegue encontrar o caminho de casa ou a sua casa mudou-se para outro lugar e ele vagueia pelas ruas, supérfluo.
Uma vez estava com o meu filho pequeno na estação e um autocarro vazio passou por nós. O meu filho disse: “Olha, um autocarro cheio de gente vazia.”
(o poema é do Yehuda Amichai. não encontrei atribuição à tradução)
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MORANGOS (Edwin Morgan Tradução: Virna Teixeira)
Nunca houve morangos como os que tivemos naquela tarde tórrida sentados nos degraus da porta-janela aberta de frente um para o outro seus joelhos encostados nos meus os pratos azuis em nossos colos os morangos brilhando na luz quente do sol nós os mergulhamos em açúcar olhando um para o outro sem apressar a festa para chegar ao fim os pratos vazios deitados sobre a pedra juntos com os dois garfos cruzados e me aproximei de você dócil naquele ar nos meus braços abandonado como uma criança da sua boca ávida o gosto de morangos na minha memória inclina-se de volta deixe-me amá-lo
deixe o sol bater sobre o nosso esquecimento uma hora de tudo o calor intenso e o relâmpago de verão nas colinas de Kilpatrick
deixe a tempestade lavar os pratos
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Há somente dois países (Enrique Lihn, trad. Gilberto Neto)
Há somente dois países: o dos sãos e o dos enfermos por um tempo se pode gozar de dupla nacionalidade mas, a longo prazo, isso não tem sentido Dói separar-se, pouco a pouco, dos sãos a quem seguiremos unidos, até a morte separadamente unidos Com os doentes cabe uma crescente cumplicidade que em nada se parece à amizade ou ao amor (essas mitologias que dão seus últimos frutos a uns passos do machado) Começamos a enviar e receber mensagens de nossos verdadeiros /concidadãos uma palavra de alento um folheto sobre o câncer
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piras históricas (marcelo reis de mello) I não existia micro-ondas na Índia quando a deusa सती ou Sati ou Sutee ou Dakshayani incendiou o próprio corpo sem saber como encarar o pai quando o consorte Shiva morreu desde então Sati é usada e ordena à viúva devota que arda na pira funerária do marido morto – amarrada ao seu corpo às egoístas administravam um pouco de ópio e umas palmadas os Hindus do império Vijayanagar bolaram o micro-ondas usado até hoje em práticas rituais do Complexo do Alemão há mesmo um excesso de viúvas onde meninas de 13 se enroscam com rapazes de 60 primeiro quebram as pulseiras na frente do falecido depois o sindor então desfazem suas roupas dão-lhes os panos brancos do luto (alguns lhes raspam a cabeça) velhinhas encurvadas os olhinhos cobertos por cataratas vagando entre os riquixás algumas são violadas e se ficam lhes chamam mangliks – a maldição do amor diz मनुस्मृति ou Manu Smriti que uma viúva deve sofrer bastante antes de morrer e deve ser pura de corpo pensamento e alma II também os viquingues anglo-saxões e germânicos em geral mandavam as escravas favoritas – suas patroas acompanharem o mestre na embarcação funerária incendiada e lançada ao mar III dizem em Saigon que o coração de Thích Quảng Ðức ou Lâm Văn Tức permaneceu intacto mesmo depois de imolar-se ainda depois de cremado o coração não queimou o coração de um Bodhisattva não arde como o nosso ... moral da história: não adiantou nada porque o irmão do autócrata Ngo Dinh Diem aquele safado Ngô Ðình Nhu atacou os pagodes budistas pelo Vietnã e tomou para si o coração sagrado IV o pagode “coração” da Turma do Pagode diz assim: dá um calor sobe um fogo no corpo quando eu paro e penso que posso te amar V o pai de cinco rebentos Ryszard Siwiec se queimou todo em protesto contra a invasão da Czechoslovakia pela URSS pela República Democrática Alemã pela República Popular da Polônia pela República Popular da Hungria pela República Popular da Bulgária