Acervo de coisas impossíveis que coleciona uma mente diligente antes do chá das quatro horas. Um pouco de tudo, e um muito de nada. Junte-se à festa.
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Da Dor.
Venho em busca, há 29 anos, de um trabalho mais hercúleo que verbalizar. Ainda assim, faz-se necessário confessar: é apenas em meio a um aglomerado de letras, organizado arquitetonicamente em palavras, ajuntadas esquematicamente em frases, que construo meu lar.
Em resumo, para quem pouco quiser olhar: falar dói; escrever, cura.
Hoje, venho aqui para escrever sobre nada mais do que ela: a dor.
A dor do não pertencimento; do inexorável autoisolamento; do fatídico dia de cair no esquecimento; e de tantas outras vivências, compartilhando o mesmo ponto de encontro no sufixo "mento," que não caberiam, aqui, nessa escrita de momento.
Essa dor, que sempre me acompanhou, desde o dia em que a autoconsciência em mim brotou; essa dor que, de forma quase que equacional, sempre resultou em me assolar, independente de qualquer tangente que eu me aventurasse a testar… O resultado? Sempre o mesmo: mais momentos de assolamento de dor a me sufocar.
Hoje, essa dor, finalmente, tem um nome; esse nome, uma definição; essa definição, uma vasta gama de explicação. Seria, isso, então, motivo de comemorar? Logo eu, que tanto gosto de palavrar para criar meu lar? Seria momento de estranhar? Questionar? Chorar? Que tormento, não saber o que fazer, nesse momento.
De repente, me vejo diante de 3 sílabas, organizadas de tal maneira, que perfuram a membrana seletiva do vocabulário que compõe a rígida ideia de quem sou eu no mundo.
Com que olhar receber essas 3 sílabas?
Quando meu mundo era desorganizado por constantes furacões, cujas causas ciência alguma parecia capaz de explicar; quando meu corpo era atravessado por tornados e tornados de estímulos embaralhados; quando terremotos vinham, sem aviso, destruir todas as moradas que para mim eu tentava construir, era sempre no ponto de encontro do lápis com o papel que eu encontrava o único abrigo do qual nunca poderia ninguém me expulsar.
Foi sempre letra por letra que eu dava um jeito de criar um novo lar.
E agora? Agora, o que há?
É que, agora, uma nova palavra há. E eu não sei se é de comemorar. Eu também não sei se chega a ser um novo lar. Mas é uma palavra que veio, curiosamente, para me salvar.
Desde que essa palavra chegou, o quebra-cabeça que representa a vida humana, com o qual sempre tentei jogar, com cujas peças sempre tentei me conectar a fim de uma imagem montar, mas nunca, nunca consegui, não importava qual máscara usasse; o quebra-cabeça da vida humana começa, finalmente, a fazer sentido.
Começo a ver alguns esboços, algumas sombras, algumas formas, alguns padrões. Faltava uma peça, e eu não sabia. Certamente, faltam várias outras, afinal, um quebra-cabeça da vida humana só se completa quando tal vida inevitavelmente chega ao seu fim. No entanto, com essa nova peça, posso começar a montar e desmontar, montar e desmontar, sem tanto precisar me machucar.
A palavra, a peça que faltava?
Autismo.
Diagnóstico oficial: transtorno do espectro autista, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade, depressão e superdotação.
Hoje, eu sei.
Hoje, eu não me sinto mais alienígena.
Hoje, eu não quero mais ir embora da minha vida.
Hoje, eu quero começar a aprender as infinitas formas de montar esse quebra-cabeça.
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A different kind of Future.
Sweet child, I can count on my fingers
All but sixteen bone-grinding winters.
I know it feela impossible to think
That at eighteen you shall see spring.
Yet bear with me, fast forward, and wow,
Just look at how things have turned out:
More than twenty candles blown out.
You got here yet you don’t know how.
Your little lighthouse blacked out on eighty;
Been a decade since you’ve parted with eighteen
Yet look at how you‘ve simply made it —
Fancy that — to the A Team.
Curtains are closing up on you though
I know, it feels like you’ve lost control
But to think of it and maybe, — oh!
No one ever really had any control.
Sweet child, always so intimate with death,
You’ve always hoped life would out
And you’d take your very last soothing breath
Long before you’d even lived out.
But child, isn’t it kind of funny
How such a brilliant future as yours
Has suddenly turned upside down?
But oh, don’t you karma-cry now, honey.
Your future is now yesterday before you die
Your yesterday shall become people’s tomorrow
Oh please do have the decency of not saying goodbye,
Yet dare, dare to say goodnight — till it be morrow.
