Um blogue que finalmente analisa e aborda a parte sentimental dos desenhos animados dos anos 2000. (Spoilers!!)
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Inside Job
Num tom mais leve e divertido, hoje vou falar de Inside Job, uma série de animação para adultos que, inicialmente, não aparenta destacar-se das restantes. No entanto, quando descobri que foi criada pela Shion Takeuchi, que tinha trabalhado previamente em Regular Show e Gravity Falls, soube que seria impossível ser só mais uma animação para adultos com piadas exageradas e extremamente sexuais.
A série segue Reagan, uma cientista/inventora da Cognito INC – empresa que controla o rumo da humanidade, onde as teorias da conspiração mais absurdas são confirmadas – que vai ser promovida ao cargo de CEO. A Reagan é uma personagem ambiciosa, focada e com poucas “people skills”, a sua vida revolve em torno do trabalho, porém, tudo à sua volta se apresenta como entrave ao progresso e sucesso da sua carreira. Assim sendo, momentos antes de ser considerada CEO, Raegan recebe a notícia de que vai partilhar o cargo com Brett, uma personagem que é, essencialmente, só “people skills” e que carece de qualquer competência para o trabalho.
COGNITO INC
A empresa Cognito inc, vinda, claramente, do nome “incognito", é responsável por todas as teorias da conspiração. Neste universo, a humanidade é controlada por um governo sombra, constituído por seres extremamente mais avançados e com grande sabedoria. Dentro da empresa existem vários departamentos que tratam de assuntos como a aterragem na Lua, redes sociais, manipulação do presidente, entre muitos outros. Deixo aqui o trailer que explica esta parte bem melhor e mostra um pouco do humor da série:
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Reagan – Rand
A necessidade constante de se mostrar capaz e ser bem-sucedida no seu trabalho foi despoletada da relação que Raegan mantém com o seu pai, Rand, que considera a existência de apenas dois tipos de pessoas: as que, como eles, são inteligentes e controlam o mundo e os normativos, que acabam por seguir um estilo de vida medíocre. Rand costumava trabalhar na Cognito Inc até ser despedido por quase revelar o governo sombra e querer destruir o sol #Relatable.
Reagan desenvolveu um conjunto de dificuldades empáticas devido à pressão psicológica e científica do seu pai. Desde pequena que lhe era imposto que soubesse mais que os seus colegas e que seguisse uma vertente mais tecnológica e racional. As suas “people skills” nunca foram verdadeiramente formadas, uma vez que não conseguiu criar qualquer laço de amizade durante a sua fase de desenvolvimento. Num dos episódios finais da temporada, Reagan viaja pelas suas memórias para descobrir uma password, no entanto investiga mais profundamente os confins do seu cérebro, desbloqueando algumas das suas memórias reprimidas. Para além de reviver alguns dos momentos mais traumáticos da sua infância, vai de encontro a uma memória de um amigo, do qual parecia não ter consciência até então. Rapidamente descobre que a sua existência foi apagada por Rand, que o considerou normal demais para a sua filha, correndo o “risco” de atrasar o seu intelecto.
Reagan, com razão, explode emocionalmente e corta toda a relação que tinha com o seu pai. Este momento de rutura é de extrema importância para o desenvolvimento da personagem que acredito e espero que na segunda temporada se venha a afirmar cada vez mais. Paralelamente, ao longo desta primeira parte, Brett revela-se uma personagem bastante importante e, sinceramente, amável, algo que não seria de esperar devido ao tipo de personalidade que as animações adultas têm vindo a habituar as suas audiências.
Por fim, recomendo que vejam esta série, ao jantar ou à tarde, depois de entregas de trabalhos, a qualquer hora. É leve o suficiente para não cansar e engraçada o suficiente para manter a curiosidade.
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Arcane, terceiro ato.
O fim de Arcane trouxe-me duas reflexões: a implementação do conceito “Show Not Tell” está extremamente bem feita e, por ser uma série tão boa, as mais pequenas falhas são facilmente visíveis.
Paralelamente, este último ato pareceu-me estar na mão da Jinx, que acabou por ser o elo de ligação e condutor da ação. Houve, também, uma boa quantidade de cenas de luta, onde pude constatar a qualidade da animação e da trilha sonora da série.
Show Not Tell
O conceito de “Show Not Tell”, como o nome indica, é a arte de mostrar ao espectador a ideia que se pretende passar sem ter a necessidade de a descrever através do diálogo. Em vez de contar a trágica história da Jinx, por exemplo, Arcane mostrou o que despoletou o seu lado mais insano. Desta forma, a animação consegue atrair-nos e manter-nos interessados na história, e não quebrar a ilusão de imersão, simultaneamente. Aliado a este conceito, o “visual storytelling” detém uma grande importância na série, é através dele que o “show not tell” ganha expressão.
Nesse sentido, no terceiro ato, já com as características das personagens bem assentes, Arcane desenvolveu o seu enredo, mas os pequenos detalhes não passam despercebidos. O meu favorito é a cor dos olhos das personagens, que se vieram a colorir à medida que as personagens se desenvolviam. O melhor exemplo é o de Jinx e Vi, que no primeiro ato, quando eram ainda crianças, tinham olhos acinzentados e que neste último ato as suas cores são reveladas:
Para além disso, algo que aprecio bastante desde início é o nível de produção que existe em todos os momentos, inclusivamente em situações mais calmas, como conversas ou reflexões das personagens. Estes momentos dão uma nova dimensão ao enredo, tudo tem o seu propósito e cada conversa é importante. O “visual story telling” brilha em qualquer uma das vertentes, seja na forma que o enquadramento da cena se adapta à situação do enredo em que se encontra, ou na forma em que a câmara acompanha os movimentos mais rápidos e o estilo de arte é alterado para consolidar o ambiente e sensação da cena.
Mudança de estilo da arte na cena de luta entre Jinx e Ekko.
Enquadramento da cena do jantar.
