#vista do gigante adormecido
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praising-gull · 2 years ago
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O Caranguejo-gema
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Um bicho até que raro, essa espécie de caranguejo gigante ganhou fama por produzir uma concha de uma madrepérola tão transparente que parece que o bicho anda por aí com um diamante gigante nas costas. Semi-joias desse material são muito valiosas porque são a coisa mais próxima de um diamante que pode se encontrar sem custar os olhos da cara.
O problema é o tamanho do bicho, mais ou menos o tamanho de uma casa, contando a concha. Cada uma das pinças tem o tamanho de uma espada longa e já foram usadas como tal, embora o grande perigo seja a força do caranguejo e não as garras em si. Encontrar o bicho também não é fácil, eles ficam numa parte mais pedregosa do deserto conhecida como as agulhas.
O nome do lugar é por causa as pedras pontudas e finas que parecem meio aleatoriamente levantadas pro alto de um jeito meio ameaçador. Normalmente em reentrâncias na rocha ou em passagens onde uma área grande se afunila, os caranguejos fazem emboscadas, caindo em cima das vítimas com suas pinças para evitar lutar por muito tempo.
Usuários de magia devem tomar cuidado especial ao enfrentar o caranguejo-gema por causa da sua concha espelhada que, assim como acontece com outros animais mágicos com coisas reflexivas, é capaz de refletir magias, com o péssimo hábito de não refletir diretamente em quem conjurou a magia e sim num de seus aliados.
O caranguejo-gema que o vendedor de contratos de Beira do Deserto menciona está no hexágono (38, 16) e embora não seja especialmente impressionante, ao persegui-lo você encontra um trilha meio esquecida, mas que em seus bons dias provavelmente foi uma estrada muito bem pavimentada, com paralelepípedos e muretas ao redor das partes mais perigosas. A trilha vai em direção as montanhas e até o grande vulcão adormecido, que visitaremos eventualmente, talvez depois de cruzar o deserto e voltar.
Amanhã iremos na outra direção, nos afastando da areia pra olhar algumas coisas estranhas que foram vistas no pântano que fica entre a baía e Beira do Deserto.
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fragmentos-de-saturno · 3 years ago
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Li um texto que me deixou pensando e cheguei a conclusão que tem coisa que só dói depois. Acontece que muitas vezes há coisas que nos fazem mal desde o começo, claro, mas nós evitamos à todo custo sentir a dor daquilo. O medo de sermos tristes nos incapacita de sentir o que deve ser sentido. O medo de nos sentirmos frágeis nos faz fugir de sentimentos que devem ser valorizados, por mais difícil que seja. Tentamos negar aquilo que é inegável, uma hora ou outra a dor vem. Uma hora ou outra a gente deita a cabeça no travesseiro e aquilo que a gente tentou deixar adormecido, acorda. E acorda como um gigante, a sensação sufocante do sentir é muita pesada, em alguns casos, quase esmagadora.
O fato é que a dor existe por um motivo, nenhum sentimento deve ser negado, tudo que temos dentro de nós deve ser aceitado, mas é tão difícil aceitar algo que corrói. Eu demorei muito pra entender que a tristeza também tem seu lado bonito, e não, não é romantizando a ferida, não é romantizando a tristeza em si, mas entender que correr do inevitável é, por muitas vezes, perda de tempo. A gente só adia o que deve ser sentido agora. Demorei muito para aprender que, se eu ver isso somente como algo ruim, eu acabo afundando toda vez que eu me sentir dessa forma.
Aceitar que algo acabou é muito difícil, é sim. Me lembro de quando eu fugia do sentimento e fingia que estava bem. Me lembro da sensação destruidora da perda, e mesmo mostrando para todos que eu estava bem, aquele sentimento me consumia, mas eu prosseguia evitando sentir. E quando eu me permiti sentir, doeu para caralho, mas hoje eu vejo o quanto foi necessário, há coisas que não me afetam mais, e quando afetam eu simplesmente me permito sentar, chorar, ouvir uma música, ver um filme triste e no fim do dia, às vezes até no dia seguinte, aquilo já não me apertava mais o peito. A gente só vê o que precisa ser visto, quando estamos prontos para ver.
No fim das contas, as coisas só doem depois, se a gente permite que doa depois. Se a gente adia até não aguentar mais.
sinta no agora o que deve ser sentido, receba a sua mágoa como se fosse uma velha amiga, sirva um café, sente-se com ela, assista um filme, a convide para dançar, mas não a evite! É frustrante perceber que perdemos nosso tempo evitando algo que podíamos ter aceitado logo. Perdemos a vista por estarmos cegos voluntariamente.
Essa dor não vai durar para sempre. Eu prometo!
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tita-ferreira · 7 years ago
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Por que um golpe atrás do outro?
"Diante disso, como se vê, não se trata de apresentar uma agenda, mas um caldo, não um plano, mas uma pororoca, não um ideário, mas o magma onde possa navegar nossa mais aguda utopia – e contra a qual tem se arremessado a mais baixa contra-utopia nacional.
Pois em Junho de 2013 é como se um gênio maligno tivesse escapado da garrafa, agigantando-se e assombrando o país inteiro. Desde então, não se faz outra coisa senão tratar de enfiá-lo de volta, a cacetadas. Pensam ter-lhe quebrado a espinha dorsal. Mal sabem eles que um corpo-sem-órgãos prescinde da rota ossatura, e pode assumir uma miríade de formas, voltando a assombrar o presente."
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Texto de Peter Pál Pelbart (*)
Originalmente publicado em Peixe Elétrico
6 de Fevereiro 2018
Ensaio sobre a Assombração Nacional
Poucos hão de associar a derrocada dos últimos anos a Junho de 2013. E no entanto, a violência da reação conservadora que se abateu sobre o conjunto da sociedade brasileira talvez seja uma resposta àquilo que de mais indomável irrompeu naquelas jornadas multitudinárias. Junho de 2013 pôs em xeque partidos, congressistas, juízes, mídia, polícia, bancos, escolas. Sentiram-se ameaçadas as instituições da dita democracia representativa, bem como o sórdido consórcio entre poder público, poder econômico e corporações da mídia no calculado sequestro de uma paixão popular como o futebol – donde a reação irada: “Não vai ter Copa”. Não é exagero postular que foi o conjunto dos valores predominantes entre nós, e as instituições encarregadas de defendê-los, que subitamente perderam a aura de intocáveis. Talvez nenhum vento da história recente do Brasil tenha aberto tantos flancos de uma só vez, sem que alguém – governante, jornalista, historiador – conseguisse oferecer qualquer explicação razoável para a magnitude do levante.
Sabemos que durou um átimo. Poucos dias, apenas. Em seguida, a rede Globo imprimiu a sua narrativa própria: era um movimento dirigido contra o governo Dilma. Ao sequestrar as direções múltiplas da eclosão e ao canalizá-las contra o PT, o governo se viu acuado e teve que prometer, à sua revelia, “ouvir a voz das ruas”. Essa promessa nunca foi cumprida. Em todo caso, não é demais insistir num ponto que continua como que recalcado pela sequência dos eventos: por alguns dias destampou-se a imaginação política, fazendo proliferar ditos tão diversos como “Saímos do Facebook”, “Sexo é amor, sacanagem é 2,95”(referência à tarifa de ônibus), “Mais felicidade, menos Feliciano” (então presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados), “Depois da cura gay só falta o alvejante para negros”, “É uma vergonha – a passagem mais cara que a maconha”, “Queremos hospitais padrão Fifa”, “É muito motivo, não cabe aqui”, “Meu cu é laico”, “O gigante acordou puto”, “O povo unido não precisa de partido”. Mas muito antes disso, e também depois, pipocaram coletivos de artistas, ativistas, movimentos e iniciativas várias, com modos inusitados de aglomeração e expressão. A tematização das catracas prefigurando os protestos contra o aumento das tarifas de ônibus pelo MPL, a ocupação Prestes Maia ou do Hotel Cambridge, a escolha de novos e velhos alvos – do “Chega de Bananalização 500 anos” em 2000 até a ousada pichação do Monumento às Bandeiras, em 2016, em claro desafio à celebração da história oficial do Brasil, para não mencionar o maciço movimento de ocupação das escolas a partir de 2015.
Em todo caso, em 2013, por um instante pareceu que “tudo” poderia ser objeto de protesto, de reivindicação, de desejo, de imaginação, de pensamento, de contestação, de inversão, de enaltecimento... Um caleidoscópio de possíveis foi projetado nos céus do país, formando outras constelações. Era apenas uma eclosão espontânea de fantasias soltas, sem relação alguma com a realidade concreta, social, econômica, política? Uma catarse efêmera, embora massiva e coletiva — espécie de carnaval cívico sem objetivo nem consequências? Ou será que naqueles poucos dias, antes da captura midiática e da distribuição organizada (por quem?) de bandeiras do Brasil, veio à tona o monstro adormecido, o fantasma de nossa história política, aquilo que desde a colonização e a escravidão até a industrialização e o neoliberalismo foi sendo sistematicamente evitado, denegado, esmagado? Quantos mecanismos foram sendo inventados ao longo dos séculos para manter no garrote índios, negros, subalternos, serviçais, trabalhadores, mas também mulheres, gays, loucos, blasfemos, rebeldes de toda estirpe? A assombração do Brasil é o levante dessa plebe! Se esse fantasma aparece a céu aberto por um curto lapso de tempo, escancarando a reversão sempre possível mas sufocada sempre, antes mesmo que possa ser esboçada, é porque governar foi sempre, entre nós, extirpar no seu nascedouro o que pudesse, de longe, subverter a hierarquia assentada das castas, classes, fardas e fardões, privilégios, exclusividades, elitismos. Governar é antes de tudo, e por antecipação, expurgar esta dimensão ingovernável, irredutível, no limbo do invisível e do indizível, através da reiteração incessante do estado de coisas.
Ora, quando Freud deu ao lapso ou ao sonho a relevância que se conhece, e os considerou vias de acesso privilegiadas para o inconsciente e o desejo, deu a ver a que ponto aquilo que domina nossa vida psíquica aparece nas brechas mais insignificantes da existência. Os desejos coletivos também podem ser lidos nas brechas e fissuras da vida social dita regrada, nas irrupções e colapsos, ainda que marginais, nos breves momentos em que justamente escapa aquilo que se tentava o tempo todo domar, domesticar, silenciar, recalcar.