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primeira pessoa
bateu no vidro: uma, duas, três vezes. a primeira, de leve, ressoando um ré docilmente acobreado. a segunda, em sol índigo, já mais escuro. e a terceira, de maneira tão forte que ameaçou rachar o vidro e estremeceu o ambiente com um eco de sapateado ininterrupto feito de dós-rubis.
o vermelho tingiu não somente o ambiente, como aqueles olhos que os de cá encontraram do lado de lá. através do vidro. das duas jabuticabas, ramificavam-se pequeninos riachos vermelho-vívido em dó.
a primeira coisa que lhe chamou a atenção foram aqueles olhos e a forma como as ramificações -- vermelhas, é claro -- se expandiam cada vez mais com o passar dos segundos. estreitou seus olhos; piscou uma, duas, três vezes a fim de clarear a visão marejada; aproximou-se: os olhos de lá estreitaram-se da mesma forma, e aproximaram-se, também, dos de cá. imitavam-se?
a vermelhidão ramificava-se, agora, pelo nariz afilado e pelas bochechas rechonchudas que lhe escondiam algumas voltas ao redor do sol. duas lágrimas cor de diamante pairavam nos cílios endurecidos por produtos que compram -- ou vendem? -- um ideal adoecido de beleza. mas que tipo de beleza? certamente não aquela, não diante de tanto vermelho.
se bem que, se piscasse novamente, poderia até enunciar que era belo; embora tingido de vermelho, era belo o rosto. o rosto pálido posava como canvas para os riachos de vermelhidão aquarelada. as feições até que eram, se contempladas de certo ângulo, harmônicas, e de toda forma, há de se admitir, havia também algo de estético nas manchas vermelhas. tal beleza e estética outrora escondidas, então desveladas, despertou no fundo de seu âmago uma espécie de instinto de cuidado. que cor era seu âmago? ora, algo lhe dizia que era, também, vermelho.
"corra", disse, num surto de impulsividade enraizada no instinto de cuidado. disse, endereçada à menina dos olhos de jabuticaba, do lado de lá.
as ramificações, agora, saíam dos olhos e chegavam até o queixo.
"você precisa correr," tornou a alertá-la, com certo tom púrpura de urgência.
mas os olhos de jabuticaba apenas se apertaram em pequenas fendas, despejando mais diamantes.
os diamantes de lá incendiaram o âmago de cá.
“entenda, você merece melhor que isso,” disse, brandamente, apesar do fogo que lhe consumia. mas a menina do lado de lá parecia ensurdecida às suas súplicas.
“seu tempo está acabando!”, veio a impaciência, tingindo esse último enunciado. “faça algo! faça algo por você, deixe algo de valioso para trás...”
e mais diamantes. quantos diamantes poderiam da jabuticaba surgir? que infinitude absurda e odiável era essa de carvão carbonizado resultante de uma pressão infinitésima, derivada de camadas de magma; tudo isso líquido? de que vale um diamante se é líquido, se escorre?
não podia a criatura do lado de lá parar de vazar diamantes? perguntou-se, irritadiça.
“...deixe algo de valioso para trás”, continuou seu aviso. “antes que eu destrua você. eu estou destruindo você, não vê? seu tempo está acabando. deixe algo de valioso nas frestas do Tempo.”
e virou-se.
quando se virou, a pessoa do lado de lá imitou seus movimentos: virou-se também.
do lado de cá, afastou-se do vidro do espelho e foi embora, sem olhar para trás. mas a pessoa do lado de lá continuou parada, imóvel; refletida diretamente para nada nem ninguém; para a não-existência; para um quarto vazio.
até que a superfície espelhada começou a sugar o quarto o qual refletia. como se fosse poeira ao vendo, o cômodo inteiro se transportou para o lado de lá, onde pairava a figura imóvel, de costas. até que não estava mais de costas. até que o lado de lá virou o de cá e já não havia mais nenhum lado.
se muito havia, era uma espécie de janus tentando irromper do peito da figura imóvel.
janus se rebelava em seu interior. a ânsia de colocar seus dois olhos para trabalhar fazia com que, com dedos sem garras, cavasse buracos no peito da menina.
se janus não possuía garras, por que esse rasgo doía mais?
e doía, doía, doía, em qualquer nota e escala e tom e cor e timbre que se possa querer utilizar para colorir aquarelas em vão.
janus se libertou; mas com isso, a carcaça da menina se partiu em dois, e caiu ao chão, craquelando-se com o baque.
de tudo que era, restou janus: um olho lá, um olho cá.