As falhas de Arcane
Arcane é uma animação excelente, do enredo à ação, dos sentimentos às falas. Contudo, não é perfeita, e a sua qualidade permite descobrir os mais ínfimos erros, ou falhas. Assim sendo, identifiquei gralhas em sequências onde o espectador foi forçado a assumir o que se passa na cabeça das personagens, o que criou uma espécie de buraco lógico, que apesar de não ser de extrema relevância dá a sensação de que forçaram rapidez ao contar a história. Falo especificamente sobre a relação entre Jinx e Ekko e entre Viktor e Sky.
No sétimo episódio somos deparados com uma fantástica cena de ação, onde a Jinx e o Ekko lutam. A animação está fenomenal e a troca de estilo de arte vincou os movimentos das personagens, porém, este “face-off” e a própria construção da cena dá a entender que este tipo de interação acontecia quando eram crianças, de uma forma mais amigável, apesar de nunca ter sido revelada nenhuma interação entre os dois no primeiro ato. Esta quebra de raciocínio pode confundir alguns espectadores, já que a restante construção de relações está bastante explícita.
Por fim, no penúltimo episódio, Viktor comete um erro mortal que atinge Sky, a sua aluna/estagiária que entrou no seu laboratório para apresentar uma das suas pesquisas. Apesar de estar explícito o sentimento romântico que Sky desenvolve por Viktor, nunca foi expresso o mesmo por parte do cientista, que muitas das vezes a ignorava. Assim sendo, o luto de Viktor faz sentido, contudo foi retratado como se ele tivesse uma relação mais forte com Sky, levando-o a considerar suicidar-se. Relembro que muito do conhecimento de Viktor foi apresentado por Singe, que não vê limites ou moralidades nas suas experiências – ética com a qual Viktor se identificou previamente a este acontecimento.
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Arcane, segundo ato.
Como já tinha referido no post anterior, Arcane segue uma estrutura que está dividida em três atos. Anteriormente, escrevi sobre as personagens, o tema e o tom da série e a presença da arte nouveau; para uma melhor compreensão do que vou abordar hoje, recomendo a leitura dessa publicação. (https://almanimada.tumblr.com/post/669758908157558784/arcane-primeiro-ato)
Dualidade e contraste entre personagens
No segundo ato, o tema da dualidade é vincado e mais aprofundado através de fatores subjetivos, nomeadamente a personalidade das personagens e na situação em que se encontram. Para além disso, um novo tipo de narrativa é utilizado: “Narrative Foils”, que, de uma forma sumarizada, serve para acentuar as virtudes dos heróis através dos defeitos e atitudes dos vilões. O “Foil” mais bem conhecido da cultura pop, na minha opinião, será o Joker e o Batman, em que a personalidade lunática e imprevisível de Joker intensifica o caráter calmo e justiceiro de Batman.
No entanto, Arcane não se rege pelo “normal”, a forma como as personagens são escritas não permite uma análise tão simples como a conclusão de que um lado é “bom” e outro “mau”. O espectador não pode adotar este tipo de postura, porque existem “foils” em toda a parte. No fundo, é esta a chave para a curiosidade e envolvimento dos que veem a série.
Assim sendo, não vou apresentar todos os contrastes evidentes, mas sim os que mais me captaram à atenção ao longo da animação.
Vi e Caitlyn e Jinx e Silco e Jace e Victor…
Vi é forte, destemida e impulsionada pelas várias desgraças que vivenciou. Nasceu na “Undercity” e desde logo aprendeu as consequências da guerra, quando descobriu da morte dos seus pais e assumiu a responsabilidade de proteger a sua irmã, Powder (Jinx). Mais tarde presenciou, também, a morte do seu pai adotivo, Vander, consequência de uma bomba que Powder lançou. A mágoa e raiva levaram-na a abandonar a irmã e desde então que o seu objetivo é saber do seu paradeiro para a voltar a proteger. Vi é sobretudo alguém que procura resolver problemas e a sua experiência de vida concede-lhe a “vantagem” de não ter nada a perder.
Paralelamente, Caitlyn nasceu em Piltover, num ambiente muito menos caótico e bastante mais carinhoso. É uma polícia exemplar, contudo procura libertar-se das rédeas dos seus pais, que não lhe permitem participar em situações de perigo. O “Foil” está patente na dualidade das suas vidas e ambientes, tornando a sua união como companheiras extremamente interessante para o seu desenvolvimento. Por um lado, temos a rebeldia e nova força de Caitlyn, por outro, um “acalmar” de Vi. A sua determinação e convicção mantêm-se, mas a forma como encara as situações é bastante mais leviana.
Relativamente ao “foil” entre a Jinx e a Vi, ambas têm origem do mesmo ambiente e família, contudo a história muda quando Vi a abandona e Silco a adota. Algo que não foi descrito na série, para além da personalidade de Jinx, é o seu luto – desde Vander e os amigos que tinha, até ao abandono da irmã – o que concede ao telespectador a oportunidade de retirar qualquer conclusão sobre a mesma. Extremamente traumatizada, Jinx é adotada pelo vilão que tentava travar e a sua educação passa a estar entregue a um idealista sem fronteiras – Silco – que por sua vez é o “Foil” de Vander, que é pragmático e altruísta. Desta forma, os paralelismos vão de encontro ao contraste entre Jinx e Vi: a instabilidade mental e insegurança sobre a sua identidade fazem com que o caráter minimamente mais controlado e sereno de Vi ganhem destaque e vice-versa.
Curiosamente, Silco pertence a mais um “Foil”: ao de Jayce, o cientista por detrás de Hex Tech e melhor amigo de Caitlyn. Neste segundo ato, ambos se encontram em posições de poder onde se vêm obrigados a contornar os entraves que os membros das suas próprias “assembleias” lhes colocam. Novamente, a discórdia e violência de Silco destaca a pacificidade e discurso persuasivo de Jayce. Por fim, Jayce é “foil” do seu colega cientista Viktor, que apesar de não ser evidente, o contraste entre os dois é enorme. Nascido numa família nobre de Piltover, Jayce cresceu com todas as possibilidades na palma da sua mão. Fisicamente é bem constituído e os seus avanços científicos e tecnológicos tornaram-no numa pessoa influente e famosa. Por outro lado, Viktor nasceu na Undercity, sempre foi “invisível” e silencioso e nasceu com uma terrível doença. Jayce desenvolve a Hex Tech porque pretende melhorar a vida dos cidadãos de Piltover e fazer parte do progresso da cidade, já Viktor desenvolveu os seus conhecimentos por necessidade e curiosidade. Apesar das várias diferenças, esta não é uma dicotomia que mede moralidade ou forças, mas que revela mais pormenorizadamente o desenvolvimento destas duas personagens, uma vez que estamos constantemente a ver os lados opostos da mesma moeda.