Quando uma sociedade se levanta, num movimento intempestivo, que não equivale à cega espontaneidade, mas a uma certa lucidez extrema, que pode cegar por fazer ver pelo excesso o que antes ninguém ousava enxergar ou enunciar, quando isso que parecia impossível aparece de pronto como desejável, é outro plano que se oferece à vista de todos.
Claro, levantes, revoltas, rebeliões, sedições, insurreições, têm sua lógica muito particular, diferente, como se sabe, das revoluções. Como o diz Furio Jesi, mestre de Agamben: “​A palavra revolução designa corretamente todo o complexo de ações a longo e a curto prazo realizadas por quem está consciente de querer mudar, no tempo histórico, uma situação política, social, econômica, e elabora os próprios planos táticos e estratégicos considerando constantemente no tempo histórico as relações de causa e efeito, na mais longa perspectiva possível. Toda revolta pode, ao contrário, ser descrita como uma suspensão do tempo histórico”.[1]
É toda a dificuldade, compreender segundo os parâmetros históricos isso que escapa à história ou a põe em suspenso. Não cabe aqui nos alongarmos nessa temporalidade outra, mas não deveríamos subestimar o quê, nesse intervalo, se dá a ver e o quê tal percepção desencadeia a seguir (Deleuze o chamaria de vidência: o que uma sociedade “enxerga” é, afinal, o que ela tem de mais “real”: as suas possibilidades).
É aqui que deveríamos lembrar de que modo 2013 foi desprezado, apagado e esquecido, sobretudo pelo discurso governista da época, que sentiu ali a ameaça de um vento que extrapolava sua institucionalidade partidária, sua matriz representacional, sua agenda de conciliação e de composição, seu programa neodesenvolvimentista, ao passo que aquele movimento denunciava, de maneira ainda indireta, o esgotamento de um modelo, o fim de um ciclo. De nada valeram as promessas de que se saberia ouvir a voz das ruas, pois elas não foram ouvidas – eram fonte de irritação, crispação, desconfiança. Para isso contribuiu, claro, o modo como o movimento foi cooptado pelas oposições, ao significá-lo como uma reviravolta contra o governo Dilma.
O Indomável
Mas o que merece ser sublinhado é que todo o espectro político ficou aterrorizado com a energia insurreta dos primeiros dias de junho, com as táticas de mobilização poderosas (as ruas e as redes sociais), com a emergência de uma juventude sem rosto (“anota aí, eu sou ninguém”), com a impossibilidade de traduzir o acontecimento aparentemente desordenado na gramática corrente: quem é o líder? qual é a reivindicação? qual segmento ou interesse está por trás?, etc. Uma sublevação que não deseja tomar o poder, mas destituí-lo – eis algo que o sistema político como um todo não pode tolerar. A irrupção de desejos que extrapolam o negociável (a negociação supõe uma equivalência entre o que se pede e o que se pode conceder). E talvez, acima de tudo, ou por baixo de tudo, o fantasma de uma imaginação política que acena para um jogo inteiramente distinto entre desejo e poder, imaginação e política, rua e palácio, corpo e polícia, intensidade e administração, etc. Um desejo de rua, uma fome de imaginação, uma força de expressão que passou ao largo das mediações disponíveis (partidos, representantes, mídia), e, por conseguinte, deu a pressentir o Indomável. O Indomável não é o black bloc isolado ou em bando, mas é o que se depreende da multidão insurreta. O Indomável é o monstro social, que pode desafiar a família, a moral, a religião, os bons costumes, os valores do trabalho, da produção, da disciplina, as hierarquias várias, econômicas, sociais, raciais, profissionais, de gênero, as segmentações herdadas e sempre vigentes. O Indomável talvez seja justamente aquilo que Viveiros de Castro, na esteira de Oswald de Andrade, detectou como um traço antropofágico, a rexistencia, que vai da “inconstância da alma selvagem” até as ocupações “selvagens” urbanas[2].
Talvez a melhor maneira de se ler Junho de 2013 seja a foto do Ministério do primeiro governo Temer. Ali estava estampado a que veio o golpe: reafirmar que governo é assunto de macho, branco, homem de família, político profissional, banqueiro experiente, empresário bem-sucedido, aliado das corporações do agronegócio, das igrejas pentecostais. Facilmente se poderia argumentar que aquele ministério era apenas o contrário de tudo o que desde o governo Lula foi tendo voz, com toda a diversidade de gênero, de raça, de origem social, de representação dos vários movimentos sociais, da floresta, etc. Não é falso. E no entanto, o que desde o impeachment, de forma calculada, sistemática, foi sendo demolido não é apenas o importante legado lulista em vários domínios, nem apenas os direitos trabalhistas, nem tão somente o patrimônio nacional (Petrobrás, Eletrobrás, etc), ou cultural (Funarte, incentivos), ou a proteção das terras indígenas (o corte nas verbas da Funai, Jucá e as mineradoras de Roraima), ou a priorização da educação (o movimento das escolas foi disso um sintoma inequívoco), a autonomia dos poderes (a vergonhosa pusilanimidade do judiciário, em todas suas instâncias, na sanha punitiva dirigida contra o PT). Tudo isso está em curso, sem dúvida.
A partir desse quadro razoavelmente consensual, malgrado as diferenças de acento que se possa evocar, como sustentar que a reação brutal a que assistimos hoje tem a ver com Junho de 2013 se tudo indica que ela é dirigida contra Lula, e sobretudo contra as chances de seu retorno à presidência?
Junho está por vir?
Uma coisa é evitar que Lula volte, outra coisa é evitar que Junho volte. Com tudo de inovador que Lula pode ter representado na política brasileira, manteve-se ainda no interior de um pacto institucional, de um arco de alianças, de um horizonte econômico, de um marco jurídico, de um sistema de representação, de um presidencialismo de coalizão, com toda a segurança e previsibilidade aí contidas. Em contrapartida, Junho é a multidão, o Imponderável, o Indomável – ousemos o conceito proveniente de Nietzsche: é a ameaça da transvaloração de todos os valores. Parece nada, se comparado com a inscrição social e histórica deixada pelos treze anos de governo petista. Parece nada, se o critério utilizado for o deslocamento socioeconômico, frente aos 36 milhões saídos da extrema pobreza e todos os demais indicadores e estatísticas diariamente relembrados por uns e desmentidos por outros. Parece nada, enfim, se avaliado pelos parâmetros utilizados na politologia, a mais rasteira ou a mais sofisticada. E no entanto... Perguntamo-nos novamente se não é Junho que encarna a nossa assombração, o fantasma nacional, ao mesmo tempo temível e impensável, ali onde mora nossa mais radical utopia, nosso mais secreto desejo, nosso maior perigo, um carnaval da história em que as ruas se tornassem o novo cenário da política, os corpos os novos protagonistas do coletivo, a irreverência a nova base do pensamento, a propriedade a mais risível das obsessões, a alegria a prova dos nove. Não o antropocentrismo, mas a oswaldiana antropofagia, não o patriarcado, mas o matriarcado ressignificado, não o produtivismo desenfreado, mas o dispêndio e o ócio.  Poderia parecer apenas uma coleta requentada das sobras de um manifesto cultural remoto, mas obviamente é outra coisa que aqui se enuncia. Simplesmente isto: Junho de 2013 mal começou. Junho de 2013 não acabou. Junho de 2013 está por vir. O que ali se anunciou é aquilo que a política institucional brasileira não pode suportar, seja ela de esquerda ou direita. Pois não é só a contestação a um sistema econômico e uma estrutura social perversos, nem só a um ideal de progresso, desenvolvimento, dominação da natureza, felicidade pelo consumo, aliança de classes, civilização da classe média. Trata-se da deposição da ideia mesma de um poder central, de um chefe ou representante do conjunto da sociedade, da predominância da religião do trabalho, do culto da normopatia, do pragmatismo economicista, e a partir daí, de todo um ideário asséptico, pequeno burguês, conformista, neoliberal. Não só outros valores, ou outra hierarquia de valores, mas outra maneira de criar valores e de avaliar o que importa e o que não importa. Mudar o valor das coisas, dizia Oiticica.
Não se trata de um messianismo tupiniquim, nem de uma folclórica carnavalização de nossa pré-história. Talvez agora já possamos tocar no que realmente interessa. Afinal, o que é esse sonho, ou o que é esse inconsciente, ou o que é esse desejo que salta nas brechas da nossa história e que é sistematicamente denegado ou deliberadamente esmagado pela sucessão de governos ou regimes? O que foi que veio à tona em 2013 e precisa ser estrangulado em 2018? O que é isso que quando salta, por ter sido tão violentamente denegado, vêm na forma de uma alucinação, ou de um fantasma intolerável, ou de uma temível monstruosidade que uns já consideravam totalmente dizimada (afinal, somos ou não civilizados?), enquanto outros a cutucavam alegremente, dionisiacamente, como um Zé Celso não cessa de fazê-lo há décadas? Que seu teatro e poética apontem para essa libido antropofágica, revolvendo nosso devir-índio, nosso devir-negro, nosso devir-bispo Sardinha, fazendo ressoarem as divindades e cultos e vozes e possibilidades soterradas ao longo da história, nada disso deveria ser visto como um experimento “apenas” cênico, pois é justamente a nova cena cosmopolítica para a qual seu teatro nos convida e que hoje pede passagem, varrendo palácios, congressos, museus, teatros, e extrapolando até mesmo as artérias urbanas que concentram bancos e federações empresariais – todos esses tristes espaços onde há tempos se repete a mesma peça, onde se nos prega a mesma peça.