a mensagem deixada pela menina de cá galopava pelos cantos do cômodo. os enunciados são irrepetíveis, mas nos galopes daquele lugar, dentro do espelho, onde a temporalidade não existe, as palavras se repetiam; talvez não nos mesmos enunciados; mas em suas cadeias de repetições galopadas, cada novo enunciado emitia um novo sentido, que dialogava com o anterior, resultando numa espécie de mesmice diferenciável.
eram galopes que soavam como o tiquetaquear de um relógio.
ora, equivoquei-me: não é que não havia tempo do lado de lá. é que o tempo corria muito mais rápido.
o tempo não parava.
os dois olhos de janus, um olhando para lá, o outro, para cá, começaram a dançar à sinfonia do galopar do tempo: para lá e para cá valsavam.
e assim, com olhos valsantes e uma visão quase 360, seria janus que assumiria as rédeas do destino?
onde estava aquela primeira pessoa?
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Através do Espelho
Pudera!
Eu transporia diretamente de meus sonhos um mundo no qual você me notasse... Ah, mas que complexo de Alice é esse do qual não consigo me livrar?
Bem, deixe-me dizer-te... Em um mundo só nosso — nosso país das maravilhas — deitaríamos na grama fria, macia, coberta por orvalho; o odor de vivacidade nos invadiria as narinas, limpando nossos pulmões do tédio da vida cotidiana. Admiraríamos as estrelas dançantes e, nessa valsa reluzente, desenharíamos, com nossos tímidos olhares, inúmeras constelações. Pintaríamos um céu só nosso, como se fosse tela e aquarela. Seríamos engolidas pela imensidão da infinitude que se expande no vértice entre existência e não-existência e eu seguraria tua mão na medida em que rodopiássemos, envoltas por um furacão feito de fumaça de algodão doce.
Quisera!
Juro-te, eu capturaria o Chapeleiro Louco e a ele designaria a tarefa de desafiar-te com inúmeras charadas sem pé nem cabeça, se ao menos isso fosse roubar-te algum sorriso de pérola ou dois.
Mas a verdade é que estou perdida no jardim das flores, trancafiada do lado de cá, prisioneira de meu solitário país das maravilhas, enquanto tu te olhas no espelho, mas não, não me vês nem em sombra. Eu, eu te vejo tanto, tão nitidamente através do espelho — o que eu não daria para que tu encontrasses em ti o ímpeto de atravessá-lo? Eu te receberia com uma festa do chá tão particular nesse mundo tão nosso, e faria nossas misturas preferidas.
Ah, como eu queria me misturar com você...
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...mas se eu dissesse que chove em dó, jamais me dariam crédito. pequenas notas de dó enrubescido, que batiam — embora molhados — quase secos, como sapateado no telhado.
as telhas de madeira velha e curtida, mal encaixadas — que flertavam mas não ousavam beijar-se e entregar-se por inteiro — criavam goteiras nos espaços mais irritantes do quarto umedecido.
a porta, também de madeira envelhecida, rangia mais que os dentes de uma velha; se um estranho a abrisse, a primeira coisa com a qual se depararia seria um espelho que tecia-se do teto — infiltrado, naturalmente — escorrendo em prata líquida até o chão linóleo ácido.
a prata líquida não falava: era apenas prata que escorria de cima a baixo, bem como as notas de dó — não, os pingos de chuva — escorriam enrubescidos telha a baixo; telhas abaixo. mas refletia: refletia farpas agudas ao inquilino; contudo, ao mero e ocasional visitante — ou visitantes, pois a prata líquida conhecera plurais que dançavam tango pelo número “pi” da matemática inteira — talvez apenas refletisse aquilo que foi consensualmente concebido enquanto “realidade” e se tecia com fios — também de prata? — nas entrelinhas dos dizeres dos bem sabidos... ou talvez, apenas talvez, refletissem miragens convincentes, tecidas cuidadosamente em metáforas por dedos calejados, mas habilidosos; calejados, pois habilidosos.
o ar era sempre grave — consequentemente, o ambiente, mal iluminado. mas havia luz suficiente e umidade excessiva para que marcas de beijo adornassem os cantos arredondados da prata líquida. vapor e pó — pó de sujeira, pó de estranhos, e por vezes pó de estrelas — batalhavam para conquistar e domar a superfície espelhada, líquida, porém dura; impiedosa. ninguém vencia, e o resultado era que crateras de poeira, lama e ferrugem surgiam a torto e a direito.
tratava-se de um quarto inundado, é claro; criatura marinha era o inquilino, mas brincava com ar: fingia sê-lo para aqueles que o visitavam. tantos panos de chão encharcados escondia por trás da tapeçaria também úmida; disfarçava o odor de putrefação com perfumes caros e franceses, com os quais gastava o dinheiro da alimentação.