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Arcane, primeiro ato.
Baseada no jogo League of Legends, Arcane conseguiu ultrapassar todas as minhas expectativas – que eram francamente baixas – e imergir-me num fantástico novo mundo. Os criadores escreveram as personagens de uma forma extraordinária e complexa, e tiveram a capacidade de desenvolver uma história coerente com a pouca informação que o jogo oferecia*. Para além disto, estes nove episódios estão repletos de detalhes escondidos na arte e arquitetura. Apesar de ainda só ter uma temporada, esta animação está dividida em 3 atos e por essa razão decidi fazer três publicações diferentes que sairão nas próximas duas semanas.
* refiro-me ao "background" e origem de certas personagens, bem como a sua personalidade. O jogo aparenta oferecer bastante informação no que toca a worldbuilding e tem mantido uma narrativa coerente.
Tema e Tom
Em todas as histórias é necessário estabelecer um tema – a mensagem que pretende passar – e um tom – a atitude e personalidade com que o tema é expresso.
Arcane destaca-se pela forma como retira, de certa forma, a subjetividade do tema, sendo tão detalhado que o espectador identifica desde logo a existência de uma Dualidade. Este tema está patente na diferença de qualidade de vida entre as cidades de Piltover e Zaun (ou “undercity”), bem como na relação entre as personagens, tópico que será abordado na próxima publicação.
Vander
Silco
A dualidade mais prominente é entre estas duas personagens – Vander optou por um caminho de paz e Silco vê sucesso em agressão e poder.
O tom de Arcane é flexível, no sentido em que tem a peculiaridade de alterar a interação do consumidor com a ficção. Neste primeiro ato, serve-se de um tom mais leviano que permite ao espectador criar uma ligação de familiaridade com o mundo e as personagens. Contudo, de modo a retratar o tema da dualidade, o tom é alterado de forma abrupta e impactante, tornando-se mais negro e consequente. A constante demonstração de cenas que retratam a condição humana e as adversidades pelas quais as personagens passam define o tom como realista, criando uma relação de empatia com o espectador
Nos primeiros dois episódios, somos constantemente presenteados com a vida e problemas de crianças - Vi, Powder, Mylo e Claggor – que são no fundo uma exploração da sua identidade, autoestima e lealdade. Já no terceiro episódio existe uma mudança de paradigma; se até então os momentos mais obscuros se mantiveram em segundo plano, a partir deste momento são os “atores principais”. As personagens encaram agora um perigo muito maior: morte, sangue, raptos… No mundo em que estão inseridas, estas crianças não são protegidas, não existe uma preocupação em preservar a sua inocência e simpatizar com a sua fragilidade.
Contrariamente a muitas outras narrativas que utilizam o mesmo tipo de enredo, Arcane apresenta uma das crianças – Powder – como o gatilho da violência. Neste caso, numa tentativa de se mostrar capaz e relevante para a missão do grupo, Powder detona um explosivo que acaba por ter consequências mortais para Mylo e Clogger, assim como Vander, o adulto visto como um pai para estas crianças. Desta forma, a série conseguiu explorar muito bem os sentimentos das personagens depois do acontecimento: A culpa e pânico de Powder (mais tarde conhecida por Jinx), a raiva de Vi e a natureza predatória de Silco.
Furiosa, Vi diz a Powder que ela é uma "Jinx" (expressão inglesa que caracteriza alguém que só traz azar).
Silco acolhe Powder, que daqui para frente adotará o nome "Jinx".
Fica também esclarecida a ideia de que as personagens podem morrer definitivamente na série, algo que é várias vezes contornado em animações.
Arte
Cada detalhe é pertinente em Arcane, especialmente quando se trata de um detalhe visual e permanente ao longo da temporada. No início do segundo episódio, podemos ver um disco a ser tocado, com as imagens de Vi e Jinx ilustradas. Este tipo de arte faz parte do movimento de Arte Nouveau, que surgiu no final do Século XIX, quando a sociedade passava por mudanças sociais, avanços industriais e pelo crescimento da burguesia industrial. É caracterizado por linhas exageradas, traços alongados, com espirais que fazem lembrar flores e folhagem. Este movimento não só está presente nos discos, como também nas pinturas urbanas, arquitetura, janelas e vitrais. Facilmente se relaciona a cidade de Piltover com estas pinturas, sendo as personagens principais, Vi e Jinx, referência desta arte, uma vez que a figura feminina é um elemento prominente do movimento.
Num ponto de vista mais atual, a própria animação é fabulosa. Contrariamente ao que a Pixar e a Dreamworks nos tem vindo a habituar, a animação 3D não precisa de ser exagerada ou exclusiva. Arcane seguiu o exemplo de Spiderman: into the spider-verse e juntou animação 3D com 2D. Desta forma, os fundos passaram a ser mais realistas e bonitos, sem ofuscarem as personagens 3D. O mundo tornou-se mais imersivo e desbloquearam um conjunto de possibilidades artísticas que lhes permitiu criar cenas impactantes e vibrantes.
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Cannis Lupus
Na semana passada falava sobre “Isle of Dogs”, portanto, esta publicação não pode saltar o “Fantastic Mr. Fox”. Se há algo que admiro em Wes Anderson no que diz respeito ao stop motion é a paciência de trazer cada detalhe dos movimentos para o ecrã de forma fluída e realista, sem perder o ritmo de uma animação.