e como a Globo pensou que Ryszard Siwiec fosse um baderneiro acabou a Primavera de Praga VI Tarek al-Tayyib Muhammad ibn Bouazizi vendia frutas para viver e ajudar a família mas a Guarda Municipal disse que não podia confiscaram as frutas e cuspiram nele disseram é Choque de Ordem é T��nis Presente então Bouazizi comprou duas garrafas de solvente e começou a Primavera Árabe VII Izaura mãe de duas meninas e do meu bisavô Aloísio imolou-se não sei bem como nem por quê aos 36 anos não se fala muito sobre isso na minha família é claro Aloísio aos 13 anos foi deixado à própria sorte tinha uns sonhos estranhos depois acabou se virando casou com Anita uma sua prima de 1º grau uma das sobrinhas da sua mãe Izaura que se queimou aos 36 anos e tiveram filhos dentre os quais o pai da minha mãe: Cleômenes VIII minha mãe contou pelo telefone que até hoje meu avô não sabe ao certo por quê foram escolher logo Cleômenes parece que por ignorância histórica ou um gosto bastante heteróclito Κλεομένης ou Cleômenes I, II e III foram reis espartanos da dinastia ágida o primeiro era um brilhante estrategista dizem que se suicidou alienado e na prisão sobre o segundo não se sabe nada exceto que o reinado foi longo o terceiro suicidou-se depois de uma revolta mal sucedida 200 anos antes de Cristo ao que se conclui pelo menos que nenhum dos três olhava com ternura para uma fogueira
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a tempestade perfeita (angélica freitas) então, graças aos homens que esbanjam tons de cinza no comando do país e da economia e que há alguns anos dormiam feito cães ao pé do Mercado qualquer joão ou josé conectado e inconformado sente-se um thor nos trópicos: deus do trovão e branco é sua a casa, ele dá as ordens tudo que respira no quarto e adjacências é súdito, subjugado aqui dentro, o varão lá fora, o vírus (segundo os jornais uma escolha difícil) se nenhuma mulher pousa leve a cabeça no travesseiro não perde de vista o martelo do seu divino thor de barro suas mãos tremem quando ele dorme e não tira o olho dos boletins meteorológicos
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ATRAVÉS DA NUDEZ (luis miguel nava) Este garoto é fácil compará-lo a um campo de relâmpagos encarcerando um touro. Através da nudez vêem-se os astros. É onde o poema interioriza a sua própria hipérbole, a paisagem. Movem-se os tigres como câmaras na areia, prontos eles também a deflagrarem. A manhã espanca a praia, é impossível descrevê-la sem falar dos fios deste poema que a cosem com a paisagem. * OS DEDOS (luis miguel nava) O mar recua, o leite e a língua digladiam-se ao sentirmos a chama largar leite, aliarem-se na boca ao leite os dentes comovidos e ao contacto do mar a romper nela os dentes como a ventania. Persigo assim o mar, no encalço dele os dedos avançam na memória, às vezes acontece eu sentir, mesmo por baixo dos cabelos, a memória aligeirar-se e arderem nas mãos os dedos em desordem.
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vestidos (bruna beber) os véus transparentes colocados nos edifícios em construção — uma teia, uma túnica de tarrafa, mosquiteiro de berço — não os protegem do medo nem da morte por despencamento apenas invertem o processo de chegada, estão vestidos antes de nascerem.
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Dúvidas apócrifas de Marianne Moore (João Cabral de Melo Neto) Sempre evitei falar de mim, falar-me. Quis falar de coisas. Mas na seleção dessas coisas não haverá um falar de mim? Não haverá nesse pudor de falar-me uma confissão, uma indireta confissão, pelo avesso, e sempre impudor? A coisa de que se falar Até onde está pura ou impura? Ou sempre se impõe, mesmo Impuramente, a quem dela quer falar? Como saber, se há tanta coisa de que falar ou não falar? E se o evitá-la, o não falar, é forma de falar da coisa?