não é necessário explicitar o que o leitor já sabe: como se sentia a criatura marinha frente à prata líquida. mas, os passantes, que apenas viam a miragem cuidadosamente arquitetada, que tinham os sentidos intoxicados pelos odores europeus, que não escorregavam no linóleo ácido, que encontravam uma cama bem re-feita donde viriam a fazer a refeição — para os passantes, ali refletia-se a perfeição. algo superior. algo digno de pedestal.
e tudo o que a criatura marinha, o monstro de um lago qualquer, conseguia pensar era que “pedestal” rimava fácil demais com “cristal”; e cristal, embora bonito e transparente, era por demais frágil; não aguentava uma queda sequer. bastava escorregar para espatifar — não, não se podia ser feito de cristal em um quarto todo molhado; sendo assim, teria de arranjar alguma forma de se re-fazer diamante — isso se quisesse ser transparente, o que, de fato, não queria. gostava das cores: jogava com elas. por exemplo, recentemente criara um hábito de pintar músicas nas paredes — notas musicais que os passantes jamais poderiam decifrar, pois o monstro se trancafiaria em sua solidão arbórea e jamais compartilharia o código. era assim que gostava, dizia para si, em esperança de enganar-se.
era um monstro caleidoscópico. talvez, pela multidão de cores, fosse tão interessante aos passantes. mas era apenas isso: um aglomerado de cores que jamais faria sentido nem mesmo se sentido — pois os sentidos jamais seriam transmitidos. criara um jogo exclusivo para si, e estava contente por tê-lo feito. sabia que vivia em um mundo só seu e que, se médicos positivistas tivessem acesso a tais pensamentos, julgariam-lhe “louco”. julgariam-lhe, sim, pois a medicina estava infestada pela moral.
mesmo as pílulas que tomava para controlar sua monstruosidade continham certa moralidade: tinham as róseas com cheiro de fumaça que tranca a garganta, as brancas, tão adocicadas que faziam o queixo doer, as laranjas ardentes, que arrepiavam a pele, as lilases salgadas, que davam calor à língua... não que de fato os comprimidos tivessem tais gostos; o gosto era fantasma — bem como a cura por eles prometida.
e não resta muito o que dizer. na verdade, resta apenas versar sobre a chuva. e a questão, pelo menos, para o monstro inquilino, é que chovia em nuances de dó enrubescido pelas telhas idosas e mal colocadas do telhado... mas se eu dissesse que chove em dó, jamais me dariam crédito.
o espelho.
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Ghosts
I am scar(r)ed, dear.
The magnetic pull is all too familiar, yet strange: the tingling sensation coming from the confines of the desert that is my stomach, generated by the sight of an undiscovered, yet inviting country; the cold, paraffin sand beneath my feet; the burning sun spilling one of its countless tentacles over my back just as a perfectly fitting cloak would cover a traveler’s journey-tainted body... Such is this feeling from which I run.
The words I so desperately want to utter sound out of tune and harsh in the realms of my mind. It is almost as if, since my last endeavors, I had forbidden myself to produce such meaningful yet meaningless sounds. It is as if my voice was not made to sing this chorus. Yet the words tiptoe on and slide down my tongue, arousing every papilla gustativa, awakening demons that rest in the darkest corners of my soul.
Those are demons I haven’t properly exorcized — even if I wanted to, I don’t think I could. I am a minefield, and I simply cannot allow kind strangers to sleepwalk across these yards, for these mines explode far too frequently, and from them things gross and rank in nature merely grow. How could I ever let a stranger in, when I can’t even harbor spring?
No, nobody wants to walk a minefield, I have always known that. And I wouldn’t invite anyone either. Except for my ghosts — why, they, for instance, have a free pass to wander about. They have the power to create explosions and blow them out of proportion. Then why do I keep these ghosts, you ask? Because I have forgotten how to let them go. I have become too accustomed to their presence, to their melody — and anything is better than to be alone in utter compressing silence.
The fear of those demons is what keeps me sane; at the same time, the mere existence of those demons is the very root and core of my insanity. I swing from one extreme to the other, never truly quite experiencing the fence — except for when I see both sides of the war at the same time. It is the fear of those demons that holds my tongue and bids me haste my peace; it is the mere existence of those demons that causes such words as those to tiptoe on and slide down my tongue.
So, like a borderline-suicidal snake, I swallow my own poison: I swallow those words, and drown them in a sea of desert, where the soil, although fertile, does not explode in things rank and gross in nature; nothing ever blooms in such a desert, things are merely left there to dry, until the draught has worn them out so much and brought them to their knees that they no longer dare to subsist.