“Fantastic Mr. Fox” foi criado em 2009 e retrata a vida de Mr. Fox, um raposo que deixou de ser ladrão quando descobriu que a sua mulher, Felicity Fox, estava grávida. Ao longo do filme, Mr. Fox torna-se cada vez mais ambicioso: não deseja viver num buraco, mas sim numa árvore e pretende regressar à sua vida antiga. Com a ajuda de um amigo, Mr. Fox faz o seu maior assalto, onde rouba galinhas, patos e cidra. Furiosos, os três donos dos armazéns conduzem uma caça à raposa e todos os animais são comprometidos. A ironia cobre Mr. Fox quando se vê obrigado a viver num buraco para escapar aos caçadores.
A ação desta história é bastante apelativa, no entanto, sendo quem sou, importa-me falar de uma cena em específico, a cena do Lobo (Cannis Lupus).
Metódico e racional, Mr. Fox podia retratar, sem dúvida, um ser humano qualquer. Tem responsabilidades dentro da sua família e do seu trabalho, tem um estatuto social e ambições próprias, sabe latim e muitas outras línguas. Adicionalmente, sofre de uma crise de identidade tão forte que arrisca tudo e todos que conhece.
Mr. Fox apercebe-se da sua necessidade de espantar toda a gente, de aparentar ser o melhor naquilo que faz, de ser o “Fantástico Mr. Fox”, mas que no fundo o que procura é perigo e galinhas, porque é um animal selvagem e é nisso que é bom.
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Na minha opinião, esta é das cenas visualmente mais bonitas do filme.
Para emendar os seus erros, a personagem principal resgata o seu sobrinho das mãos dos caçadores e foge numa mota. A meio do caminho trava para observar um Lobo. Há dois fatores de grande importância nesta cena:
1. Mr. Fox tem uma fobia a Lobos.
2. Não conseguem comunicar.
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Ao contrário do Lobo, Mr. Fox leva uma vida civilizada, com ordem, aparência e racionalidade. A sua vontade de ser o melhor em tudo não é de todo animalesca e o seu fascínio com este Lobo vinca essa ideia. Visualmente existe uma linha branca, de neve, que separa o ambiente do Lobo do ambiente de Mr. Fox. O animal é contrastante, tem um olhar intenso e não anda exclusivamente com as patas traseiras. O silêncio dele é ensurdecedor, no sentido em que não precisa de falar ou emitir qualquer som para que se perceba a sua essência, mas o mais interessante de tudo é que não entende Mr. Fox. É verdadeiramente selvagem e por isso responde apenas ao gesto que fez, talvez por ser algo simples de replicar, ou talvez por ser um símbolo de resistência aos seres humanos, a única coisa que aparentam ter em comum.
"Fantastic Mr. Fox" destaca-se dos restantes filmes porque não sugere um caminho certo, ou ideal. As personagens encontram equilíbrio aceitando a sua natureza, mas mantendo os conhecimentos que sempre tiveram. É nesta cena, onde os dois mundos colidem, que a crise existencial de Mr. Fox acaba: ele é um "wild animal", mas não é apenas isso que o define. É também um excelente atleta, jornalista, pai, tio, marido, líder... Enfim, é o Fantastic Mr. Fox.
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A ilha dos cães
Wes Anderson sempre teve a sua peculiaridade. Simetria, imagem centrada, humor sentimental e um talento especial em tornar a assuntos sérios mais toleráveis e menos pesados. Os seus filmes parecem mesmo isso: filmes. É tudo perfeitamente pensado. Estou agora a passar por um momento um pouco mais dramático na minha vida: fiz mais um ano, sozinha, no quarto, porque o meu último ato como adolescente foi contrair um vírus verdadeiramente chato. Fez-me lembrar de dois filmes de Anderson, ambos de stop motion: A Ilha dos Cães, e O Fantástico Mr. Fox. A grande diferença entre estas duas animações são as emoções que abordam - por um lado, temos a procura de identidade por parte do Mr. Fox e, por outro, temos a raiva e angústia do pequeno piloto, quando descobriu que já não tinha o seu cão a seu lado. Nesta publicação escrevo apenas sobre a ilha dos cães.
Numa cidade fictícia japonesa chamada Megasaki, um vírus canino instaura o caos os entre os cidadãos. Vistos como uma ameaça à saúde pública, todos os cães foram deportados para uma ilha vizinha, a ilha de lixo. Existe uma grande conspiração no governo e a resistência acredita que a doença dos cães foi criada por eles para se iniciar uma ditadura (de gatos*). Neste filme não há legendas, tudo o que é dito em japonês é traduzido oralmente, ou, então, fica apenas em japonês.
*existe uma dicotomia gatos-cães durante o filme inteiro. Apesar dos gatos não interferirem na história realmente, servem como simbolismo dos vilões.
O sobrinho do prefeito, Atari, órfão devido a um acidente de comboio, viu o seu cão, spots, a ser o primeiro a partir para essa ilha. Numa imagem escura, onde mal se vê a personagem, sente-se a raiva e tristeza do “pequeno piloto” ao ver o seu fiel companheiro a desaparecer. Com doze anos, Atari perdeu os pais e o único amigo.
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A cena de que falo acima encontra-se a partir dos 3 minutos até aos 3 minutos e 27 segundos.
Coberto de raiva e coragem, Atari, parte em busca do seu cão e vai até à ilha num pequeno avião. Quando aterra, o pequeno piloto encontra-se com uma matilha. Como os espectadores não são, à partida, fluentes em japonês, não conseguem compreender o que Atari diz, tal como os cães. Esta característica adiciona uma camada de realidade e empatia ao filme, que nos obriga a interpretar o filme do ponto de vista das personagens principais, os cães.
Chief, um dos cães da matilha, intitula-se como rafeiro, não gosta de pessoas e prefere lixo a ração. Mais tarde na história descobre-se que chegou a ter donos, mas fugiu depois de morder um dos membros da família, assustado com o conceito de “festas”. Habituado a ser cão de rua, solitário, perseguido por funcionários do canil, percebe-se a angústia com que vive. Ser lançado para a ilha do lixo foi apenas mais um infortúnio numa vida de rejeição e culpa.
Porém, todos os cães adoram miúdos de doze anos**, especialmente quando procuram o seu melhor amigo, por isso Chief concede-lhe um voto de confiança.
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** referente à expressão "os cães adoram miúdos de doze anos."