Devir-negro, devir-índio, devir-transfeminino
O que é então isto que a sucessão de golpes recentes visa erradicar de vez? Sim, Lula, sim, a agenda de esquerda. Porém mais radicalmente, segundo a mais conservadora visão, aquilo para o que a era Lula teria aberto o flanco, involuntariamente (sim, involuntariamente – basta lembrar da inquietação e até mesmo da desconfiança com que o PT assistiu ao início de Junho). A sucessão de golpes visa erradicar tudo aquilo que se manifestou festivamente naqueles dias: um desejo de rua, uma aspiração ao comum (bens comuns como o transporte, a água, a terra, a internet, o verde, que deveriam ser comuns, para além de qualquer enclosure, ou seja, simplesmente inapropriáveis, como diria Agamben), a abolição da família patriarcal (novos tribalismos, pluralidades transgêneros, a força das mulheres), uma nova geopolítica da alegria (não reservada apenas ao entretenimento, aos shows, ao carnaval, mas que derrubasse de vez o espírito de gravidade com que se manifesta um juiz ao aumentar a sentença de um ex-presidente, ou a presidente do STF ao pregar o respeito à lei e à justiça, rodeada de três bandidos que governam a República, ou qualquer economista ou jornalista que diariamente nos quer fazer engolir a versão do apocalipse que se aproxima caso não se aprove a reforma da previdência), uma mestiçagem de direito, que varresse o escravagismo que os governantes da senzala reafirmam a cada dia.
Para se entender o que está em jogo nisso tudo bastaria recuar um pouco na história europeia e dar-se conta de que o capitalismo, a escravidão e a racialização foram parte de um mesmo movimento. Como o diz Achille Mbembe: “O pensamento contemporâneo se esqueceu de que, para seu funcionamento, o capitalismo, desde suas origens, sempre precisou de subsídios raciais. Ou melhor, sua função sempre foi produzir não apenas mercadorias, mas também raças e espécies”. Ora, não está na hora de o relembrar, e sobretudo operacionalizar tal compreensão, num momento em que vem à tona a disseminação desta mesma lógica? Ainda Mbembe, esse pensador africano que tanto tem a nos ensinar: “Os riscos sistêmicos aos quais somente os escravos negros foram submetidos na primeira fase do capitalismo representam agora, se não a norma, ao menos a parcela que cabe a todas as humanidades subalternas. Há, portanto, uma tendência à universalização da condição negra. Ela é acompanhada pelo surgimento de práticas imperiais inéditas, uma rebalcanização do mundo e a intensificação das ações de zoneamento. Essas práticas constituem, no fundo, um modo de produção de novas subespécies humanas fadadas ao abandono e à indiferença, quando não à destruição”[3].
Como contrarrestar a mencionada subalternidade? Se isso implica confrontar nossa famigerada branquitude a partir dessa negritude, também significa confrontá-la a partir de nossa sempre denegada dimensão indígena: somos todos, queiramos ou não, descendentes dos índios ou seus genocidas. Déborah Danowski e Eduardo Viveiros de Castro não poderiam formulá-lo com maior contundência: “O genocídio dos povos ameríndios – o fim do mundo para eles – foi o começo do mundo moderno na Europa: sem a espoliação da América, a Europa jamais teria deixado de ser um fundo de quintal da Eurásia, continente que abrigava, durante e Idade Média, civilizações imensamente mais ricas que as europeias (Bizâncio, China, Índia, o mundo árabe). Sem o saque das Américas, não haveria capitalismo, nem, mais tarde, revolução industrial, talvez nem mesmo, portanto, o Antropoceno”.[4] Donde uma observação nada inofensiva: “Pois são justamente os maya que nos oferecem, hoje, talvez o melhor exemplo de uma insurreição popular bem sucedida (no sentido de não se ter transformado em outra coisa) contra o monstro bicéfalo Estado-Mercado que oprime as minorias do planeta, a única revolta de um povo indígena da América Latina que conseguiu se manter sem degenerar em mais um projeto estatal-nacionalista, e, muito importante, que deixou rapidamente de se apoiar na velha escatologia revolucionária ‘marxista’ (na verdade, cristã de fio a pavio), com que a Europa, por meio de seus insuportáveis intelectuais-clérigos, continua a querer controlar as lutas de libertação dos povos, para traçar um caminho cosmopolítico próprio. Estamos falando, é claro, do Movimento Zapatista, esta rara revolta que é um modelo de ‘sustentabilidade’ – sustentabilidade política também e sobretudo”.
Será que se trata de voltar a ser indígena, perguntam os autores? Nada deixa mais furiosas as classes dominantes brasileiras do que essas comunidades que tomam esse rumo (desejar o atraso como futuro). Mas não se trata de fazer disso um exemplo, mesmo porque “talvez seja impossível voltar historicamente a ser índio; mas é perfeitamente possível, mais do que isso, está efetivamente se passando, um devir-índio que vai tomando de assalto setores importantes da “população” brasileira de um modo completamente inesperado. Este é um dos acontecimentos políticos mais importantes que testemunhamos no Brasil de hoje, e que vai contaminando aos poucos muitos outros povos brasileiros além dos povos indígenas. O Brasil é uma gigantesca Aldeia Maracanã; aqui todo mundo é índio, exceto quem não é. E todos sabemos bem o que são os que não são, e onde eles estão. Insistimos: não se trata de retorno a nada, mas de cavalgar e intensificar as linhas de fuga que podem advir dos coletivos ameríndios, mestres da “bricolagem tecnoprimitivista e da metamorfose político- metafísica”[5].
Ora, ao devir-negro de Mbembe, ao devir-índio de Viveiros de Castro, ambos sintônicos com intuições oswaldianas, não seria preciso agregar o devir-transfeminino depreciado, tão perto e tão longe da obsessão antropofágica com o matriarcado? “Se o feminismo pensava que o poder estava nas leis e instituições, o transfeminismo sugere que o poder está nas logísticas, infraestruturas, redes e técnicas culturais. Nosso acesso e uso das pílulas – Viagra, testosterona, Prozac, Truvada, Facebook, Google, representações em vídeo etc. – são mais importantes que as leis do casamento. O sujeito do transfeminismo não são as “mulheres”, mas os usuários críticos das tecnologias de produção da subjetividade. Esta é uma revolução somatopolítica: o surgimento de todos os corpos vulneráveis contra as tecnologias de opressão. A figura chave do transfeminismo, inspirada pelo manifesto de Haraway, não é nem homem nem mulher mas um hacker mutante. A questão não é: o que sou eu? Qual sexo ou qual sexualidade? Mas: como isto funciona? Como podemos interferir no seu funcionamento? E, mais importante ainda: como isso pode funcionar de outro modo? Vamos entrar na caixa-preta e abrir as pílulas. Em tempos de extensão global do biopoder e técnicas farmacopornográficas de produção de subjetividades sexuais, faz-se necessária uma nova aliança de movimentos críticos. Nós, os trabalhadores farmacopornográficos da terra, trans, migrantes, animais, indígenas, queer-gêneros, Crips e trabalhadores do sexo, estamos inventando novas tecnologias de produção de vida e subjetividade. [...] Política-de-gênero é Política-da-Terra! Contra a expansão do Estado de Guerra, nós produzimos resistência nas redes comuns de afeto, música, sementes, ecstasy, água, palavras, micróbios, moléculas...”[6].
A revolução molecular
Não seria o caso, justamente, de agregar uma outra dimensão, que Félix Guattari chamou de revolução molecular? Lembremos que por essa expressão o pensador se referia às mutações diversas que atravessam nossa atualidade, sobretudo as rupturas menos visíveis, no nível da sensibilidade, da percepção, do afeto, do inconsciente, que reconfiguram a subjetividade individual e coletiva no contexto do capitalismo que, antes mesmo da dita globalização, ele denominava de mundial integrado. A nomadização do desejo faz voar pelos ares várias relações de hierarquia, autoridade, comando, colocando em cena planos em geral expulsos do domínio político: nossa relação ao corpo, ao tempo, à sexualidade, à festa, às drogas, à infância ou à velhice, ao cosmos, etc. O caráter “molecular” das mutações evocadas por Guattari obviamente não coincide com a dimensão “primeva” própria à Antropofagia[7]. A revolução molecular não é a revolução caraíba. E no entanto, em ambas predomina a esfera inconsciente, a pulsão nômade, o entrecruzamento entre o arcaico e o tecnológico, a contestação da racionalidade capitalista e sua axiomática homogeneizante, a evocação de uma subjetividade mais plural, intensiva, plástica, coletiva, libertária, híbrida, mais de devoração do que de devoção, de invenção do que de reprodução, com seu quinhão de loucura assumida. A dimensão insurreta, refratária a dogmatismos, transversaliza raças, tempos, geografias, e desafia dicotomias tais como natureza/cultura, humano/inumano, individual/social, objetivo/subjetivo, corporal/anímico, físico/metafísico, eu/outro, ser/devir, mesmo que tais termos, e muitos outros utilizados acima, não necessariamente figurem no repertório dos autores.
Donde um paradoxo. Contra uma utopia racional, asséptica, civilizatória, planificada, estatal, progressista, proletária, numa espécie de versão moderna da República de Platão, desenha-se outra coisa, mais anárquica, heterogênea, ociosa, incerta, plural, forjada a partir de uma matéria desejante ou libidinal. É o que se viu na gestualidade ensaiada em Junho de 2013, mesmo que de modo incipiente. Talvez o mistério e a força daqueles dias tenha residido em parte no fato de que ali se cruzaram várias das dimensões evocadas acima: a molecular, a transfeminina e a caraíba, sobre a qual é preciso, ainda, dizer algumas palavras, pois foi no seu sulco que as demais confluíram.