But all of this is pure gibberish to avoid saying the words that the loud beatings of my heart seem to so desperately want to muffle. Someone once told me to Dare!, and still I have a hard time following simple advice.
Should I dare? Should I care? Should I risk it? Is it too late? Have I ruined everything already? Have I revealed the scariest mines? Have I unleashed the freakiest demon? Like I always do...
The pure, naked truth is, I really, truly like you. But those demons will kill me before I even have a chance to say it. And for the first time in my life, I’d rather die, than give you entrance. Why? Because you are different. You are too important — and I will die before I kill you.
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(Nova)(Mente)
Tão dionisíaca me tornei, que já nem importa o caminho que as palavras fazem; se a escrita sobe ou desce, se muda a caligrafia… (d)Os sentimentos, nem se fala, embora talvez devesse (ou um ma(i)s devia?). Se o sentido das coisas mesmas me escorre líquido por entre os dedos, tal qual o relógio de Dali, eu pinto uma nova aquarela: de trás pra frente, de frente pra trás; atravesso o espelho, sapateio no campo no campo minado, danço tango com as flores que explodem diretamente das minas — mas será que devia? E, se sim, quanto já me devia? De quantas flores já me roubei? De quantas pétalas me poupei por medo dos espinhos? Quantas cores enterrei em pó de cristal — que, na verdade, é pó de estrelas? Quantas vezes me permiti escorregar céu a baixo, para amontoar todo esse pó cristalino e estrelado na forma de Andes, que ora aterram meus pés, me impedindo de andar, ora servem como material para esculturas que se desfazem às carícias do vento; vento esse que transporta meus sentidos (produzidos e sentidos) através das ondas fictícias do Tempo, permeando verdades históricas e reescrevendo — pichando contemporaneamente — novas palavras nas paredes? E pensar que, tudo isso, eu guardo (reservo) em minhas mãos? Por tanto tempo já fechei as mãos — ah, que se abram! Será que se atreve a abrir-se, também, o meu coração? Desenterra a chave que enterraste nesse amontoado de pó de estrelas — mesmo que espirres; mesmo que tussas. É só pó… Bem como essas palavras que, em desespero frente à brevidade do “instante que lhes reserva a cena” (falar é como trovoar; é um relâmpago de palavras que arrebenta aos céus e por vezes se faz visto; por outras, até ouvido; mas logo desaparece), eu tento, no papel, eternizar — ou, ao menos, (de)marcar… Contudo, bem como as esculturas, mesmo no papel, elas não estão a salvo do vento: são palavras ao vento, que brincam com o Tempo a seu contento enquanto eu contemplo — e (com)templo. Ah, poder dominar o vento é de tamanha liberdade que quase engulo sílabas na tentativa de passar a mensagem — e a arte se faz AQUI-AGORA, termo esse que designa um lugar tão elástico que pode ser chamado, também, de estilingue ou gangorra. As metáforas me vazam e eu me (es)vazio — e contemplo meu (com)tento; sabendo, enfim, que mesmo o vazio é alguma coisa e que, dele — o próprio poço do devir — pode tudo surgir… Que por (h)ora descansem meus sentidos produzidos (levanta-te, caneta!) — mas nunca os SENTIDOS — até que, palavras ou esculturas, ou, ainda, pinturas e garranchos nas paredes, vejamo-nos (nova)(mente).
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Sabotagem
Ah, você!
Desconheço,
Reconheço,
Descompasso,
Rearranjo:
Só mais um compasso.
A música toca:
Movimento
— Uma dança;
Só mais três goles
E é bem aí
Que eu escorrego...
Te vejo,
Te ouço:
Teu timbre,
Tuas cores,
Teus cheiros
— Jamais sabores.
Reconheço,
Desconheço,
Trapaceio,
Me penduro,
Me seguro,
E me derrubo.
Decorei teu ritmo,
Amoleci no toque,
Sei a cor do teu riso,
Mas, sem choque:
Eu saboto!
Ah, você...
Que seja, então, aviso,
Fiquemos longe!
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Palavras
Quero me derramar, e palavras não parecem mais ser suficientes -- talvez, por isso, o delírio de que recente e frequentemente elas têm me falhado.
Talvez eu tenha transcendido palavras por um breve momento que me reservou a cena; momento que se cristalizou por entre as fendas do tempo e do espaço enquanto memento (quase mori, mas não). Talvez, agora eu não queira mais retornar por completo.