Esta aventura é impulsionada por uma variedade de sentimentos, com que todos os espectadores se conseguem relacionar. A raiva, tristeza, solidão e culpa são muitas vezes postas de parte ou contidas em demasia porque não são “boas” ou não sabem bem. Neste filme, são essas emoções que fazem a história progredir. O mesmo acontece na vida real, se tudo estiver sempre bem, pouco faremos para o alterar. É muitas das vezes no desafio que surge a mudança. No entanto, se nos permitirmos lidar com o que estamos a viver, quer seja isolamento numa ilha, num quarto, estar longe de quem gostamos, estamos a progredir e a crescer. O pequeno piloto transformou a sua tristeza em ação, recuperou o seu melhor amigo e inspirou uma revolução. (e este post).
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Zuko Alone
“Água, Terra, Fogo, Ar. Antigamente, as quatro nações viviam em harmonia, mas tudo mudou quando a nação do fogo atacou. Só o Avatar, senhor dos quatro elementos, os pode deter, mas quando o mundo mais precisou dele… ele desapareceu. Cem anos passaram, até que eu e o meu irmão descobrimos o novo Avatar, um airbender chamado Aang. Apesar de todo o seu poder, ele ainda tem muito que aprender, mas eu acredito que o Aang vai conseguir salvar o mundo.”
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Assim começa Avatar: The last airbender, bem como a minha vontade de ter um bisonte voador (mãe, estou quase a fazer anos).
Criada por Michael Dante DiMartino e Bryan Konietzko, esta animação estreou em 2005 no Nickelodeon e tem uma atenção ao detalhe fabulosa. As quatro nações estão assentes nas culturas Inuit (Água), Chinesa (Terra), Japonesa (Fogo) e Tibetana (Ar) e para controlar os elementos, as personagens devem nascer* com a habilidade de “bend”, que aliada a movimentos de artes marciais** conseguem manipular o seu elemento.
*ao longo da série não existe uma explicação concreta sobre como se adquire o “bending”, estando implícita a ideia de que pode ser algo genético, espiritual, religioso ou algo relacionado com a natureza. Sabe-se, porém, que nem toda a gente consegue esse poder e que envolve energia, como uma espécie de chacra. Cada elemento está associado a um bending, por exemplo: água – waterbending.
** Para que a animação fosse o mais realista possível, os produtores contrataram peritos em artes marciais de quem aprenderam e copiaram as formas e posições do corpo. Assim sendo, as bases de Tai chi estão presentes em waterbending, Hung Gar em earthbending, Shaolin do Norte em firebending e, por fim, Ba Gua em airbending.
As personagens são complexas, curiosas e emotivas. Questionam-se e tentam entender o que se passa à sua volta, cometem erros e crescem. O melhor exemplo da escrita das personagens é Zuko, o príncipe da nação do fogo que procura redenção depois de ter sido deserdado pelo seu pai, Ozai – o senhor do fogo. Desde então que Zuko viaja com o seu tio, Iroh, em busca do Avatar, o único obstáculo na conquista do mundo. No entanto, no episódio que vou abordar, Zuko está sozinho e renegou as suas ligações ao reino do fogo.
Este episódio aborda todas as vertentes da escrita em avatar, desde “worldbuilding”, criação do mundo e ambiente, até à psicologia e crescimento das personagens. Repleto de Flash Backs e um olhar mais profundo sobre o conceito de guerra, “Zuko Alone” retrata, tal como o título indica, a viagem solitária de Zuko, depois de ter renegado a sua ligação à Nação do fogo e de se ter afastado de Iroh.
Montado numa avestruz-cavalo, percorre um campo deserto onde estão enterradas moedas de pedra, utilizadas pelo reino da Terra para lutar. Desde logo somos presenteados por uma subtileza de worldbuilding - exposição ambiental – que é um verdadeiro “show not tell”. Apesar da cena ter apenas uns segundos, o espectador fica com a informação de que naquele campo houve uma batalha devastadora há muito tempo atrás, o que contribui para a ideia de que o Reino da Terra está dividido interiormente.
Terreno de guerra do reino da Terra.
A exaustão e sede de Zuko levam-no a uma aldeia, que, apesar de pertencer ao Reino da Terra, é pobre e não tem earthbenders, à exceção do antagonista do episódio: Gow. A história principal segue Zuko, que mantém a sua identidade anónima perante a família que o acolhe depois de fazer frente aos guardas da Terra, conhecidos por abusarem do seu poder e aterrorizar a população. A personagem principal cria uma relação de amizade com Lee, o filho mais novo da família, que cai por terra quando Zuko utiliza o seu firebending para proteger a família. Seria simples para os escritores de Avatar manter a sequência tradicional de que a população daquela aldeia fosse compreensiva e perdoasse Zuko, no entanto as consequências da guerra falam mais alto e o medo instaura-se, levando Lee, agora aterrorizado, a rejeitá-lo por completo.
Neste Gif, Lee diz a Zuko que o odeia. "I hate you!".
Ao longo do episódio, Zuko tem flashbacks da sua infância, maioritariamente referentes à sua mãe e irmã, já que o seu pai sempre se mostrou uma figura autoritária, mas distante.
No primeiro flashback, o espectador tem uma melhor noção de que Zuko tenta ser algo que não é. Existe uma forte comparação com a sua irmã, Azula, que se revela muito mais ágil, fria e calculista que ele. Esta diferença está patente quando as crianças recebem presentes de Iroh, que acaba de conquistar Ba Sing Se e oferece uma faca a Zuko e uma boneca a Azula. Depois de perceber que Iroh não lhe dá o devido valor e não lhe será útil, Azula inicia a conversa que se o seu tio não sobreviver à guerra, Ozai subirá ao poder, demonstrando frieza e desprezo.
Após recebida a triste notícia de que o filho de Iroh faleceu em combate, Azula menospreza a decisão do seu regresso, já Zuko encontra-se apreensivo e empático com a situação. Esta dinâmica estende-se para os restantes flashbacks.