A utopia oswaldiana
Oswald contrapunha a cultura antropofágica à cultura messiânica (cristã, claro!), bem como a seu sucedâneo terreno, a dogmática obreirista (“último refúgio da filosofia messiânica, trazida do Céu para a terra”)[8], e tinha certeza que, exceto a de Platão, as utopias todas beberam na descoberta da América: “Tenho a impressão de que o encontro da humanidade nua da Descoberta muito influiu sobre o movimento geral de ideias daquele instante histórico. Saber que do outro lado da terra se tinha visto um homem sem pecado nem redenção, sem teologia e sem inferno, produziria não só os sonhos utópicos cujo desenvolvimento estamos estudando, mas um abalo geral na consciência e na cultura da Europa. Era a negação do Cristianismo ecumênico”[9].  É a linhagem que nos vem de Montaigne, aquele que “ouviu” o que se passava do lado de lá do Atlântico e que imaginou o “homem natural”. Sabe-se que sentido tem em Oswald essa referência – não um culto desse suposto primitivo, mas de sua capacidade de resistir: “Oswald não era a tal ponto ingênuo que acreditasse em uma entidade primitiva, estável e indomável que teimosamente teria sobrevivido a séculos de colonização. Em vez de uma arqueologia assim estática, com uma camada primitiva e indelével e outra mais superficial, formada pela herança do branco, Oswald enfatiza uma força primitiva de resistência à doutrinação promovida pelo colonizador. Essa capacidade de resistência seria antes um traço cultural do que o produto de algum estoque étnico. E, por isso, identificada apenas pelo modo como opera; pelo canibalismo simbólico. Em poucas palavras, a doutrinação cristã e europeia não teria superado o poder de resistência da sociedade colonial, que se manifestaria na manutenção de nossa capacidade de devorar e ser alimentado pelos corpos e valores consumidos.”[10]
Mas no interior dessa “larga ondulação do pensamento que faz a criatura desligada do Criador retomar pé na terra de suas misérias e de seus entusiasmos”, Oswald agudamente distingue dois tipos de utopia, a afirmativa e a negativa. A primeira é edificante, e a segunda eivada de “sátira e de crítica, onde o Humanismo se torna admiravelmente útil e construtivo. Há o que se poderia chamar de avesso da Utopia e que, justamente no século XVI, nos é dado por três mestres da Europa culta. São eles: Rabelais, Cervantes e Erasmo”. O escárnio e a volúpia de Erasmo, a epopeia do equívoco em Cervantes e o riso rabelaisiano – é toda uma “geografia do riso”[11] que vai na contramão do otimismo social de Morus. Se é a América que dispara as Utopias, com seu “homem natural” feito de comunismo, politeísmo, ócio, nudez, liberdade sexual, ausência de culpa ou castigo, de chefe ou escravidão, não se trata apenas de uma imagem edênica ou de uma ideia primitiva, mas de uma força subversiva, como o frisou Costa Lima. “No fundo de cada Utopia não há somente um sonho, há também um protesto... toda Utopia se torna subversiva, pois é o anseio de romper a ordem vigente”, escreve Oswald. As Utopias são sempre sinal de “inconformação e um prenuncio da revolta”[12], mesmo aquela que Oswald batizou de “avesso da Utopia”, na esteira da qual se poderia inscrever seu legado.
O mundo do teatro, o teatro do mundo
Quando Zé Celso conta de que modo, no auge da ditadura militar, saído da tortura a mais aviltante, sentiu que seu corpo havia atravessado um limiar “para além do bem e do mal”, e que dispunha de dois caminhos diante de si – ou bem oferecer o corpo à guerrilha, isto é, matar ou morrer, ou bem oferendá-lo à celebração, que ele chamou de desbunde, ou de dionisíaco, ou de orgiástico – vislumbramos uma bifurcação ética, sem que caiba qualquer juízo de valor. Ambas as opções eram igualmente dignas. Mas o diretor insiste: ficar no ódio, no ressentimento, na vingança? Ou esposar uma outra maneira de viver o corpo, o coletivo, a abertura? Ainda durante os anos de chumbo, seu grupo entendeu que se a polícia viesse ao encalço dos atores no interior do teatro, não haveria saída, pois o espaço cênico terminava num muro, sem escape. Ora, um belo dia decidiram arrebentar essa muralha a marretadas em meio a um espetáculo, com o que se abriu uma brecha para uma área aberta, a céu aberto. Ali estava um terreno em franco abandono, ideal para a construção futura de um teatro de Epidauro. Ora, o teatro não se destinava à multidão, ao povo, a todos e a qualquer um? Não deveria ser ele um ritual capaz de reatar com a origem dionisíaca do próprio teatro grego, mas também com a alegria guerreira dos tupis, com o ritmo afro do candomblé, com a devoração antropofágica dos personagens emblemáticos de nossa História? Virar bacante, mergulhar na dimensão “subterraneada”, que vai de Oswald ao tropicalismo[13], de Zé Celso até Hilton Lacerda (o belíssimo Tatuagem), a sociedade feminizada, o gozo coletivo, o atletismo afetivo, a primazia da percepção sobre a consciência, do sensorial sobre o lógico, da intensidade contra o corpo cartorial – é essa utopia sem modelo nem contorno que transborda o próprio teatro, que chega à rua e que poderia contaminar a cidade, desafiando o outro teatro, o dos negócios e da maracutaia política.
A revolta e a reação
Por curtas que sejam, certas revoltas podem elevar-se ao plano de um acontecimento, no sentido que lhe dá Deleuze – Acontecimento é aquilo que escapa à História, que extrapola o domínio dos Fatos, que se espraia no Tempo: a Comuna de Paris jamais ficou delimitada ao ano em que ocorreu – assim como Junho de 2013 não acabou.
A reação a um evento como esse, chame-se ele revolta ou revolução, é tão imponderável quanto ele. Não espanta que diante do que veio à tona em 2013, a reação furiosa insista em reafirmar todas as divisões molares, de classe, gênero, raça, nacionalidade, religião, partido, filiação, onde as Igrejas, o Mercado, o Estado e a Justiça se aliam para deixar ainda mais drásticas as fronteiras que ali ameaçaram embaralhar-se. Índio é índio, pobre é pobre, negro é negro, homem é homem, mulher é mulher, operário é operário (e não ex-presidente), PT é ladrão, PMDB é um partido respeitável, museu não é bordel, a escola serve só para ensinar, os magistrados têm direitos inalienáveis, brasileiro é brasileiro e venezuelano não pode cruzar a fronteira, craqueiro é craqueiro, um idoso é um idoso – mas tudo isso não passa da ponta do iceberg.
Uma vez reterritorializados todos em seus papéis, identidades ou funções, como o nacional-socialismo precisou determinar a filiação judaica, abre-se a porteira para o ódio, a vingança, o justiçamento, o extermínio (dos índios em favor do garimpo, dos craqueiros em favor da higiene urbana, a cura gay em favor da família, dos idosos em favor da previdência, dos direitos dos trabalhadores em favor da flexibilização, da esquerda em favor da moralidade institucional, da liberdade de imprensa em favor da lavagem cerebral, do suposto assistencialismo do bolsa família em favor da suposta autonomia dos cidadãos, do nível da saúde ou da educação em favor do teto de gastos, da soberania nacional em favor das corporações multinacionais).
Mais um passo e chegamos à camada mais elementar – é preciso sufocar os mínimos laivos de rebeldia ou arruaça (tolerância zero, diria um prefeito de Nova York) para extirpar de vez esse magma indomável, incompreensível, renitente, que teima em recusar a civilização branqueada, eurocêntrica, heteronormativa, a subjetividade consumista, a hegemonia do mercado – em suma, assegurar a extorsão da existência. É um modo de existência padrão que deve imperar, dizimando os demais, residuais, menores, insignificantes, experimentais, que teimam em arrastar heranças bárbaras, sustentar utopias minúsculas, emitir vozes desafinadas, relembrar inutilmente dores pretéritas ou sonhos de futuro. Opera-se uma gentrificação que prescinde da construção de um shopping, de um aeroporto, de um calçadão ou de um centro cultural, pois novos mecanismos de esterilização vão sendo implantados com a ajuda das redes sociais, do bullying virtual ou midiático, da hipnose pelo black mirror, da codificação tecnocientífica, da rentabilização da existência, numa espécie de envenenamento atmosférico onde respirar já é duvidoso. Sim, estamos já no plano da atmosfera, daquela porção de exterioridade que permitiria ao pensamento e à existência se oxigenarem, se reinventarem, habitarem outras perspectivas. Não devir-o-Outro (baixa antropofagia, o mimetismo do estrangeiro), mas devir-outro-do-que-si-mesmo-e-do-que-o-Outro através da deglutição do Outro (“Só me interessa o que não é meu”). Não surpreende que na mesmidade saturada atual uma espécie de claustrofobia, existencial, psíquica, subjetiva, artística, coletiva, política, gere a sensação de uma crescente impotência – “seja lá o que tentarmos, está tudo dominado”.
Diante disso, como se vê, não se trata de apresentar uma agenda, mas um caldo, não um plano, mas uma pororoca, não um ideário, mas o magma onde possa navegar nossa mais aguda utopia – e contra a qual tem se arremessado a mais baixa contra-utopia nacional.
Pois em Junho de 2013 é como se um gênio maligno tivesse escapado da garrafa, agigantando-se e assombrando o país inteiro. Desde então, não se faz outra coisa senão tratar de enfiá-lo de volta, a cacetadas. Pensam ter-lhe quebrado a espinha dorsal. Mal sabem eles que um corpo-sem-órgãos prescinde da rota ossatura, e pode assumir uma miríade de formas, voltando a assombrar o presente.
Como lidar com uma assombração?