O papel em branco é minha liberdade: é infinito vezes infinito, é de uma matemática linguagética inapreensível. É liberdade, é fluidez, é vivência, é experiência; é o próprio poço do devir. Ah, o "sublime Oscar Wilde" estava mesmo certo sobre tudo. Talvez seja verdade que bons poetas não vivem a poesia que escrevem; mas poetas ruins vivem a poesia que não conseguem escrever.
Palavras são poderosas e cerceiam as possibilidades do papel em branco. São meros limites, nos quais as sonatas do inconsciente encontram suas pausas. Fui muito e, ao mesmo tempo, pouquíssimo libertina com palavras que escolhi usar, até então.
Ocorre que agora quero me derramar -- e desarmar. Quero me deitar por sobre esse mundo de folhas em branco e, no lugar de palavras, usar aquarela, jogar com os sentidos -- em todos os possíveis sentidos que a palavra "sentidos" possa alcançar.
A experiência, enfim, assume a prometida e devida primazia, e as palavras... Bem, elas dão o contorno e o limite às formas, para que não se desfaçam; elas delimitam o que é real, irreal e desreal, para mim.
Palavras deixaram de ser o início e o fim: passaram a ser o meio.
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Jardim-minado
(...) É como se, antes, eu pairasse na ponta dos pés, como judia em um campo minado de concentração nazista, tremendo da cabeça aos pés, aterrorizada pela possibilidade de me mover e gerar explosões.
Aqui-e-agora, trata-se do mesmo campo minado de concentração nazista, mas meus pés estão inteiros e confiantes no chão. Caminho, me movo: sem medo! Por vezes, esbarro em minas; por outras, pulo de propósito. Frequentemente danço tango aqui e ali, gerando explosão atrás de explosão, em ritmo de fogos de artifício.
Mas a verdadeira beleza de tudo isso reside no seguinte fato incontestável: cada mina, quando explode, explode em flores, de modo que eu só quero continuar a dançar tango até que todo o jardim-minado se torne um jardim florido... Até que eu construa a primavera que nunca reinou.
Eu quero pisar em todas as minas. Eu quero ver todas as flores explodirem das crateras abertas no asfalto. Eu quero transformar puro e duro asfalto em jardim colorido e me coroar monarca desse reino de pétalas e espinhos. Mesmo que aqui ou ali eu me depare com uma rosa negra bem ao lado de uma branca; ou mesmo que algumas flores tenham mais espinhos do que pétalas, cores, odores ou sabores...
Mesmo que eu precise deixar parte de meu sangue para trás ao caminhar por este jardim...
Eu tenho muito sangue no meu corpo. E, honestamente? Eu nunca tive medo de sangrar.
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Uma Breve Nota
Não consigo mais ser pela metade. Quero transbordar; quero me derramar em nuances furtacor; colorir tapetes; brincar de esconde-esconde com as cores que se amontoam no exato ponto em que se encontram duas paredes. Quero acolher as sombras que chegam ao meu quarto em eterna companhia dos raios de luz, tal qual se sombra e luz fossem a própria máscara de Janus: inseparáveis. Quero assumir e aceitar tudo o que é meu, quero regurgitar tudo que me obriguei a engolir e censurar: quero expressar! Quero ser produção desejante; quero fluir e transcender; quero deixar de me afogar. Aprendi a respirar debaixo d'água e, agora, não quero apenas viver. Quero Ser-aí. Quero existir em todas as minhas cores e timbres.
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Pó de estrelas
Lembra dos cacos de vidro em toda parte? No chão, ao meu redor; no teto e nas paredes; no ar que me envolve, no ar que eu respiro; no sangue que corre em minhas veias? Lembra do pó de cristal estilhaçado, amontoado na forma de Andes aos meus pés, que para tudo serviam, menos para me fazer andar? Lembra do medo que eu tinha de poder tocar?
Mas o cientista em mim falou mais alto, e eu precisei sentir aqueles cacos e o pó de cristal nas palmas das minhas mãos, mesmo que eu sangrasse, mesmo que eu me desfizesse. E, que surpresa, não é que não eram cacos? Não era pó de cristal. Era pó de estrelas... Estrelas cadentes, que queimam bem depressa e deixam pelo céu um rastro que logo se apaga; rastro esse que escorre despercebido, como se fosse líquido, mas se amontoa em pó ao chão. Bem como eu.
Contudo, os resultados dessa experiência de contato demonstram que esse pó ainda brilha. Aos que diziam que estrelas não possuíam brilho próprio, eu lhes digo: esse jogo de linguagem não faz mais sentido para mim. E aproximando-me cada vez mais do pó de estrelas em forma de Andes, percebo que esse brilho não somente ainda existe, como é furta-cor, e capaz de iluminar todo um quarto escuro.