Verifica-se que a única pessoa que apoia Zuko é a mãe, que desaparece pouco tempo depois de Ozai sugerir subir ao trono em vez de Iroh. Antes desse incidente, Azula inquieta Zuko com a ideia de que Ozai o irá matar, como castigo por ter sugerido ser senhor do fogo antes do seu irmão. Receoso, mas acostumado à personalidade manipulativa da irmã, Zuko repete a frase “Azula always lies” - “A Azula mente sempre”.
O último flashback é o culminar da manipulação de Ozai, que sobe ao trono depois do seu pai falecer durante a noite. O ambiente familiar em que Zuko está inserido não valoriza a bondade nem a empatia, especialmente após o desaparecimento da sua mãe, obrigando-o a adaptar-se e, por consequência, tornar-se num “vilão” sedento de aprovação.
Por fim, Zuko tenta agora encontrar o seu próprio caminho e destacar-se da sua família. A tarefa é árdua, o príncipe ainda é reconhecido e a sua fama persegue-o, porém destaco a sensação de que o espectador está perante um mundo vivido, no sentido em que se assemelha à realidade - existem locais históricos e as personagens não estão alheias ao que os rodeia – tornando a experiência de Avatar muito mais imersiva e pessoal.
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The Midnight Gospel - You Cry.
Do criador de Adventure Time, Pendleton Ward (Pen), emerge uma nova série de animação, chamada The Midnight Gospel, que ilustra o podcast “The Duncan Trussell family hour”. Ao longo dos 8 episódios, Clancy, a personagem principal representada por Duncan Trussell, vai explorando vários planetas através de uma máquina virtual que simula as suas experiências e sensações. Clancy tem um “spacecast” e aproveita estas aventuras para entrevistar as pessoas que vai encontrando pelo caminho. São histórias engraçadas, emotivas, esquisitas, fantásticas e surreais que aliadas à estética e cores da animação prendem o espectador ao ecrã. Apesar do programa se centrar, maioritariamente, no spacecast, existe uma “story line” secundária, isto é, uma história alternativa à principal, que se vai desenvolvendo ao mesmo tempo, tornando a série numa espécie de “híbrido perfeito” entre animação e podcast.
O último episódio da primeira temporada, “Mouse of silver”, aborda o tema da vida e da morte, numa conversa honesta e necessária que Duncan teve com a sua falecida mãe, Deneen Fending, em 2013.
Através de uma sequência de imagens visualmente maravilhosas, o espectador vê Duncan a passar pelas várias fases da vida: desde que é um bebé até ao seu corpo se transfigurar.
Este é o único episódio em que não se refere à personagem principal como Clancy.
No fundo decorrem inúmeros testes sobre as emoções, conduzidos por ursos de peluche, que realçam o cariz emotivo e possivelmente devastador da conversa. Enquanto Duncan progride no seu crescimento, a mãe acompanha-o até ao momento em que a vemos falecer e Renascer, seguindo o tema da discussão onde se debate se a meditação serve como preparação para morte ou para a vida. Esta troca de ideias é bastante aprofundada, realçando alguns métodos de meditação. Senti quase como obrigatório mergulhar no momento e experimentar um desses métodos, o que tornou o episódio muito mais imersivo e intenso.
Para além do que acontece por detrás da ação principal, a própria conversa está repleta de metáforas sobre energia, que desenvolvem respostas para se lidar com os momentos difíceis da vida. Uma das conclusões mais concretas centra-se na reatividade e em como se tivermos noção da nossa reatividade podemos controlar a forma de como respondemos à mesma em vez de repetir essa ação. A conversa estende-se por mais algum tempo, tornando notória a ideia de que este podcast serve de preparação para Duncan enfrentar a morte da mãe.
Neste momento, o espectador é informado sobre detalhes da relação entre as duas personagens e do estado terminal do cancro da mãe de Duncan. Os locutores estão dentro de uma esfera com porta de coração e encontram-se frente a frente numa mesa cheia de velas, onde se inicia uma segunda fase deste podcast, mais séria e frágil.
Após ter sido várias vezes informada da sua efemeridade, Deneen teve de a enfrentar quando lhe foi aconselhado planear a sua própria cremação. A calma, suavidade e aceitação com que fala sobre este assunto é reconfortante e simultaneamente assustador. Segue-se o facto de que ninguém escapa à morte, salientando de que esse momento faz parte do nosso tempo no mundo, de que somos parte de um todo que aparece e desaparece. A ideia de que existem casos especiais está diretamente ligada ao que o nosso ego personaliza, não passando de uma ilusão.
Duncan afirma que a mãe é um caso especial, num tom mais suave, ciente de que não é verdade. Continua a sua linha de pensamento, gaguejando e atropelando certas palavras, questionando como parar ou lidar com um coração partido. Quase que sobrepondo a sua voz à de Duncan, Deneen responde:
“You cry! You cry…”
“Choras! Choras…”
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Sei que a escrita, apesar de detalhada, nunca vai conseguir evocar as emoções presente nas vozes, portanto deixo o clip.
A partir daqui vê-se uma transformação nas personagens, que agora fazem parte do universo, apresentando o momento final do podcast. A benevolência do amor, por vezes desapercebida, destaca-se quando se enfrentam situações como a morte, Deneen e Duncan esclarecem, também, que este sentimento é tão forte que criamos toda uma vida à sua volta. São abordados, ainda, conceitos como “ego death” – “a morte do ego” – que apelam à transfiguração do ser.
Por fim, Deneen e Duncan trocam umas últimas palavras antes da personagem de Deneen ser engolida por um buraco negro:
“Well, I love you very much, obviously”
“Bem, amo-te muito, obviamente”
“I love you too.
And, Duncan, that kind of love isn´t going anywhere. That’s another thing you find. That I may leave this plane of existence, sooner rather than later… But the Love isn’t going anywhere.
I’m as certain of that as I am of anything”
“Também te amo.
E, Duncan, este amor não vai a lado nenhum. Essa é outra coisa que descobres: posso sair deste plano de existência mais cedo que tarde… Mas o amor não vai a lado nenhum.
Estou tão certa disso como de tudo.”