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coisas que já respondi pra gente branca (rubens akira kuana) não eu não sou da china eu não sei falar japonês sim minha avó sabe falar meu pai não sabe meu avô não era um samurai nem um ninja eu não sou bom em matemática eu não sou bom em matemática porque sou japonês não sei cara eu acho que só estudei pra prova mais do que você sim eu sei contar até dez em japonês iti ni san shi go roku shiti hati kyu jyu não eu não sei lutar karatê sim eu gosto de pokémon eu acho que o tamanho do meu pau é normal eu estou com os olhos abertos sim meus olhos são assim mesmo eu não vejo as coisas em widescreen eu não sei fazer sushi não na minha casa nós não comemos sushi nós comemos feijão e arroz eu não me acho tão parecido assim com meu pai nós não somos todos iguais você não deveria chamar as pessoas desse jeito minha pele não é amarela sim eu nasci no brasil mestiço meu pai é japonês minha mãe não meus avós vieram do japão não eu nunca fui pro japão não eu nunca morei no japão sim o japão é muito desenvolvido mesmo sim de primeiro mundo né sim videogames ultraman sayonara godzilla playstation playstation playstation sim eu tenho parentes lá não sei eu não falo muito com eles não eu não conheço essa pessoa asiática sim os “orientais” tem fama de serem muito pacientes é eu não sou muito de falar sim eu acho que você poderia dizer que sou “zen” eu não sei fazer feng shui minha casa não é minimalista eu acho que a palavra “oriental” não significa isso esse não é meu nome essa piada não tem graça * harakiri (rubens akira kuana) entre a homenagem e o fetiche entre o respeito e a conivência entre o haxixe e o ópio entre o aplauso e o pornô entre o shoyu e o tempurá entre a bomba e o museu entre o turismo e o anime entre o meme e a mesma merda entre a liberdade e o pó entre são paulo e o brasil entre o convite e o token entre o kimono e o véu entre o o evento e o rolê entre o inferno e o céu entre a pele e a página entre o corpo e o som entre a espada e a voz entre o silêncio e a flor, alguém digita um comentário que começa assim: esses identitários q * o segredo da longevidade japonesa (rubens akira kuana) fazer um detox virtual e então falar e falar tudo de novo como um sísifo que carrega um gigantesco sushi de goiabada até uma privada que limpa automaticamente seu cu com um delicado jato d’água quente, arigato gozaimasu
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Duas horas no trem (Abdellatif Laâbi) Durante duas horas no trem Eu refaço o filme de minha vida Dois minutos por ano na média Meia hora para a infância Outra meia hora para prisão Amor, livros, vontade ocupam o resto a mão de minha companheira gradualmente se derrete na minha e sua cabeça em meu ombro é como a luz como um pombo Quando chegamos Eu terei cinquenta anos ou algo assim e ainda terei em torno de uma hora para viver.
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COM O CORAÇÃO PACATO (József Attila trad. Paulo Sérgio Souza) Sem genetriz, genitor, sou eu sem pátria e senhor, sem berço ou chão pra finar, sem beijo, sem quem amar. Três dias de fome ao cabo, sem sequer tascar um naco. Meus vinte anos, viço afora, meus vinte anos à penhora. Se fizerem menoscabo, Há de comprar o diabo. Com o coração pacato, roubo e, se preciso, mato. Serei pego e pendurado, em solo bento enterrado co’a mata da morte vindo frondar meu coração lindo.