O leitor tem todo o direito de se perguntar se o que fizemos foi projetar arbitrariamente a vidência gozosa e estética de um mestre da profanação sobre as Jornadas de Junho. “A gente escreve o que ouve – nunca o que houve”[14]. Ainda assim, hão de nos objetar: “Foi isso mesmo que aconteceu em Junho de 2013? Ou isso que você descreve é o que poderiater acontecido? Ou é o que pode vir a acontecer?” Fantasia, fabulação ou futurologia? Mas, entre nós: como lidar com uma assombração sem um pouco de fabulação? E se tivéssemos enxertado em Junho de 2013 o Manifesto Antropófago publicado quase um século antes, no ano 374 da Deglutição do bispo Sardinha – 1928 de nossa era cristã? Não nos é permitido ainda, apesar da patrulha historiográfica, ideológica ou política que se abateu tanto sobre os textos de Oswald como sobre os manifestantes de 2013, entrecruzar linhas de fuga longínquas no tempo ou no espaço, mas não incompossíveisnum mesmo mundo? Não é próprio de um acontecimento extrapolar sua abrangência territorial ou factual, ter uma irradiação para além de sua esfera visível ou mesmo detectável a olho nu, como num desastre provocado por uma usina nuclear? Estaríamos proibidos de convocar sonhos ou afetos soterrados, que dormitam sob os nossos pés, à espera, talvez, de que tenhamos absoluta necessidade deles, reativados, ressuscitados? Só então, diante do perigo, para usar e torcer uma imagem benjaminiana, teriam a força de irrigar nosso presente, e em contrapartida, nosso presente poderia fazer-lhes justiça. Afinal, a qual regime de veridicção estamos submetidos para pensar a potência biopolítica dos vencidos? Aos critérios da eficácia molar, do resultado final? (“A revolta deu certo? Quais seus resultados concretos, quantificáveis?”) Ora, sabemos que todas as revoluções acabam mal. Medir um evento pelo mero resultado não seria, afinal, traí-lo antes mesmo que ele nos traia? Ou há algo da imanência do acontecimento que vale por si só? O devir-revolucionário das pessoas, não o futuro da revolução, diria Deleuze. É o que diz o provérbio argentino: “No me quitan el bailado”. Nada nem ninguém jamais poderá me privar do fato de eu ter dançado, do prazer dali extraído, de ter vivido aquilo – e isso vale igualmente para a experiência coletiva de uma revolta. Furio Jesi o diz à sua maneira: “Pode-se amar uma cidade, podem-se reconhecer suas casas e suas ruas nas próprias memórias mais remotas e secretas; mas só na hora da revolta a cidade é sentida verdadeiramente como o ‘haut-lieu’ e ao mesmo tempo como a própria cidade: própria porque do eu e ao mesmo tempo dos ‘outros’; própria, porque campo de uma batalha que se escolheu e que a coletividade escolheu; própria, porque espaço circunscrito em que o tempo histórico está suspenso e todo ato vale por si mesmo, nas suas consequências absolutamente imediatas. A gente se apropria de uma cidade fugindo ou avançando no alternar-se dos ataques muito mais do que brincando quando criança em seus pátios, ou por suas ruas, ou passeando mais tarde com uma mulher”[15].
Talvez Junho de 2013 ainda esteja por vir. Ou como um espectro, está à espera dos corpos coletivos capazes de o encarnarem (Safatle), mesmo que não os reconheçamos de imediato, porque surgem como corpos-sem-órgãos. Se isto for verossímil, podemos supor que a sequência dos golpes que assistimos desde então visa, para além dos alvos imediatos, preventivamente esconjurar tal eventualidade, e se possível, de uma vez por todas, para todo o sempre.
(*) Peter Pál Pelbart é filósofo, ensaísta, professor e tradutor húngaro, residente no Brasil. Graduado em Filosofia pela Universidade Paris IV, mestre pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), doutor em Filosofia, pela Universidade de São Paulo e livre-docente pela PUC-SP.
Vive na cidade de São Paulo, onde é professor da PUC-SP e coordena a Companhia Teatral Ueinzz, formada por pacientes psiquiátricos do hospital-dia A Casa. É professor no Departamento de Filosofia e no Núcleo de Estudos da Subjetividade do Pós-Graduação em Psicologia Clínica da PUC-SP.
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NOTAS
[1] Furio Jesi, Rimbaud nas barricadas, n-1 edições, 2018.
[2] Eduardo Viveiros de Castro, “Que temos nós com isso?”, in Beatriz Azevedo, Antropofagia, Palimpsesto Selvagem, São Paulo, Cosac Naify, 2016.
[3] Achille Mbembe, O Fardo da Raça, cordel da coleção Pandemia, n-1 edições, 2018.
[4] Déborah Danowski e Eduardo Viveiros de Castro, Há mundo por vir? Desterro, Cultura e Barbárie, ISA, 2014, p.141.
[5] Ibidem, p. 158.
[6] Paul B. Preciado, Transfeminismo, cordel da coleção Pandemia, n-1 edições, 2018.
[7] Foi Suely Rolnik quem primeiro associou a Antropofagia à obra de Deleuze e Guattari. Com isso, abriu um vetor crucial da cultura brasileira a uma filosofia que Oswald não poderia ter conhecido, e estimulou o mais rico diálogo entre eles. Cf. “Esquizoanálise e Antropofagia”, in E. Alliez (org), São Paulo, Ed. 34, 2000.
[8] Oswald de Andrade, A Utopia Antropofágica, São Paulo, Globo, 1990, p. 146.
[9] Ibidem, p. 177
[10] Luiz Costa Lima, “Antropofagia e controle do imaginário”, in www.abralic.org.br/revista/index.php/revista/article/download/7/8
[11] Oswald de Andrade, A Utopia Antropofágica, op. cit., p. 180
[12] Ibidem, p. 209
[13] Celso Favaretto elucidou as relações entre tropicalismo e antropofagia em Tropicália: alegoria alegria. São Paulo: Kairós, 1979. (4ª.ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2007)
[14] Oswald de Andrade, Serafim Ponte Grande, São Paulo, Globo, 1990, p. 34.
[15] Furio Jesi, Rimbaud, op. cit.
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thetravelviagens-blog · 5 years ago
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NASCER DO SOL NA PEDRA DO ÍNDIO, CIRCUITO CACHOEIRAS EM BOTUCATU Conhecida como a cidade dos Bons Ares, a região de Botucatu é por muitos considerada mística. As formações geográficas que geram lendas como as Três Pedras, Gigante Adormecido, Cuesta e o Morro do Peru. Suas belas Cachoeiras completam esse belo cenário. Embarque: 21/09 ⏰ Encontro na Barra Funda às 23:45 Retorno para São Paulo dia 22/09 às 17hrs. • Previsão de chegada às 21h - Desembarque no mesmo local. Sobre o roteiro: ➡ Nascer do Sol Pedra do Índio: Mirante com vista para as Três Pedras, onde teremos um Nascer do Sol incrível. ➡ Fazenda Pavuna Com um circuito que possui no total cinco cachoeiras e um lago a ser visitado, sendo a maior com 80 metros de queda. Valor por pessoa: R$185,00 a vista ✅ INCLUSO ➡ Transporte executivo em Van, com ar condicionado e wi-fi ➡Ingresso nas atrações, Pedra do Índio e Fazenda Pavuna. ➡ Monitores da agência ➡ Fotógrafo para resguardar os momentos da viagem ➡ Brinde da agência ❎ NÃO INCLUSO • Alimentação • Qualquer item fora do roteiro 📝 RESERVAS Reserva apenas com sinal de R$80 enquanto houve vagas, restante podendo ser pago até 5 dias antes do evento. *Importante* Faça sua reserva antecipada para café da manhã na Pedra do Índio ⚠️Descidas íngreme e pedras escorregadia na Cachoeira da Pavuna não recomendada para pessoas sedentárias. RESERVAS E INFORMAÇÕES: FELIPE - THE TRAVEL (11) 95788-9031 -------- 👉 EXPLORE SEU LADO #VIAJANTETHETRAVEL #pedradoindio #botucatu #cachoeirasbrasil #viagensbaratasonline #viagensbaratas #viagemfamilia #viagensincriveis #viagenspelomundo #trilhasiniciantes #trilhasetravessias #trilhassp #trilheirasp #trilheirasdobrasil (em Pedra Do Índio - Botucatu) https://www.instagram.com/p/B17QvNXJFAn/?igshid=1ry3m8bvyz41e
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headlinerportugal · 5 years ago
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Dia 3 - ‘New Normal’: a pluralidade musical | Reportagem
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Chegamos ao último dia do festival, dia em que a pluralidade de todos os seus intervenientes era gigante, desde o indie feminino de Lucy Dacus, Big Thief, Snail Mail, ao noise/punk de Viagra Boys e de Amyl And The Sniffers, ou viajando até ao país vizinho pela nova sensação pop flamengo da Rosalía, navegando ao outro lado do oceano pela voz da colombiana Erykah Badu ou do brasileiro Jorge Ben Jor ou até mesmo pela dance club de Nina Kraviz e dos Modeselektor.
Foi uma odisseia musical intensa, este último longo dia do Primavera Sound, e talvez o melhor reflexo que poderíamos ter desta nova imagem que o festival quer transmitir com o seu novo slogan: ‘New Normal’.
Chegar cedo ao festival pode ser fantástico. Não tínhamos visto os Shellac no dia anterior, pelo que o seu concerto surpresa ali bem ao lado da zona de restauração tornou-se num miminho para todos nós que madrugamos na chegada ao recinto. Durante cerca de 45 minutos, não se negaram pedidos e tocaram-se canções do seu repertório. Foi um incrível início de sábado. 
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Shellac em concerto surpresa [Mais fotos do concerto aqui]  
E o “Oscar” vai para… Amyl And The Sniffers
Cada vez sou mais fã da música noise, da cena punk, pós-punk, do fuzz, por isso a banda australiana entrou diretamente para as minhas escolhas para este último dia. Uma banda que já andou em tour e a abrir os concertos para os King Gizzard? Tinha tudo para dar bem.
A escolha foi difícil entre os suecos Viagra Boys e Amyl And The Sniffers, mas por toda a envolvência do concerto da banda australiana, a escolha foi feita.
A banda começou bem ao lado da danceteria que Jorge Ben Jor trouxe ao parque da cidade, ainda num começo morno trazido pela luz que se ia desvanecendo por detrás das árvores que delimitavam o recinto, e pelas poucas pessoas que estavam a assistir na linha da frente ao concerto da Amyl And The Sniffers.
A hiperativa Amy Taylor, a jovem (23 anos) desbocada que não tem medo de dizer o que quer que seja, abanou com o palco Super Bock, levando aquele pequeno anfiteatro natural para a cena punk do final dos anos 70. Estão a imaginar aquele corte mullet dos anos 80 que já ninguém usa? Bem, os elementos da banda australiana trouxeram de volta essa moda e todo o seu outfit de um tempo já longínquo.
Pouco faltou para o pó levantar, as vozes começarem a ecoar e o mosh pit rebentar. Com o sol cada vez mais para lá do que para cá, o ambiente começou a aquecer. A constante irreverência da vocalista durante o concerto, facilmente acabou por fazer explodir um vulcão que se encontrava adormecido há pouco tempo - o público, que por esta altura já enchia por completo o pequeno anfiteatro.