Eu vejo os raios, vejo as cores, vejo o brilho... E eles estão dentro de mim. Eu sou os raios, as cores, o brilho; no chão, ou no céu; em forma de pó ou de estrela... Eu sou tudo isso e muito mais.
Agora, apenas espere o tempo de mais uma xícara de chá, pois estou prestes a me tornar uma galáxia inteira. E eu não pretendo me deixar cair e estilhaçar outra vez.
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Quando a Morte fala
Eu, domada
Lá pela época da Alta Idade Média, eu era cerimoniosa, ritualizada; comunitária e enfrentada com resignação. Meus ritos eram cumpridos sem questionamentos, sem caráter dramático, ou gestos de comoção excessivos.
Eu, ladra e vilã
Pouco antes e durante a Renascença, com a ascensão da noção de Sujeito, o individualismo e o antropocentrismo explodem em incontáveis tons de aquarela no céu outrora monocromático. As pessoas passam a me enxergar como aquela que vem impor a finitude. Torno-me vilã: venho a roubar tesouros; roubar aquilo que, pelos poetas e pintores, é aclamado.
Eu e o drama
Do século XIX ao XX, quando venho, trago comigo as cores do drama, e o céu outrora furtacor tinge-se de preto. Inicia-se um processo de afastamento social de mim: torno-me insuportável ao fim de meus trabalhos; torno-me invertida, escamoteada, oculta, vergonhosa e suja. Torno-me algo indesejável. E a irrefreável sinfonia das máquinas da revolução industrial vem para lembrar que o meu lugar é nas margens, pelo máximo de tempo que for possível.
Eu, para lá e para cá
Com a expansão e a consolidação do poder médico institucional e a constituição da família enquanto núcleo das relações afetivas, ocorre um deslocamento ainda maior do meu lugar. São-me proibidas as casas, as ruas, a comunidade: confimam-me às macas dos hospitais.
Eu, teimosa
Contudo, eu sou teimosa, imprevisível, misteriosa. Eu chego. Em qualquer lugar, a qualquer hora: eu chego. Eu permeio os espaços que me são vetados e tinjo o céu com nuances de preto, não importa com quantas máquinas ou procedimentos tentem me manter à espreita. Eu sempre chego.
Mas, é claro, não chego só
Dizem que o luto se passa em cinco fases: negação, raiva, barganha, depressão e, por fim, aceitação. Mas será mesmo que tudo se dá nessa ordem cartesiana, metafísica, linear, quando nem mesmo as cores do céu parecem estar em concordância? O que mais me fascina nos seres humanos, os quais sempre acabam caindo em meu abraço, é que eles também são imprevisíveis, misteriosos... E teimosos.
Por que tanto me temem?
Será que é porque, tal qual um espelho, eu devolvo à humanidade o reflexo da finitude de sua existência? Será que é porque sou ladra; porque roubo a vida das pessoas coisificadas, que se tornam bens passíveis de posse por seus semelhantes?
E por que me vilanizam?
Será que é porque ninguém se atreve a falar abertamente sobre meus trabalhos? Será que é porque sou, de fato, misteriosa, e de meu abraço, ninguém retorna para relatar o quão gentil e misericordiosa eu posso ser?
Quem sou eu, de verdade?
Eu sou aquela que traz o vazio da existência; a finitude natural que é intrínseca a tudo o que tem vida.
Eu sou aquela que acolhe os corpos vencidos, que passaram da validade; que já cumpriram aqui sua missão, quer eles aceitem isso ou não.
Eu não sou vilã, eu sou apenas natural e invencível.
A verdade é que, teimosos como são, os seres humanos, com seus egos inflados por uma importância que não lhes cabe, não se atrevem a aceitar que são tão mortais e finitos quanto o bater de asas de uma frágil borboleta.
Eu sou bela, se você olhar com cuidado.
Posso, até, ser sedutora para aqueles que sofrem por demasia.
Eu sou acolhedora.
Não me tema.
Afinal, eu vou chegar para você também.
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Wet dogs in the Underworld?
I am sitting right where the walls meet at a 90 degrees angle, in a square table, at a bookstore’s overly expensive cafe. The round table I’d very much like to take is already occupied by some ordinary couple, who probably wanders through life like everybody else, without a second thought about existence, it’s meaninglessness and our subsequent duty as existential beings to cut out the “lessness” from the word.