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monumento ao jovem monolito (andré dahmer) I enquanto eu brincava de índio na praia bianca franco você se transformou em uma maravilha tecnológica máquina de bolinar máquinas II enquanto o homem de terno dançava sobre o homem de crachá que dançava sobre o homem de farda que dançava sobre o homem de macacão que cantava músicas para jesus cristo eu estava na praia brincando de índio quando a polícia chegou III seu corpo relinchava enquanto a internet forjava o novo formato da sua coluna meu amor você se parece cada vez mais com uma cadeira de escritório talvez com rodinhas você rodopie você queria ser bailarina ou veterinária eu queria ser índio ou astronauta que bolsa bonita comprei na zara adorei seu cabelo estou fazendo terapia com cristais enquanto eu brincava de índio na praia você inventava a pólvora IV eu brincava de índio na praia rezava para os elefantes comungava com os pássaros minha igreja era um chá de gosto ruim ver um elefante era coisa comum como avistar um automóvel minha vida era uma selva até que a alegria foi considerada uma forma de selvageria análoga à barbárie tipificada como terrorismo eu brincava de terrorista na praia quando os americanos chegaram V meu amor seus seios se parecem cada vez mais com uma tela sensível ao toque enquanto eu bebia sangue na praia você fazia exercícios aeróbicos para salvar sua bunda da morte certa às vezes tenho vontade de largar tudo comprar um carrinho de coco virar índio ou astronauta você ainda está viva e também pode largar tudo para ser bailarina ou veterinária precisamos guardar algum dinheiro para pagar a faculdade das meninas precisamos largar tudo ontem nossa caçula viu elefantes nas celas do zoológico
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Você se dá conta de repente de que muitos dos poemas que ama foram na verdade escritos por seus tradutores: senhores míopes enfiados em escritórios improvisados em quartinhos dos fundos enquanto os netos jogam bola na sala jovens mães de família implorando por umas horas de silêncio traduzindo versos longos enquanto ouvem ao fundo bater como um mar a máquina de lavar professoras aposentadas que se metem a verter ao português os versos de um velho poeta chileno funcionários públicos que passam suas horas livres trocando palavras umas pelas outras como numa casa de câmbio doutorandos mal remunerados autores de outros poemas que você não ama debruçados sobre palavras que você nunca vai ler e lançando sobre o papel novas palavras que se tornarão depois suas palavras preferidas. * Você entrava nesses poemas como num mar estrangeiro como daquela vez que entrou no mar de um outro continente um mar feminino sob um sol feminino e teve a impressão de ter abandonado partes de si mesma da sua vida da sua língua do seu nome junto com as roupas amontoadas na areia. * São muitas você sabe as palavras e esperam como toras de madeira empilhadas capim crescido mercadorias que aguardam transporte pequenos barcos a remo sem remo máquinas que não se sabe para que servem cartas extraviadas no voo as manchas de café nas páginas de um livro todas as coisas encontradas no estômago da morsa que morreu em 1961 no zoológico de Berlim esperam que você as escute e as deixe dizer o que dizem no entanto você não pode – um rastilho de pólvora e você não tem isqueiro – precisa de outro que as acenda só pode se aquecer numa fogueira emprestada – é mais ou menos isso mas com outras palavras. (ana martins marques)
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POR QUÉ LOS PLÁGIOS? (ulises carrión, 1973) PORQUE Hay demasiados libros Toma demasiado tiempo leer o escribir un libro El Arte no es propiedad privada Son una señal de amor hacia el autor Le dan a un livro una segunda oportunidad de ser leido Hacen que la lectura sea innecesaria No se prestan a interpretaciones psicológicas No tienen propósitos utilitarios No tienen valor comercial Son simples e absolutos Son bellos
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A luz apagada, ou parar de fumar (ana martins marques) O que fazer agora com as mãos cegas? o cigarro é parente do lápis eram, afinal, gestos para nada como na dança (e fico à espera de alguém que coreografasse o ato de acender um cigarro numa praia cheia de vento) as cariátides as gárgulas seriam mais felizes se fumassem só amamos de fato o que serve para nada mas as mãos mais do que nós sabem o que fazem – são desde cedo adestradas no adeus só sinto falta de fabricar minha própria nuvem e de esperar-te em alguma esquina fumando em pé como um farol