Amyl And The Sniffers vieram agitar as águas bem calmas que se têm visto este ano dizendo: Punk’s Not Dead.
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Amyl And The Sniffers em palco [Mais fotos do concerto aqui]
‘Surprise Motherfucker’!!! Yves Tumor
Com o final do dia e do festival a aproximarem-se, a escolha entre Erykah Badu e Yves Tumor teve de ser feita. Devido a um atraso considerável no concerto da artista colombiana, a escolha ficou fácil, e ainda bem que assim foi. 
Não conhecia muito o trabalho do artista norte-americano, mas, pela irreverência que fomos tirando do que dele ouvíamos, sabíamos que íamos ter show. Aliás, show não é a palavra correta, mas sim FREAKSHOW!!!
Chegámos ao palco Pull & Bear (claramente o palco que mais cartas deu neste festival), não com muita gente, talvez pela hora tardia, talvez pela enchente no palco principal, mas isso pouco importou para o que vimos.
Só uma palavra para Sean Bowie aka Yves Tumor: selvagem! Veio apresentar ‘Safe in The Hands Of Love’, álbum editado no ano passado, em que toca músicas imprescindíveis como ‘Licking An Orchid’, ‘Lifetime’ ou ‘Noid’. Esta última veio soltar a primeira e única moche de um concerto que foi consumido pelo seu glam e luxo. Uma “diva” de mil e um pseudónimos, que mesmo surfando pelo público adentro não deixou de o ser. 
Muitos concertos já vimos por esse território fora, mas nenhum como este. Já tinham visto algum concerto onde os seguranças raramente olhavam para o público, mas, em vez disso, para o artista a atuar? Uma exigência dele, quem sabe, mas a verdade é que por onde Yves Tumor ia, os seguranças faziam sprints para acompanhar aquele monstro de palco, algo insólito e só visto no concerto do artista americano.
Muitas vezes, sem percebermos se o artista estaria a fazer playback, quer pela quantidade de vozes infinitas sobrepostas, quer pelo facto de nunca ter perdido o fôlego sobre os seus longos saltos altos (mesmo após kms percorridos no palco), a verdade é que isso pouco importou. Viver, assistir e presenciar um concerto de tal animal de palco, valeu praticamente o bilhete de todo aquele festival. 
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’Dance marks the Spot’: Jorge Ben Jor
Não sei quem faz os horários do festival NOS Primavera Sound, mas para essa pessoa um beijinho, por ter posto Jorge Ben Jor sob o pôr-de-sol mais bonito de todos.
Foi assim, numa tarde solarenga, em que o verde das árvores e da manta natural que se estendia sob os nossos pés se fundia com o céu azul do Porto, que o calor e o samba do Brasil chegaram a Portugal.
Se calhar até muita gente desconhecia o nome de Jorge Ben Jor, mas quando este começou a tocar, “Mas, Que Nada!”, o seu maior clássico, não houve ninguém que não batesse um p��, esboçasse um sorriso ou uma voz a acompanhar um dos grandes embaixadores dos sons mais tropicais.
Toda a banda de Jorge Duilio Lima Menezes transmitia a boa onda e a alegria da cena brasileira, através dos seus sorrisos rasgados e dos passos de dança que os milhares de pessoas reproduziam, transformando o palco NOS numa danceteria.
Não importa a idade que o artista brasileiro tem (74 anos!!) mas a verdade é que ele está aí e consegue pôr um festival inteiro a dançar como aconteceu em “Take It Easy My Brother Charles”, “Mais Que Nada” ou “Bebete Vãobora”. Uma força da natureza trazida para o anfiteatro que fez toda a gente sambar com o “nosso irmão de cor”.
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E o derrotado do dia é… 
Este dia claramente não teve um derrotado, aliás, ter teve, mas desta vez não foi um artista ou uma música.
Quando estás perante tantas e tão boas escolhas, num leque que dá a volta ao mundo musical vezes sem conta, e te deparas com este rótulo de “derrotado” que decidimos atribuir, a escolha não é nada fácil. Por isso, o título teve de recair sobre as condições que este ano o festival ofereceu ao seu mais recente e ampliado palco Bits.
Após ter vivido intensamente o palco Bits nos dois dias anteriores, apenas saindo já com o sol a raiar, este palco veio a mostrar as suas fraquezas no último dia.
Um dos grandes momentos deste festival, e deste último dia, que levou centenas de pessoas a ficar até mais tarde no recinto, mesmo depois de todos os concertos já terem terminado nos restantes palcos, foi Nina Kraviz.
A artista russa deparou-se com uma enchente brutal que não se tinha visto nem de perto nos dias anteriores e o tráfego num palco fechado tornou-se tão difícil quanto respirar lá dentro. Não fosse este o único problema, também a qualidade do som que se fez sentir por quem se encontrava à frente das colunas que tentavam formar uma arena 360º stereo.
Apesar disso, quando a música sai a vencer no seu todo, todos ficamos a ganhar, e o ’New Normal’ ficou a ganhar neste dia, em que a pluralidade musical foi a grande vencedora.
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O Terno
O trio brasileiro O Terno, composto por Tim Bernardes, Guilherme D'Almeida e Gabriel Basile, apresentou-se no Palco Seat. Antes da sua presença em palco já Tim se passeava pelo NOS Primavera Sound, no dia anterior, aproveitando também ele para ver algumas das performances. Aquele som, com a típica pegada brasileira, foi a opção perfeita para nos imbuirmos ainda mais no espírito festivaleiro. Os raios de sol, ao som do belíssimo tema “Pegando Leve” (logo a segunda a ser tocada), proporcionaram momentos perfeitos de pura intimidade quer com a banda, quer com o festival e o ambiente circundante.
Enquanto alguns elementos do HeadLiner optaram por Viagra Boys, outros fizeram o caminho até ao Palco NOS para Hop Along. Quem fez esta opção decididamente não se terá arrependido, mesmo que ao fundo se fizessem ouvir os Viagra Boys, que tocavam no palco ao lado da entrada. Aquele timbre rouco de Frances Quinlan não deixa ninguém indiferente, é mesmo uma daquelas vozes bem sensuais e irresistíveis. “Well Dressed” e “How Simple” não faltaram à chamada e foram cantaroladas pelos fãs lá bem na frente.
Lucy Dacus
Com um cartaz de sábado devidamente recheado de grandes vozes femininas, tínhamos em Lucy Dacus uma curiosidade acrescida. O seu concerto decorreu no Palco Super Bock, perante bastante gente. Do cimo da encosta, a vista até ao palco estava repleta de gente sentada, a piscar um olho ao palco. O concerto não desiludiu, e ficamos com vontade de a rever num futuro próximo.
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Big Thief
Não contávamos com aquela mini multidão para Big Thief, cujo concerto arrancou às 19:15h, ainda relativamente cedo. Não teve em nós o impacto avassalador da performance do ano passado no Festival Vodafone Paredes de Coura, porém, foi também bastante emocionante. Desta vez, Buck Meek veio com a banda, pelo que surgiu um motivo extra de interesse. Esta, que foi a última data da sua digressão europeia, deu para tudo. Buck Meek rebentou as cordas da sua guitarra tendo inclusive saído de palco. No último tema interpretado, “Masterpiece”, chamaram todos os seus roadies ao palco para celebrarem a ocasião. Sem dúvida um momento muito bonito. “Paul” e Mythological Beauty” foram outras das canções essenciais na sua performance.
Snail Mail
A estreia de Lindsey Jordan em Portugal deu-se nesta edição do NOS Primavera Sound. O seu grande êxito como Snail Mail foi logo tocado de início, falamos de “Heat Wave”. Não teve uma prestação vocal assim tão agradável, certo é que a sua voz foi melhorando com o passar das canções. No Palco Pull & Bear, deparámo-nos com muita gente nova a seguir o seu concerto, algo natural pois a própria artista norte-americana é também muito nova. Nota de registo para a sua banda cuja performance teve devidamente à altura.
Todas as fotos do terceiro dia: clicar aqui
Além de fotos do ambiente deste terceiro dia inclui fotos dos concertos de: - Shellac - O Terno - Lena D'Água e Primeira Dama - Hop Along - Viagra Boys - Lucy Dacus - Big Thief - Snail Mail - Jorge Ben Jor - Amyl & The Sniffers - Rosalía - LOW - Erykah Badu
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Texto: Luís Silva e Edgar Silva
Fotografia: João Machado
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cocaincadence · 6 years ago
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Facebook deve resolver sua questão de confiança para se tornar uma potência de varejo
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Eu tenho registrado várias vezes porque o Facebook é um gigante adormecido no varejo . A comunidade social de mais de 2 bilhões do Facebook é incomparável, e tem o know-how técnico, bolsos profundos e inteligência para inventar uma plataforma de comércio social de ponta a ponta que leva os consumidores da descoberta a comprar em nanossegundos.
No entanto, toda vez que defendo esse argumento, sou assediado nas mídias sociais por detratores, alegando que o Facebook nunca poderia se tornar um gigante do varejo porque o Facebook não tem "confiança" suficiente com o público.
Esses detratores estão certos? Eles estão errados?
Em primeiro lugar, "confiança", em si, é uma palavra amorfa. Ela diminui e flui, especialmente no varejo. É difícil saber o que isso realmente denota. Pense nos anos 90. As pessoas confiavam no Walmart? Eles agora? Ou que tal a Amazon? Essa ideia nunca impediu as pessoas de comprar o que precisavam, onde mais queriam obtê-lo, e com os melhores preços e da maneira mais conveniente possível.
Em segundo lugar, como "confiar" transpõe as fronteiras? É correto pensar que as questões de "confiança" identificadas nos Estados Unidos são as mesmas em todos os outros lugares, como na Ásia, onde os mercados on-line ponto a ponto são bastante ativos e onde o Facebook está testando alguns de seus comerciais mais avançados? aplicativos, como compras de vídeo ao vivo ?
Em terceiro lugar, a "confiança" no Facebook é igual à "confiança" no Instagram? Os consumidores e as marcas pensam sobre essas duas entidades de forma diferente, mas, em última análise, a receita e os lucros são revertidos para a controladora do Facebook.