The woman sits with her back turned at me. Her hair is dyed yellow -- a hideous, screaming yellow that, I swear, smells like a wet dog. I’m kindly assuming it was supposed to be blonde. Let us be fair, though: there are some shades of gold, though it heavily depends on where the light shines and how she moves her head. A few waves here and there tell me that she straightens her hair -- in a poorly manner. Does she straighten her ideas as well? Must she go through life all straight, unbent, uptight, and always think of her husband, who is sitting right next to her, and always think of her children, who are probably playing video games at their 5-bedroom beach house? Are the waves of her hair a failed attempt to mirror the waves of the beach she probably beholds every day? Does she really see the beach, though, or has it already become part of her furniture, which she can’t live without but is no longer enough to capture her attention? Is she merely a wet dog who won’t let go of leftover bones, even after they are rotten?
Surely, that seems to be the case, for her husband is sitting right next to her. He has grizzly hair, and he fluctuates between looking at life and checking his phone that never rings or vibrates. He pays his wife no mind -- it is like she is not even there; like he doesn’t notice that black hair has started to grow out of the woman’s head -- have her thoughts grown dark as well? I wonder about the husband, though, for he has plenty of white hair and, if white must be the color of experience, then... But, oh, goodness!, how many colors MUST he have in his hair, since white is made of rainbows! Does his wife notice the colors in his hair? Are his thoughts technicolor? Does he feel every nuance vibrate in his mind?
For they used to vibrate in mine... However, I have lost my colors. It has all grown very dark here inside, just as the blackness of my hair. I have lost sight of the shades of the very few white strands that so stubbornly made their way through the black mass -- or mess of a mass. If one didn't know better, one could fancy they've been swallowed up by the ever-growing darkness.
My black hair falls flat, although I frequently go out of my way to fabricate some ringlets. Sometimes I am successful; at other times, I fail miserably. Sometimes, my hair embodies that of Apollo; at others, that of Dionysius. Lately, though, it feels as if Hades has been twisting the very ends of my hair, forcing ringlets to pop out and point everywhere; forcing distorted thoughts into my head. Why, the ringlets do look beautiful, thank you very much, but like every Pandora’s box, each ringlet holds its own deadly secret; each thought self-explodes into another thought into another thought into another thought into another ad infinitum until I no longer know, or feel, or look, or live or even breathe -- I just think.
Hades pulls me by the hair, as a horseman would a horse's reins, straight to the Underworld, where I am kept imprisoned, like Ariel in his tree. But, you see, the thing is: Shakespeare's Ariel had beautiful wings and magical powers; he could fly and take countless different forms, whereas I am stuck with... Well... Curling my hair at Hades' mercy. Oh, would I had his powers of controlling storms... Maybe then I could end this raging one that tears my soul asunder and bring back some rainbows on which I would most certainly dare to tiptoe.
But even if I shaved my head and freed myself from the grip that Hades has on my hair, whatever would I do with the grip he has on my heartstrings? He plays them as one would a violin; however, this melody is terribly out of tune -- harsh, even. And though it tortures my ears, I am beginning to get accustomed to the sound... It hypnotizes me; it immobilizes me -- but the only thing it doesn't do is put me to sleep. Here, I never sleep. Can anybody, please, just come and sing me to sleep? Why isn't there a Puck around when you most need one, to transform this mess into A Midsummer Night's Dream?
I don't want to fight this war against Hades anymore: it is way too exhausting. I say, let him have his way with me. Maybe I do belong in the Underworld after all, as it seems to have been the common sense in one of those alternate universes I choose to never visit but sometimes come crawling right back at me... Maybe the time has come for me to accept Dionysius' embrace and let go of all I thought I knew about Apollo... Hell, I would be willing to, if only that would so much as cut me some heartstrings.
I just wish someone would come and sing me to sleep... But maybe there isn't anyone in their right mind who would dare come down here, for it is much easier to get into the Underworld than it is to fly away -- and I should know. Maybe I should learn how to sing and just do it myself -- lest I become a wet dog who won’t let go of Hades’ rotten leftover bones.
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For Hamlet and the trifling of his favor, Hold it a fashion and a toy in blood, A violet in the youth of primy nature, Forward, not permanent, sweet, not lasting, The perfume and suppliance of a minute. No more.
Laertes, 1.3 (Hamlet, William Shakespeare)
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You gifted with the power of pleasing him? You of importance to him in any way? Go! your folly sickens me. And you have derived pleasure from occasional tokens of preference -- equivocal tokens shown by a gentleman of family and a man of the world to a dependant and a novice. How dared you? Poor stupid dupe!
Jane Eyre, Charlotte Brontë.
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You loved me when I was high, but you left me when I was low. But maybe it isn't a bad thing: to you, I shall always be the shooting star: bright, beautiful, warm, intense -- and gone in the blink of an eye.
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