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poema pra se bronzear no nordeste (thiago barbalho) os surfistas um dia usarão parafinas pra erguer cristas nos meus mamilos um dia os surfistas vão sair de dentro das espumas em pé nas pranchas vão mirar em mim sentado na areia e finalmente vão deslizar até minha boca esta úmida pista os surfistas um dia vão se render às sábias ondas da minha língua vão preencher minhas ambições de realidade os surfistas enfiarão suas cabeças erguidas por dentro dos tubos da minha alegria os surfistas virão vão vir os surfistas um dia
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COMO SER PERFEITO (Ron Padgett trad. Ana Martins Marques) Everything is perfect, dear friend. Kerouac Durma um pouco. Não dê conselhos. Cuide de seus dentes e gengivas. Não tenha medo de nada que esteja além do seu controle. Não tenha medo, por exemplo, de o seu prédio desabar enquanto você estiver dormindo, ou que alguém que você ama vá subitamente cair morto. Coma uma laranja toda manhã. Seja amigável. Vai ser bom pra te fazer feliz. Faça seu pulso subir para 120 batimentos por minuto por vinte minutos seguidos quatro ou cinco vezes por semana fazendo qualquer coisa de que você goste. Anseie por tudo. Não espere nada. Cuide primeiro das coisas que estão perto de casa. Arrume seu quarto antes de salvar o mundo. Depois, salve o mundo. Saiba que o desejo de ser perfeito provavelmente é a expressão velada de outro desejo – de ser amado, talvez, ou de não morrer. Faça contato visual com uma árvore. Seja cético em relação a todas as opiniões, mas tente ver algum valor em cada uma delas. Vista-se de um jeito que agrade tanto você quanto aqueles a sua volta. Não fale depressa. Aprenda alguma coisa todos os dias. (Dzien dobre!) Seja legal com as pessoas antes que elas tenham chance de se comportar mal. Não fique com raiva de nada por mais de uma semana, mas não se esqueça do que te deixou com raiva. Deixe sua raiva a um braço de distância e olhe para ela, como se ela fosse uma bola de vidro. Então inclua-a na sua coleção de bolas de vidro. Seja leal. Use sapatos confortáveis. Programe suas atividades de modo que elas tenham um equilíbrio agradável e variedade. Seja gentil com os mais velhos, mesmo que eles sejam obnóxios. Quando você ficar velho, seja gentil com os mais jovens. Não bata neles com a bengala quando eles te chamarem de vovô. Eles são seus netos! Conviva com um animal. Não passe tempo demais com grupos de muitas pessoas. Se precisar de ajuda, peça. Cultive uma boa postura até que ela se torne natural. Se alguém assassinar seu filho, pegue uma espingarda e exploda a cabeça dele. Planeje seu dia para que você nunca tenha que se apressar. Seja agradecido às pessoas que fazem coisas para você, mesmo que você tenha pagado a elas, mesmo que elas façam favores que você não quer. Não desperdice dinheiro que você poderia dar para aqueles que precisam. Não se surpreenda com o fato de a sociedade ser defeituosa. E lamente quando descobrir que ela é ainda mais defeituosa do que você imaginava. Se pegar alguma coisa emprestada, devolva-a em condições ainda melhores. Sempre que possível, use objetos de madeira em vez de objetos de plástico ou metal. Olhe aquele passarinho ali. Depois do jantar, lave a louça. Calma. Visite países estrangeiros, exceto aqueles cujos habitantes tenham manifestado o desejo de te matar. Não espere que seus filhos te amem, para que eles possam fazê-lo, se quiserem. Faça meditação. Depois vá um pouco além, se tiver vontade. O que tem lá? Cante de tempos em tempos. Seja pontual, mas se você se atrasar, não dê desculpas longas e detalhadas. Não seja autocrítico demais nem autocomplacente demais. Não pense que o progresso existe. Não existe. Suba pela escada. Não pratique canibalismo. Imagine o que você gostaria que acontecesse, e então não faça nada que torne isso impossível. Desligue seu telefone pelo menos duas vezes por semana. Mantenha suas janelas limpas. Extirpe qualquer traço de ambição pessoal. Não use a palavra extirpar com muita frequência. Perdoe seu país de tempos em tempos. Se isso não for possível, mude-se para outro. Se se sentir cansado, descanse. Cultive alguma coisa. Não vague por estações de trem resmungando “Todos vamos morrer!” Tenha entre seus verdadeiros amigos pessoas de diferentes classes sociais. Aprecie os pequenos prazeres, como o prazer de mastigar, o prazer da água quente escorrendo nas costas, o prazer de uma brisa refrescante, o prazer de cair no sono. Não exclame: “Não é