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Hall of Egress
Adventure Time, ou “Hora de Aventuras” em português, é das melhores séries de animação que alguma vez vi. Acompanhou os meus anos de adolescente e pré-adolescente inteiros, e à medida que ia amadurecendo, o programa também. Estreou em 2009 no Cartoon Network e sempre vi em inglês, tanto que a dobragem e até o próprio nome em português me provoca uma certa dor na alma que, apesar de pequena, é bastante incómoda. O último episódio foi lançado em 2018, porém as lágrimas foram tantas que decidiram lançar, através da HBO Max, 4 episódios especiais de 45 minutos cada um. O último destes especiais saiu em setembro de 2021, mas deixou-me contente(ada) com o fim da era de Adventure Time.
Este programa segue as aventuras de Finn, um rapaz humano e o seu meio-irmão Jake, um cão amarelo, falante e elástico. Juntos percorrem Ooo, uma terra repleta de monstros e outros seres fantásticos.
Dez temporadas recheadas de humor, amor, aventura, diversão, amizade, canções e inside jokes depois, tenho uma lista de episódios imperdíveis. Um deles é “Hall of Egress” (s07e24), que me fez aceitar que precisamos de crescer e mudar, mesmo que seja assustador. Este é daqueles episódios cheios de alegorias e simbolismos, difíceis de entender. Não contei as vezes que o vi, mas decerto que preciso de o rever novamente.
Ilustração do título feita pela artista Joy Ang em conjunto com Tom Herpich, que criou o design. No youtube de Joy Yang pode-se acompanhar o processo de pintura digital deste desenho: https://www.youtube.com/watch?v=V70prNgY7f8&t=1s
No episódio “Hall of Egress”, Finn depara-se com uma situação nunca antes vivida: para além de estar preso numa gruta estranha, se abrir os olhos, por muito mais que explore, regressa ao início e tudo o que experienciou será praticamente apagado, como se voltasse atrás no tempo. A arquitetura da gruta nunca é a mesma e obriga a uma abordagem menos racional, já que um mapa, por exemplo, nunca será útil.
Frustrado com a situação, Finn solta um leve suspiro.
Ao longo do episódio está implícita a necessidade de reinvenção e superação do “eu” antigo, através das várias tentativas falhadas de regressar à normalidade. Destaco o grande esforço que a personagem principal fez para explicar a situação e não abrir os olhos quando encontra Jake, o seu fiel companheiro. Porém, toda essa resistência serve de pouco, porque Jake encontra sempre forma de abrir os olhos de Finn, julgando que está a alucinar toda a aventura pela qual passou.
Sempre que Finn abre os olhos está patente uma alegoria que define o episódio na sua totalidade: olhar não é sinónimo de ver. A partir do momento que o espectador se apercebe desta condição, mais clara fica a noção de que devemos mudar a nossa perspetiva para podermos progredir.
Jake força Finn a abrir os olhos.
Quando, à beira do rio, o herói despe toda a sua roupa, constata-se o momento que melhor define a decisão de se tornar uma pessoa nova, passando a ideia de que se está a livrar da sua antiga identidade. Para além disso, Finn aprende a estar sozinho e a ultrapassar qualquer adversidade.
Ao mesmo tempo que a roupa flutua, Finn diz "No more Egress", traduzido "Chega de Egress", que marca novamente a decisão de renovação.
No entanto, uma nova identidade não basta. O truque está em não querer sair do Egress (cuja tradução é saída), aceitar a necessidade de crescer, de ser mais, de abraçar uma nova realidade.
Por fim, quando deambula até a um novo “Hall Of Egress” algo está diferente: Já não tenta voltar ao que era, mas sim encontrar um novo caminho. Finn retira as suas vendas e finalmente abre os olhos e vê. Agora as paredes, que antes eram de metal, são transparentes e o Jake ainda está à sua procura.
As paredes subterrâneas transparentes servem de metáfora para a ideia de que Finn agora tem uma perceção mais clara da realidade.
Enquanto corre na sua direção, Finn ouve a frase “At the seashell’s center lies the cornocopia’s smallest door” – que traduzida se entende: “No centro da concha fica a porta mais pequena da cornucópia” – que adquire um significado baseado em simbolismos. A cornucópia representa abundância, normalmente ligada ao crescimento dos frutos da terra, porém, de acordo com a conotação do episódio, tem o intuito de referir crescimento emocional, vincando a importância da mudança. Seguindo a lógica desta aventura, a “porta mais pequena” é uma representação da dificuldade inerente a essa mudança, já a concha é alvo de um debate maior dentro da comunidade. Para mim, a especulação que melhor se adequa é a de que a concha pode ser um objeto em espiral, apontando a possibilidade de que a saída se encontra no centro de cada um.
Termino o post com um vídeo do youtube oficial de Adventure Time que mostra os primeiros cinco minutos do episódio:
youtube
Espero que, se ainda não viram, tenham curiosidade suficiente para o fazer :)
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Brunch de Domingo
São nove da manhã de um domingo onde tenho 7 anos, e a calma paira no ar nesta casa onde toda a gente ainda dorme tranquilamente. De repente, quase que por milagre, sou acordada pelo meu subconsciente, que me relembra que hoje é dia de Disney Kids na SIC! Para quem não se recorda, ou não teve o privilégio de experienciar este espaço televisivo, o Disney Kids foi uma belíssima iniciativa da SIC que permitiu a muitas crianças ver desenhos animados que na altura só passavam no Disney Channel - canal a que nem toda a gente tinha acesso, uma vez que não vinha incluído nos pacotes genéricos das operadoras. As manhãs de domingo eram o evento mais esperado da semana: sofá, cereais, pijama, Kim Possible, repeat. O banquete total em modo “all-you-can-eat”. Que delícia!
A Kim Possible fez de mim uma “miúda p’ra lutar”, e mostrou-me aquilo que os meus pais já me diziam: sou livre para o que quiser (mesmo que implique lutar contra mauzões).
Os criadores da série, Bob Schooley e Mark McCorkle, tiveram em consideração a falta de protagonismo e protagonistas femininas no mundo da Disney e, portanto, exploraram esta oportunidade ao seu expoente máximo. Este desenho animado segue a vida de uma adolescente que, para além de ser cheerleader e ter imensos trabalhos de casa, salva o mundo com o seu companheiro Ron Stoppable e Ruffus, o rato careca, que de uma forma ou outra serve de ajudante. Tem também a seu lado Wade, um informático pré-adolescente que aparenta nunca sair do seu computador. O Wade fornece equipamentos, boleias à volta do mundo e todas as informações necessárias à missão.