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E, em quarto lugar, e talvez o mais importante, o que acho estranho no argumento da "confiança" é que ele não diz nada sobre se o Facebook tem ou não as capacidades reais para dar à Amazon, Walmart, Alibaba e outros uma corrida pelo seu dinheiro. O argumento "confiança" não diz nada sobre as capacidades reais do Facebook.
É muito mais difícil construir uma rede social muito usada do que imitar as capacidades comerciais de outros, especialmente em um mundo onde as infraestruturas e tecnologias comerciais do mercado agora permitem que varejistas como a Amazon forneçam a espinha dorsal e assumam o papel de terceiros. atividade, sem desempenhar o papel tradicional de "varejista".
Não, em vez disso, é hora de chamar como é e oferecer soluções para o problema da "confiança". O Facebook tem a capacidade de ser um dos varejistas mais formidáveis. "Confiança" pode de fato ser um problema a curto prazo, mas há uma resposta.
O Facebook poderia facilmente restaurar a opinião pública americana - e isso deve acontecer, para que as pessoas possam voltar a falar sobre o que deveriam estar falando: a beleza esmagadora do modelo de negócios do Facebook para o comércio.
Aqui estão minhas recomendações rápidas:
Etapa 1: o Facebook precisa de um editor
O maior problema com o Facebook é que ele não tem nenhum ponto de vista medido. Como fica evidente em tudo que minha sogra publica, o Facebook tornou-se o moderno, superalimentado, equivalente a Barry Bonds do tablóide dos supermercados.
Em vez de ser bombardeada com histórias de círculos misteriosos ou a mais falsa notícia sobre celebridades apenas pagando por produtos, agora a mídia dos tablóides é tão desenfreada no Facebook que as pessoas podem se empanturrar com esse e outros tipos de propaganda até as vacas chegarem em casa. dia ou noite, e não apenas enquanto estiver na fila da mercearia.
Com o tempo, torna-se difícil, como consumidor, saber o que é real e o que é falso. É por isso que o Facebook precisa estabelecer um braço editorial, um braço que o público que usa o Facebook possa usar como fonte de verdade todos os dias. Os compradores de mantimentos sempre sabem que a sujeira nas prateleiras dos checklanes é suspeita, mas, no feed do Facebook, a obscenidade e o jornalismo premiado com o Pulitzer acontecem lado a lado, muitas vezes com a pornografia chegando muito mais brilhante e com manchetes mais atraentes. também.
A única maneira de reverter esse problema é que o Facebook contrate um editor, digamos, alguém de um tipo do Ben Bradlee. Alguém de integridade inabalável e com um histórico de jornalismo objetivo. Uma vez que isso aconteça, o Facebook pode chegar às dicas de como colocar essa pessoa para trabalhar.
Etapa 2: estabeleça uma tomada de notícias do Facebook para o bem público
Algumas das minhas frases favoritas são "para todas as tendências, há uma tendência contrária" ou "o que antes era velho é novo de novo". Isso é exatamente o que está acontecendo com a reação contra o Facebook. Os problemas atuais com o Facebook me fazem lembrar de um ótimo estudo de caso na escola de administração em torno da turbulência na NBC News quando foi comprado pela General Electric. Muitos apontam para essa aquisição como um dos momentos seminais em que as notícias deixaram de ser um bem público para um empreendimento lucrativo.
Fox News, CNN, etc todos têm o seu lugar, mas o público também precisa de um lugar onde possa ir com confiança. Há um vazio a preencher, e o Facebook tem o potencial, muito maior do que qualquer outro, para preenchê-lo admiravelmente.
A posição de distribuição do Facebook é segura. Tudo o que realmente precisa é de conteúdo mais confiável, conteúdo que traga de volta uma generosidade de Walter Cronkite à vida cotidiana americana - ou seja, uma abordagem equilibrada, sem inflexão na voz, nenhuma posição política sobre o conteúdo e apenas uma desqualificação. Em linha reta relatando as notícias para o bem do público.
Passo 3: contrate jornalistas credíveis e planeje o conteúdo
Aqui está minha parte favorita: o Facebook poderia estabelecer uma agência de notícias sem realmente produzir qualquer conteúdo próprio. Seu editor e uma equipe respeitável de jornalistas poderiam simplesmente curar o melhor dos melhores em notícias diárias que estão na internet em qualquer dia da semana. Existem muitos estabelecimentos tentando fazer isso já, apenas nenhum deles é uma propriedade de propriedade do Facebook, com uma posição promovida pelo Facebook nos feeds sociais da América.
youtube
Quem é quem da integridade jornalística poderia ser empregado para ler e reagir ao conteúdo que já está na mídia, catalogá-lo e depois determinar como disseminá-lo, como se fosse uma programação regularmente programada na qual todos pudessem sintonizar, bem como as notícias noturnas do passado.
O público poderia então gostar, comentar e / ou votar histórias para cima ou para baixo como bem entendesse. "Facebook News" (minhas citações) poderia simplesmente colocar o conteúdo lá fora, e então caberá ao público determinar o quão longe ele vai.
Passo 4: Faça o Papel Público Usando o Facebook Uma Função Ativa
Os usuários do Facebook também devem ter responsabilidade pelo bom esforço público. Se os usuários do Facebook estão dispostos a dizer quando eles estão em um relacionamento com alguém, então eles também devem estar dispostos a denotar-se como assinantes do Facebook News.
Não deve haver escrúpulos sobre a pressão dos colegas desempenhando um papel aqui. A pressão dos colegas é o que faz o Facebook já funcionar. Agora é hora de voltar na direção do orgulho cívico.
Mensagens e compartilhamentos devem ser marcados como sendo do Facebook News ou de outras fontes de origem. As pessoas devem ser capazes de discernir com bastante clareza o que seus amigos do Facebook postam em comparação com o que seus amigos tablóides em busca de agenda compartilham e podem agir para ver menos das chamadas notícias dos amigos, se desejarem.
No final, a moda não vem de dentro do próprio armário, nem a iluminação vem dos cinco usuários mais ativos dentro do feed social de alguém. Vem de uma curiosidade ativa em novos pontos de vista, de fontes confiáveis, colocadas em debate, para todo o mundo ver.
O Facebook não é algo novo. Na verdade, é o mais antigo dos antigos. É, em essência, uma rede de mídia, como a NBC, ABC e CBS antes, apenas muito mais poderosa. Essa é a beleza disso. O Facebook tem a capacidade de reimaginar o antigo, não o novo, e a profundidade dessa afirmação, por si só, se você permitir, é inspiradora. Mídia, comércio e muito mais podem ser revitalizados para moldar o verdadeiro bem público, se aproveitado corretamente, de uma maneira nunca antes na ponta dos dedos do mundo.
Então, o potencial do Facebook está em "confiança"? Sim.
Mas é uma confiança bem dentro do alcance do Facebook, uma confiança não em onde os próximos brinquedos e tecnologia inovadores levarão o mundo, mas uma confiança em algo que os norte-americanos consideravam tão querido - no investimento de notícias que vale a pena como um bem público. Esse é o "no papel" e o investimento de geração de ROI não de curto prazo que o Facebook precisa fazer em todos os seus portadores, o que levará à salvação a longo prazo.
Essa é a raiz pela qual o Facebook pode se encontrar novamente e a raiz pela qual um mais um será igual a três no mundo do comércio do Facebook também, pois os fundamentos da confiança - confiabilidade, transparência, integridade - são tão importante no comércio como estão nas notícias.
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gracapaz365 · 6 years ago
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Alive & Well
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Hoje a familia de férias, dividisse pelos vários spots da casa, nas suas actividades favoritas. 
A minha mãe desfruta dos seus 80 anos, usufruindo de uma sesta, o momento de descanso que a vida lhe conferiu. Tenho-a cá por uns dias, e sendo que ainda está totalmente auto-suficiente sonha com a vida no campo desde que me recordo de a ouvir falar. Tornamo-nos boas companheiras, aliás dos filhos todos, e desfruta de tudo aquilo que cada um de nós alcançou. Sempre que pego no meu James Bond, um Volvo vintage que apesar de fazer férias na oficina com mais regularidade do que eu gostaria, ela exibe-o orgulhosa e faz as suas delicias.
Na sala, na outra mesa gigante o Sebastião regressado de Kiel, desfruta o poder da familia, que alguma falta lhe fez com vista para os livros, algumas flores, dados de brincar coloridos que trouxe do Algarve.
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O Antonio navega de canoa pelo rio e não ouço falar dele há horas...
E eu, bem eu, volto à minha mesa da cozinha, também eu rodeada de livros, embora hoje o dia tenha sido decidido ao acordar sem leitura, portanto faço-me acompanhar de revistas também. Gosto no entanto de os sentir à minha volta!
Aprendi então num dos meus livros e num momentos catartico o poder do 6 na data de nascimento.
Sempre fui uma aficionada da numerologia, embora esteja longe de ser boa a matemática, e partir de um livro de Edgar Cayce, (o chamado profeta adormecido da década de 50) descobri 2 outros livros fabulosos que vem de alguma forma ser os meus próximos mestres.
O livro completo da numerologia (em ingles claro_) escrito por aquele que é considerado um dos maiores especialistas deste tema, David A. Philips. 
Digo catártico porque aprendi a fazer a minha carta de nascimento baseada na técnica de Pitágoras e fiquei quase comovida por me aperceber que muitas das características que possuo, e com as quais nem sempre vivi em paz, fazem parte integrante e especifica do ser humano que sou e que aqui veio viver algo único também.
De repente, sentei-me na cama, já a noite ia alta, num AHAH moment a pensar no quanto a nossa vida poderia ser bem mais facilitada se todos nos preocupássemos em fazer a carta de nascimento numa dada altura da vida.
Assim, hoje falo apenas do numero 6, embora tenha descoberto algo muito mais fascinante ainda.
Aprendi que as pessoas que possuem o 6 na carta de nascimento, são os amantes da casa. A criatividade que possuem, é especialmente direcionada para o amor que tem pela casa. As suas casas são sempre locais especiais e o grande desafio é saírem com a sua imensa criatividade para a rua e tornarem-se artistas, musicos, whatever...e fazer dela o seu valor. 