uma maravilha a tecnologia?!” Aprenda a fazer alongamentos. Alongue seus músculos todos os dias. Não fique deprimido por envelhecer. Isso vai te fazer se sentir ainda mais velho. O que é deprimente. Faça uma coisa de cada vez. Se queimar o dedo, coloque-o na água fria imediatamente. Se bater no dedo com um martelo, segure sua mão no ar por vinte minutos. Você vai se surpreender com o poder curativo do frio e da gravidade. Aprenda a assobiar num volume ensurdecedor. Mantenha a calma em momentos de crise. Quanto mais grave a situação, mais calmo você deve ficar. Curta o sexo, mas não fique obcecado. Exceto por breves períodos da sua adolescência, juventude, meia-idade e velhice. Considere o oposto de todas as coisas. Se for atingido pelo medo de ter nadado longe demais no mar, dê meia volta e retorne para o bote salva-vidas. Mantenha viva a criança dentro de você. Responda as cartas prontamente. Use selos atraentes, como o que tem o desenho de um tornado. Chore de vez em quando, mas só quando estiver sozinho. Então repare no quanto você se sente melhor. Não fique com vergonha de se sentir melhor. Não inale fumaça. Respire fundo. Não dê uma de esperto com um policial. Não desça da calçada enquanto você não puder atravessar toda a extensão da rua. Da calçada você pode observar os pedestres presos no meio do tráfego louco e barulhento. Seja bom. Caminhe por ruas diferentes. Para trás. Lembre-se da beleza, que existe, e da verdade, que não existe. Repare que a ideia de verdade é tão poderosa quanto a ideia de beleza. Não seja preso. Quando mais velho, torne-se um místico. Use pasta de dente Colgate com a nova fórmula de controle de tártaro. Visite amigos e conhecidos no hospital. Quando sentir que é hora de ir embora, vá. Seja honesto consigo mesmo, diplomático com os outros. Não perca a cabeça com frequência. É perda de tempo. Leia e releia grandes livros. Cave um buraco com uma pá. No inverno, antes de ir pra cama, umidifique seu quarto. Saiba que as únicas coisas perfeitas são 300 pontos numa partida de boliche e 27 batedores, 27-out numa partida de beisebol. Beba muita água. Quando perguntarem o que você quer beber, diga “Água, por favor”. Pergunte “Onde fica o banheiro?”, e não “Onde posso mijar?” Seja gentil com os objetos físicos. A partir dos quarenta, faça um check up completo regularmente, com um médico da sua confiança e com quem você se sinta confortável. Não leia jornais mais do que uma vez por ano. Aprenda a dizer “oi”, “obrigado” e “pauzinhos” em mandarim. Arrote e peide, mas discretamente. Seja especialmente cordial com estrangeiros. Veja peças de teatro de sombra e imagine que você é um dos personagens. Ou todos. Coloque o lixo pra fora. Ame a vida. Tenha dinheiro trocado. Quando tiver um tiroteio na rua, não chegue perto da janela. * HOW TO BE PERFECT BY RON PADGETT Everything is perfect, dear friend. Kerouac Get some sleep. Don't give advice. Take care of your teeth and gums. Don't be afraid of anything beyond your control. Don't be afraid, for instance, that the building will collapse as you sleep, or that someone you love will suddenly drop dead. Eat an orange every morning. Be friendly. It will help make you happy. Raise your pulse rate to 120 beats per minute for 20 straight minutes four or five times a week doing anything you enjoy. Hope for everything. Expect nothing. Take care of things close to home first. Straighten up your room before you save the world. Then save the world. Know that the desire to be perfect is probably the veiled expression of another desire—to be loved, perhaps, or not to die. Make eye contact with a tree. Be skeptical about all opinions, but try to see some value in each of them. Dress in a way that pleases both you and those around you. Do not speak quickly. Learn something every day. (Dzien dobre!) Be nice to people before they have a chance to behave badly. Don't stay angry about anything for more than a week, but don't forget what made you angry. Hold your anger out at arm's length and look at it, as if it were a glass ball. Then add it to your glass ball collection. Be loyal. Wear comfortable shoes. Design your activities so that they show a pleasing balance and variety. Be kind to old people, even when they are obnoxious. When you become old, be kind to young people. Do not throw your cane at them when they call you Grandpa. They are your grandchildren! Live with an animal. Do not spend too much time with large groups of people. If you need help, ask for it. Cultivate good posture until it becomes natural. If someone murders