Kim com Ron e Ruffus.
Wade.
Apesar de enfrentar milhares de vilões, o Doutor Drakken e a Shego são os verdadeiros arqui-inimigos da Kim. Esta oposição é também evidente na dualidade “feminino vs masculino” presente na relação de ambas as equipas. Tanto a Kim como a Shego partilham a particularidade de serem mais atléticas, assertivas e inteligentes que os seus parceiros, porém, essa semelhança choca quando se comparam os seus comportamentos. O Ron, apesar de menos capaz que a sua companheira tem uma presença ativa e bem-vinda na equipa, respeitando o poder da Kim, que alimenta essa ligação baseada na amizade. Já a Shego e o Drakken são opostos completos, o único fator que os une é o objetivo de dominar o mundo. Dentro dessa dinâmica, a Shego abdica dos louros quando resolve situações de grande pressão e pouco comunica com Drakken.
Shego e Drakken.
Se não ficou claro ainda, este desenho animado é fantástico.
De repente é segunda-feira. Tenho de esperar uma semana inteira para voltar a ver os meus desenhos animados favoritos e comer o máximo de cereais que posso ingerir nas duas horas do Disney Kids. Porém, nem tudo está perdido: Tenho uma semana inteira para por à prova a minha Kim Possible interior. Podia não ter a mesma roupa, nem a mesma habilidade, mas fiz o meu melhor e quando domingo voltou e liguei a televisão e fiz os meus cereais, soube-me infinitamente melhor que na semana passada.
Decidi iniciar este blogue com uma apresentação de um dos desenhos animados mais marcantes no meu crescimento, porque foi fulcral no desenvolvimento da minha personalidade e do meu compasso moral. O meu nome é K… Laura e já não tenho 7 anos, mas sim 19. Como existem serviços de streaming, já não cumpro a minha rotina semanal, mas continuo a dar o devido valor à animação. Agora que já sou gente, Q.B., fui presenteada, pelos meus professores da UC de Laboratório de Multimédia 5 do curso de Novas Tecnologias da Comunicação, com a ideia de criar um blogue sobre um tema à minha escolha. Confesso que gostava de ter pensado neste meio primeiro, mas estava muito ocupada a tweetar e a fazer uns desenhos pelo instagram – aproveitem e visitem: @laui.art . Os restantes posts serão sobre esta vertente mais “séria” e emocional das séries de animação. Creio que existe muito pouco reconhecimento, especialmente em Portugal, por esta arte e sei que se for bem divulgada, a área da expressão animada irá crescer nacionalmente. Portanto convido todos/todas/todes a ler e a acompanhar as minhas mini dissertações sobre este mundo, que apesar de tão imaginativo consegue ser bem real.
Acrescento, ainda, uma lista de blogues com uma temática semelhante à minha, que servem para esclarecer a abordagem que pretendo tomar quanto à minha escrita. Wikicartoon, Fandom
https://cartoons.fandom.com/wiki/Main_Page - Neste website os leitores encontram uma variedade quase infindável de informações sobre centenas de desenhos animados e outras formas de entretenimento. É escrito em inglês e tem um caráter meramente expositivo, no entanto alberga também uma das maiores comunidades de discussão sobre desenhos animados da internet. O meu blogue centra-se em aspetos específicos de várias séries de animação, por isso adquire um aspeto igualmente expositivo, apesar de ter a vertente da opinião.
Biblioteca dos Desenhos Animados
https://bibliotecadesenhos.blogs.sapo.pt/ - O autor deste blogue, por vezes, conta uma história imersiva da sua vida como se estivesse dentro de um desenho animado, utilizando uma linguagem informal e direta. Paralelamente, recorro a uma espécie de Storytelling para cativar o leitor, no entanto não utilizo uma linguagem tão solta, nem transformo o meu mundo no da animação.
Desenhos Animados Esquecidos http://desenhosanimadosesquecidos.blogspot.com/ - Este blogue resume as histórias de desenhos animados esquecidos, tal como o nome indica, mas pouco mais acrescenta a essa informação. Apesar de bastante informativo, não inspira à visualização nem existe uma opinião concreta sobre a animação, contrariamente ao que irei tentar transmitir nos próximos posts.
Todas as imagens usadas neste post pertencem à Disney.
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2001
Uma vontade enorme de me tornar pessoa livre fez com que a minha mãe quase me tivesse no elevador! Virada ao contrário começou a minha jornada incessante de descobrir quem sou e para onde vou. Passados 20 anos, revejo-me em desenhos animados, mas apenas naqueles que me fazem sentir, pensar e ser mais. Por todas as histórias e personagens que refletem o mundo através de uma lente divertidamente distorcida, até aos momentos mais sérios e verdadeiros que fazem jus ao significado de animação.
O mito mais insano e ignorante que alguma vez ouvi é o de que os desenhos animados servem apenas para crianças, para as entreter por umas horas e promover o sedentarismo. É tudo fictício e, portanto, não tem qualquer valor que não o ridículo. Uma nuvem negra invade-me o coração de tristeza, e tentando compreender questiono-me: “como será crescer sem ver os ‘bonecos’?” .
Talvez não saibam como lidar com situações de frustração ou canalizar sentimentos, ou talvez nunca tiveram uma fuga do mundo real. De qualquer das formas o remédio é simples e eficaz. Os desenhos animados não são reais nem costumam ter regras comuns dos mortais, mas são reconfortantes e libertadores. Sabem bem e fazem crescer. Tudo o que a personagem vive, nós (espectadores) sentimos, e de repente o nosso cérebro aplica estas emoções e reações ao mundo real, aprendendo a cada episódio da vida e do programa. E é disso mesmo que vou falar ao longo deste blogue.
Quando cheguei, o mundo estava de pernas para o ar, mas agora que me encontrei tenho os pés assentes na terra e a cabeça na TV.
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