Uau,... pensei eu, estou no caminho certo, já não há detours...
Também reparei que esta minha necessidade quase diária de há anos desenvolver a minha espiritualidade advém do facto de a minha carta de nascimento ser focada no plano mental e material mas de tal forma que o plano espiritual vem de propósito dotado de uma hipersensibilidade que me obriga precisamente a pegar nesse tema, para assim, completar essa carta e me equilibrar. Vim assim dotada de uma imensa intuição que só hoje em dia com muito estudo e dedicação ouço inegavelmente permitindo-me seguir caminho sempre acompanhada de uma sabedoria maior que numa me deixa ficar mal.
Deixo esta sugestão hoje, ainda com muita caminho para fazer na minha própria carta. A ciência dos números, originalmente ensinada por Pitágoras, está preste a ser revelada nas vossas vidas, e é uma viagem excitante.
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wronghatezl-blog · 7 years ago
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EL NIÑO DE LA NOCHE [ZIAM]
PRÓLOGO: LA NOCHE.
ABRIL, 2001
Todo estaba a oscuras, pues la noche ya había caído. El viento rugía feroz, la lluvia caía fuertemente, empapándolo todo a su paso. Está demás mencionar que para las ocho y treinta y seis todas las familias de la ciudad de Wolverhampton ya estaban acurrucadas en sus camas con pijamas y gruesas colchas calentitas. Pero la señora Payne y su pequeño chiquillo de siete años eran la completa excepción.
“Sólo un minuto más, príncipe” animó la dulce voz femenina de Karen, que al ver a su bebé soltar un décimo bostezo, citó dichas palabras mientras acariciaba su moflete colorado.
El niño castaño sentado en uno de los bancos metálicos de la tienda -que estaba envuelto en un abrigo gigante, vistiendo jeans anchos, guantes y gorro de lana, y pequeñas botas marrones- asintió adormecido sin parar de agitar los pies. Sus ojitos cansados cerrándose por sí solos y la mirada cegada del sueño mientras veía a su madre vaciar el canasto rojo y pagar los productos con los que prepararía la cena.
Era muy tarde ya, pero el grosero hombre regordete que ésta tenía por jefe no quiso hacerle un préstamo y tuvo que dar mil vueltas al banco para poder conseguir unos cuantos billetes. Le rompía el corazón ver a su tesoro hambriento, hacía hasta lo imposible por darle todo lo necesario: comida, ropa, juguetes, el amor de padre y madre a la vez…
La ajetreada mujer culminó con el pago de las compras y, lo más rápido que pudo, embolsó cada lata, tomó las bolsas ya anudadas y entrelazó su mano propia con la de su adormecido bebé para por fin partir a casa.
“Déjame ayudarte, mami” se ofreció con la espalda encorvada. Karen sonrió agradecida y le tendió la bolsa menos pesada que sólo contenía pan.
Ambos caminaron por la desolada calle bajo el gran paraguas café que había abierto su madre y que sostenía fielmente. Liam se encogió bajo la capucha de su abrigo algodonado cuando una feroz brisa le azotó el colorado rostro.
“Tranquilo bebé… Yo- no quiero que te resfríes pero tampoco iba a dejarte solo y hambriento en casa” su madre resopló dolida, con el corazón encogido ante la imagen del infante tembloroso. Sus botas humedecidas y los calcetines enlanados mantenían sus piecitos calientes, pero aún así prefería estar metido en su cama bajo la dulce caricia de una manta.
“Tengo tanta hambre que me podría comer un caballo, un elefante, una jirafa, un dinosaurio muy grandototo-” el niño detuvo su incesante hablar cuando visualizó, a través de las espesas gotas de agua, una pequeña silueta encogida sobre un banco de aquella parada de autobuses.
Sintió miedo por un segundo, agudizó la vista un poco más y registró una melena de cabello azabache muy espeso, brazitos flacuchos abrazados a unas piernas pequeñas, y tan sólo vestía unos jeans, un abrigo bastante fino y unas zapatillas converse; todo aquello goteando agua.
“¿Qué ocurre, amor?” inquirió la castaña al ver cómo su hijo paraba de hablar para plantar la mirada en un punto fijo.
El ojicafé a penas parpadeó “¡Ése niño, mami, míralo!” chilló sorprendido señalando con su mano enguantada. ¿Por qué no estaba con su familia, en su cama calentita en vez de quedarse bajo la lluvia siendo arropado por el inaguantable frío?
“¡Madre mía!” soltó horrorizada y aceleró el paso para dirigirse al tembloroso cuerpecito. Liam miraba todo con ojos curiosos.
»"¿Qué te sucedió, pequeño?“ el morenito desconocido, alzó la mirada de inmediato. Sus ojos enrojecidos, labios casi azulados y muy temblorosos, nariz colorada, mejillas ahuecadas. Su carita parecía una triste historia.
"F-frío” sollozó debilmente. Su voz desgastada como si hubiese gritado por bastante tiempo y cada parte de su cuerpo sacudiéndose ferozmente por la bajísima temperatura y el pésimo clima.
“Ay Dios” Karen sintió sus ojos cristalizarse y rápidamente se retiró su gruesa bufanta tejida para envolver el helado cuerpecito. Liam estaba sorprendido viendo cómo su madre lo ayudaba a ponerse de pie y lo abrazaba de manera maternal.
“Cariño, voy a cuidar de ti, ¿Sí? No tengas miedo” él asintió castañeando los dientes blancos y la solidaria fémina se colgó las bolsas del brazo para tomar las manos de ambos niños y trotar con ellos hasta el edificio en donde vivía.
Ellos entraron de inmediato al mobiliario y tomaron el ascensor en cuanto se abrió. En un instante, ya estaban dentro del departamento de los Payne, que estaba muy tibio gracias a la calefacción.
“Li, amor” Karen guió al morenito hasta el sofá color crema de la sala y lo sentó ahí, retirándole la ropa con gran rapidez. Sollozos bajitos escapándose de la garganta del niño.
»"Necesito que traigas una de tus pijamas y todas las colchas que puedas de tu cuarto, ¿Va?“ Liam asintió y corrió velozmente escaleras arriba.
"Auch” gimió terriblemente adolorido el morenito en cuanto la mujer le retiró la empapada camiseta, revelando los horribles moretones que se esparcían en su huesudo estómago.
“Disculpa” Karen intentó ignorarlos por el momento y se dispuso a secarle el cuerpo, siendo más cuidadosa para no continuar lastimándolo.
“Uy” el pequeño llegó tambaleándose segundos después con un montón de colchas que le doblaban el tamaño y las tiró en la alfombra.
“Gracias tesoro” ella se apresuró a tomar el pijama azul claro que le había traído el castaño. Primero le colocó la suave camisa ya sintiéndolo más calmado y luego le retiró la ropa interior para vestirle los largos pantalones algodonados idénticos a la camisa.
Después de aquel percance, y cuando el desconocido niño detuvo los temblores, Karen preparó un t�� de manzana y se acomodó con los dos niños en la mesa de la cocina.
“¿Cuál es tu nombre, bebé?” preguntó interesada. El morenito tomó un sorbo de ese rico té caliente. Estaba un poco asustado porque había parado en la casa de unos desconocidos, quedando como un intruso y sabiendo que en cualquier momento podía terminar nuevamente en la calle.
“Zayn” balbuceó enredando los dedos de los pies que la señora Payne había protegido con unos tibios calcetines de Spider Man.
“Uh, ¿Y qué edad tienes?” Liam bebía de su taza sin formular media oración, sabiendo de antemano que el niño debía estar aterrado y no pretendía aterrarlo más.
“Cumplí ocho en enero” dijo cabizbajo paseando su dedo índice por la taza de té.
“¡Yo cumpliré ocho en agosto!” exclamó no intencionalmente, para luego cubrirse la boca con ambas manitas.
“Genial” susurró Zayn con un nudo en la garganta.
Karen sonrió ante la acción de su niño, acariciando su moflete. El moreno estaba muy flaco, incluso parecía hambriento, sus ojitos mieles estaban cansados y sin brillo; se le pusieron los vellos de punta al recordar todos esos golpes que tenía en el estómago.
“Prepararé pasta con pollo, ¿Te gusta el pollo, Zayn?” se puso de pie para colocar su taza vacía en el fregadero.
Zayn sonrió ligeramente, y levantó la mirada por vez primera “Me encanta, señorita Payne.”
“Llámame Karen, corazón” y con aquellas palabras, se dispuso a preparar una cena rápida para los dos niños hambrientos que tenía sentados en su mesa.
El pequeño Liam agitaba las piernas en el aire, soplando su taza para ver los agujeros que su aliento provocaba en el té, con una concentración admirable.
Zayn apretó los ojos; imágenes perturbadoras abarrotando su mente como constantes balazos. Se sujetó la cabeza con fuerza tras las dolorosas punzadas en sus sienes; le dolía el corazón; se le apretó el estómago; sus ojitos mieles se aguaron; gimió adolorido; el vómito subiendo por la garganta; su esófago obstruido; cada vez más asfixiado por los recuerdos; las lágrimas corriendo por sus cálidas mejillas que empezaban a empalidecerse.
Liam se horrorizó al observar el repentino aspecto del niño, parecía como si tuviera un mounstruo que peleaba por salirse dentro suyo, pero él peleaba de vuelta para evitar que saliera.
“¿Zayn, Zayn, qué ocurre, cariño?” Karen lo tomó de las mejillas, sus ojos aún apretados, más lágrimas corriendo, sollozos liberándose de su garganta; le ardía todo dentro suyo.
Él se alejó de repente, y se paró de la silla, cayendo de rodillas al piso. No pudo evitarlo; vomitó nada más que ácido estomacal, no había comida que devolver en su barriga… Ni siquiera sabía porqué estaba vomitando.
“Lo s-iento” sollozó avergonzado; Karen acariciando su despeinado cabello; abrazando su flacuchento cuerpecito; él desmoronándose; los moretones palpitando…
Y Liam aún no sabía qué estaba ocurriendo.
(1,405 palabras.)
Written by Wronghate.
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