your child, get a shotgun and blow his head off. Plan your day so you never have to rush. Show your appreciation to people who do things for you, even if you have paid them, even if they do favors you don't want. Do not waste money you could be giving to those who need it. Expect society to be defective. Then weep when you find that it is far more defective than you imagined. When you borrow something, return it in an even better condition. As much as possible, use wooden objects instead of plastic or metal ones. Look at that bird over there. After dinner, wash the dishes. Calm down. Visit foreign countries, except those whose inhabitants have expressed a desire to kill you. Don't expect your children to love you, so they can, if they want to. Meditate on the spiritual. Then go a little further, if you feel like it. What is out (in) there? Sing, every once in a while. Be on time, but if you are late do not give a detailed and lengthy excuse. Don't be too self-critical or too self-congratulatory. Don't think that progress exists. It doesn't. Walk upstairs. Do not practice cannibalism. Imagine what you would like to see happen, and then don't do anything to make it impossible. Take your phone off the hook at least twice a week. Keep your windows clean. Extirpate all traces of personal ambitiousness. Don't use the word extirpate too often. Forgive your country every once in a while. If that is not possible, go to another one. If you feel tired, rest. Grow something. Do not wander through train stations muttering, "We're all going to die!" Count among your true friends people of various stations of life. Appreciate simple pleasures, such as the pleasure of chewing, the pleasure of warm water running down your back, the pleasure of a cool breeze, the pleasure of falling asleep. Do not exclaim, "Isn't technology wonderful!" Learn how to stretch your muscles. Stretch them every day. Don't be depressed about growing older. It will make you feel even older. Which is depressing. Do one thing at a time. If you burn your finger, put it in cold water immediately. If you bang your finger with a hammer, hold your hand in the air for twenty minutes. You will be surprised by the curative powers of coldness and gravity. Learn how to whistle at earsplitting volume. Be calm in a crisis. The more critical the situation, the calmer you should be. Enjoy sex, but don't become obsessed with it. Except for brief periods in your adolescence, youth, middle age, and old age. Contemplate everything's opposite. If you're struck with the fear that you've swum out too far in the ocean, turn around and go back to the lifeboat. Keep your childish self alive. Answer letters promptly. Use attractive stamps, like the one with a tornado on it. Cry every once in a while, but only when alone. Then appreciate how much better you feel. Don't be embarrassed about feeling better. Do not inhale smoke. Take a deep breath. Do not smart off to a policeman. Do not step off the curb until you can walk all the way across the street. From the curb you can study the pedestrians who are trapped in the middle of the crazed and roaring traffic. Be good. Walk down different streets. Backwards. Remember beauty, which exists, and truth, which does not. Notice that the idea of truth is just as powerful as the idea of beauty. Stay out of jail. In later life, become a mystic. Use Colgate toothpaste in the new Tartar Control formula. Visit friends and acquaintances in the hospital. When you feel it is time to leave, do so. Be honest with yourself, diplomatic with others. Do not go crazy a lot. It's a waste of time. Read and reread great books. Dig a hole with a shovel. In winter, before you go to bed, humidify your bedroom. Know that the only perfect things are a 300 game in bowling and a 27-batter, 27-out game in baseball. Drink plenty of water. When asked what you would like to drink, say, "Water, please." Ask "Where is the loo?" but not "Where can I urinate?" Be kind to physical objects. Beginning at age forty, get a complete "physical" every few years from a doctor you trust and feel comfortable with. Don't read the newspaper more than once a year. Learn how to say "hello," "thank you," and "chopsticks" in Mandarin. Belch and fart, but quietly. Be especially cordial to foreigners. See shadow puppet plays and imagine that you are one of the characters. Or all of them. Take out the trash. Love life. Use exact change. When there's shooting in the street, don't go near the window.
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